Saga Sillentya: as Sete Tristezas escrita por Sunshine girl


Capítulo 18
XVII - Um novo começo


Notas iniciais do capítulo

ahhh voltei!

17° capítulo...

Boa leitura!



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Capítulo XVII – Um novo começo

 

“Oh, Oh... Tudo que eu quero fazer, fazer

É cair ainda mais fundo com você, você,

E nunca voltar, respirando, respirando embaixo d'água,

Eu estou pesando a cada beijo que você me dá, garoto,

Você está me fazendo sentir, sentir,

Como se eu estivesse respirando, respirando embaixo d'água”.

 

(Marie Digby – Breathing Underwater)

 

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- Solo pervatus. – disse-me ele, um sorriso nos lábios, os olhos brincalhões.

 

Uma brisa suave balançou toda a relva ao nosso redor, agitando-a. Ajeitei uma mecha de cabelo, teimosa, escondendo-a atrás de minha orelha e depois minha mão voltou a repousar em seu ombro largo.

 

- E o que isso significa? – perguntei, curiosa.

 

Ele riu de leve e eu aproveitei para roubar-lhe um beijo. Não permitindo que ele se divertisse mais às minhas custas. Porém, seus olhos ganharam um aspecto de seriedade, até que sua voz ecoou na clareira mais uma vez.

 

- Eu sou seu. – respondeu-me ele, calmamente.

 

Agora foi a minha vez de rir e ele estranhou meu comportamento. Então tratei de me explicar, antes que ele se zangasse comigo.

 

- Desculpe, é que eu fico imaginando quantas garotas recebem uma declaração dessas no idioma antigo utilizado pelos espíritos.

 

Ele sorriu mais uma vez.

 

- Você deve ser a primeira.

 

Fiz-lhe uma careta e ele se divertiu novamente, rindo de mim.

 

Estávamos sentados sobre a relva, um de frente para o outro, embora sua mão jamais deixasse a minha cintura e ele me puxasse para perto de si. Aproveitei a deixa, e lancei meu corpo sobre o seu, empurrando-o, tombando a nós dois sobre aquela vegetação de inicio de primavera, caindo sobre ele.

 

Não me importei com o fato de estar parecendo meio possessiva, muito menos de demonstrar um pouco de meu mau comportamento. Simplesmente pressionei meus lábios nos seus, impedindo que ele continuasse divertindo-se às minhas custas.

 

Não foi preciso muito para que ele mesmo tomasse a liberdade e correspondesse o beijo na mesma intensidade. Era incrível como estávamos juntos há tão pouco tempo, era um domingo de manhã, a pouco menos de vinte e quatro horas nós havíamos trocado o nosso primeiro beijo, ainda que ele tivesse hesitado mais, mas enfim, eu o convencera de que era o melhor para nós dois.

 

Senti sua mão quente deslizando por minha face, afagando minha pele com tanta delicadeza e suavidade, era completamente impossível resistir a ele.

 

Afastei-me dele, fitando seus olhos, e em todas as vezes que eu fazia isso, eu me perdia completamente neles. E eles estavam tão diferentes, exalavam um brilho especial, o que os tornava ainda mais belos.

 

Sua mão ainda acariciava minha face enquanto seus pensamentos pareciam estar distantes dali. Arqueei uma sobrancelha e esperei que ele despertasse, mas ele continuava refletindo e isso causou um certo desconforto em mim.

 

- Aidan? – eu o chamei e ele atendeu-me de imediato, voltando toda a sua atenção para mim.

 

Seu semblante ainda aparentava estar pensativo e eu não suportaria aquele silêncio por muito tempo, ou não saber o que se passava em sua cabeça.

 

- O que foi? – perguntei-lhe e ele sorriu novamente, como se tentasse desculpar-se.

 

- Nada. – respondeu-me, mas eu não me convenci, esperei pacientemente até que ele me contasse tudo. – Estava apenas pensando em como deixei isso acontecer.

 

- Nenhum de nós teve escolha. – retruquei, um pouco irritada, pensei que ele já tivesse se esquecido disso.

 

Sua expressão ficou brincalhona e divertida novamente enquanto ele se explicava.

 

- Para você é fácil falar, você não passou a vida inteira acreditando que seu destino fosse ser um monstro até o findar de seus dias e depois descobrir que tudo não passava de um grande mal entendido.

 

- Como assim? – eu lhe perguntei, confusa.

 

- A minha... vida inteira, eu acreditei que meu destino fosse servir Sillentya, caçar, destruir, matar. Mas eu estava enganado, meu destino não é Sillentya, meu destino é você. – confessou-me ele. – E o pior de tudo isso é que talvez eu sempre soubesse que havia algo reservado para mim, eu apenas tinha de esperar que esse algo atravessasse o meu caminho.

 

- Estava se lembrando do dia em que nos falamos pela primeira vez? – perguntei a ele, ainda mantendo o tom descontraído de nossa conversa, eu me lembrava perfeitamente de quando ouvi sua voz pela primeira vez.

 

Aidan apertou-me mais contra o seu corpo, seus olhos por nenhum momento deixavam os meus, quando ele enfim revelou-me o motivo de seu distanciamento.

 

- Sim, eu estava me lembrando de quando a vi pela primeira vez. Mas, não foi exatamente naquele dia.

 

- Mas, você era tão silencioso e reservado. – reclamei, recordando-me perfeitamente de seu comportamento assim que ele chegou a South Hooksett.

 

- Você nunca permite que eu termine de me explicar. – retrucou ele.

 

Assenti e aguardei que ele prosseguisse, fazendo um gesto engraçado, como se estivesse trancando meus lábios. Ele riu disso.

 

- A primeira vez em que a vi foi na sala de aula, lembra-se?

 

Assenti com um gesto e ele continuou.

 

- Para ser franco, eu não prestei muita atenção em você, aliás, eu nunca prestava atenção em nada, tudo era supérfluo e comum a meus olhos. Mas, então, eu senti a sua energia, a sua alma, brilhando, ao meu lado, tão perto de mim. Eu quase não acreditei, a forma como ela cintilava, algo tão belo e intenso, jamais vi algo parecido em todos esses anos de experiência como caçador. Mas eu lutava contra mim mesmo, contra o desejo insano que eu tinha de olhá-la, de vê-la. Eu tentava de alguma forma ignorar você, como sempre fiz com os seus semelhantes, mas era algo impossível, você parecia estar chamando o meu nome, esperando por mim. E então, você falou comigo no dia seguinte, lembra-se?

 

Rompi minha promessa de não interrompê-lo mais, rindo como nunca ri em toda a minha vida.

 

- Eu me lembro perfeitamente disso, em um dia você me tratou muito bem, mas no outro, estava tão calado e... distante... – interrompi minha fala pela metade, perdendo-me na profundidade de suas íris mais uma vez.

 

- E você sabe por quê?

 

- Não. – respondi-lhe, prontamente.

 

- Porque você não saía da minha cabeça por nenhum segundo, você ocupava cada pensamento meu, e isso me deixava furioso. Como uma humana podia mexer tanto comigo? Isso nunca havia acontecido comigo antes. Mas quando você apareceu, quando eu a vi, Agatha, eu soube quase no mesmo instante que você estava destinada a mim, assim como eu havia procurado por você durante todos esses anos. Tantos anos de solidão, de amargura e remorso, e quando você surge, tudo isso simplesmente desaparece. Sinto-me um tolo por ter acreditado durante tanto tempo que minha vida seria sempre vazia, escura e solitária. Sendo que eu só precisava encontrar você desde o inicio. E depois daquele dia eu me senti horrível por ter sido ríspido com você, você não merecia esse tipo de tratamento. Então, mudei de idéia mais uma vez, e resolvi ser simpático, aproximar-me mais de você, descobrir mais a seu respeito, - ele riu novamente, interrompendo-se – você pode não ter percebido, mas eu a observava muito durante as aulas. E eu vi o quão solitária, triste e imersa em seu próprio mundo você era. Você mal conversava com os outros jovens da sua idade, você evitava olhá-los, e parecia viver em sua própria realidade. E isso chamou a minha atenção.

 

Recordei-me vagamente da última vez em que eu o vira sob a fachada humana, na noite seguinte eu descobriria o seu verdadeiro eu, quando ele lutou contra dois escravos das sombras que me perseguiam naquela floresta nefasta. E então Aidan prosseguiu em seu discurso.

 

- Naquela noite, eu estava seguindo pistas do desertor, e embora eu soubesse que devia focar-me em minha missão, eu não te tirava da minha cabeça. O modo como você ficou perturbada quando eu lhe disse o que enxergava quando a olhava, a dor imensa que você carregava, que você sempre suportou... e bem, quando eu senti a sua presença naquela floresta, assustada, em pânico, e completamente sozinha, eu não tive outra escolha, tive que me meter no meio daquela carnificina para salvá-la.

 

- Mas você me disse... – apenas mencionei interrompê-lo, mas seus olhos repreenderam-me e eu parei minha frase pela metade no mesmo instante.

 

- Qualquer caçador sabe que sua missão vem em primeiro lugar, não importa mais nada, sentimentos, emoções, razões pessoais, nada é levado em conta. Naquela noite eu cometi um erro imperdoável ao me intrometer na luta para salvá-la. Eu sabia que se esperasse mais um pouco, o desertor acabaria por revelar-se das sombras, mas eu não tinha certeza alguma do seu bem-estar, ou se você ao menos sobreviveria, então sem pensar em qualquer outra coisa, eu me lancei na sua frente, impedindo-os de te machucarem. Quando a luta terminou, eu percebi o seu medo, o seu pânico, e eu vi que você me temia. Embora aquilo doesse, eu sabia que tinha que me afastar de você, seria a única maneira de mantê-la segura, então eu decidi ainda naquela noite que agiria como se nada tivesse acontecido. Eu a ignoraria se fosse preciso, e por um mês isso até funcionou, embora você ainda estivesse em todos os meus pensamentos, e eu a observasse furtivamente. Mas depois, você me surpreendeu, tomou coragem para me peitar e exigir a verdade. E você realmente lutou até o fim por ela.

 

 - Disso eu me lembro. – murmurei, fitando seu semblante, agora sério.

 

- E aqui estamos nós. Você em meus braços, isso é muito mais do que eu poderia pedir. Eu nem sequer a mereço, e mesmo assim ouso tomá-la para mim. Se você realmente soubesse o tipo de pessoa que eu sempre fui, os tipos de sentimentos que eu sempre cultivei dentro de mim, você teria nojo de mim, e sentiria repudia por tudo o que eu sou.

 

Silenciei seus lábios com meus dedos, impedindo-o de falar qualquer outra palavra.

 

- Eu não me importo com o seu passado, já lhe disse, eu conheço apenas uma parte sua, e sei que a amo mais do que tudo.

 

Ele riu de repente e eu estranhei que ele o fizesse.

 

- O que foi?

 

Ele sorriu, retirando meus dedos de seus lábios a fim de responder-me.

 

- Você disse que me ama.

 

Eu ruborizei no mesmo momento, sem querer eu havia lhe dito isso.

 

- Faz alguma diferença? – perguntei-lhe, temerosa de que ele se zangasse comigo.

 

Mas ele sorriu novamente, afastando todos os meus temores de mim.

 

- Faz toda a diferença para mim.

 

Respirei, aliviada, porém, seu semblante ainda não estava completamente relaxado. Esperei pacientemente que ele me dissesse o que o afligia naquele momento.

 

- E agora sua vida corre perigo por minha causa. Se eu ao menos soubesse que seria tão perigoso para você, eu juro, Agatha, que teria feito de tudo para evitá-la, eu me manteria o mais longe possível de você, mesmo que isso me doesse mais do qualquer outra coisa, eu lhe juro que o teria feito.

 

- Você não podia saber, nenhum de nós dois podia. – sussurrei, tentando confortá-lo de alguma forma.

 

- Isso não muda muito. – rebateu ele. – Você é a minha redenção, Agatha. – confessou-me, a voz suave, abafada, os olhos sérios e profundos.

 

O choque atravessou o meu rosto no mesmo instante e eu fui tomada por um estranho sentimento de compaixão.

 

- Por que você diz isso?

 

Aidan semicerrou seus olhos, ele sempre parecia um tanto relutante em falar-me de seu passado sombrio. E eu sempre tentava distanciá-lo de tudo o que pudesse lhe ferir, mas seu passado era como uma sombra, o seguia por toda a parte, atormentando-o e remoendo-o.

 

- Eu nunca fui... bom. Nunca fui uma boa pessoa. Eu jamais soube que era o valor de uma amizade, ou um amor fraternal entre irmãos. Claro que sempre houve o respeito mútuo, a lealdade, mas nunca mais do que isso. Eu nunca imaginei que o amor pudesse ser uma força tão poderosa assim. Para mim, o ódio era a fonte de poder, a raiva era o que poderia me fortalecer, mas eu estava enganado, o ódio apenas destrói, e te leva a um caminho solitário e obscuro, mas o amor é o que realmente lhe torna forte, o desejo de proteger as pessoas queridas e amadas, a vontade de sacrificar tudo sem hesitação, até mesmo a vida se for preciso, é o que te guia até o verdadeiro poder, até o caminho de luz e salvação.

 

Compreendi o que ele estava falando-me, ele havia trilhado um caminho obscuro por tanto tempo, havia convivido com a solidão e a amargura por tantos anos, e embora ele tivesse se afastado dele agora, tivesse deixado-o para trás, era impossível que tantas lembranças viessem à tona e tentassem empurrá-lo de volta para ele.

 

Eu sabia que era assim porque me sentia exatamente da mesma maneira. Perseguida e assolada pelo meu próprio passado sombrio, e era por isso que eu precisava dele mais do que precisava de qualquer outra coisa. Aidan era o antídoto, a cura que todo o meu corpo necessitava.

 

- E agora, olhe só para mim. – ele interrompeu-se, rindo novamente – Você me mudou por completo, despertou sensações e sentimentos em mim que eu jamais pensei poder sentir ou ter. Eu jamais serei o mesmo, jamais voltarei a ser o que era, você, Agatha, de alguma forma, conseguiu libertar-me, tirar-me do inferno no qual eu sempre vivi. É um novo começo para mim, para nós dois.

 

Toquei sua face e curvei meus lábios até os seus mais uma vez. Fui correspondida no mesmo instante, seus lábios buscando sedentos novamente pelos meus.

 

E uma brisa suave irrompeu pela relva mais uma vez, agitando toda a vegetação rasteira ao nosso redor, enquanto desfrutávamos daquele turbilhão de sensações que nos atingia.

 

 

 

 

 

 

 

Cheguei em casa, abrindo a porta e deparando-me com ela completamente vazia.

 

- Mãe? – gritei para o nada, mas não houve resposta, a casa estava completamente silenciosa.

 

Estranhei que minha mãe não estivesse lá àquela hora.

 

Cruzei a sala, quando o som do telefone interrompeu meu percurso. Corri até ele e o atendi.

 

- Alô?

 

Uma voz masculina soou do outro lado da linha, mas eu não a conhecia.

 

- Eva, é você? – perguntou-me ele, querendo confirmar se era minha mãe ou não.

 

- Não, é a filha dela.

 

- Ah, sim! Você deve ser a Agatha. – julgou-me ele e eu estranhei novamente que ele também me conhecesse.

 

- Sim, sou eu mesma.

 

- Sua mãe está em casa?

 

- Não, ela saiu. Mas eu posso dar o recado de que você ligou para ela. Desculpe, mas você é...

 

- Ah, John Collins, eu e sua mãe nos conhecemos em Suncook.

 

- John Collins, tudo bem, eu direi a ela que você ligou.

 

- Muito obrigada. – agradeceu-me ele – Ah, e mande lembranças minhas a ela.

 

- Tudo bem.

 

- Obrigada mais uma vez, Agatha.

 

E depois o telefone ficou mudo, ele o havia desligado. Um sorriso brotou em meus lábios no instante seguinte, então minha mãe também estava tentando acertar-se na vida.

 

Eu cobraria a história toda dela mais tarde, e é claro não ia resistir a incentivá-la a levar isso adiante. Minha mãe era uma mulher belíssima, era atraente e cheia de vida, não tinha sentido algum ela permanecer sozinha até o resto de seus dias.

 

Tenho certeza de que meu pai ia querer isso, de onde quer que ele esteja, eu sei que ele quer que ela seja feliz mais uma vez.

 

Subi as escadas e rumei na direção do banheiro, disposta a tomar um relaxante e demorado banho quente.

 

Mais tarde eu sei que Aidan apareceria em meu quarto, disposto a vigiar os meus sonhos como sempre fazia.

 

Assim que saí do banho, enrolei-me na toalha e sequei meu cabelo no secador. O som da porta sendo aberta sobressaltou-me, mas era apenas minha mãe.

 

Vesti-me apressadamente e desci as escadas, deparando-me com sua figura sorridente, cantarolando baixo.

 

- Oi, mãe. – eu murmurei com um sorriso nos lábios.

 

Minha mãe desviou sua atenção de sua atividade, – ela lavava algumas verduras frescas para o jantar - encarando-me boquiaberta, mas depois sorriu e murmurou um simpático oi.

 

- Oi, meu amor, já voltou?

 

- Sim. – respondi-lhe, enquanto caminhava em sua direção.

 

Cruzei meus braços e mordi meus lábios, eu estava louca para despejar todas aquelas perguntas em cima dela, mas me continha. Talvez ela fosse contar-me de John na hora certa, e eu não queria pressioná-la, queria que tudo fluísse com naturalidade.

 

Aproximei-me mais de sua figura sorridente, uma de minhas mãos mexia impacientemente em uma mecha de meu cabelo.

 

- Mãe... – chamei-a.

 

- Sim, querida? – ela respondeu-me, desviando sua atenção das verduras que ela lavava na pia para mim.

 

Disfarcei, circulei sua figura, relaxei meus ombros querendo passar a impressão de que não queria absolutamente nada e revirei os olhos; a quem eu estava enganando?

 

- Um tal de... John Collins ligou para você hoje. Eu disse que ia te dar o recado.

 

Minha mãe pareceu ter petrificado no mesmo instante, a verdura escorregou de suas mãos e caiu na pia. Esperei que ela se recompusesse.

 

Ela despertou depois de alguns segundos, suas mãos apanharam instintivamente a verdura que ela havia deixado escorregar e depois disfarçou, eu reprimi um riso.

 

- Ah, John ligou?

 

- Sim, enquanto a senhora estava fora. – resolvi mudar de tática, lancei verde para ver se ela mordia a isca – Ele disse que a havia conhecido em Suncook, estranho que a senhora não tenha dito-me absolutamente nada sobre ele.

 

Minha mãe engoliu em seco e depois se virou para mim, completamente desconcertada e com um longo suspiro ela rendeu-se.

 

- Tudo bem, você venceu. Nos conhecemos realmente em Suncook, ele é o dono da hospedaria onde eu me acomodei. E... ele é muito interessante. – confessou-me ela.

 

Dei alguns passos em sua direção, sorrindo para ela.

 

- Mas... – instiguei-a novamente a continuar.

 

- Mas, eu sou uma senhora, não tenho mais idade para essas coisas. – reclamou ela.

 

- E quem disse isso? – perguntei, completamente abismada.

 

- Faça-me o favor, mocinha, eu sei exatamente o meu lugar!

 

Aproximei-me mais de sua figura, minhas mãos flutuaram até seus ombros e eu não desisti até que ela sustentasse seu olhar e me encarasse.

 

- Mãe, não há idade para ser feliz. Sempre há tempo para recomeçar.

 

Minha mãe fez-me uma careta, mas depois sorriu, e eu a abracei calorosamente.

 

- Ah, minha filha, você é tão compreensiva! Quem dera que todas as adolescentes rebeldes tivessem o mesmo nível de compreensão que você tem!

 

Murmurei contra seus cabelos perfumados, ainda sorrindo.

 

- Eu só desejo a sua felicidade, não importa como ou com quem, apenas quero vê-la feliz!

 

Ela riu e uma de suas mãos afagou os fios de meu cabelo. Depois afastamo-nos, encarando uma a outra, tinha horas que nós parecíamos mais duas amigas do que mãe e filha. Éramos companheiras, parceiras, e principalmente, éramos inseparáveis.

 

Mas de repente, toda a minha felicidade esvaiu-se, porque os olhos de minha mãe ganharam um brilho súbito e eu sabia que era a minha vez de ser interrogada.

 

- E você, meu amor, quando me contará com quem estava ontem e hoje pela manhã?

 

A resposta pulou por entre meus dentes, foi algo completamente instintivo.

 

- Ninguém!

 

- Ah, claro! – ela não havia se convencido ainda.

 

Seu sorriso era irônico, mas eu sabia que ela estava sentindo-se traída por mim naquele momento. Mas eu realmente não tinha culpa. Meu relacionamento com Aidan não é o que se poderia chamar de algo comum, muito menos planejado. Fomos pegos de surpresa pelo implacável destino e pelo irresistível sentimento chamado "amor".

 

- Eu esperarei pacientemente que você decida apresentá-lo formalmente para mim. Só que darei um prazo, você tem até a quarta-feira para trazê-lo aqui em casa para jantar. Porque caso contrário, mocinha, você terá sérios problemas. – ela advertiu-me.

 

- Tu-tudo bem. – gaguejei lamentavelmente e minha mãe não deixou isso escapar. E agora eu sabia que tudo o que dissesse e fizesse, pesaria contra mim no final. Porque quando se tratava de proteger sua prole, no caso eu, minha mãe era uma verdadeira leoa.

 

- Ótimo! Estamos entendidas! – ela sorriu vitoriosa e depois tornou a sua atividade doméstica, lavando as verduras na água corrente.

 

Devo ter permanecido petrificada por um bom tempo, até que a proximidade da hora de dormir lembrou-me de que em breve, eu teria um anjo belíssimo vigiando meus sonhos e isso trouxe de volta a minha paz e a minha tranqüilidade, dissipando mais uma vez todas aquelas nuvens cinzentas que ameaçavam o meu recente céu azul e ensolarado.

 

 

 

 

 

 

 

 

A segunda-feira chegou, toda a minha rotina recomeçando, ainda que minha vida parecesse totalmente às avessas agora.

 

Eu estava quase chegando a escola, meus pés arrastavam-se, não que eu não gostasse de lá, na verdade nos últimos meses a minha visão da escola mudou bastante. Com a companhia de Tamara e de Peter eu não me sentia mais tão só. Ainda que a ausência de Max ainda incomodasse-me um pouco.

 

Mas, depois do que houve entre mim e Aidan, depois de nosso relacionamento ter mudado e evoluído, eu temia encarar a todos. Principalmente as garotas!

 

Parecia tolice, mas eu ainda podia me ver como um alvo ambulante de pedradas.

 

Ainda que a idéia de estar com ele mais uma vez, mexesse com todo o meu ser e despertasse em mim aquelas sensações poderosas mais uma vez.

 

Estava prestes a empurrar a porta de vidro e adentrar ao longo corredor, quando uma mão moveu-se antes da minha, empurrou a porta para mim, enquanto eu sentia que a outra pousava de forma protetora em meu ombro, puxando-me para si. Depois lábios roçaram delicadamente em minha testa.

 

Não ousei olhar para cima, eu já sabia quem era, e devia estar tão vermelha quanto um tomate naquele momento, pois não houve um sequer que não olhasse para Aidan e eu, abraçados, como qualquer casal de namorados. O que não era bem uma verdade.

 

Então, contentei-me em encarar o chão, enquanto os cochichos e sussurros ganhavam destaque no corredor abarrotado.

 

Entramos ainda abraçados na sala de aula, e eu não o havia olhado por uma vez sequer. Sentei-me em meu lugar de sempre, enquanto sentia todos aqueles olhares sobre mim. Havia por acaso uma placa de néon sobre a minha cabeça?

 

Havia uma melancia pendurada no meu pescoço? Então por que raios todos olhavam para mim? Encolhi-me na carteira, enquanto sentia a figura curiosíssima de Tamara do meu outro lado, encarando a cena com a mesma perplexidade. Aposto que ela só se continha devido ao fato de que Aidan estava do meu outro lado. Porque caso contrário, eu seria praticamente metralhada com suas perguntas.

 

Abri minha bolsa, retirei de dentro dela um de meus livros, abri-o em uma página qualquer e escondi meu rosto nele, bem que eu queria naquele momento uma britadeira, assim eu abriria uma fenda no chão e enfiaria a minha cara.

 

Suspirei várias vezes, seriam longas horas...

 

 

 

 

 

 

 

Aquilo era realmente muito estranho.

 

O horário para o almoço já havia soado, estávamos todos sentados à mesa, Aidan e Tamara dos meus lados e Peter, bem, Peter estava sentado a minha frente.

 

Claro que eu tentara evitar a todo custo aquela situação deveras embaraçosa, mas Tamara havia fincado pé e insistira e muito para almoçar comigo. Peter viera como um brinde, muito emburrado, é claro, pela nova relação que brotara entre mim e Aidan.

 

Eu tentava de alguma forma quebrar aquele clima silencioso e mortal entre nós quatro, mas era impossível, e eu descartava cada pensamento que vinha a minha mente.

 

Eu sentia que Tamara, do meu lado esquerdo, estava muito impaciente, ela ainda queria respostas.

 

Aidan... estava calmo e distante, como sempre.

 

E embora meus olhos não desgrudassem da bandeja repleta de comida a minha frente, eu sabia que Peter estava mal humorado.

 

Suspirei, como é mesmo que eu havia acabado assim? Ah, claro eu me apaixonei!

 

Um pigarro chamou a minha atenção, então alguém devia ter criado coragem para quebrar aquele silêncio, alguém não, Tamara.

 

- E então como estão as coisas? – perguntou-me ela, um pouco sem graça.

 

Agradeci internamente por seu esforço, pelo menos ela estava tentando. Pigarreei também e virei-me um pouco mais para ela para poder conversar.

 

- Estão... ótimas!

 

Ela abriu um meio-sorriso.

 

- Isso é... bom.

 

- É.

 

O silêncio logo prevaleceu novamente, nossas tentativas frustradas de tentar interagir uma com a outra, morrendo vagarosamente nele.

 

- Mas e quanto ao baile de primavera? - ela tentou novamente.

 

- O que há com o baile? – perguntei a ela.

 

- Bem, ele será em duas semanas. – lembrou-me ela de algo que eu preferia esquecer.

 

- E? – eu a instiguei.

 

Tamara corou no mesmo instante a sensação de que era melhor que eu não soubesse o que ela havia aprontado aflorou dentro de mim, fazendo-me estremecer no mesmo instante.

 

O som do sinal tocando por todo o refeitório despertou-me. Vi que o primeiro a se retirar da mesa foi Peter, ainda sem dizer uma única palavra. Tamara se levantou, mas aguardou por mim, teríamos o mesmo período.

 

Levantei-me da cadeira, apanhando minha mochila, mal tive tempo de virar-me para meu lado direito, quando percebi que Aidan me encarava.

 

Gelei dos pés a cabeça, ainda mais quando senti ele se aproximar de mim e depositar um casto beijo no alto de minha cabeça. E então, ele sussurrou bem baixo, apenas para que eu o ouvisse.

 

- Te encontro mais tarde.

 

Eu podia sentir que todos ao meu redor estavam prestando atenção naquela cena. Cerrei meus olhos com força e respirei devagar, contando mentalmente, aguardando que suas atenções voltassem para seus afazeres e distanciassem-se o mais longe possível de mim.

 

Abri meus olhos novamente e percebi três coisas: Aidan já havia ido embora; todos ainda me encaravam boquiabertos e Tamara estava impaciente, ela queria chegar logo a sala de aula.

 

Sacudi minha cabeça e corri até ela. Caminhamos até a sala em total silêncio. E ignorando aquela estranha sensação de que eu não deveria saber o que ela havia feito, eu pigarreei a fim de chamar-lhe a atenção.

 

- Er, Tamara, sobre o baile... O que exatamente você estava tentando me dizer?

 

Ela ruborizou novamente, e as sensações desagradáveis apanharam-me de novo, meu estômago estava um pouco baqueado, parecia ter sido revirado pelo avesso e isso me causava um pouco de náusea.

 

- Er, bem, eu... – ela se interrompeu, parecendo procurar as palavras certas para contar-me, ou quem sabe tomar fôlego – eu reservei dois convites para você para o baile de primavera.

 

O choque foi tão grande que eu quase fui ao chão. Engasguei, e tive de tossir algumas vezes.

 

- Você o quê? – perguntei-lhe, completamente aturdida.

 

Ela cerrou seus olhos e mordeu seus lábios.

 

- Eu reservei convites para você.

 

- Mas por quê?

 

De repente ela mudou de postura, virou-se completamente para mim, os olhos brincalhões.

 

- E não é óbvio, bobinha? Eu quero companhia!

 

Quase engasguei novamente, havia um bolo entalado em minha garganta que não se dissolveria tão cedo.

 

- E você logo pensou em mim?

 

Ela colocou um de seus braços em meu ombro, recostando sua cabeça a minha, enquanto cambaleávamos pelo corredor.

 

- Claro! Você é minha melhor amiga.

 

Suspirei derrotada, eu estava completamente perdida.

 

- Tem algum sentido discutir esse assunto com você? – perguntei a ela, tentando esconder meu desânimo.

 

Ela sorriu no mesmo instante.

 

- Não.

 

- Ótimo. – murmurei – Isso não dá para ficar melhor!

 

Mais uma vez, Tamara tentou reconfortar-me, abraçando-me de um jeito um pouco desajeitado.

 

- Ah, não fiquei assim! Será divertido, eu prometo!

 

Respirei fundo antes de entrar na sala ainda na companhia de Tamara. Eu me sentia encurralada por uma matilha enraivecida. Se não bastasse minha mãe pressionando-me para conhecer Aidan, Peter que mal olhava para mim, e agora Tamara que queria de qualquer forma arrastar-me junto com ela para um baile.

 

E ainda havia esse desertor a solta por South Hooksett, uma ameaça eminente que vagava tranqüilo pela cidade, passando-se por um humano, enquanto mais pessoas correm risco de desaparecer e tornar-se um Escravo das Sombras.

 

Mas talvez, esses sejam os menores dos meus problemas. Uma sensação desagradável ainda me apanhava, e nada tinha haver com o baile. Talvez fosse apenas o meu detector para o perigo, alertando-me mais uma vez de que algo nefasto e tenebroso pousaria sobre nossas cabeças, ameaçando a segurança de todos.

 

Sentei-me na cadeira e Tamara sentou-se a minha frente, virando-se para mim com uma animosidade fora do comum.

 

- Agora me conte tudo! - exigiu ela - E não poupe nenhum detalhe!

 

Suspirei mais uma vez, eu estava realmente perdida.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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Notas finais do capítulo

hummmmm o q será que a Agatha sentiu??

ahhh e a relação dos dois não tá fofa??

queria agradecer a todos que estão recomendando músicas para a fic! Obrigada msm!!!

E logo, logo eu voltarei a aprontar por aqui, mas por enquanto as coisas ficarão só no LOVE!!

até a próxima!!

Beijoss