Shimmer escrita por scarlite


Capítulo 12
Capítulo 12




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CAPÍTULO 12: O avesso do espelho

No fim, tudo se transforma

Da infância para a vida adulta; e a chave é uma só: O sofrimento.

15 de março

Querido Deus.

Eu não consigo compreender muitas coisas.

Porque não tenho amigos além dos meus familiares?

Eu sou mesmo o que dizem os meus colegas de aula?

Uma estranha.

Hoje, na escola, alguns garotos começaram a rir enquanto a professora Dawkins estalava os dedos a frente do meu rosto. Foram necessários uns dez estalos para que eu visse que ela estava ali ao meu lado.

Não é a primeira vez que isto acontece.

Eu não consigo ignorar certas coisas, que as pessoas parecem não perceber. Segundo elas coisas “idiotas”.

Eles não entendem que eu não sou como eles.

Ah, faz um tempo que não escrevo; travei um novo conhecimento:

Rebeca.

Gosto do som do seu nome:

Re – be - ca

Parecem teclas de piano sendo pressionadas.

Ela tem cabelos bem negros, como o piche; os olhos são meio puxados.

Ela não faz perguntas que não quero responder. E ouve.

Descobri que gosto dela.

O Edward diz que só mesmo uma cabeça “livre” pode entender outra.

Ele anda meio alterado ultimamente. Como sei disto?

Está calado e não troça de mim como de costume.

Eu sei que eu sinto vontade de ficar grudada nele; o que não é diferente de sempre; mas, agora é uma coisinha que aperta meu estômago, como uma mão agarrada a ele.

O que pode ser isso? É a mesma coisa que fica circulando na minha corrente sanguínea quando toco piano; só que muito, muito mais forte.

 ***

Um a um os dias de março iam passando.

\t\t  As folhas das árvores pareciam acordar de um sono comprido.

Mesmo aqui em Forks, a primavera causava certo rebuliço na paisagem e nos ânimos.

- Mais para a direita Edward! – Alice me “ordenou” altiva.

Com uma tremenda cara de tédio movi o cartaz colorido com um “Seja bem vindo” enorme escrito com canetinhas coloridas.

- Aqui está bom? – Questionei pela trigésima vez naquela tarde.

- Hm... Acho que devíamos colocar deste lado da sala. – Deu uma passada comprida em direção oposta a que eu me equilibrava sobre a escada de dobrar.

Bufei.

- Allie, quantas vezes você vai mudar esse negócio de lugar até retornar a posição de início? – Ela não se ocupou de me responder. Apenas olhou compenetrada para toda a sala com o indicador repousado no queixo. Ela agora realmente parecia uma professora.

- Não acredito que Emmett estará de volta! – Bateu palma empolgada.

Vários balões coloridos adornavam a pequena sala de estar;

- NÃO TIA ESME! – Uma figura pequena e esguia passou como uma bala ao lado da escada onde eu estava.

Agarrou-me as calças tentando se esconder. Ou pedira socorro.

Olhei para baixo e vi o topo da cabeça marrom de Bella vestindo apenas a parte de baixo das roupas. Uma saia xadrez bem feminina e de sutiã. Na hora que reparei na escassez de tecido ergui a cabeça como quem escapa da morte.

Pisque nervoso e me perguntei o que diabos ela fazia.

- Bella, meu bem, não machuca vestir uma roupa apropriada para sua idade. Venha cá! Coloque essa blusa agora.

Mamãe foi categórica, e pude ouvir claramente as risadas histéricas de Alice. Quando olhei para ela, meu rosto esquentou.

Oh, meu Deus! O que porra estava acontecendo comigo?!

- Não! Isso pinica! – Bella se encolhia atrás da escada.

- Vamos Bellinha, é só uma roupa. – Alice saiu em apoio a nossa mãe. – Saia daí. – minha irmã estendeu as mãos em nossa direção.

Eu continuava mudo.

Atrevi-me então a olhar para Isabella, engoli em seco ao notar a brancura da pele do busto. Virei o rosto novamente.

- Mãe, deixa a Bells usar as próprias roupas. Lembra da última vez? – Argumentei sabedor das conseqüências de tentar forçar minha prima a fazer qualquer coisa. Principalmente no tocante a vestimentas.

Num dos aniversários de Carlisle, Bella tinha nove anos, minha mãe resolveu que seria uma boa idéia levar toda a família até Port Angeles para comer no comentado novo restaurante. Fez reservas com dias de antecedência.

No entanto, havia um pequeno detalhe que ela não levou em consideração: O tal restaurante era de alto nível; teríamos todos que nos vestir elegantemente. Homens de terno e mulheres com vestidos de boa linha.

Lembro-me de estar no quarto com Alice; ela me ajudava a colocar a gravata e Emmett apenas me enchia por parecer um “mauricinho”. Quando ouvimos os barulhos vindos do quarto de Bella.

Olhei para minha irmã e Emm com um ponto de interrogação na testa. Ao que eles me acompanharam.

- Eita! O que será agora?! – Emmett largou a bola de baseball na cama onde estivera deitado.

Lembro-me muito bem da voz exasperada de Esme, e quando chegamos ao quarto no fim do corredor, a cena era mais que engraçada:

Mamãe agarrada à barra da calça de Bella enquanto ela estava com metade do corpo para fora da janela. Ao notar nossa presença, minha mãe e prima olharam para Alice e eu.

Soltei uma gargalhada alta, me curvando com as mãos na barriga enquanto ouvia minha irmã ecoando minha reação. Lógico que o urro que Emmett lançou para fora da garganta foi muito mais escandaloso.

- Bellinha tentando fugir com algum pretendente? – Ele tentou zombar enquanto segurava com as enormes patas, a barriga.

- O que é isso mãe? – Me esforcei ao máximo para manter a voz coerente.

Isabella se deixou puxar para dentro do quarto, e com naturalidade pulou para sua cama agarrando o tão surrado boneco vermelho.

- Sua prima não quer colocar o lindo vestido que comprei especialmente para hoje. – Com desgosto Esme olhou para o vestido pendurado no braço esquerdo. Alice saiu do nosso lado.

- Bella, olhe como é bonito, vamos colocá-lo e você verá as cores como lhe caem bem; - Alice sentou-se ao lado dela na cama erguendo-lhe o queixo com os dedos.

- Allie, é bonito sim, mas, pinica. Machuca. – Bella falou meneando a cabeça. – Não gosto dessas roupas. – Apontou com o pequeno indicador a peça azul escuro que pendia dos braços de Esme.

- Desculpa tia Esme. – Ela olhou rápida para mamãe. Que de imediato amoleceu de sua decisão de imposição.

- Oh, meu anjo. – Esme acomodou-se do lado de Isabella. – O que faremos então? – Minha mãe olhou-me; eu me mantinha com as mãos nos bolsos ao pé da cômoda.

- Porque ela não pode ir com suas próprias roupas? – Questionei o óbvio.

- Bom, seria estranho chegarmos todos vestidos assim e ela não. – Allie constatou.

- Seria original, isso sim! Apoio você Bells – Emmett exerceu novamente seu papel: Fazer tudo que Bella queria.

Nesse momento papai chegou apertando o laço de sua própria gravata.

- Estão todos prontos? – Perguntou animado como sempre. – Hoje a noite será toda nossa. – Olhou finalmente para nós, e notou nossa expressão incomum.

Ninguém respondeu nada. E o vi abrir a boca para questionar, mas, Bella se adiantou:

- Tudo bem tia Esme, pode colocar. – Estendeu os bracinhos magros a frente do corpo para que minha mãe lhe enfiasse o vestido infame.

Mamãe suspirou aliviada e nos excomungou do quarto para que pudesse vestir Bella.

Cerca de uma hora depois estávamos no Une nouvelle vie no centro de Port Angeles. Durante todo o caminho, Bella se coçou e fez cara feia para o adorável vestidinho azul.

Não atino exatamente em que momento aconteceu, já faz alguns anos que não me recordava desse inusitado acontecimento.

Tudo corria bem, papai estava feliz e minha mãe encantada com o cardápio. Eu conversava distraído com Emmett sobre o último jogo de bascket que vimos na TV. Bella havia pedido para ir ao banheiro e Alice a acompanhou.

Escutei os primeiros “Oh”, e “minha nossa” e momentos depois: as risadas. Um monte delas.

Na seqüência minha mãe ficando terrivelmente vermelha e de olhos arregalados. Uma completa expressão de pânico. Meu pai por outro lado parecia prestes a cuspir o vinho branco que enchia sua boca. Quando engoliu com dificuldade foi-lhe impossível conter o riso.

Finalmente me virei para ver o motivo de tanta comoção.

Ah, eu esperava tudo, menos ver Bella passando correndo entre as mesas apenas com a roupa de baixo.

A sua pequena figura serpenteava entre os figurões bem vestidos; rápida e ágil. Seguida por uma Alice completamente aturdida, e um garçom emproado.

- Oh, meu Deus! – Mamãe se levantou num átimo indo em direção da pequena trupe.

Foi cômico!

Parecia uma corrida em fila:

Mamãe

  O garçom

Alice  

  E Bella.

Eu mesmo não me segurei e comecei a gargalhar. Pobre Esme! Por outro lado parecia prestes a se esconder embaixo de uma das mesas.

***

- Sim! E como me lembro! - Mamãe riu um pouco. – Mas, você já é uma moça Bella! Tem que parar de vestir essas peças largas.

- Sim Bells, como vai arrumar um namorado hein?! – Alice brincou com ela enquanto lhe cutucava as costelas.

Namorado.

Hm.

Detestei o som que isso fez.

- Bella é uma criança Allie. Não fala besteira. – Ralhei contrariado. Com ela ainda se escondendo da destemida Esme.

- Tsc. – Alice meneou a cabeça.

- Emmett vai chegar a qualquer momento, não vamos querer que ele te pegue assim não é? – Mamãe se aproximou mais de nós.

- Vai Bella veste logo essa roupa. – Falei enquanto pegava a lata de tinta verde que usamos para pintar a parte branca da cartolina como forma de adorno sugerido por Alice. (Na falta de material da cor verde, que, segundo ela, era a preferida de Emmett). 

Isabella escolheu exatamente este momento para tropeçar no pé da escada que já estava meio instável.

O resultado?

Um cover do Incrível Hulk.

Um não.

Dois.

- Wow! – Uma voz grave se ergueu no ambiente. Limpei meus olhos cobertos de tinta, e vi minha prima toda empapada ao meu lado, no chão. Quando ergui a vista, meu enorme irmão estava parado a nossa frente com as mãos nos quadris.

- Emm! – Alice pulava em cima dele quase o derrubando.

- Meu filho! Que bom ter você conosco, espere até seu pai vê-lo. – Minha mãe o abraçou afetuosamente, sua voz carregada de alegria; enquanto eu me levantava deixando um rastro de tinta verde pelo pequeno espaço entre mim e Isabella. Ela agarrou minha mão estendida e a ergui com facilidade.

- Oi Emmett! - Ela disse com alegria. Com resquícios de timidez na voz, porém, o contornou com os braços.

- Wow de novo Bellinha! Uma boa recepção. – Ela o sujou completamente com a tinta.

- E aí irmão?! Como tem passado? – Logo que soltou Bella, desarrumando completamente o seu cabelo, se aproximou de mim, dando-me um apertado abraço fraterno.

Era muito bom tê-lo de volta. Ainda mais depois de tanto tempo quase sem contato.

- Tudo bem. – Lhe respondi entre o contentamento e a euforia.

Esme tinha os olhos marejados de felicidade. Enquanto Alice apenas observava nossos cumprimentos.

Ele estava diferente.

Algo na forma meio esquisita com que olhava para tudo me deixou intrigado.

Parecia ansioso e, como companheiras, ele carregava duas grandes olheiras arroxeadas.

Não era aquele enorme homem que saíra de Forks com sorriso limpo se derramando com facilidade.

Parecia mais um rasgo no rosto magro.

- Emm, meu filho você parece muito cansado, e está muito magro. – Pela primeira vez essa costumeira observação materna foi totalmente verossímil.

- Só preciso de uma noite de sono e de sua comida mãe, daí tudo vai ficar bem. – Depois da chegada abrupta de meu irmão que parecia prestes a cair a qualquer momento no meio da sala de estar, fomos, Bella e eu, intimados para nos livrar de toda aquela tinta espalhada no chão.

Não sem antes um banho claro.

***

Quando desci as escadas, meu pai já havia chegado a casa e conversava alegremente com Emmett. Sentados a frente da lareira.

Bella estava mais a frente segurando o que parecia ser um globo daqueles de vidro transparente com miniaturas de prédios dentro.

Acomodei-me junto a eles na acolhedora saleta.

- Então falei com esse professor, Sr. Leo, e ele me ajudou com uma vaga para estagio no Hopkins.

- Uau! Emmett, você tem noção de como é seleto? – Me meti na conversa pelo meio.

- Sim Ed, eu sei. – Ele sorriu. – Mas, no fim não deu muito certo. – Ele abaixou o olhar para suas botas.

- Por quê? – Uma risada nervosa dele e percebi estava sendo muito invasivo. Mordi minha língua por isto. –Desculpa Emm. É minha curiosidade. – Desconversei.

- Tudo bem. Vocês são família, têm o direito de saber. – Agarrou o copo que tinha em mãos, e mudou de posição no sofá. Parecia tão desgastado que até esse simples movimento pareceu tomar toda sua energia. – Acontece que o “ser seletivo” inclui ser exigente. E eu tinha outras atividades. – Um gole e um suspiro.

- Dediquei o máximo que pude. Mas, eu não andava muito bem... – Por um momento pareceu muito desconfortável – De saúde. – Completou, e parecia a milhas de distância.

- E porque não entrou em contato filho? Ficamos tão preocupados com esse seu afastamento. – Meu pai lamentou. – Sua mãe ficou especialmente aflita por você estar se esforçando tanto.

- Eu sei, mas, andei sem tempo. – Mudou o copo de uma mão para outra com os olhos ainda perdidos em algum lugar.

- Mas, agora você está aqui, e vai deixar a mamãe cuidar de você sem por limites. – Esme apareceu atrás do sofá em que Emmett estava sentado, postando as mãos sobre seus ombros. Ele lhe sorriu docemente relaxando contra o estofado do sofá.

- COMIDA PESSOAS! – Ouvimos Alice anunciar através da porta da cozinha.

Durante o jantar, falamos dos mais diversos assuntos. Foi um momento leve e feliz com a família completa novamente.

O Menu composto pelas guloseimas mais apreciadas por meu irmão, claro.

Emmett como sempre – e apesar de seu aspecto – fez piadas o máximo que conseguiu. Principalmente de minha cara esfarrapada contando o porquê do roxo no olho.

Ele alegou cansaço e se recolheu cedo da noite.

Enquanto lavava os pratos com meu pai conversei brevemente, e longe dos ouvidos de minha mãe, sobre a aparência cansada de Emmett.

- Acho que os estágios finais acabaram com ele. – Me passou um prato.

- Sim. Ele deveria ficar um tempo descansando de toda a loucura. – Carlisle apenas acenou com a cabeça.

- Mas, ele já tem uma vaga no Hospital aqui em Forks.

- Podemos falar com Jasper, pedir um período de pelo menos um mês até que ele se estabeleça. – Sugeri. Jasper havia se tornado um bom conhecido da família. Não digo “amigo”, simplesmente pelo fato de que os únicos eventos que nos reunia eram os acidentes de Bella.

- Resolvemos isto depois.

***

Em algum momento da madrugada acordei meio aturdido com os gritos.

Levantei-me rapidamente, indo para o corredor. Caminhei alguns metros e ouvi melhor; era a voz do meu irmão.

- “Não!” – E vários grunhidos desconexos. Emmett parecia em meio a um pesadelo terrível, porém, ele nunca havia tido esse tipo de perturbação de sono antes. Não que eu me lembrasse.

Esfreguei os olhos quando entrei no seu antigo quarto escuro. Bella estava lá parada como uma estátua olhando assustada para o meu irmão. Quase tive uma síncope quando a percebi.

- Bella! Quer me matar do coração? – Sussurrei para ela que apenas negou com a cabeça; Levei uma mão para o peito. Sentei-me na cama de Emmett.

- Emm, acorde é só um pesadelo – Balancei-o pelo braço.

- O que... – Ainda parecia atordoado. O suor escorria pelo seu rosto. Ele nos olhou e esfregou o rosto com as palmas das mãos. Olhos arregalados com um horror indescritível; Logo em seguida, levantou-se com brusquidão correndo para o banheiro do quarto. Pude ouvi-lo vomitando, e lentamente me dirigi ao seu encontro encontrando-o curvado no vaso. Confesso que fiquei alarmado.

- Sonhos ruins... – Ele balançou a cabeça enquanto se recuperava da crise.

- Falar sobre eles ajuda Emmett. Quer falar? – Bella deliberou, enquanto se aproximava de onde eu estava na porta do banheiro, puxando o quanto podia as mangas do seu pijama, o quarto realmente estava um gelo.

- Não. São só sonhos. Bobagem. – Um sorriso forçado que não alcançou sequer a metade do rosto. Já mais firme, Emmett passou por nós indo sentar-se a cama novamente.

Ele e Bella começaram uma conversa boba sobre pesadelos.

Olhei ao redor do quarto e notei um maço de cigarros amassado no chão. Algumas seringas.

Quando percebeu para onde eu estava olhando, meu irmão lívido ergueu-se da cama escondendo os cigarros e as seringas.

- Coisas de médico: Cigarros e material farmacêutico – Enfiou os artigos num bolso de mala. 

Estranhei seu comportamento. E fiquei ainda mais intrigado e preocupado com meu irmão mais velho. Ele nunca fizera o tipo que fuma. Sempre foi o atleta da família.

- Okay. Você quer alguma coisa? – Perguntei esfregando com a mão os meus cabelos. Decidi dar-lhe um tempo. 

- Não Ed, não se preocupe. Apenas uma boa noite de sono basta. Desculpe por tê-los acordado.

- Tudo bem Emm, eu já fiz com o Ed um monte de vezes. – Bella deu um sorriso lindo para Emmett. Ao que ele devolveu com doçura.

Depois de alguns minutos, e da garantia de que estava tudo bem por parte dele, nos recolhemos.

Fiquei bastante inquieto com o ocorrido e com o comportamento de Emmett; além das seringas, claro. Será que... Não, ele nunca usaria ou faria algo ilícito. Era de Emmett Cullen que estava falando. Deveria ser tudo uma questão de tempo e descanso.

Adormeci me sentindo ridículo por cogitar possibilidades tão absurdas.

***

- Edward, você pode levar Bella? Pegue o carro de Emmett emprestado hoje – Alice me perguntou enquanto engolia seu café às pressas.

- Claro. Aonde você vai?

- Tenho que pegar alguns materiais para os alunos na papelaria. Vou atrasá-la para o primeiro horário. – Falou a última parte com a boca cheia com uma rosquinha.

- Pode deixar. – Ela me deu um beijo rápido e saiu disparada.

- Bom dia mano! – Depois da noite parece que meu irmão recuperara um pouco do aspecto humano novamente.

- Bom dia grandão. Conseguiu dormir ontem?

- Como um bebê! – Deu uma enorme mordida em uma torrada. – Onde está a mãe?

- No jardim. – Respondi distraído enquanto arrumava minha pasta com alguns documentos de aluguel do prédio da mercearia ao norte da cidade.

- E o pai?

- Acho que foi até os Black. Ele tinha acertado de ver alguns animais novos que chegariam hoje de madrugada. – Tomei o último gole de café.

- Você vai precisar do carro hoje? – Questionei.

- Nope. Acho que vou ficar por aqui e monopolizar os mimos da mamãe. – Sorriu zombeteiro.

- Que bom, porque eu vou monopolizar o seu carro.

- Hey, cuidado com ele. – Me jogou as chaves que estavam no balcão logo atrás de sua cabeça.

- Pode deixar. Só alguns rachas... O de sempre. – Bati em seu ombro enquanto passava para a sala.

- BELLA! VAMOS! VOCÊ VAI SE ATRASAR.

- NÃO QUERO IR HOJE! – Ela respondeu de algum lugar no alto da escada.

Subi os degraus procurando por ela.

Estava no corredor caminhando de um lado para o outro esfregando as mãos.

- Bella, o que... O que você está fazendo? Já está vestida, vamos lá. – Peguei seu pulso e nos guiei para a escada.

Ela arrancou sua mão da minha.

- Não quero ir hoje. – Parecia acuada. E resoluta a faltar aula.

- Esme não vai gostar de ver você faltando aula Bells. Venha. – Indiquei as escadas novamente.

Percebi que a abordagem pela força não ia resolver nada. Olhei no relógio de pulso, ainda era bem cedo.

- O que houve, porque você não quer? – Questionei pacientemente.

- Er... – Olhou para todos os lados como se procurasse uma justificativa plausível nos papéis de parede. – Estou... Estou com dor de barriga. – Colocou mecanicamente a mão sobre o estômago. Parecia bem confusa e com cenho franzido estaria adorável não fosse a situação.

- Bella, você simplesmente não pode mentir. – Cruzei os braços a frente do corpo.

- Edward, me deixe ficar em casa; A escola é um saco. – Era hilário quando tentava usar nossas gírias. Na sua fala naturalmente articulada, soava quase como um sacrilégio.

- Não adianta. Todos nós tivemos que passar por isso, venha. – Enfim, ela não resistiu e me seguiu enraivecida.

- Coloque seu agasalho, apesar de tudo, o tempo está meio frio. – Instruí enquanto pegava o meu próprio que deixara no sofá.

No carro, Bella parecia especialmente silenciosa.

Olhava pela janela e murmurava a melodia que tocava no rádio.

Toquei de leve a ponta de seu nariz com meus dedos. Ela mal me olhou. Meneei a cabeça.

- Porque estamos tão silenciosos? Vai ficar com raiva de mim?

- Sim. Eu não queria vir hoje.

- O que tem hoje na escola que você não quer aparecer?

Ela emburrou ainda mais e virou o rosto na direção oposta a mim.

- A escola é ruim. – Pareceu sombria sua expressão. Havia algo acontecendo e bem debaixo do meu nariz.

- Como assim? – Questionei interessado. Eu sabia que Bella era alvo de críticas por ser tão distraída e de comportamento incomum; isto ficou claro quando visitamos a praia. O fato muito me assustava, pois tinha medo do que falavam ou faziam a ela.

No entanto, há algum tempo ela se mostrava simplesmente indiferente em relação às outras pessoas que não a família. Ademais, os professores tinham olhares protetores em relação a ela. O que na realidade, poderia ser bem pior, pois, além do estigma pela sua forma de ser, ainda haveria os invejosos, claro.

- Eu sou “estranha”. Eles não gostam de mim. – Ela se mexeu desconfortável, e agarrou o próprio corpo. Corri o risco deliberado de fitá-la.

Ela tinha o olhar distante, vazio. E isso me gelou os ossos.

Parecia que estava perdida em outro lugar.

E por um motivo ou outro, me senti sendo arrastado para aquela fria, distante e potente massa de melancolia.

Minha respiração ficou levemente alterada.

- Bella, por favor, me conte... Apenas fale. – Pronunciei as palavras lentamente. Com o máximo de intensidade que pude, visando de alguma forma fazê-la entender que aquilo estava me perturbando. – Me diga: Eles te ofenderam ou machucaram novamente? – Eu não era imbecil, sabia que ela era um alvo fácil para os zombadores.

E, quando menor, muitos acontecimentos meio desastrosos foram protagonizados por Bella e seus algozes.

Não se enganem: ela não aderia completamente ao papel de donzela em risco. Na maioria das vezes que alguém a provocava em excesso, sua reação tendia a ser um tanto quanto violenta.

Pedras e empurrões a parte, sentia que ela só queria ser deixada em paz.

Minhas mãos apertavam nervosamente o volante. Tirei os olhos da estrada mais uma vez fitando-a. E o mesmo olhar insistia em turvar a leveza que normalmente cobria o ambiente em que ela estava. Isabella era acima de tudo, uma menina especial, com uma aura especial. Estar perto dela sempre me proporcionou um sentimento de paz e bem estar sem precedentes.

- Chegamos. – Mal estacionei o carro ela deslizou pelo banco do passageiro.

- Bella, as luvas. – Saí do carro recebendo alguns olhares curiosos das garotas aglomeradas ali. Percebi claramente quando algumas delas sussurravam no ouvido umas das outras.

Aproximei-me de Bella e tomei suas mãos colocando as luvas.

- Ed, eu vou tirá-las daqui a pouco. Não precisa. – Eu sabia. Só queria mostrar para quem precisasse que ela não era sozinha. Que estávamos ali, sua família para protegê-la.

- Bella, preste atenção na aula hoje okay?- Beijei sua testa.

- Vou tentar. – Ela sorriu olhando para os pés. Ficou alguns segundos a minha frente, me olhou através dos cílios e fez um tipo de continência saindo em seguida.

Fiquei parado apenas a observando enquanto entrava de cabeça baixa, nos portões do Forks High.

Olhei ao redor e vi como todos ali eram diferentes dela. Toda a superficialidade que só os jovens sem perspectiva poderiam carregar.

Vi John e seu pequeno grupo de fãs; trinquei os dentes quando os vi cruzando despreocupados o pátio arborizado. Quando entraram na escola – sem me ver – pude continuar com meu caminho.

Sem perceber estava atrasado para o compromisso de hoje. 


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