Um Novo Rumo

 

Capítulo 2

 

“O Diário”

 

Após desembarcarem do trem, as duas colegiais saem correndo em direção à avenida principal do bairro.  A pressa era óbvia: elas perderam a parada por causa da discussão que Sakura tivera com aquele “grosso”.

 

-         Por Kami, Sakura!! – Grita Tomoko. – O que deu em você para puxar briga com aquele universitário da Toudai???!!! Você agora conseguiu perder o juízo de vez!

 

-         Como você sabe que aquele palerma é da Toudai?? – Perguntou Sakura, tentando diminuir a velocidade, uma vez que estava começando a ter dores na região do abdomen por causa da corrida.

 

-         É lógico que ele é da Toudai... – Desta vez, é Tomoko que para de correr e fica com aquela feição de donzela sonhadora. – Você não notou, Sakura-chan... Aquela pele morena, aquele corpo atlético, aqueles olhos azuis... Você viu?!  É a primeira vez que eu vejo um japonês de olhos azuis!!!  Com certeza ele deve ter raízes estrangeiras, talvez o pai seja alemão, ou...

 

-         Para! Para! Para!! – Sakura tapa os ouvidos – Eu não acredito que em pleno século 21 ainda possam existir garotas como você que ficam suspirando pelos atributos físicos de alguns idiotas como aquele!!  

 

-         Mas Sakura-chan...

 

-         O que você pensa da vida, Tomoko!  Não é porque aquele babaca tenha isso ou aquilo que ele vá obrigatoriamente pertencer a um certo grupo! – Explica Sakura, tentando se acalmar.

 

-         Tá bom...  Lá vai você começar com os seus discursos ideológicos...  Onegai, deixa os seus delírios ecológico-sociais para as aulas...

 

-         Ah! Agora desistiu de querer proteger aquele tapado?

 

-         Não é isso Sakura-chan... – Diz a garota desanimada – É que eu percebo que você nunca conversa sobre coisas que as garotas normais conversam...  Você não fala sobre roupas, festas, filmes, animes, garotos...

 

-         Tá certo Tomoko.  Só porque eu não perco tempo com futilidades eu sou considerada por você, minha melhor amiga como “anormal”?  Eu mereço...

 

-         Não foi isso que eu quis dizer!

 

-         Mas foi o que ficou no ar!

 

As garotas param em frente a um bloco de apartamentos. 

 

-         Bem, eu definitivamente não quero discutir mais com você. – Suspira Tomoko. – Vê se você se cuida e até amanhã, Sakura-chan.

 

-         Eu também não gosto de discutir com você, Tomoko-chan. – Diz Sakura, abrindo pela primeira vez um sorriso.  Cansado, mas mesmo assim um sorriso. – Afinal, você é minha melhor amiga e é a única que me compreende.

 

-         Ah! Sakura-chan prometa que não vamos mais discutir, onegai?

 

-         Tá certo, Tomoko-chan!  Não vamos mais brigar por causa daquele idiota. – Responde a outra.

 

Nesse momento, as duas dão um abraço fraternal que só é interrompido pelo rápido  comentário de Tomoko:

 

-         Mas bem que aquele universitário é o cara mais lindo que eu já vi neste ano!!

 

-         Ah!!!  Você não tem jeito mesmo, Tomoko!!!!

 

Tomoko então entra no condomínio, e Sakura segue o seu trajeto rumo à sua casa que fica cerca de seis quarteirões de distancia daquele local.  No caminho vai pensando:

 

“Que estranho...  Eu nunca vi aquele sujeito, mas tenho a impressão de que o conheço faz  muito tempo... ”

 

No apartamento, Tomoko pensa:

 

“Por que a Sakura-chan é tão arredia com todas as pessoas?  Logo ela que é tão linda... Deve ser por isso que os garotos da escola chamam ela de ‘Gata Selvagem’...”  

 

Realmente, os pensamentos de Tomoko eram sinceros.  Sempre arisca com todos, Sakura nunca teve muitos amigos e não mantinha quase nenhuma relação com os garotos da escola. Sua única preocupação no entanto era a campanha pela prevenção do mundo. Não como os Cavaleiros de Athena que tinham que lutar pela paz. Mas como ecologista: Sakura fazia parte da ONG Greenpeace que “lutava” também pela preservação dos recursos naturais do planeta. Porém apesar de tudo, a sua beleza era notável até mesmo para uma garota da sua idade:  Cerca de 1,72m de altura, cabelos lisos na altura do ombro, presos apenas por uma fita de cetim, olhos castanhos claros, boca carnuda...  Ela também era muito confundida por todos como sendo estrangeira.  Mas quem conhecia sua vida sabia que toda a sua beleza foi herdada única e exclusivamente de sua mãe...

 

***

 

Ikki caminha pela rua vazia que leva direto a mansão mais imponente de toda Zona Sul de Tóquio.  A mansão da família Kido.  Nas mãos, carrega o diário da estudante que definitivamente conseguiu tirar o resto da tranqüilidade que ele tivera neste dia...

 

***

- Xeque-mate! – Diz gentilmente uma jovem de aparência grega.

 

-         Pelas barbas de Lenin!  È a vigésima quinta vez consecutiva que eu perco neste maldito jogo de xadrez!!! – Exclamava o jovem loiro de sotaque meio europeu.

 

-         Também, quem manda você jogar xadrez logo com a deusa da sabedoria, ô lindão!!

 

-         Escute bem uma coisa, Seiya...  Eu não gosto de quem zoa da minha cara e muito menos de homem que me chama de lindão!!! – Esbraveja Hyoga, que está com o rosto corado de raiva.

 

-         Oh não!! – Clama Seiya colocando a costa da mão na testa e falando de uma forma afeminada, se fazendo de donzela em perigo – O tenebroso cavaleiro-deus de Cisne vai me atacar!!  Alguém me ajude... ahahahahahaha!!!!!

 

-         Basta, Seiya!! Se você não parar já com essa brincadeirinha idiota, eu vou terminar o serviço que Hades deixou pela metade com você!!!

 

Seiya para de correr (de forma afeminada), se vira para ele e pergunta:

 

-         Cê tá falando sério?! Se você ao menos encostar o seu dedo no meu corpinho sarado... - agora falando sério - será eu que vou terminar o serviços que todos os seus oponentes deixaram pela metade!!

 

-         Então vem!! – Grita o outro.

 

-         Não precisa nem repetir!!! – Grita Seiya.

 

-         Já chega! Parem imediatamente com essa baderna já!!! – Dessa vez, quem grita com eles é a jovem Saori Kido que até o momento, estava sentada na mesa do tabuleiro de xadrez.

 

Os dois param e ficam apenas olhando para ela que por sua vez, olha para o teto, como se contempla-se o céu.

 

-         Como isso pode acontecer, meu pai!! Dois cavaleiros-deuses e ainda por cima meio-irmãos discutirem dessa forma!!  Prefiro todo e qualquer tipo de castigo, a ter que presenciar isso!! – Lamenta ela meio chorosa.

 

-         Ah... Fica assim não Saori... – Diz Seiya com uma cara de completo arrependimento por ter contrariado a sua deusa e seu amor secreto. – Você viu que quem começou tudo isso foi o Hyoga...

 

-         Como é?  Foi você que começou com essas brincadeiras de criança boba, Seiya!! – Diz Hyoga – Mas está bem...  Se é para não ver a Saori se lamentando com o próprio Zeus... – Ele estende a sua mão para Seiya que fica com cara de bobo ao ver aquele gesto - ... Desculpa por ter te “ofendido”, Ogawara... 

 

-         ... Hum... Eu é que peço desculpas, Alexei – Fala Seiya com a cabeça baixa, mas com os olhos atentos em Saori.

 

-         É assim que quero ver todos vocês! – Diz Saori com o rosto iluminado pelo seu belo sorriso. – Como verdadeiros irmãos...

 

-         Mas que cena linda! Parece aqueles dramalhões mexicanos que passam na TV por assinatura... – Debocha Ikki, que estava na porta principal só observando a cena que para a visão dele era muito bizarra.

 

-         Ah você estava aí Ikki, nem notamos! – Diz Saori.

 

-         Se eu fosse algum inimigo, com certeza todos vocês já estariam mortos. – Diz, entrando na sala e sentando (na realidade se esparramando) no sofá.

 

Antes que os outros três pudessem dizer alguma coisa, Tatsumi, o mordomo da mansão, entra esbaforido e fala:

 

-         Perdoe-me senhorita, mas é que esse demônio – apontando em direção a Ikki – me ameaçou de morte se eu não deixasse ele entrar!!

 

-         Ikki... – Fala Saori de forma pasma.

 

-         Ahahahahaha!!!! É muito engraçado ver esse careca com medo!!! – Gargalha Seiya apontando em direção do mordomo que está suando frio, mas não se sabe se é de medo ou de raiva pelos comentários.

 

-         Já chega por hoje, Seiya! – Esbraveja Saori - você não tem jeito mesmo... Tatsumi, pode se retirar, por favor... E você, Ikki, o que te deu na cabeça afinal, parece que nem teve um dia agradável...

 

-         Bingo!! – Clama Ikki, que já está perto do bar preparando uma dose de uísque. – Eu tive um dia péssimo!! Acho que terminei de pagar todos os meus pecados... Espero esquecer desse dia para sempre...

 

-         Nossa... Então o seu dia foi péssimo mesmo...  – Hyoga pensa alto.

 

-          E qual foi a causa desse dia ruim? – Pergunta a jovem Kido – Foi algum problema na universidade?

 

-         Já sei! Você tirou zero na prova de hoje! – Seiya tenta advinhar.

 

-         Não... A universidade não foi a causa... E você sabe mais do que ninguém eu nunca tive problemas com estudos.  Não sou como você que foi reprovado neste teste ridículo para aprovação na Toudai.

 

-         Teste ridículo!! – Esbraveja Seiya – Uma prova de duzentas questões de múltipla escolha com todas as matérias, mais outra prova com matérias específicas e uma redação e você chama isso de ridículo!!??

 

-         Mas qual foi a real causa então? – Pergunta Hyoga, tentando dissipar o novo clima de tensão que iria começar a se estabelecer.

 

-         Foi porque eu tive a infelicidade de encontrar no metrô duas adolescentes malucas que começaram a me bombardear com perguntas paranóicas e uma delas começou a me chamar de grosso, machão... umas besteiras que eu nem me lembro mais, mas que me deixaram de péssimo humor, porém espero esquecer tudo isso de uma vez e...

 

-         Nome:  Sakura Amamiya, idade: 14 anos, signo: escorpião, cor preferida: preto (porque consegue encobrir tudo), namorado: não perco tempo com idiotas!... – Seiya estava sentado no sofá, lendo o diário que Ikki teve a infelicidade de esquecer lá. – “06/08/2002 Tive um dia péssimo hoje. Além da Passeata Anual de Combate a Poluição do Grupo Internacional Greenpaece ter sido cancelada, o idiota do Kogiro ainda teve a petulância de pedir para ficar comigo! Jamais ficaria com um bunda-mole daquele que só perde tempo em ficar medindo o tamanho dos seios das outras garotas... Se ele ousar a falar comigo novamente, eu juro que vou matar ele de uma forma lenta e dolorosa... ” Parece que ela é bem nervosinha mesmo, heim?

 

-         O que tá fazendo lendo isso, seu idiota!! – Grita Ikki que derruba o copo de uísque no chão e “voa” em direção a Seiya que não conseguiu esboçar nenhuma reação. -  Ninguém te falou que é errado entrar na vida dos outros! – Grita, tirando a força o diário da mão de Seiya que fica petrificado com a atitude de Ikki.

 

-         ... Ma-mas vo-vo-você foi que roubou o diário da menina sem ela saber.... – Fala um amedrontado Seiya.

 

-         Eu roubei o diário dela? Deixa de ser panaca Seiya!! Só você mesmo para ter essas idéias de jegue!!

 

-         Por favor parem agora, ou eu vou ter que apelar!! – Grita Saori. – E de onde veio esse diário, Ikki?

 

-         A estudante mais biruta deve ter esquecido.

 

-         A Amamiya? – Perguntou Hyoga.

 

-         Essa daí mesmo.

 

-         Mas espere! – surpreende-se Seiya – Ela tem o mesmo sobrenome que você, não é Ikki?

 

-         ... É verdade Ogawara... – Ikki responde pensativamente.

 

-         Deve ser coincidencia. – diz Hyoga.

 

-         Deve ser carma é isso aí!  Fora o Shum, parece que todo Amamiya é cruel e vingativo... – Seiya para de falar ao ver o olhar de Ikki que está cada vez mais inflamado.  Mas este se vira e responde:

 

-         Concordo com você, Cisne. – responde Ikki que ainda estava se lembrando da reação que tivera quando Sakura “revelou” seu nome – Mas mudando de assunto, vocês viram o meu irmão? Eu pensei que ele estivesse por aqui...

 

-         Não Ikki, Shun não tem aparecido por aqui ultimamente. – Responde Saori.

 

-         Pois é né... – Fala Seiya – Ela mal tá dando as caras por aqui depois que se envolveu com esse negócio de fotografia para National Geographic... Todo esquisitão mesmo...

 

-         Não diga isso Seiya! Shum agora conseguiu se descobrir como ser humano... Depois da guerra contra Hades ele só saiu daquela depressão, porque começou a trabalhar com a fotografia. – Diz Hyoga.

 

-         Realmente ele se sentia muito culpado por ter sido o eleito de Hades... Qualquer um ficaria daquele jeito. – Complementa Saori.

 

-         Bem, se tem uma coisa que eu destesto é “vale-a-pena-ver-de-novo”, tchau para todos. – Fala Ikki, fazendo menção em sair.

 

-         Não vá agora, Tatsume irá colocar um lugar para você no jantar. – Diz Saori.

 

-         Obrigado Kido, mas vou lanchar qualquer coisa. Fica pra próxima.

 

-         E você vai devolver o diário da mina? – Pergunta Seiya.

 

-         Não. Eu vou jogar na primeira lixeira que eu ver pela frente. – Responde Ikki.

 

-         Não faça isso Fênix. – Saori revida – Não é bom que as lembranças da vida de uma pessoa sejam jogadas ao vento para sempre.   Mesmo que ela tenha lhe aborrecido, é de bom grado que você entregue esse diário à sua dona.  Por favor... Pense bem antes de agir.

 

-         ... Está bem...  Vou pensar no seu caso. – Ikki fala indo em direção ao portão e por fim, desaparece entre as trevas da noite.

 

-         M-I-L-A-G-R-E... – Fala um pasmo Seiya. – Ele disse que “ia pensar” no pedido da Saori... Isso é inédito!

 

Nesse momento, todos olham para Saori que parecia ainda ver o vulto do cavaleiro de Fênix.

 

-         Não é milagre Seiya... – Responde Athena – É que algo grandioso está para acontecer na vida de Ikki e Shun...

 

Continua...