Era tempo de voltar à realidade e deixar que os sonhos repousassem naquele chalé a beira-mar até que chegasse a hora de despertá-los.

Na madrugada do dia 26 de dezembro voltamos para a nossa casa em Konoha. As ruas silenciosas denunciaram a nossa chegada, mas nenhum vizinho veio até a janela nos espionar; estava muito frio e as pessoas gostavam demais do conforto de suas camas para levantarem.

Cansada eu subi enquanto o Naruto guardava a moto na garagem. O meu quarto estava praticamente igual ao que eu havia deixado, o casaco de lã azul marinho sobre a cadeira não havia sido movido do lugar, entretanto a colcha da cama estava remexida, como se alguém houvesse se deitado sobre ela. Perguntei-me se Naruto também havia ido buscar o meu perfume nos dias em que estive ausente da mesma maneira que eu muitas vezes fora buscar seu perfume em sua cama.

Tirei meu casaco e joguei sobre o outro casacona cadeira, rapidamente vesti meu pijama de moleton cinza e fui para baixo dos cobertores. Esperei ansiosa a vinda de Naruto para se deitar comigo. Não tardou mais que quinze minutos para que ele viesse já vestindo seu pijama laranja e se deitasse comigo, nessa hora eu fingi que estava dormindo e tomando cuidado para não me acordar, ele se deitou ao meu lado. Procurando fazer poucos movimentos, ele se virou de lado ficando de frente para mim, ao sentir que os movimentos dele haviam parado, eu abri meus olhos e o beijei na lateral dos lábios.

- Hey, Sakura! – ele se assustou – Você está acordada.

- Não achou que eu dormir sem você? – eu abracei seu tronco.

Levantei meu corpo e comecei a beijar o pescoço dele até a parte que ia para dentro da camisa. Ele ria como uma criança que sentia cócegas.

- Para Sakura!

Parei de beijá-lo, sentei-me em suas coxas e o encarei de maneira séria.

- Tem uma coisa que eu queria te perguntar - achei que seria mais fácil falar sobre o assunto se eu não estivesse olhando nos olhos dele, a penumbra do quarto seria minha aliada - Você recebeu alguma noticia sobre o alistamento?

Ele ficou em silêncio por um tempo antes de responder.

- Não. Eles ainda não me chamaram.

- Mas o exército vai te chamar, não é?

- Um dia, sim – senti pelo tom da voz dele que ele estava meio contrariado em me responder.

Novamente o silêncio ficou entre nós.

- Eu vou com você.

- O que está dizendo, Sakura?! – ele sentou-se na cama.

- Naruto, eu vou com você. Eu sou médica, bom, quase médica... Eu posso me alistar também.

As mãos dele seguraram em meus braços e me puxaram para mais perto de seu corpo.

- Em dois anos eu estarei de volta, e nós vamos nos mudar para um lugar em que as pessoas aceitem o nosso amor...

Eu coloquei minhas mãos espalmadas em seu peito e comecei a beijá-lo na boca.

- Eu quero ficar com você agora... – sussurrei enquanto o beijava ardentemente.

As mãos dele escorregaram por meus braços e aos poucos ele cedia ao meu pedido.

Repentinamente, ele interrompeu meu beijo jogando o corpo para trás.

- Você ainda está machucada, Sakura. Faremos isso depois.

- OK – eu concordei com ele.

Voltamos a nos deitar. Posicionei minha cabeça sobre seu peito, ele colocou seu braço por debaixo do meu corpo e apoiou suas mãos em minhas costas.

Sem que eu quisesse, as lágrimas começaram a cair de meus olhos.

- Eu não quero te perder, Naruto – eu disse baixinho - Você é tudo o que eu tenho.

- Sakura, eu não vou te deixar sozinha.

Adormeci em seus braços em meio ao meu pranto. Meu único alento era a esperança de que ele cumpriria a promessa de nunca me deixar sozinha.

Pela manhã, depois do café da manhã, Naruto seguiu para o ginásio de Konoha para o treino; eu pedi que ele não brigasse com o Sasuke e não caísse em qualquer provocação dele. Eu disse que iria até o hospital realizar alguns exames e aproveitaria para visitar a todos, e assim o fiz.

Na volta para casa parei no píer e fiquei olhando o movimento marítimo.

Ino me encontrou lá quase chorando.

- Sakura, o que aconteceu? – ela perguntou enquanto se sentava ao meu lado num banco de cimento que havia de frente para o mar.

Eu acabei contando a razão de minha tristeza maior.

- O Naruto disse que vai para a guerra.

- O seu irmão se alistou no exercito?! Estou impressionada.

Eu ainda não havia contado isso a ela, e pelo visto tampouco Shikamaru o havia feito.

- Ino, eu não quero perdê-lo.

- Ele é a sua única família... Mas se ele se alistou não há como voltar atrás.

Eu abaixei minha cabeça e comecei a olhar o chão.

- Eu sei.

Ino manteve seu olhar fixo nas pessoas que caminhavam tranquilamente pelo píer.

- A Hinata vai ficar arrasada quando souber que o grande amor da vida dela está indo para guerra.

Ergui a cabeça e olhei para Ino que seguia olhando as pessoas sem notar meus olhos arregalados de surpresa. Ela continuou falando.

- O Naruto deve amar mesmo aquela sonsa da Hinata. Eles já estão juntos desde o colégio.

Por que o Naruto nunca terminou com a Hinata? De repente essa pergunta veio a minha mente e me entristeceu o fato de eu não saber a resposta.

- Ino, você se lembra do que me dizia sobre se envolver com um homem casado?

- Sim – ela virou-se para mim e vi que ela achou graça eu ter tocado no assunto – Eu te disse que se um dia você se envolvesse com um homem casado terminaria chorando pedindo para ele se separar da esposa. Os homens casados sempre mentem sobre seus sentimentos...

- Eles dizem que te amam, mas nunca abandonam as esposas - eu continuei.

- É isso mesmo. Mas por que está falando sobre homens casados? Tá apaixonada por um homem comprometido?

Enchi meus pulmões de ar e contei a Ino a verdade.

- Eu gosto do Naruto.

Ela sorriu e olhou para mim com ternura.

- Claro que gosta. Afinal ele é seu irmão. Meio irmão – ela se corrigiu rapidamente.

Elevei meu tom de voz.

- O Naruto não é meu irmão!

Ino ficou sem reação. Aquela era a notícia mais chocante que ela escutara em anos.

- Ele sabe disso? – foi tudo o que ela conseguiu me perguntar depois de um tempo.

- Sim. Eu contei ao Naruto toda a verdade. Uma verdade que agora pode salvar a vida dele!

- Está falando do alistamento dele?

- Incesto ou a falsa paternidade do Naruto, qualquer um dos dois destruiria o sonho dele de ir para a guerra e o levaria para a cadeia.

- Então o que o Sasuke disse era verdade. Você e o Naruto dormiram juntos! - a Ino estava confusa e espantada com o que eu lhe revelara - Sakura, o que você fez?

- Eu amo o Naruto, e ele me ama. E isso não é pecado! Desde o colégio estamos juntos, mas sempre escondemos a nossa relação para não sermos acusados de incesto. Mas nunca existará incesto entre nós, porque antes de meu pai morrer, ele me contou que o Naruto foi adotado.  O Naruto não é americano! O alistamento no exército não é válido!

- Como você foi se apaixonar pelo seu irmão, Sakura? E quanto ao Sasuke?

- Depois que o Sasuke foi embora, eu não quis perder o Naruto também. Eu achei que apenas o amor nos manteria juntos, já que não éramos irmãos.

Ino se pôs em pé.

- Com foi pensar numa idiotice dessas? – ela gritou comigo.

- Você disse que o amor era o laço mais forte que unia duas pessoas! – eu rebati de pronto.

- E o Sasuke? E a Hinata? Quem são eles nessa história?

Eu me levantei também.

- Coadjuvantes.

- Coadjuvantes?! Por um acaso o seu relacionamento com seu irmão, digo, com o Naruto é algum tipo de filme?

Ino ficou brava por pensar que eu estava negligenciando a seriedade da situação em que eu me encontrava.

- O que quer que eu diga, Ino? Que eu não amo mais o Sasuke? Que eu não sei o porquê o Naruto continua com a Hinata? Que durante anos eu me abstive do meu amor pelo Naruto para que ele jamais descobrisse a verdade sobre a adoção? Que eu sacrifiquei os meus sentimentos e os dele em nome desse segredo? Que eu pedi para ele jamais contar que não éramos irmãos? Ou... Quer que eu diga que eu amo tanto o Naruto que enlouqueceria se eu o perdesse?

- Eu quero apenas que me diga que hoje é primeiro de Abril e que você inventou tudo isso só para me deixar com cara de boba.

Eu sorri sem jeito.

- Não negarei mais a minha história com o Naruto!

- Mas a escondeu por todos esses anos.

Por mais que admitir tal coisa me doesse, Ino estava certa. Eu não negaria o que eu sentia pelo Naruto, porém havia ocultado a verdade por muitos anos. Qual era a diferença prática entre negar e ocultar um fato?

- O que eu faço Ino?

- Você tem que contar a verdade a todos.

Para a fofoqueira oficial de Konoha nada é segredo.

- Sakura, eu vou fazer por você algo que nunca fiz por ninguém... – ela fez uma pausa e colocou as mãos na cintura – Eu vou manter essa história que você me contou em segredo. Até que você decida contar.

Eu sorri.

- Obrigada.

- Entenda isso como um tempo para você poder contar a verdade. Não dá para ficar adiando isso, porque você só vai continuar sofrendo.

- Eu sei. Eu vou contar a verdade.

Minha amiga estava certa, havia chegado o tempo de contar a todos a quem eu amava antes que fosse tarde demais. E se eu tinha que fazer isso, então eu começaria pela parte mais difícil.