Entrei no quarto em silencio, com os saltos nas mãos para não acordar Sam, os pés grudentos da água salgada, descabela, vestido molhado e com certeza maquiagem borrada. Se Sam acordasse agora, ia gritar, pois acharia que eu sou o bicho papão. Mas mesmo eu não fazendo barulho nenhum, ela começou a se remexer na cama e, se antes eu só conseguia ver seu cabelo ruivo em meio ao branco das cobertas, agora eu estava vendo ela coçar os olhos enquanto me encarava.

- Hum... Já está na hora do clipe? – perguntou sonolenta, mas depois de um tempo ela arregalou os olhos e berrou: - OH MY GOD, JÁ ESTÁ NA HORA DO CLIPE?!

Sam pulou da cama e correu de um lado para o outro do quarto, pegando a toalha e as roupas na mala. Eu a parei, segurando ela pelos ombros.

- Calma! Não, ainda não está na hora do clipe. São 7:00h da manhã.

Ela respirou fundo e depois bufou, se arrastando de volta para a cama.

- Scooter disse 9:00h, não foi? – murmurou puxando o cobertor para mais perto.

- Uhum... – eu fui até minha cama e me sentei lá. Sam me olhou da cabeça aos pés, me analisando.

- E o que a senhorita estava fazendo para chegar agora? – ela perguntou desconfiada.

- Eu estava na praia, com Justin... – disse reprimindo um sorriso e dando de ombros, enquanto tirava a presilha que estava deixando minha cabeça dolorida.

- Com Justin? De madrugada? – ela arqueou a sobrancelhas e eu assenti. – Sexo na praia?

- Saam! – eu gritei, tentando não rir.

- Ah, eu não acredito! – ela colocou a mão na boca. – Não sabia que já tinham chegado tão longe, wow!

Eu peguei o travesseiro da minha cama e taquei nela.

- Cala boca! – eu disse enquanto nós duas riamos. Ela tirou o travesseiro do rosto e se recompôs.

- Okay, eu parei... Ansiosa? – ela perguntou.

- Sim. – disse em um suspiro e ela sorriu.

(...)

Justin deu um beijo na minha bochecha depois que bocejei. Ele havia me pegado de surpresa. Então sorriu para mim e foi até o meio do set. Eu o observei e depois olhei para o copo de café quente na minha mão. Eu odiava café, mas Scooter mandou eu tomar para ficar mais desperta, eu não dormia desde sexta, estava muito cansada, mas eu sabia que não pregaria os olhos, estava bastante nervosa e ansiosa agora. Eu estava no set onde gravariam o clipe. Em minha frente, Sam, Ryan, Pattie, Scooter, Kenny, maquiadores, produtores, organizadores e todos os “ores” que você puder imaginar, até mesmo de Flores. Alfredo Flores, diretor e amigo do Justin. Era um cara legal e havia me reconfortado, para eu relaxar e não ficar tão nervosa na hora do clipe.

Eu tomei o restinho do café e depois fiz uma careta, então larguei o copo na mesa das bebidas e andei até o set.

- Aly, é a sua vez de se vestir. Vá até aquele camarim, sua roupa está lá. – Pattie apontou para mim, ao lado dela estava Sam, já arrumada com uma mini-saia, Nike, uma regata longa branca, por cima de outra em salmão e um cinto fino em cima do quadril. O cabelo da Sam estava com alguns cachos também e usava uma maquiagem que no vídeo pareceria leve, mas estava carregada de pó.

- Adorei o look, Sam. – eu sorri.

- Eu também! – sua voz saiu fina, os olhos dela brilhavam olhando a roupa. – Será que deixam eu ficar?

- Acho que sim. – Pattie respondeu, sorridente.

Sam ficou feliz e eu ri. Então fui até onde Pattie mostrou. Tinha araras repletas de roupas, já combinadas, dentro de plásticos. Havia meu nome em umas quatro, o nome da Sam, do Ryan e do Justin. Tinha duas mulheres conversando, elas usavam algo na cintura, que pendurava pinces de maquiagem. As duas me maquiaram, tirando as olheiras que tinha ganhado com o cansaço. Passaram um lápis azul na linha d’agua dos olhos, blush rosa e batom claro, depois me vestiram com uma calça jeans, bota preta e uma camisa estampada, por baixo de um casaco de couro. Nós estávamos rindo enquanto uma colocava um alfinete na barra da camisa, quando uma mulher, provavelmente com 60 anos, cabelo branco e curto, mas moderno, vestida elegantemente e com um ar de superioridade, apareceu.

- O que é isso? – ela disse seca, olhando para mim de cima para baixo.

- A roupa... – disse uma das garotas. – A do clipe... Por que?

- Quem mandou ela se vestir assim? – ela olhou com raiva para as duas.

- Mas... foi o que escolheram...

- Não foi o que eu escolhi. – ela interrompeu. – Isso está horrível, ela parece uma garota de gangue. Saiam daqui, já fizeram demais.

As duas saíram do camarim enquanto aquela mulher caminhava até mim. Eu estava ficando nervosa e irritada com o jeito que ela tratou aquelas duas.

- Argh. – rosnou olhando para a minha roupa. Então se afastou e pegou um novo look. Lançou para mim uma regata branca, com um micro short e um cardigan azul marinho e florido. – Você vai vestir isso. – disse abaixada, mexendo nas dezenas de sapatos no chão. Ela pegou uma sapatilha rosa e a estendeu para mim. – E isso daqui também, vá se trocar.

Eu praticamente corri para dentro do trocador e coloquei a roupa que ela mandou. Então me olhei no espelho e tentei sorrir, sem sucesso. Arrastei as cortinas e sai do provador, aquela mulher estava sentada na cadeira do maquiador, ajeitando o cabelo. Quando viu que eu sai, ela se virou para mim.

- Ah, bem melhor! – ela disse sorrindo, então me puxou para sentar na cadeira em que antes ela estava sentada. Ela começou a mexer na penteadeira de maquiagem na nossa frente.

- Ahm... A senhora é a stylist? – perguntei meio sem graça.

- Sou a dona das roupas que você está vestindo. – respondeu, sem olhar para mim. Eu peguei a etiqueta do shorts e vi o nome da marca, Forever 21.

- Wow! Você é a dona da Forever 21?

- Uma das. – ela disse dando de ombros. Então se virou para mim, com o blush rosa da MAC e o pincel, e retocou o blush. Ela ficou em silencio, não era de falar muito, pelo menos não comigo. Ela me levantou e me examinou. – Já melhorou, mas a modelo não ajuda muito... – murmurou, quase não escutei.

- Ah, o que?! – eu disse tentando sair dura. – Se eu não ajudo, desculpa, mas você também não ajuda muito! Por que não para de ser tão arrogante?

Ela arregalou os olhos e eu me arrependi de ter falado isso. Ela se aproximou de mim e agarrou meu braço.

- Onde encontrou isso? – ela tocou o pingente do meu pai no meu bracelete.

- É meu. – eu puxei meu braço de volta. – Mas sabe, eu estou nervosa, eu nunca fiz um clipe antes e você não deveria me...

- Não pode ser seu. – ela me interrompeu, ainda olhava para o bracelete no meu pulso. – Isso é original, não se vende... Quem deu isso a você?

Eu estava confusa, não a entendia. E por que ela queria saber daquilo? Qual era o interesse nela no meu pingente?

- Meu pai me deu. – respondi. Ela abriu a boca e olhou fixamente para mim. Chocada, surpresa... eu não sabia.

- Isso é mentira! Não pertence a você, devolva! – ela foi para cima de mim, pegando meu pulso e tentando arrancar o bracelete.

- O que?! Me solta! – eu me debatia, assustada.

- Não sei da onde você roubou isso, mas não é seu!

- Claro que é meu! É do meu pai, ele me deu! – eu soltei dela e recuei para longe da mulher. Ela não avançou mais, ficou parada, se recompondo e colocando uma mexa do cabelo que caiu no rosto.

- Desculpe, eu... – ela tentou dizer, mas sua pose seria voltou. – Eu tinha um igual. – murmurou e depois encarou meus olhos. Depois de um de alguns segundos assim, saiu do lugar.

Eu fiquei espantada, ela era louca? Eu ajeitei meu bracelete no braço de novo e caminhei para fora também. Quando vi Justin, fiquei aliviada e corri até ele, o abraçando.

- Hey, você vai gravar já, já. – ele respondeu sorrindo, mas eu nada disse. Ele notou. – Tudo bem?

- Sim... – murmurei e o apertei mais. Ele passou seus braços no meu corpo. Senti seus braços quentes ao redor de mim me relaxou.

- Está nervosa?

Não era exatamente por isso que estava assim, mas eu assenti. Ele riu.

- Vai ser divertido. – ele sussurrou e depois encostou de leve seus lábios no meu.

Alfredo nos chamou e nós começamos as gravações.

(...)

- Alicia? Alicia? ALICIA!

- O que? O que é?! – eu dei um pulo da cadeira em que estava.

- Ficou surda? Se perdeu na Bieberlândia? Eu estou falando com você! – Sam dizia, irritada.

- Desculpa, o que você estava dizendo mesmo?

- Eu disse que mal posso esperar para ver como vai ficar o clipe. – ela repetiu.

- Ah, eu também... – disse, mas estava distante. Não conseguia parar pensar no que havia acontecido mais cedo.

- Eu não sabia o que fazer, quando gritaram: SORRIA! – ela imitou o gritou e me tirou do devaneio novamente. Sam notou e bufou. – Você está longe, o que deu?!

- Não estou não, estou lhe escutando... – menti.

- Não está. – ela afirmou. – Tá tudo bem?

- Sim, é que aconteceu uma coisa...

- Que coisa? – ela tinha um tom preocupado e curioso.

- Quem vestiu você, Sam? – eu perguntei.

- Uma senhora deu a roupa para mim e Pattie me ajudou. – ela respondeu.

- Senhora? Que senhora?

- Ah Aly, uma senhora! – ela disse impaciente, depois apontou para um ponto. – Aquela dali.

Me virei e segui o dedo da Sam. Era aquela mulher doida e ela estava olhando para mim, enquanto falava no celular. Ela estava tensa.

- É, foi ela... – deixei as palavras saírem sem perceber.

- Ela o que? – Sam me escutou e perguntou curiosa. Não achei errado contar a ela.

- Eu fui me arrumar e essa mulher apareceu. Ela pegou meu pingente e ficou gritando, tipo: “Isso não é seu, onde você pegou?”.

Sam riu da minha imitação.

- Aly, sabe quem ela é? – Sam perguntou, ainda rindo, e eu neguei com a cabeça. – Abigail Mayer, dona da Forever 21 e Heritage 1981. Por que ela ficaria gritando com o seu pingente?

- Eu não sei, ela deve ser doida. – eu disse balançando a cabeça negativamente e dando de ombros.

- Minha mãe já falou com ela, eu soube que ela é bem seria... Mas doida? – Sam voltou a rir.

- É verdade, aquela mulher me assustou!

Por mais que eu falasse, Sam não parava de rir.

- Ah, eu acredito! – ela disse sarcástica. – Vou pegar uma garrafa de água... Doida. – ela murmurou a ultima palavra e voltou a rir.

Eu bufei e olhei novamente para a mulher. Ela havia desligado o celular, mas ainda olhava estranho para mim. Sei que seria tão louca quanto aquela mulher se me aproximasse dela, mas eu estava curiosa. Quando cheguei perto dela, eu perguntei:

- Qual o problema do meu pingente?

P.O.V. Justin

- Foi ótimo, Justin! – Alfredo disse olhando na pequena televisão onde toda a filmagem passava.

- Quando fica pronto? – perguntei saindo do meio das câmeras e indo até ele.

- A edição termina rápido, em alguns dias já está pronta. Mas a estréia é daqui a algumas semanas.

- É, eu sei. – disse dando uma olhada nas filmagens ao lado dele. Depois parei de ver e decidi procurar a Alicia. Talvez ela estivesse no camarim.

Fui até lá, a encontrei sentada em uma cadeira, com os braços apoiados no joelho. Sua expressão era pensativa e seria.

- Acabei de gravar a ultima cena, Alfredo disse que ficou ótimo! – disse chegando mais perto dela.

Ela ergueu a cabeça, deu um sorriso fraco e disse:

- Isso é bom.

Depois voltou a como estava antes, eu a estranhei. Me ajoelhei ao seu lado e peguei nas suas mãos.

- Tudo bem?

- Sim, sim... – ela respondeu, mas parecia longe.

- O que houve?

- Eu não conheço a minha avó. – ela disse, simplesmente.

- Humm... Eu sei. – eu respondi. Ela me contou faz tempo, em umas das nossas conversas, mas ela não tocava tanto nesse assunto, por que estava falando disso agora? – O quê que tem?

- Sabe... Sabe a dona da marca de roupas? Do figurino? – ela disse finalmente olhando para mim.

- Sei...

- O nome dela é Abigail. – ela respondeu.

- Eu sei. – afirmei, estava completamente confuso.

- Sabia que ela mora em São Francisco? – perguntou.

- Não.

- Ela é de lá. A família dela é de lá... Ela tinha um filho... O filho dela morreu.

Ainda não conseguia entender, onde ela queria chegar com isso tudo?

- Isso é uma pena, eu não sabia... – respondi.

- Pois é... Morreu no Brasil.

Alicia estava seria, tensa, pensativa, completamente estranha e eu estava confuso. Isso deveria levar a algo muito serio?

- Ele ia casar com uma brasileira. – Alicia continuou. – Ele morreu antes disso... E ele deixou para ela um neto. Tinha quatro anos quando ele morreu.

Eu a encarei, não tinha certeza, mas já conseguia deduzir alguma coisa. Alicia também me encarou, sua expressão era indescritível, uma confusão de pensamentos e sentimentos tinha nela.

- Ela reconheceu meu pingente, Justin. – Alicia disse com uma voz mais diferente agora, mais chorosa, e tocando na sua pulseira.

- Você acha que ela é... – não conclui, ela já sabia.

- Posso está errada. – ela disse por fim, voltando a ficar seria e olhando para longe de mim.

- Talvez não, você não queria conhecer a sua avó? É a primeira vez que você chega tão perto, você deveria aproveitar, falar melhor com essa mulher, juntar os fatos...

- Justin, eu não sei... – ela respondeu. – É exatamente por isso, nunca cheguei tão perto. Estou com medo. Se não for...

- Ainda tem duvidas? Tudo se encaixa! – eu lhe disse. Ela não me respondeu mais, ficou calada, pensando. Peguei suas mãos e as alisei. – E se não for, não é impossível. Estamos no século XXI, é fácil hoje em dia... Sem falar que você tem a mim, Justin Bieber, que posso ter tudo. Eu posso conseguir isso para você.

Quando ela olhou para mim, estava um pouco mais feliz, sorrindo. Me deixou mais aliviado.

- Obrigada... Eu só não consigo acreditar, eu posso está diante da minha avó, Justin! Minha avó! Sabe quanto eu esperei por esse momento? Quando eu não briguei com a minha mãe por isso?

- Eu imagino... – respondi com sinceridade. – Então, o que você vai fazer?

Ela demorou um pouco para me responder. Depois suspirou e apertou mais a minha mão.

- Não sei se é o certo, mas eu deveria falar com a minha mãe. Corro o risco dela esconder tudo de mim e eu nunca mais poder me encontrar com Abigail, mas ela é a única que pode fazer algo por mim agora. – ela disse, depois tirou do bolso um papelzinho. – E eu sei como encontrá-la agora.