Sala Vazia escrita por Jade Amorim


Capítulo 6
Lembranças




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Sala Vazia

Capítulo 5.

- Oi Sakura, tudo bem com você? – repeti a pergunta quando ela continuou me encarando estupefata.

- O que você está fazendo aqui? – também repetiu a dela, parecia não conseguir raciocinar, mordi o lábio inferior para segurar o riso, ela pareceu enrubescer mais.

- Não quer entrar? – me afastei para lhe dar passagem, ela encarava o apartamento curiosa, mas logo deu os primeiros passos.

Suspirei e fechei a porta, indo logo atrás de seu corpo curvilíneo. Estava usando um shortinho rosa com uma regata branca e transparente o suficiente para ver os traços da lingerie num rosa bem clarinho. Ela realmente era o tipo de mulher que usava rosa, delicada, mesmo com as curvas voluptuosas, meiga, mesmo com os olhos sempre um pouco desconfiados, e vaidosa, a julgar pela pele clara de aparência tão macia.

Me aproximei dela que encarava a bagunça do local com uma das sobrancelhas arqueadas e peguei-lhe a torta levando em seguida para a cozinha. Ela me acompanhou com o olhar, parecia meio muda. Ao abrir a geladeira, optei por também pegar duas garrafas de cerveja.

- Aceita uma cerveja? Ia lhe oferecer água, mas não tenho gelada, e meu cunhado acha que vivo para beber e fez o favor de encher minha geladeira com uma cerveja que não sei onde enfiar.

Ela soltou uma leve risada, comprimindo os olhos que brilhavam. Pegou a garrafa em minhas mãos e deu um bom gole, desviando o olhar de mim. Aquilo pareceu lhe devolver o dom da fala.

- Porque está morando aqui? – inquiriu, de maneira petulante.

- Oras, quando vim lhe trazer em casa ontem achei o lugar aconchegante, estava sem onde morar e nada do que tinha olhado me agradou, simplesmente vim aqui ontem à noite ver se tinha apartamentos à venda.

- Você é meu vizinho... – Ela me olhou desconfiada.

- Alguma objeção quanto a isso? – inquiri.

- Não, nenhuma, só não esperava, fiquei surpresa. – Seu sorriso não chegou aos olhos. Tomou mais um gole de cerveja. – Gosta de torta de chocolate com morango?

- Qualquer coisa que tenha alto teor calórico me agrada. – Ela riu, balançando a cabeça negativamente.

- Então vamos cortar um pedaço e comer um pouco, precisa de ajuda para arrumar a casa? – Perguntou, indo até a cozinha.

- Na verdade, o que poderia estar arrumado, já está. Não tenho móveis, pelo menos não montados. Não trouxe nada da minha antiga casa, terei de remobilhar tudo.

- Entendo, está tentando desapegar de alguma coisa, Kakashi?

Ela me olhava apenas de rabo de olho enquanto cortava os pedaços da torta com a faca e colocava sobre os pratos que havia lhe entregado. Estremeci um pouco com aquela pergunta e não respondi. Ela também não cobrou uma resposta. Deixou com que sua indagação pairasse no ar como uma prévia de tudo que estava por vir.

Não sei bem como, ou porque, mas numa hora estávamos comendo a torta de chocolate que ela havia trazido – que estava muito boa – e noutra estávamos rindo apenas por olhar um na cara do outro. Talvez a resposta para nossa inegável felicidade estivesse na meia dúzia de garrafas de cervejas sob a mesa.

- Céus, acho que estou bêbada! – ela me encarou, comprimindo os lábios para segurar outra risada. – Eu fico tão ridícula quando bebo.

- Não acho que você fique ridícula – respondi rapidamente. – Ao contrário.

- Não pode falar nada! – me cortou. – Você não está em condições de fazer qualquer tipo de análise.

- Tudo bem, vamos para a sala. Preciso me sentar naquele colchão, esse banco parece muito, muito instável. – Ela riu, suas bochechas estavam com um tom rosado adorável, uma característica sua, pude observar.

Peguei mais duas garrafas na geladeira, fechei-a com os pés e fui para a sala. Ela estava lá, esparramada no colchão, com meu travesseiro tampando-lhe o rosto. Com a minha aproximação, se levantou, ajeitando a blusa que havia subido um pouco, expondo um pedaço da pele macia de seu abdômen.

- Senta aqui – ela bateu no colchão ao lado de onde ela estava.

Sentei-me ao seu lado, entregando a garrafa extra na minha mão. Ela pegou e tomou um gole, deitando novamente, mas sem desviar os olhos do meu rosto. Não sei quanto tempo ficamos nos encarando, sem falar nada, apenas desviando para tomar alguns goles.

- Acredita em destino? – ela sussurrou, por fim.

- Não sei dizer...

- Ora, ou você acredita, ou não acredita. É simples.

- Bom... – deitei-me ao seu lado, com a mão apoiando a cabeça, virada para ela. – Às vezes sim, às vezes não.

- Eu acredito – ela suspirou, ficando da mesma maneira que eu sobre o colchão, o rosto perigosamente perto. – Não daquela maneira cega, da qual é tudo predestinado. Existe um destino, mas nosso destino é feito de escolhas, entende? É difícil explicar.

- E porque você falou sobre destino? – ela abaixou o olhar, ruborizando um pouco.

- Eu esbarro com um cara misterioso num parque, almoço com ele, descubro que ele está sem onde morar, e, ao me levar em casa, acha o apartamento perfeito, para, no fim, ser meu vizinho. Muita coincidência, não acha?

Não pude segurar um riso abafado, era ela boa, devia admitir. Seus olhos ostentavam um brilho divertido e, talvez, ela não estivesse tão bêbada assim.

- Exceto a parte de ser seu vizinho. – Ela arfou e fez cara de indignada.

- Eu sabia! Seu mentiroso! Sabia que era coincidência demais você se tornar justamente meu vizinho – ela apontou o dedo na minha cara e perguntou lentamente: - O que você fez para conseguir o apartamento?

- Não precisei subornar ou torturar ninguém, se é isso que quer saber. O fato é que o apartamento ao lado do seu estava vazio, eu só precisei jogar uma conversa para o administrador para descobrir qual era o seu. – Falei, abafando o riso.

- E porque você queria ser meu vizinho? – Ela perguntou, um pouco mais séria dessa vez.

Na verdade, aquela era uma pergunta para a qual eu não tinha resposta, porque cargas d’água eu gostaria de ser vizinho de uma garota que havia conhecido no dia anterior?  Parei por um momento, analisando a situação, não tinha um motivo exatamente, não um motivo forte, eu só me sentia ridiculamente atraído por aquela garota, como se tivesse dezesseis anos e nunca houvesse gostado de alguém. Por fim, dei de ombros, e talvez a minha expressão tenha feito com que ela não me questionasse mais.

Esvaziei minha garrafa e vi que a dela já estava no chão, completamente vazia. Ela me olhava como se me analisasse, e seus olhos novamente fizeram com que eu tremesse, era como se ela pudesse ver aquilo que eu escondia no canto mais escuro da minha alma.

- Eu... – ela começou, vacilante. – sinceramente, não te entendo – me encarou, os olhos verdes nublados pela dúvida. – Em alguns momentos é tão receptivo, mas em outros... é como se tivesse medo que alguém se aproximasse – ela suspirou – do que você tem medo, Kakashi?

- É uma história meio longa, e o final não é feliz. Você não precisa saber.

Eu estava deitado, encarando o teto com uma garrafa de cerveja vazia nas mãos. Sakura estava apoiada num cotovelo, e eu podia sentir seus olhos sobre mim. Ela se curvou um pouco mais, me obrigando a encará-la.

- Eu quero saber.

Suspirei, talvez a bebida tenha soltado a minha língua, ou talvez eu simplesmente precisasse falar sobre aquilo com alguém de maneira desesperada. Eram memórias que eu não queria me lembrar, mas que contraditoriamente lutava para não esquecer. Apenas abri a boca e comecei a falar.

- Eu era casado, e amava muito a minha mulher, – Evitei olhá-la enquanto contava, não queria ver as emoções passando por seu rosto – mas ela era muito fria e calculista às vezes, e geralmente discutíamos por pensar de maneira diferente. Essas brigas, depois de um tempo, começaram a ficar freqüentes demais, e ela foi se afastando. Ficamos quase um ano sem nos falar direito, apenas o estritamente necessário. Nem na cama as coisas eram as mesmas, ela fazia sexo como se tivesse encarando uma chata e longa reunião de negócios, frígida, totalmente. Mas... – respirei fundo e fechei os olhos, ainda podia sentir os orbes dela sobre mim. – Eu a amava tanto e, por puro egoísmo, não podia deixá-la ir embora. Naquela noite, nós discutimos mais uma vez, só que aquela ela pior, ela se descontrolou... – Franzi as sobrancelhas, tentando me recordar melhor dos fatos. – Céus! Faz tanto tempo que não consigo me lembrar mais do motivo. Só sei que era uma coisa tão insignificante, uma única gota que fez com que o copo transbordasse. Eu joguei na cara dela tudo o que estava acontecendo, como me sentia e ela cuspiu veneno na minha cara. Ela queria ir embora, queria me largar, mas mesmo assim eu não podia! Não conseguia, havia me apegado à imagem dela de anos antes, talvez a Rin que realmente tenha valido à pena se apaixonar, não conseguia aceitar o fato dela ter mudado tão drasticamente de comportamento. Eu tentei impedi-la, juro que tentei, mas ela pegou a chave do meu carro e saiu de casa correndo.

Parei para respirar fundo, sentia as lágrimas tentando sucumbir, mas as reprimi com força. Tentando me desviar das imagens, da dor dilacerante das memórias, abri os olhos e encarei os de Sakura, comprimidos, e cheios de um sentimento que eu percebi como sendo pena, aquilo me irritou.

- Não sita pena de mim, droga! – Ela parou, arqueou uma sobrancelha.

- Não sinto. Agora continue, por favor.

- Cínica. – Ri fraco, e ela piscou para mim, me incentivando. – Estava chovendo muito, era final de ano, verão, estava frio, o vento derrubou muitas árvores naquela noite, lembro de ter ouvido em algum noticiário. Contudo, isso não a impediu de pegar o carro e sair a toda velocidade. Não tinha como segui-la, teria que entrar e procurar a chave do outro carro. Não tinha o que fazer senão esperar, ela mais cedo ou mais tarde, teria que aparecer. Foi uma noite horrível, agonizante, ela não atendia minhas ligações, e eu parei de tentar. Estava arrependido ao ponto de me ajoelhar quando a visse pedindo para voltar a ficar comigo, só que eu nunca tive essa chance. Ela capotou o carro naquela noite, a pista estava molhada, ela estava correndo demais e não conseguiu frear. Ligaram umas quatro da manhã pedindo que fosse reconhecer o corpo. Eu achei que fosse morrer naquela hora, eu tinha sido muito duro com ela e ela havia ido por minha culpa. Se eu fosse mais compreensivo, ela ainda estaria viva. Não teria pego a porra do carro e sofrido o maldito acidente.

- A quanto tempo faz isso? – Ela cortou minha linha de pensamento, virei o rosto para encará-la.

- Não sei dizer ao certo, seis meses, um ano, meu cunhado disse que faz nove meses. Por quê?

- O que você fez nesse meio tempo?

Suspirei, mesmo tendo passado a pior parte, essa era, talvez, a mais vergonhosa.

- Eu fiquei trancado dentro de casa até as ultimas duas semanas, quando percebi que ficar remoendo não ia ajudar em nada.

Ela suspirou, deitou duma vez, olhando para o teto assim como eu.

- Era por isso que você estava procurando um novo apartamento não é? Por isso não trouxe nada do antigo? Você quer esquecer?

Ela virou a cabeça para me olhar, e eu fiz o mesmo. Seu semblante era calmo, compreensivo. Ela sorriu de leve e eu, tentando retribuir, sorri debilmente. Tinha a impressão de que devia responder algo a ela, mas talvez não precisasse, pois no momento que nossos olhares se fixaram um no outro, o único foco estava naquele ato. A única coisa da qual estava ciente era de que aqueles lábios eram muito convidativos e, impulsivamente, os tomei para mim. Beijando-a de uma forma quase sedenta.

Continua..


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Notas finais do capítulo

Eu sei que prometi um capítulo quente, mas acabei escrevendo algo mais revelador. Aí está o passado do nosso querido, amado, lindo, sexy (#táparei) Hatake Kakashi. Desculpem a demora, mas recompensei no capítulo, ele era muito importante, ok? rs
Deixem reviews queridos, se gostaram, ou não. Podem falar!

Beijinhos e abraços,
Jade.