Saga Sillentya: as Sete Tristezas escrita por Sunshine girl


Capítulo 12
XI - Respostas


Notas iniciais do capítulo

hello!!

ahhh finalmente voltei!!

capítulo mega gigante, mas bombástico!!

a verdade finalmente veio a tona!!

Boa leitura!!



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Capítulo XI – Respostas

 

 

“O sofrimento acaba esta noite

Eu pegarei este pedaço de você

E guardarei por toda eternidade

Por apenas um segundo me senti plena

Quando você voou, direto para mim”.

 

 

(Flyleaf – Sorrow)

 

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A pequena luz no fim do túnel cintilou ainda mais, um pequenino ponto brilhante que contrastava com a negritude do abismo onde eu me encontrava.

 

Minhas mãos moveram-se, tentando agarrar a pequena luz, prendê-la entre meus dedos. Mas, algo me impediu, algo me puxou bruscamente para trás, afastando-me daquela pequena luz.

 

Tentei lutar, tentei impulsionar meu corpo, fazê-lo recuar diante daquela força estranha, mas não conseguia, e o pequeno feixe brilhante afastava-se gradativamente de meus olhos, diminuindo, desaparecendo, sumindo...

 

Aquela estranha força ainda me puxava para trás, enquanto minhas mãos buscavam desoladas pelo ponto brilhante.

 

Tentei dizer para a força estranha para que parasse de me puxar, para que me deixasse ali, deixasse-me retornar para a luz. Mas algo bloqueava minha voz, algo me impedia de falar.

 

E então me desesperei.

 

Tentei libertar-me de alguma forma daquela força estranha, mas ela era mais forte do que eu, mais veloz, eu não tivera a menor chance.

 

Eu ainda estava engolfada por toda aquela escuridão, embebida pela negridão, eu era refém das trevas, mas não temia, porque eu sabia que naquelas profundezas inóspitas estava a luz de minha esperança, a centelha que iluminara meu momento mais sombrio.

 

E agora um túnel escuro e gelado revelara-se para mim, tive certeza de se tratar de um túnel devido à gelidez do vento, o modo como ele soprava, tão suave.

 

E embora ainda estivesse mui escuro, eu podia sentir que aquela brisa leve raspava em minha pele, arrepiando-a, enquanto aquela força estranha ainda me puxava insistentemente.

 

E de repente o frio aumentou, senti como se estivesse nevando ao meu redor, estava tão gelado ali.

 

Tentei mais uma vez encontrar minha voz para poder responder a aquele estranho poder, mas algo ainda estava entalado em minha boca, algo havia se alojado em meus lábios, bloqueando minha fala.

 

Sentia-me muda, e muito, muito confusa.

 

Então a força cessou, parou de me puxar, de me rebocar consigo. Porém, no instante seguinte a força esmagadora derrubou-me de costas no chão frio e negro, tentei levantar-me dali, exigir-lhe que parasse com aquilo, um cadáver não teria esse direito? O direito de tentar descansar em paz? Minha alma incendiava pela fúria, eu queria encontrar essa força oculta misteriosa e dizer-lhe umas boas verdades.

 

Ainda deitada sobre aquele chão escuro e frio, eu comecei a sentir as primeiras fisgadas. Elas vieram de meu peito, como se algo estivesse esmagando-o.

 

Tentei ver através da escuridão, mas foi inútil, meus olhos ainda estavam toldados pela manta espessa da negridão.

 

Lutei desesperadamente para encontrar minha voz e ordenar a aquela força que cessasse aquilo, mas a pressão em meu peito tendia apenas a aumentar, eu estava em agonia, e minha voz estava sumida.

 

De repente comecei a notar que a pressão misteriosa em meu peito, cedia por alguns segundos, senti um alívio, eu não gostava da forma como aquelas fisgadas atrapalhavam a minha concentração; eu ainda tentava de alguma maneira encontrar o ponto brilhante de luz que a pouco eu vira.

 

E um sopro quente fluiu por minha garganta, uma brisa escaldante que parecia incendiá-la ao simples fato de encostar nela. Eu não sabia que uma brisa poderia ser tão quente. Tive de lembrar a mim mesma que devia estar boquiaberta.

 

Lutei uma verdadeira batalha para tentar cerrar meus lábios, mas não obtinha resultado. Talvez porque eu não sentisse nada do que normalmente deveria sentir. Seria essa dormência conseqüência da morte?

 

Eu ainda esperava impacientemente que aquela força estranha deixasse-me em paz. Queria que a pressão em meu peito e o vento em meus lábios também cessassem. E principalmente, queria encontrar minha voz, que aquela mudez minha passasse logo.

 

Talvez quando isso acontecesse, eu pudesse resolver todos esses problemas e ainda como bônus, tornar a procurar pela centelha brilhante que tanto me enfeitiçara.

 

Mas aquilo não acabava nunca, parecia mais um ciclo vicioso, um tormento eterno.

 

Depois de chegar à constatação de que estava profundamente irritada devido a tudo isso, notei que algo se acumulava em minha garganta, uma sensação estranha e tão desagradável.

 

Conclui que deveria ser minha voz, que enfim havia retornado. Tentei pigarrear para me certificar, mas aquela coisa entalada em minha garganta impedia-me. O que estava havendo ali?

 

Tornei toda a minha atenção para aquele empecilho que obstruía minha voz. E só aí notei a sua gelidez, parecia que eu estava com um enorme cubo de gelo entalado em minha garganta. Mas não era apenas isso, com minha atenção toda voltada a aquela parte de mim, notei que meus pulmões estavam queimando, como se estivessem em brasa viva.

 

Desesperei-me de imediato, o que estava havendo comigo?  E uma forte náusea apanhou-me.

 

Agora aquele imenso empecilho subia por minha garganta, escalando-a dolorosamente. Eu estava sufocando, estava confusa, e extremamente irritada. O que afinal era tudo aquilo?

 

Quando a coisa gelada avançou mais por minha garganta, chegando a minha boca, senti a gelidez novamente, dessa vez em minha língua. Mas, para a minha total surpresa não era sólido, era líquido e ralo.

 

Não pensei duas vezes antes de entreabrir meus lábios e cuspir aquilo; e eu realmente o fiz.

 

Enquanto a sensação em meus pulmões desaparecia vagarosamente.

 

E a manta negra que me encobria, recuava em marcha lenta.

 

A dormência caiu por terra, e eu senti cada membro de meu corpo totalmente intacto.

 

Mas, junto da dormência, minha sensação de paz e tranqüilidade esvaiu-se completamente, e eu senti a dor.

 

Dor em minhas vias respiratórias, e eu que achava que o fogo havia cedido. Não, ele apenas trocou meus pulmões por elas. Meus lábios, minha garganta, tudo ardia.

 

Tentei acalmar-me, raciocinar, encontrar uma explicação lógica para tudo aquilo. E cheguei a apenas uma constatação, assim que eu abrisse meus olhos eu veria a verdade, saberia o que estava se passando e principalmente, tiraria essa dúvida que tanto martelava em minha cabeça.

 

Porém, antes mesmo que eu o fizesse, algo me segurou, sustentando minha cabeça. A curiosidade atiçou-me, e eu abri meus orbes, desejosa pela verdade.

 

E então eu vi...

 

- Aidan... – consegui sussurrar, descobrindo que minha voz estivera comigo durante todo o tempo, era somente a água bloqueando-a.

 

Sim, porque eu estava viva. Eu não havia morrido, ou pelo menos, essa foi a primeira conclusão que eu cheguei.

 

Seu rosto estava tão severo, o cenho franzido, os olhos semicerrados, e os lábios apertados na familiar linha rígida que eu tanto vi. A água escorria pelos fios de seu cabelo negro.

 

Aidan apoiava minha cabeça, segurando em minha nuca, enquanto sua outra mão em minha cintura segurava-me a lateral de seu corpo.

 

Tentei olhar ao redor, recordar-me do que tinha acontecido, e só então notei que o céu ainda estava negro, chuvoso, coberto pelas nuvens escuras e medonhas.

 

Olhei novamente, dessa vez prestando mais atenção aos detalhes. Havia um som de forte correnteza ao fundo, mas não me detive nele, um zunido irritante ecoava em meus tímpanos.

 

Atrás de mim, árvores altas e imponentes, sendo terrivelmente castigadas pela chuva e pelo vento rude.

 

E embaixo de meu corpo, uma imensa rocha, no que eu reconheci ser a margem de um rio.

 

E tudo veio a minha mente em apenas um segundo, eu, preparando-me para atirar-me da ponte, eu, tentando suicidar-me.

 

- O que... houve? – perguntei, ainda receosa que ele guardasse alguma mágoa de meu comportamento essa tarde.

 

- Não se lembra? – perguntou-me ele.

 

- Não... muito. – admiti.

 

Como Aidan estava ali, junto ao meu corpo, também concluí que fora ele a me salvar, a me tirar do fundo daquele rio cheio e de águas agitadas. A questão era, como ele havia chegado até mim? Como sabia que eu estava aqui? E ainda mais, que estava em perigo, precisando de ajuda?

 

Ele também deve ter me reanimado, pois a quantidade de água que eu engolira conseguira retirar a minha consciência.

 

- Como... como você...

 

- Isso não importa agora. – interrompeu-me ele, o calor dos olhos abrasadores direcionados todos para mim – Você está segura.

 

Não tentei contestá-lo, estava tão debilitada que não tinha forças suficiente nem mesmo para discutir com ele.

 

De repente Aidan encarou o céu tempestuoso e pareceu preocupado. Seus olhos moveram-se para trás, encarando a estrutura velha e decadente da ponte acima do rio.

 

E seus lábios curvaram-se novamente naquela linha rígida, enquanto seus olhos assumiam um tom hostil e ameaçador.

 

- Ele sabia. – murmurou ele a meia-voz, parecendo profundamente irritado.

 

- Quem... quem sabia? – perguntei, forçando minha voz rouca.

 

- Droga! - ele murmurou de repente e eu me assustei – Ele sabia que você estava comigo! Por isso te fez pular dessa maldita ponte!

 

A confusão tingiu todo o meu semblante. Do que ele estava falando?

 

- Aidan, eu não... não entendo.

 

Seus olhos voltaram para os meus, toda a sua hostilidade e fúria recuando da beleza de seus orbes.

 

- Isso não tem importância agora, tenho que tirar você dessa tempestade. – murmurou ele calmamente.

 

E suas mãos sustentaram o peso de meu corpo, segurando-me por minha cintura, enquanto eu apoiava-me nele.

 

Eu não podia contestá-lo, ficar embaixo daquele temporal estava acabando comigo, embora não tivesse muito mais de minhas forças para esgotar.

 

Então deixei que ele me rebocasse consigo, enquanto caminhávamos em meio às árvores. A floresta assumia um aspecto muito mais sombrio e grotesco em noites tempestuosas.

 

Caminhamos os dois em absoluto silêncio, de minha parte porque eu estava cansada demais para tentar falar ou puxar qualquer assunto com sua figura silenciosa. E da parte dele, bem, eu não sabia porque exatamente ele mantinha-se tão calado.

 

Logo percebi que ele me levava de volta para o seu chalé, estremeci internamente, mas que opção eu tinha? Permanecer plantada embaixo daquele temporal?  Definitivamente eu não tinha outra opção, e isso me irritou profundamente.

 

Aidan parou diante da porta de madeira, abrindo-a e carregou-me consigo enquanto adentrava ao pequeno cômodo obscurecido.

 

Um clarão no céu iluminou-o por alguns segundos. Aidan soltou-me então pela primeira vez, deixando-me no meio daquela escuridão para fechar a porta, por onde uma brisa rude e fria adentrava.

 

Depois passou reto por mim, caminhando rumo a escuridão. Abracei-me na esperança de apaziguar aquele frio, eu estava praticamente congelando ali.

 

Aidan voltou com o que parecia ser um velho lampião. Ele postou-se de costas para mim e o acendeu; soube disso porque houve uma leve incidência de luz no cômodo.

 

Depois, ele o depositou acima da cômoda, abriu a gaveta e pareceu procurar por algo nela. Logo, ele já havia encontrado o objeto de seu foco, uma toalha, que ele gentilmente estendeu para mim.

 

- Tome. – disse-me ele, o tom de voz parecendo um pouco mais controlado.

 

- Obrigada. – murmurei e aceitei seu presente, desdobrando a toalha e começando a me enxugar.

 

Passei a toalha em meu rosto, em meus cabelos, em meu pescoço, porém a sensação de frio não diminuía em nada. Só então me dei conta de que meus dentes batiam uns contra os outros com extrema violência devido a ele.

 

Aidan voltou a remexer na gaveta outra vez e dessa vez apanhou o que me pareceu ser uma camisa flanelada. Ele olhou para mim outra vez, enquanto sua mão gesticulava para que eu pegasse.

 

- Vista isso, você deve estar com frio.

 

- Estou bem. – menti e ele não se convenceu, pois insistiu com sua gentileza.

 

- Pegue, Agatha, você ficará doente se permanecer com essas roupas molhadas no corpo.

 

Suspirei derrotada e peguei o pedaço de tecido de suas mãos.

 

- Você pode usar o banheiro para se trocar. – informou-me ele.

 

- Tudo bem. – assenti e rumei na direção do cômodo pequenino, distanciando-me da única fonte de luz naquela casa.

 

Empurrei a porta, entrei e a fechei. Fitei-me no pequeno espelho acima da pia branca, um clarão iluminou meu reflexo, eu estava tão pálida quanto giz devido ao frio.

 

Desabotoei minha blusa de mangas e retirei minha blusinha branca de alças. Vesti a camisa que ele me emprestara, e era extraordinária a forma como o seu cheiro havia impregnado naquele pedaço de tecido.

 

Mas, minhas suspeitas internas confirmaram-se. Claro que eu não contei nada a ele, mas sua camisa ficara gigante em mim. Eu não tinha o mesmo porte dele, nem mesmo tinha um corpo tão atlético.

 

Abotoei-a e puxei as longas mangas até liberar meus pulsos, dobrando-as. Usei a toalha novamente para secar meu cabelo mais cuidadosamente e tentei penteá-los com os dedos.

 

Dobrei minhas blusas encharcadas, aquilo ainda não estaria seco de manhã nem mesmo se eu fizesse um milagre.

 

Abri a porta novamente e vi sua figura imóvel, encostada junto à parede de madeira, os olhos vagando pelo teto tediosamente, até que me encontraram ali e caíram sobre mim.

 

Cruzei meus braços, estava completamente deslocada ali. O silêncio era algo mortal, e era rompido apenas pelo eco das gotas grossas da chuva chocando-se contra o telhado de madeira do chalé.

 

Fitei meus pés enquanto avançava passo a passo até ele, eu não sabia se teria ousadia suficiente para encará-lo diretamente, não depois do que ele me disse hoje pela tarde.

 

Porém, sua figura movimentou-se novamente, andando com elegância até um velho roupeiro, onde suas mãos apanharam uma manta. Ele avançou novamente até mim, mas ao invés de simplesmente estender a manta para mim, ele preferiu aproximar-se mais, nossos corpos quase se tocavam.

 

E então com um movimento muito sutil e suave ele abriu a manta e a colocou sobre meus ombros. Senti suas mãos fortes segurarem-me e limitei-me a apenas encarar o seu peito largo enquanto a manta deslizava pelos meus ombros.

 

Baixei meus olhos ainda mais, sentindo o modo como sua respiração quente chocava-se contra o meu rosto. E então ele se foi...

 

Afastou-se de mim em um único movimento, como se estivesse sendo cauteloso o suficiente para não me assustar.

 

Mas em nenhum momento seus olhos deixaram os meus, pelo contrário, pareciam vidrados em cada reação minha, em cada expressão que ele podia ler no fundo daquelas duas janelas para a minha alma.

 

Tentei romper aquele clima estranho, demonstrando ao menos um pouco de preocupação por aquele quem me salvara pela segunda vez.

 

- Você também apanhará uma gripe se permanecer com essas roupas.

 

Sua expressão permaneceu inflexível enquanto ele me respondia.

 

- Eu ficarei bem.

 

Mas então suas mãos agiram com precisão, e ele retirou a sua camisa encharcada, ficando com o peito totalmente nu. Tive de lembrar a mim mesma de que não poderia olhá-lo com tanta intensidade como fizera da última vez.

 

Sob aquela leve incidência de luz alaranjada da chama do lampião, sua pele pareceu-me tão sedosa, tão macia, meus dedos coçaram em minhas mãos para tocá-la, para sentir a sua maciez na ponta deles. Deixar que eles deslizassem por aquela superfície tão plana e lisa.

 

Mordi meus lábios, refreando aquele desejo insano, eu devia não apenas ter engolido muita água, como também devia ter perdido o juízo. Onde eu estava com a cabeça?

 

Aidan retirou uma toalha também, enxugando os fios curtos de seu cabelo, chacoalhando-os. Depois procurou por uma camisa limpa e a vestiu, tapando a visão divina que eu tinha de seu corpo.

 

Desviei meus olhos, um pouco ruborizada e então decidi sentar um pouco, estava deveras cansada. Eu jamais pensei que se afogar pudesse ser tão exaustivo.

 

Cambaleei para trás, sentando-me na beirada do colchão da cama de casal e então ajeitei a manta sobre meus ombros, eu já não estava mais com tanto frio.

 

Aidan caminhou até o lampião, levantando-o e trazendo-o para mais perto de mim, colocou-o perto de meus pés, de frente para mim, e então ele próprio se sentou no chão, os olhos ainda acompanhando cada movimento meu.

 

- Parece que essa será a nossa única fonte de luz por essa noite. – sua voz abafada e aveludada rompeu o silêncio entre nós e eu o olhei, aturdida.

 

- A energia... – tentei começar uma pergunta, mas ele interrompeu-me novamente.

 

- Sim, algum raio deve ter atingido algum poste, estamos sem eletricidade, pelo menos por essa noite.

 

Vi que seus olhos tornaram-se vazios por alguns poucos segundos, enquanto ele ouvia atentamente o som das gotas de chuva que despencavam incessantemente do lado de fora.

 

- Parece que você terá de passar a noite aqui também, duvido que consigamos ir a algum lugar com esse temporal. – concluiu ele calmamente.

 

Respirei fundo e elevei meus olhos até sua face rígida, estava decidida a não importuná-lo mais.

 

- Tudo bem, Aidan, se eu conseguir chegar até o carro de minha mãe...

 

- Eu acho que não. – sua voz cortou-me, deixando-me confusa – E além do mais, não é seguro. Por ora é melhor que você fique ao meu lado.

 

- Isso é por causa do desertor? – perguntei meio temerosa.

 

- Sim. – ele assentiu instantaneamente e depois prosseguiu – Ele deve tê-la visto comigo por mais de uma vez e também a viu naquela noite na floresta, por isso te julgou uma ameaça e a forçou a pular daquela ponte.

 

- Forçou? – perguntei abismada, eu não me lembrava de muita coisa, mas tinha a absoluta certeza de que não havia sido agarrada e muito menos lançada de lá de cima.

 

Aidan encarou-me por alguns segundos, mas depois preferiu esclarecer-se.

 

- É um tipo de controle mental, aqueles... como eu, possuem essa habilidade, a de penetrar na mente humana e ordenar qualquer tipo de coisa.

 

- Qualquer tipo? – repeti, incrédula, e então o choque moldou minhas feições, enquanto uma antiga lembrança preenchia meus pensamentos – Você... – sussurrei – você também me manipulou naquela noite, não foi?

 

Tentei encontrar algum sentido em minhas palavras, mas eu estava coberta de razão. Eu ainda podia me lembrar do pânico que me atingira, a adrenalina fluindo por minhas veias, e então a voz em minha mente, ordenando que eu me acalmasse e que depois dormisse.

 

Aidan juntou suas sobrancelhas, claramente um sinal de reprovação, ele não queria iniciar aquele assunto novamente, isso estava claro, mas que opção ele tinha?

 

- Sim, eu a manipulei naquela noite. Pedi a você para que se acalmasse.

 

- E depois que eu perdesse a consciência. – completei sua frase.

 

- Seria melhor assim para você.

 

- Foi realmente muito melhor – concordei ironicamente – todos pensaram que eu tivesse enlouquecido, eu quase fui parar na ala psiquiátrica do hospital.

 

Sua face assumiu um tom de escárnio.

 

- E você estaria mais segura lá do que aqui comigo e agora.

 

- Tem razão, estaria presa em alguma camisa de força, talvez, ou fortemente sedada, eu realmente estaria muito melhor lá, sendo considerada uma louca.

 

Calei minha boca, parecia que minhas forças para discutir com ele estavam revigoradas e em seu auge novamente. Estava tão irritada naquele momento.

 

Não me atrevi a romper o silêncio mais uma vez, então seria uma longa noite silenciosa.

 

Porém, conforme os segundos avançavam, minha irritação esvaiu-se toda, minha fúria apaziguou-se, e eu tive de permitir que toda aquela minha raiva se transformasse em uma gratidão irreverente.

 

- Aidan... – chamei-o novamente, mas evitei olhá-lo enquanto recomeçava nossa conversa – obrigada. – agradeci-lhe – Obrigada mesmo, por me salvar mais uma vez.

 

 Aidan baixou seus olhos, ele parecia estar remoendo algo em sua mente.

 

- Não, não me agradeça. Fui eu o responsável por metê-la nisso, talvez se eu tivesse sido mais... cuidadoso você não estaria em perigo tão eminente como está agora.

 

- Você está errado. – sussurrei e seus olhos voltaram até os meus, fitando-me com tanta intensidade – Por mais de uma vez você salvou minha vida, você me tirou daquela floresta, tirou-me do fundo daquele rio, e eu estaria morta agora se não fosse por você.

 

Por alguns segundos, seus olhos endureceram, e eu realmente achei que ele tentaria me contestar, dizer que eu estava enganada, mas ele não fez, e seus olhos apenas voltaram ao mesmo tom melancólico e vazio.

 

O silêncio fez-se presente ali mais uma vez, e eu sabia que não conseguiria conviver com ele por muito tempo, então decidi rompê-lo, pressionando-o mais uma vez a me contar toda a verdade.

 

- Aidan, como exatamente você sabia que eu... estava... – minha frase perdeu-se pela metade, ainda mais depois que percebi que ele me encarava daquela forma novamente, com seu olhar penetrante.

 

Ele pareceu relutante, talvez não quisesse conversar sobre o assunto, mas eu estava errada, pois no instante seguinte ele respondera a minha pergunta.

 

- Eu estava atento a sua... energia. – confessou-me ele.

 

- Minha o quê? – perguntei-lhe confusa.

 

- Sua energia. – ele tornou a repetir o que havia dito com o máximo de naturalidade possível, embora eu estivesse literalmente viajando ali.

 

Permaneci boquiaberta, como assim ele estava atento a minha... minha energia? Então algo me ocorreu, uma breve conversa que tivemos no mês passado enquanto fazíamos aquele trabalho de inglês.

 

Quando por alguns momentos, Aidan confessou-me julgar as pessoas não por seu exterior, mas pelo que elas apresentavam dentro de si; suas almas.

 

Lembro-me de ficar bem perturbada quando ele me dissera isso, que podia ver e olhar para a minha alma. Surpreendi-me que eu não tenha percebido ou recordado desse fato anteriormente.

 

E então entendi do que ele estava falando.

 

- Você estava vigiando o meu estado de espírito. – murmurei, completamente segura do que estava dizendo.

 

Aidan arqueou uma de suas sobrancelhas, depois completou.

 

- Na verdade, mais do que isso.

 

- Explique-se melhor. – pedi-lhe, esperançosa de que ele me atendesse.

 

Aidan pareceu hesitar no inicio, mas então suspirou e prosseguiu com sua explicação.

 

- Tudo bem, pense que cada humano contém dentro de si um tipo de energia. Melhor ainda, pense que cada alma, cada espírito contido dentro de um corpo exala um tipo de energia, que eles são compostos por esse tipo de energia.

 

Assenti e ele continuou.

 

- Eu já disse anteriormente a você que posso ver essa energia pulsando, posso ver a alma dos humanos, senti-la. Quando você saiu daqui pela tarde, eu estava um pouco... receoso do que você pudesse fazer. Então fiquei atento à energia que a sua alma exalava. Eu senti uma certa tensão, uma tristeza e uma dor imensa – ele pareceu dizer essa última frase com certa relutância e eu me senti de certa forma culpada por isso – mas então algo aconteceu, e eu senti que você teve medo, temor. Fiquei na expectativa de que não fosse nada, que você estava bem, mas algo chamou minha atenção de novo, um outro tipo de energia que eu conheço muito bem, agindo sobre você, manipulando a sua mente. Não sei quando decidi intervir nisso, apenas sei que o fiz. Corri como um louco, a todo segundo pensando que poderia não chegar a tempo para salvar você. E eu realmente quase não consegui. Quando cheguei até a ponte, estava muito escuro, mas não havia nenhum rastro seu nas proximidades. Pensei em voltar, desistir de tentar, mas algo me impedia, então continuei procurando por você e quando a achei novamente, no fundo daquele rio, não pensei duas vezes antes de pular atrás de você para salvá-la.

 

Ele encerrou seu discurso, e eu podia notar a tensão que irradiava de todo o seu corpo por reviver aquelas lembranças.

 

- Eu sinto muito, Agatha, sinto muito mesmo. Tentei protegê-la de todas as formas, evitar você, afastá-la de mim, mas não ajudou em nada, porque ainda assim aquele... desgraçado veio atrás de você.

 

- Você não tem que se culpar. – tentei consolá-lo, aquilo não era culpa dele, nunca fora. Se havia algo a ser culpado ali seria o destino, por atirar-me naquele caminho sombrio, por atirar-me no mesmo caminho de Aidan.

 

- Não, você não está entendendo. – ele teimou comigo – Se eu tivesse me controlado mais, se não tivesse sido tão egoísta a ponto de desejar tanto a sua companhia, nada disso estaria acontecendo.

 

Processei lentamente tudo o que ele acabara de falar para mim, palavra por palavra e meus lábios entreabriram-se pelo choque.

 

- Minha companhia? – repeti confusa – Você deseja a minha... companhia?

 

Ele lançou-me um olhar de desculpas, como se estivesse pedindo-me perdão.

 

- Aidan, eu não... não entendo...

 

- Você não precisa entender, na verdade, acho que jamais conseguiria. Você não foi criada com os mesmos objetivos que eu. Você tem uma vida comum, embora eu possa ver que não é feliz com ela, mas você a tem. E eu, eu jamais tive isso. – ele riu sem o menor humor – Claro que eu sempre serei grato a Ducian por tudo o que fez por mim, mas mesmo assim, acho que jamais encontrarei o que eu realmente quero nesse caminho, nessa vida.

 

- Du-Ducian? – tentei repetir o nome que ele havia dito. – Quem é Ducian?

 

- Meu mentor, aquele quem me treinou desde que eu era criança, e de certa forma, aquele quem me criou, por isso eu o tenho como um pai, embora não tenhamos nenhum laço sanguíneo ou vínculo familiar.

 

- Seu pai? – repeti incrédula, aquela era a primeira vez que ele me falava de sua figura paterna, embora eles realmente não o fossem, Aidan o tinha como um pai.

 

Então me lembrei de outra de nossas conversas, quando ele me disse ser filho de uma americana e de um italiano. Então se esse tal de Ducian era o pai italiano, a mãe seria...

 

- E quanto a sua mãe? – perguntei despreocupadamente, mas então me arrependi de imediato, pois uma dor imensurável tomou conta dos olhos de Aidan, mas não era apenas dor, era culpa. – Aidan? – voltei a chamá-lo, temendo ter reaberto uma antiga ferida.

 

- Minha mãe morreu há algum tempo. – respondeu-me ele depois de parecer recuperar a sua postura.

 

Mordi meus lábios, eu refrearia minha curiosidade sobre ela, não queria magoá-lo, muito menos reviver seu passado, ainda mais se ele era tão doloroso assim.

 

- Aidan, quem realmente é você? – perguntei-lhe, decidindo mudar de assunto, voltando nossa conversa para a sua raça, já que ele me dissera haver muitos como ele.

 

- Você ainda quer saber? – perguntou-me ele, incrédulo.

 

- Acho que não faz muita diferença agora, estou na lista negra desse desertor de qualquer maneira. – dei de ombros e ele abriu um singelo sorriso, que conseguiu retirar o meu fôlego.

 

- Tudo bem, será realmente melhor que você saiba com o que está lidando.

 

Assenti em silêncio e esperei ansiosa que ele me dissesse, eu estivera aguardando aquela resposta por tanto tempo e agora parecia tão tolo que ele estivesse mesmo me contando.

 

- Somos conhecidos por Mediadores. – murmurou ele a meia-voz, seus olhos medindo cada reação minha.

 

- Mediadores? – repeti, esperando que ele me explicasse o que exatamente significava aquilo.

 

- Um Mediador é um ser muito poderoso, porém não invencível. Como principal habilidade ele possui o dom de se conectar ao plano espiritual...

 

Ele parou por alguns segundos, certificando-me de que eu não estava assustada ou talvez a ponto de gritar histericamente, mas minha expressão tranqüila o convenceu e ele tornou a sua explicação.

 

- Isso significa que podemos usar os espíritos ao nosso favor, usá-los como armas, ou até mesmo como grandes exércitos que batalham ao nosso comando. Pense nos espíritos como grandes formas de energias canalizadas e conscientes, e pense em nós como os seus manipuladores, aqueles que podem reger e sobrepor a sua vontade sobre essas energias. E também pense que tudo ao seu redor, tudo o que tem vida, tudo o que respira, tem e possui uma energia fluente dentro de si.

 

- Isso é como uma espécie de... invocação? – conjeturei.

 

Aidan assentiu com um gesto e depois prosseguiu calmamente.

 

- Exatamente. Como uma espécie de invocação.

 

- E como exatamente vocês fazem isso?

 

Aidan riu novamente sem o menor humor.

 

- Primeiro você tem que conhecer a história que cerca a minha raça.

 

- E algum dia você me contará?

 

- Veremos. – desafiou-me ele.

 

Os olhos dele de repente focaram-se na chama dançante dentro da cúpula de vidro do lampião, observando-a atentamente.

 

Mordi meus lábios e então repassei para a próxima pergunta.

 

- Você disse que caça desertores, e que essa é a sua tarefa.

 

- Sim. – assentiu ele, os olhos demovendo-se da chama dançante e voltando ao meu rosto. – Mas, não necessariamente desertores. Eu já travei inúmeras batalhas em nome de Sillentya.

 

- Sillentya? – repeti aturdida – Que nome estranho.

 

- Sillentya é a sociedade suprema dentro do meu mundo, aqueles que comandam, que ditam todas as regras. – respondeu-me ele.

 

- E você os serve? – conjeturei novamente.

 

- Eu já lhe disse, Agatha, eu fui criado com apenas esse propósito. Eu devo minha lealdade para com eles, para com todas as Sete Tristezas, principalmente meu mentor.

 

Curvei meu corpo para a frente, ficando imensamente interessada no que ele estava contando-me.

 

- Sete Tristezas?

 

Aidan notou minha curiosidade e tratou de se explicar.

 

- As Sete Tristezas são as sete autoridades supremas dentro de Sillentya, eles comandam absolutamente tudo. São os Sete Mediadores mais poderosos que já conheci.

 

- E o que eles tem de tão especial?

 

- Experiência, séculos e séculos acumulados em conhecimento e estratégia de batalhas. Além disso, eles são o mais perto de divindades que temos em meu mundo.

 

- Divindades?

 

- Eu já lhe disse que nós manipulamos as energias que constituem os espíritos, mas existem no plano espiritual figuras com imenso poder de destruição, chamados de espíritos do caos, ou simplesmente antigos. Eles estão nesse mundo desde o inicio, desde a criação de tudo e nem sempre foram tão dóceis e pacíficos. Esses seres antigos já espalharam terror e devastação sobre o plano físico, o plano em que os seres de carne e osso vivem. Até que nós surgimos para estabelecer um equilíbrio entre esses dois mundos e banir os antigos para o plano espiritual.

 

- Mas, você ainda não respondeu minha pergunta. – reclamei e ele lançou-me um olhar de como já tivesse deixado escapar a resposta óbvia. – As Sete Tristezas, elas podem... invocar esses... antigos?

 

Os olhos dele voltaram para a chama dançante do lampião, enquanto eu permanecia abismada.

 

- Não se preocupe, Agatha, eu lhe disse que somos pacíficos, não desejamos prejudicar o seu povo, muito menos feri-los. Claro que no passado já tivemos as nossas desavenças, – eu o encarei assustada e ele tratou de se explicar – vocês foram nossos servos durante muitos séculos, viviam sob uma espécie de regime de servidão, mas alcançaram a liberdade, e nós não os importunamos mais.

 

Suspirei de alívio, eu nem mesmo conseguia imaginar algo assim, uma guerra entre humanos e Mediadores.

 

- Você disse que eles possuem séculos de experiência. Então vocês são...

 

- Não. – sua voz interrompeu-me – Não somos imortais, eu lhe disse que somos exímios guerreiros, poderosos lutadores, mas não somos invencíveis, e além do mais, envelhecemos em um ritmo bem mais desacelerado. Um Mediador pode facilmente viver de oito a nove séculos. Mas as Sete Tristezas elas vivem mais, tem que viver, até que seus sucessores estejam realmente prontos para assumirem seus lugares.

 

- E quanto tempo exatamente eles vivem?

 

Aidan sorriu um pouco e depois respondeu minha pergunta.

 

- Meu mentor tem mais de mil anos.

 

- Seu mentor é uma das Sete Tristezas?

 

Ele assentiu em silêncio, mas depois completou.

 

- Lorde Ducian Satoya, aquele que mudou minha vida e a de meu irmão para sempre. Ele nos escolheu como seus discípulos, treinou-nos desde que éramos crianças e então quando enfim o dia chegou...

 

- Seu irmão? – perguntei confusa, mas então vi a expressão de Aidan mudar, a dor atravessou o seu rosto e eu encerrei definitivamente aquele assunto. – Mas, você disse que ele o escolheu, então você não nasceu lá, você não é filho de um deles.

 

- Não. – ele respondeu e a dor ainda estava cravada em sua voz – Eu nasci no mundo humano, uma época muito difícil, de caos e devastação. Eu nem mesmo me lembro da figura de meu pai, ele morreu quando eu tinha apenas três anos, e deixou a mim, a minha mãe e a meu irmão, um bebê de poucos meses de vida ainda, durante a guerra civil.

 

O choque mais uma vez atravessou a minha face, eu simplesmente não sabia mais no que acreditar. E muito menos digerir a idéia de que eu tinha diante de mim alguém com mais de cento e cinqüenta anos.

 

- Você... você nasceu durante a guerra civil? – consegui perguntar-lhe.

 

- Em 1860, em uma cidadezinha no interior da Virginia.

 

- Quando Ducian veio até nós, eu mal acreditava no que estava vendo. Ele pareceu ser a nossa salvação, afinal estávamos fugindo da guerra, éramos refugiados. Ducian afeiçoou-se a mim e ao meu irmão, pois segundo ele, nós os lembrávamos de seu único filho, assassinado em uma batalha, então convenceu-nos a ir embora para a Itália com ele. Minha mãe aceitou o convite com honraria, ela acreditava que estava construindo para nós dois um futuro melhor, garantindo-nos um futuro melhor, afastando-nos daquele ambiente de caos e morte. Quando chegamos à Itália, iniciamos o nosso treinamento. Eu era apenas um garotinho e já carregava um fardo tão pesado. Quando eu completei dezoito anos, eu fui iniciado como Mediador. É um ritual que leva dias e que desperta dentro de você todos esses poderes, – ele elevou a palma de sua mão e começou a fitá-la – é claro que você permanece inconsciente enquanto tudo acontecesse, e então quando abre os olhos novamente, tudo já está diferente, tudo mudou. Meu irmão foi iniciado três anos depois de mim, e quando ele se juntou a mim, tornamo-nos quase invencíveis. Éramos respeitados por todos, temidos até mesmo pelo mais poderoso Mediador. É quase impossível contar o número de batalhas que travamos um ao lado do outro.

 

Sua fala interrompeu-se, seus olhos tornaram-se vazios novamente e eu sabia que algo de muito grave havia acontecido ao seu irmão.

 

- Até que um dia, ele voltou-se contra Sillentya, voltou-se contra as Sete Tristezas. Ducian não me deu outra opção, não me deixou tentar trazê-lo de volta, convencê-lo a não cometer aquela loucura. E então eu fui enviado para caçá-lo. Você pode imaginar isso, Agatha, ter que caçar o seu próprio irmão? Alguém do seu próprio sangue? Da sua própria família?

 

- Não... – sussurrei – eu jamais conseguiria imaginar.

 

- Pois eu já tive essa sensação.

 

- Mas o que você fez? – perguntei um pouco temerosa por sua resposta.

 

- Eu o cacei até a fronteira com a França, nós lutamos e eu o venci. Mas quando chegou o momento, eu não consegui fazê-lo, não consegui matá-lo, então deixei que ele partisse, e ele se foi, jurando que se nos víssemos outra vez, somente um de nós sairia com vida.

 

- Você não tem que fazer isso. – sussurrei, tentando consolá-lo. – Você não precisa fazer isso, Aidan. Quero dizer, é errado, ele é seu irmão.

 

- Ele ainda está por aí, em algum lugar. Mas eu também sei que ele nutre uma espécie de ressentimento por mim, que ele planeja vingança contra mim e contra Ducian.

 

- Entendo.

 

Aidan baixou sua cabeça, seus olhos estavam tristonhos novamente. Uma sensação tão forte apoderou-se de mim, tudo o que eu queria naquele momento era confortá-lo, abraçá-lo, dizer-lhe que estava tudo bem. Mas eu não o fiz. Fiquei completamente parada, observando-o, enquanto a culpa o consumia.

 

- Você será o sucessor de Ducian, não será? – perguntei-lhe.

 

- Sim. – ele assentiu a meia-voz, como se a idéia não o entusiasmasse muito.

 

- Eu acho que entendo porque essa idéia não lhe agrada muito. – murmurei.

 

Aidan permaneceu em silêncio. Então tratei de puxar outro assunto.

 

- Você disse que descobriu pistas de um desertor aqui, em South Hooksett, como?

 

Ele estreitou seus olhos levemente e então prosseguiu mais uma vez.

 

- Dois jovens desapareceram a cerca de seis meses nesses arredores. Considerando o que já houve...

 

- Você quer dizer os dois jovens que me atacaram na floresta naquela noite? – interrompi-o, incrédula. – Eles eram...

 

- Não. – dessa vez ele interrompera-me – Aquelas criaturas que atacaram você não eram Mediadores, na verdade, o poder de um Mediador não chega nem mesmo perto do que você viu.

 

- Então o que eram?

 

Aidan hesitou por alguns segundos, mas decidiu por me contar a verdade.

 

- Escravos das sombras.

 

As palavras não fizeram sentido algum para mim, então ele tratou de se explicar novamente.

 

- Antigamente, os Mediadores encontravam um modo um pouco peculiar de travar suas batalhas, não acho que seja correto, mas quem sou eu para questionar?

 

- Que modo?

 

Sua voz soou um pouco descrente, e eu notei a repulsa no modo como ele falou.

 

- Eles escolhiam alguns humanos, extraíam suas almas por meio de um ritual, e depois transformavam seus corpos em recipientes para espíritos. Eles os chamavam de escravos das sombras, e eles realmente mostravam-se muito eficientes quando se tratava de carnificina, porém eram muito instáveis, sedentos por caos e destruição, então meu mentor proibiu o ritual, pois constatou que eles colocavam a nós mesmos em grave perigo.

 

- Então, aquelas coisas eram...

 

- Sim. – ele assentiu friamente.

 

- Mas você disse que considerando o que já houve por aqui... – murmurei, recordando-me do que ele tinha tentado me explicar antes que eu o interrompesse.

 

Aidan refletiu por alguns segundos e por fim falou.

 

- Após a segunda guerra, um fato despertou as suspeitas de meu mentor.

 

- Que fato?

 

- O massacre de toda uma família, no ano de 1949.

 

- Os Hamilton. – conjeturei.

 

- Exatamente. Um pai que alveja a própria família e depois tira a própria vida, isso cheirava a interferência de um Mediador, a manipulação mental de um Mediador.

 

- Mas, por que eles fariam isso?

 

- Por uma simples razão, poder.

 

- Poder? – repeti, descrente.

 

- Sim.

 

- Mas como a morte trágica de uma família pode conceder poder a um de vocês?

 

- É simples, uma alma que deixa o seu recipiente de forma violenta e cruel, é atormentada por toda a eternidade, ela não consegue cruzar a fronteira para o plano espiritual e permanece aprisionada por toda a eternidade no plano físico.

 

Ele olhou-me por alguns segundos e depois tornou a falar.

 

- Eu lhe disse que os espíritos eram formas de energia canalizadas e conscientes, e é essa energia que alimenta nossos poderes, fortalece-nos.

 

- É por isso que eu nunca te vejo no refeitório? – conclui, repensando nos reais motivos de sua ausência por lá.

 

- Eu não preciso de alimentos sólidos como você.

 

Ri de leve e sua expressão tornou-se confusa.

 

- Desculpe, não consegui evitar.

 

Aidan permaneceu em silêncio por alguns segundos novamente, seus olhos vagaram pelo cômodo escuro e por fim ele falou.

 

- Está ficando tarde, você devia tentar descansar um pouco.

 

- Não estou cansada.

 

Ele arqueou uma sobrancelha, e imediatamente meu corpo traiu-me, eu bocejei.

 

- Durma, Agatha, e de manhã eu a levarei de volta a cidade.

 

- Mas e quanto e você? – perguntei-lhe, a preocupação vincando minha testa.

 

- Ficarei bem, preocupe-se apenas com si mesma.

 

Aidan levantou-se do chão, dando as costas para mim e sua voz soou uma última vez naquela ambiente.

 

- Estarei vigiando os seus sonhos, não se preocupe.

 

Vagarosamente deitei-me no colchão, virando-me para o lado oposto de onde ele se encontrava.

 

Suspirei, tudo o que eu não queria fazer agora era dormir. Havia tanto a perguntar ainda para ele, tanto para se saber, mas meu corpo discordava do que minha mente queria, e eu estava moída pelo cansaço.

 

Fechei meus olhos, ainda tendo a imagem sua em minha mente, e então sabendo que ele seria a sentinela a vigiar atentamente o meu sono profundo, que seria ele a estar ali, olhando-me, eu rumei a escuridão, dormindo um sono sem sonhos, sem pesadelos, pela primeira vez em toda a minha vida.

 

Talvez porque eu sentisse aquele meu vazio esmigalhar-se e desintegrar-se em sua presença arrebatadora.  

 

E eu me sentisse totalmente completa. Porque em sua presença, eu o era, não, não havia dúvida a respeito disso. E aquela parte que me completava estava nele, dentro dele, e apenas nele.

 

 

 

 


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Notas finais do capítulo

ahhhh finalmente esclareci tudo!!
Ufa!!

Mas isso não é nem a metade de toda a história que cerca Sillentya! Mas é só mais pra frente q vcs irão saber!! rsrsrsrs

bom, agora queria esclarecer algumas coisas:

*prestem muita atenção no Ducian, ele é um dos personagens principais da trama!! *e uma pedra no sapato tbm!! opaa!! fechei a boca*

*existe uma lenda por trás do surgimento do primeiro Mediador e ela será contada.

*existe uma trágica e triste história por trás do abandono do irmão do Aidan e ela será contada, mas não agora!!

*a cena do primeiro beijo: eu sei q vcs estão ansiandoo por isso, eu mesma mal to me aguentandu para escrevê-la, mas por enquanto ela não sai!! algumas coisas ainda terão de acontecer antes!! mas fiquem atentos pq quando vcs menos esperarem ela acontece!!

*ainda existem alguns assuntos pendentes a serem esclarecidos, e eles não serão esquecidos!!

*com a trama da primeira parte se desenrolando, minha mente já está trabalhando na trama da segunda parte... e estou um pouco receosa de q ninguém siga(infelizmente eu já tive experiencia com isso) e Sillentya é uma fic gigantesca!! por issu eu a dividi em cinco partes!! e bom eu queria saber se todos seguirão a saga toda, afinal a conclusão é só no último mesmo!! kkkkkkk'

mas, enfim!! preciso da opnião de todos vocês!!

Até a próxima


Beijoss