Capítulo 3 – A dor de uma perda

Já fazia algumas horas que o grupo deixara Twilight Town. E também algumas horas que o silêncio dominava a nave Gummi.

A nave era grande e vermelha, e Riku a chamava de High Wing. Tinha três andares. O que parecia uma espécie de subsolo era a sala das máquinas, onde havia todos os geradores e demais coisas que faziam a nave funcionar. O andar do meio era a cabine. Ela era quase toda computadorizada. O painel de controle indicava piloto automático e as coordenadas do lugar para onde o transporte ia. Porém, um rapaz loiro vigiava tudo. Seu nome era Vaan. E no nível superior era um salão de tamanho mediano não muito decorado. Havia alguns sofás e cadeiras. Era bem aconchegante para quem fazia uma longa viagem e precisasse de um descanso sem precisar pousar. Também havia alguns poucos dormitórios e uma espécie de mirante.

Zack já não aguentava ver a amiga na situação em que estava. No início, ela estava aos prantos. Tentou consolá-la, mas Riku dissera que não adiantaria de nada. Deixou-a sozinha. Porém, foi em vão. Aproximou-se dela calmamente, mas Lilian nem parecia notar o amigo.

- Lil?! – chamou-a sentando-se ao seu lado. – Eu também lamento a perda da Olette... Mas você não pode ficar assim... – engoliu o seco e respirou fundo para poder continuar. – Ela não iria querer vê-la chorando. Nem eu quero. Essa não é você. Sorria para mim como você sempre faz.

A menina não se mexera. Parecia ignorar tudo a sua volta. E isso irritava Zack. Já não sabia o que podia dizer ou fazer sem piorar a situação atual. Um som de portas se abrindo e Riku apareceu. Zack lançou-lhe um olhar furioso e se levantou pronto para deixar o salão.

- Eu desisto! – disse o garoto ao cruzar com Riku. – Fale com ela! Ela pelo menos deve escutar o seu príncipe encantado de cabelos prateados! – e deixou o lugar, descendo pelo elevador para a cabine.

Riku suspirou e pôs-se a olhar Lilian. Ele sabia o que ela sentia perfeitamente bem, pois já se sentira assim antes. Aproximou-se um pouco mais e sentou-se no mesmo sofá onde a moça se encontrava, com a cabeça apoiada no braço do móvel. Ele ficou pensando por algum tempo no que falar, porém, ela foi a primeira a quebrar o silêncio.

- Por quanto tempo pretende ficar ai me olhando? – disse ela em tom neutro, com a cabeça ainda apoiada no braço do sofá, evitando olhar o rapaz.

- Acho que essa frase é minha. – disse o rapaz rindo, o que fez a garota sorrir um pouco.

Então ela finalmente levantou a cabeça e passou a olhá-lo. Lilian já não chorava mais, contudo, seus olhos ainda estavam inchados. Ela tentava sorrir, mas não conseguia. Continuou a fitar o rapaz, com uma expressão um pouco triste.

- Seu amigo tem razão. Olette não iria querer ver você chorando. Deve sorrir sempre para poder prosseguir. Eu vi a forma como sorri para o seu amigo. Você sempre deve sorrir e estar alegre. – disse ele desviando o seu olhar e sorrindo. – A propósito, você tem um belo sorriso.

Isso com certeza havia pegado a garota de surpresa. Sua expressão triste transformou-se. Ela corou e desviou o olhar, passando a olhar agora para as suas mãos pousadas no colo.

Tentou agradecer, porém começou a gaguejar e logo se calou. Ele não conseguiu conter uma risada. Lilian lembrou que ele dera a mesma risada na Torre do Relógio. Aparentemente Riku achava graça na maneira desajeitada da menina, o que não a agradava muito.

- O que há de tanta graça? – perguntou Lilian cerrando os punhos no colo e uma ponta de fúria era notada em seu tom de voz.

- Não precisa ficar nervosa. – disse o rapaz. – Só acho esse seu jeito desastrado engraçado. E divertido. Dessa maneira você consegue fazer outras pessoas sorrirem mesmo nas piores situações.

Ela não falou nada. Suavizou os punhos e continuava a olhar para baixo ainda. O silêncio entre os dois predominava mais uma vez.

- A Olette disse que você sonhava comigo. – disse o rapaz, e esperava uma reação tímida da moça, mas ela não fez nada. – O que você via? – perguntou com uma ponta de curiosidade escapando pela voz.

- Você era um herói! – respondeu ela um pouco mais tranquila. – Você salvava as pessoas com uma espada estranha. Queria ser como você! Queria poder salvar as pessoas. Ser forte assim como você é nos meus sonhos.

Silêncio mais uma vez. Ele não respondera, mas sorria por dentro, pois alguém via algo bom nele.

- Queria poder voltar no tempo e salvar a Olette. Ela poderia estar aqui conosco. Eu sou uma fraca que não consegue nada. Sempre tem que ter alguém me protegendo. Você, e o Zack também. – disse a garota num desabafo, com algumas lágrimas caindo de seu rosto. – Mas um dia eu serei forte e salvarei as pessoas como você.

Riku, num gesto automático, puxou a garota para junto de si e a abraçou, na tentativa de consolá-la um pouco. Ela recebeu a reação de forma surpresa, mas não o impediu. Aceitou o gesto. Após alguns poucos minutos naquele abraço, Riku a soltou e sorriu para ela. Lilian fez o mesmo.

- Você é forte. – disse ele. – Lembre-se apenas de sorrir sempre.

O rapaz sorriu mais uma vez e se afastou. Levantou-se e esticando os braços, ele se dirigiu ao elevador. Porém, antes de sumir, se virou para ela.

- Você deve estar muito cansada. Eu já providenciei roupas para você. Aconselho que tome um banho e descanse um pouco. Não demoraremos muito para chegar à Disney Castle.

- Obrigada! – agradeceu ela sorrindo.

- A propósito, diga ao seu amigo que eu não sou nenhum príncipe encantado. – disse Riku para a menina antes de sumir pelo elevador que levava à cabine.

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Zack havia ido para a cabine. Talvez fizesse ele esquecer de Lilian e do que havia acontecido.

Ao chegar lá, Zack viu que o rapaz loiro que tomava conta do painel de controle estava sentado numa cadeira próxima a alguns computadores. Ele estava saboreando uma maçã enquanto verificava alguma coisa na tela. O rapaz loiro percebeu a entrada do visitante e acenou.

- Acho que não me apresentei, mas eu sou o Vaan.

Zack sorriu e acenou enquanto se sentava em uma cadeira.

- Eu sou o Zack. Acho que você já sabe que sou de Twilight Town.

- Sim, sim! Eu vim de um lugar distante chamado Ivalice. Não creio que tenha ouvido falar, pois poucos conhecem.

Zack acenou confirmando. Através das histórias que a Olette contava, ele sabia que havia vários mundos. Sempre se perguntava o que haveria nesses mundos.

- Queria poder conhecer todos os mundos...

- Não só você. – concordou Vaan. – Eu conheci o Riku por acaso. Eu era um Sky Pirate quando ele me encontrou. Acho que ele percebeu o meu interesse pelos mundos fora de Ivalice e acabou por me chamar para seguir junto com ele nessa jornada, porém, logo as trevas chegaram ao meu mundo, mas graças aos meus amigos, Ivalice ainda sobrevive.

- E para onde estamos indo exatamente? – perguntou Zack curioso, olhando os computadores.

- Disney Castle! – respondeu ao rapaz. – É onde se concentra a “sede” da resistência.

- Tudo isso parece tão complicado. – comentou Zack olhando com uma ponta de interesse por toda a cabine.

- Não é não. Quem sabe um dia você aprende e pilota um desses. – então Vaan se calou dando outra mordida na maçã. – Você quer uma? – perguntou o rapaz mostrando a fruta.

- Adoraria. – aceitou Zack, que não havia percebido que não comera algo há horas.

Vaan entregou uma segunda maçã para o rapaz e olhou para os painéis de controle, enquanto conversava amigavelmente com Zack.

Os dois interromperam o diálogo quando a porta da cabine se abriu. Riku entrou acenando para os dois e virando-se para Zack.

- Creio que a Lilian esteja melhor agora. Providenciei roupas novas para você, então aconselho que tome um banho e descanse um pouco. Não devemos demorar a chegar.

- Obrigado. – agradeceu Zack, que se levantou dirigindo-se ao elevador.

Antes de sumir por ele, o rapaz acenou para Vaan, que retribuiu o aceno com um sorriso.

Quando o elevador parou, Zack se encontrava mais uma vez no salão onde deixara Lilian. Ele olhou pelo local e viu que a moça não se encontrava pelo lugar. Devia estar descansando em algum dormitório daquele corredor no canto direito na parede oposta.

Enquanto caminhava pelo corredor dos dormitórios, o rapaz viu um bilhete em uma das portas. Nele continha o seu nome. Então ele pegou o pedaço de papel e leu, enquanto entrava no quarto. Não era grande. Só havia uma cama, um pequeno armário e uma porta que levava ao banheiro. Porém, o que mais chamava a atenção do garoto era o fato de tudo ser branco.

Ignorando a cor do local, ele foi para o banheiro, onde tomou banho. Sentiu a água gelada percorrer pelo seu corpo todo, o que ajudou a relaxar os músculos. Enquanto a água escorria pelos seus cabelos loiros escuro, ele parou para pensar em tudo o que acontecera. Foi tudo muito rápido em Twilight Town. Num minuto estavam todos dormindo e no outro o caos abatera a Torre do Relógio. Quando finalmente terminou, ele procurou afugentar esses pensamentos.

Ao olhar para a cama, viu que as roupas estavam dobradas. Vestiu a calça e passou a enxugar os cabelos, quando ouviu a porta se abrir. Ao se virar, Zack viu que uma moça estava na abertura.

A moça parada vestia uma calça preta colada ao corpo, acentuando suas curvas, com botas da mesma cor. Usava uma camisa branca, com uma blusa mais apertada de cor vermelha sobreposto à branca, que modelava o corpo. Seus cabelos castanhos cor de mel estavam amarrados num rabo de cavalo e a franja grande que caia sobre o queixo estava penteada de lado, presa atrás da orelha. Sua face branca e delicada com bochechas rosadas, assim como o de uma boneca de porcelana, exibia um sorriso nos lábios finos e bem desenhados, com os olhos verdes brilhantes fitando o rapaz.

- Lilian?! – perguntou o rapaz surpreso ao ver a amiga.

Durante os anos em que estivera ao lado de Lilian, ele jamais a vira de forma feminina. A Lilian que ele conhecera vestia roupas largas de menino e um boné para esconder os cabelos. Vê-la naqueles trajes o fizeram perceber o quão diferente ela era. E bonita também.

- Posso entrar? – perguntou ela sem jeito, ao ver que o rapaz ainda se vestia.

O rapaz só acenou, e a garota entrou. Ela se sentou na cama, ao lado das roupas dobradas, enquanto ele a fitava. Ninguém falou nada a princípio. Zack continuou a se arrumar, enquanto Lilian olhava. O rapaz vestia uma calça preta, com dois bolsos na frente e sapatos de mesma cor. Ainda havia a camisa de malha branca, com um colete azul-escuro por cima. Ao terminar, ele se sentou na cama, com uma pequena distância de onde a garota se encontrava.

- Sinto muito por agora há pouco. – começou ela. – Sei que tentava me animar e acho que fui um pouco...

- Não se preocupe. – interrompeu o rapaz. – A culpa é minha.

- A culpa não é sua. Você só tentou me consolar e eu o ignorei. Estava tão abalada com tudo que esqueci o amigo que se importa comigo.

Zack sorriu e olhou para a garota, que estava sem jeito e olhava para as mãos sobre o colo. Sentou-se mais perto da garota e passou a mão pelo seu ombro, trazendo-a para junto de si. Num impulso, Lilian o abraçou e sem perceber, deixara uma lágrima cair. O rapaz retribuiu o gesto. Porém, ao se dar conta de que a garota poderia chorar novamente, ele se afastou e olhou para o seu rosto.

- Baixinha! Quantas vezes eu terei de dizer a você que eu não quero você triste? – perguntou Zack olhando para ela e abrindo um pequeno sorriso. – Cadê aquela garota que sempre sorri para mim?

- Não me chame de baixinha, oras! – falou a garota mudando o tom de voz para uma indignação atuada, e depois começou a rir com o amigo.

- Bem melhor assim. É bom pensar duas vezes da próxima vez que ficar com aquela cara triste. – disse o rapaz levantando e estendendo a mão para a garota. – Vamos para a cabine. Quero que conheça o Vaan, aquele garoto loiro. Ele é bem legal.

Lilian pegou na mão do rapaz e juntos, eles foram para a cabine. Ao chegar lá, se depararam com Vaan nos controles de comando da nave e Riku observando tudo. Quando percebeu a entrada dos dois visitantes, ele se virou e sorriu.

- Chegamos ao nosso destino. – disse ele quando a nave finalmente pousou após uma manobra de Vaan. – Bem-vindos à Disney Castle!