Sakura acordou se sentindo muito bem. Era a segunda vez que acordava se sentindo daquele jeito. Sentiu três dedos acariciarem seu rosto, como no dia anterior, e sorriu de leve. Não queria deixar de ter aquela sensação tão gostosa, e quando sentiu que aqueles dedos abandonariam seu rosto, segurou a mão a qual eles pertenciam.

-Te acordei? - ouviu a voz que tanto amava lhe perguntar num tom de preocupação.

Sakura abriu os olhos e fitou Shaoran olhando-a com um pouco de culpa no olhar.

-Não, já estava acordando - disse enquanto se sentava ao lado de Shaoran e apoiava a cabeça no ombro dele, que por sua vez começou a mexer no cabelo dela - hã? Não estava com a tipóia quando dormi? - perguntou ao olhar para o braço enfaixado, ele estava um pouco dolorido pela ação da cicatrização.

-Eu o tirei quando fui dormir - disse Shaoran pegando a tipóia que deixara na mesinha ao lado do sofá - está aqui.

-Pode me ajudar a colocá-la? - perguntou Sakura.

-Claro.

Shaoran ajudou Sakura a colocar a tipóia. Quando o braço já estava devidamente protegido pela tipóia, Shaoran abraçou Sakura por trás. Sakura fechou os olhos apreciando aquele momento tão romântico e perfeito. Sentiu um frio subir pelo seu estômago ao sentir a respiração quente de seu namorado tocar-lhe o pescoço. Ficaram assim por um bom tempo. Estavam tão envolvidos que nem perceberam a chegada de outra pessoa.

-Ah, que gracinha esses dois pombinhos, não acha Yuki?

Shaoran desfez o abraço de imediato. Os dois olharam para a escada, ao pé dela estavam Touya e Yukito, sendo que o primeiro ria da cara dos dois que estavam vermelhos como tomates.

-Touya, você estragou o momento dos dois - ralhou Yukito com um semblante risonho.

Sakura se levantou do sofá, e seus movimentos foram atentamente avaliados pelos três rapazes presentes.

-Gente, calma! Estou bem, o joelho não dói mais, só está um pouco dolorido.

-Mas o seu joelho está tão roxo que chega a ficar preto - disse Shaoran apontando para a mancha no joelho da garota.

-Claro, a pancada foi feia.

-O que vai fazer hoje, Sakura? - perguntou Yukito.

-Eu e o Shaoran vamos visitar o vovô - disse Sakura se dirigindo a escada - Vamos nos arrumar Shaoran.

Shaoran bufou antes de seguir Sakura. Antes que colocasse o pé no primeiro degrau da escada, Touya sorriu pra ele e, usando um tom para provocar, disse:

-Boa sorte com o vovô, moleque, vai precisar.

Shaoran amarrou a cara e foi se arrumar. No caminho ele se encontrou com o Sr. Kinomoto, deu bom-dia e continuou seu caminho até o seu quarto. Cinco minutos depois ele estava na mesa do café da manhã, saboreando a comida, Sakura ainda não descera para comer. Ele usava uma camisa pólo verde com listras marrons horizontais que iam dos ombros até um pouco abaixo do peitoral, e uma calça marrom um pouco larga com um tênis branco. Sakura desceu quinze minutos depois, ela usava uma blusa rosa com alcinhas e detalhes brancos, com uma saia branca rodada e sandálias rosa. A primeira coisa que Shaoran pensou ao olhá-la foi:

-"Ela está linda! Quero casar com ela... Shaoran! Curta o namoro primeiro!"

-Você está muito bonita, minha filha. Vai visitar o vovô? - perguntou Fujitaka quando a filha sentou-se á mesa.

-Sim, pai - respondeu Sakura. Shaoran bufou novamente, e olhou aborrecido pro lado.

Sakura demorou meia hora para tomar o café da manhã, encontrara uma certa dificuldade em comer sem usar a mão esquerda. Após avisar que voltariam ao entardecer, os dois tomaram o caminho para a mansão do tal "vovô" de Sakura. Apesar de não gostar da idéia de visitar aquele senhor, Shaoran não deixou de apreciar o pequeno passeio com a namorada. Pegou na mão dela, a abraçou, a beijou, e até comprou uma rosa de uma menina para dar a Sakura. Mas sua diversão não durou muito, em uma hora já estavam enfrente a mansão. Sakura se adiantou até a porta e apertou a campainha. Em vinte minutos a porta foi aberta e um rosto ancião e simpático foi revelado. Ele esboçou um grande sorriso ao fitar Sakura.

-Mocinha! A quanto tempo? Você cresceu, ficou mais bonita, mas o que houve com o seu braço? - comentou o senhor.

-Ah, vovô, não se preocupe, foi só um acidente. Você parece ótimo - disse Sakura.

Foi quando o senhor reparou em Shaoran, e com uma cara não tão boa quanto antes, perguntou:

-Quem é esse seu amigo, Sakura?

-Ah, esse é o Shaoran Li - Sakura apresentou com um grande sorriso, e corou ao completar - Ele é o meu namorado.

-Namorado, é? - perguntou o senhor analisando Shaoran de cima a baixo - Meu nome é Masaki Amamiya, prazer.

-Prazer, senhor - respondeu Shaoran se curvando polidamente.

Masaki encarou Shaoran por um momento.

-Então... querem tomar um chá?

-Claro - respondeu Sakura.

-Vamos, entrem, a sala fica por aqui.

Ao entrar, Shaoran sentiu um cheiro muito familiar no ar. Mas não expôs suas suspeitas e continuou a seguir ao Sr. Amamiya. Ele os levou até uma salinha com uma mesa de chá, onde já estavam três xícaras postas na mesa, um bule com chá quente, e biscoitos e bolinhos para acompanhar. A mesa estava posta de uma maneira muito familiar aos olhos de Shaoran.

Sakura conversou muito com o Sr. Amamiya, ao contrário de Shaoran que permaneceu em silêncio o tempo todo, como costuma fazer quando há algo o incomodando. Sakura não demorou a perceber que o namorado estava mais calado que o normal, e decidiu perguntar.

-Shaoran, você está bem?

-Hã? - perguntou Shaoran.

-Perguntei se você está bem - repetiu Sakura.

-Estou, estou sim.

-Verdade? - desconfiou Sakura.

-Verdade, estou bem - respondeu Shaoran com um sorriso.

Sakura continuou desconfiada, mas voltou a conversar normalmente com o Sr. Amamiya.

-Sakura, eu gostaria que você experimentasse um vestido da minha neta, mas acho que com esse braço vai ficar difícil - disse o Sr. Amamiya quando eles terminaram com o chá.

-É... já foi um sacrifício colocar essa blusa, mas o vestido da sua neta... ele vai caber em mim?

-Claro, vou te mostrar - disse enquanto se levantava.

O Sr. Amamiya guiou os dois jovens até um quarto, foi até um baú de onde tirou um vestido lindo de saia bufante e cheio de babados e enfeites de cravos silvestres.

-Nossa! É lindo, vovô! - exclamou Sakura se aproximando do vestido - Não é lindo, Shaoran?

Shaoran que analisava o desenho de um arco-íris pendurado na parede do quarto, olhou para Sakura e depois para o vestido. Lembrou de ter visto alguns vestidos parecidos nas mãos de Sakura, na realidade ele até a viu usá-los algumas vezes.

-É... é lindo sim - disse sem esboçar um sorriso, e depois voltou sua atenção para o quadro.

- Sorrir de vez em quando não vai te fazer mal - Sakura resmungou para si mesma enquanto voltava a sua atenção para Masaki.

-Senhor Amamiya, esse desenho, quem fez? - perguntou Shaoran com um certo interesse.

-Foi a minha neta, meu jovem - respondeu Masaki, sendo formal.

-Vovô? - Masaki olhou para Sakura - Se me permite saber, com que idade a sua neta morreu?

Masaki ficou em silêncio por um tempo, Shaoran ficou atento á espera da resposta, e Sakura já começara a se arrepender por ter feito tal pergunta quando ele disse:

-Minha neta tinha vinte e sete anos, quando morreu... mas a última vez que eu a vi, ela tinha dezesseis anos, quando se casou.

-Hã? Ela se casou aos dezesseis? - perguntou Sakura.

-Sim... eu fui contra o casamento dela, e quando ela se casou eu deixei de falar com ela... foi um grande erro essa minha decisão... me arrependo profundamente por não ter engolido o meu orgulho e admitir que o homem que ela escolheu, era um bom homem... só espero que ela me perdoe por eu ter sido um cabeça-dura...

Sakura se aproximou de Masaki, e delicadamente pôs uma mão no ombro do senhor. Esboçou um lindo e delicado sorriso e disse:

-Tenho certeza que ela te perdoou... eu sei que ela sabe que o senhor queria o melhor para ela...

Uma brisa suave soprou e algumas pétalas de cravos silvestres entraram pela sacada do quarto, e começaram a rodopiar pelo quarto numa dança com o vento. Bagunçou os cabelos de Shaoran, e acariciou a face de Sakura, para depois secar as lágrimas de Masaki que se formaram suaves em seus olhos. Sakura sentiu uma presença muito conhecida perto de si, sabia que não era Shaoran. Mas sabia de quem era, sorriu, embora estivesse confusa.

Depois Masaki e Sakura continuaram conversando até que a garota se sentiu com muito sono e dormiu na cama do quarto, onde estivera sentada conversando com o senhor. Este admirou Sakura por um tempo com um grande carinho nos olhos. Levantou-se e deu de cara com Shaoran o olhando de forma inexpressiva. De algum modo, o olhar penetrante daquele rapaz lhe rendeu um pequeno calafrio, parecia que ele sabia de alguma coisa. Decidiu perguntar.

-Precisa de alguma coisa, meu jovem?

-Quando vai contar a ela que é o seu bisavô? - perguntou Shaoran sem alterar sua expressão.

-Como?!

-E, Sra. Daidouji, pode sair daí de trás, a Sakura está dormindo agora.

Ouviu-se então, alguns passos e Sonomi Daidouji apareceu pela porta do quarto. Ela olhava Shaoran com muita indignação.

-Como sabia que eu estava aqui, troço? - perguntou muito irritada.

-A primeira coisa que eu reparei quando entrei nessa casa foi no perfume. Percebi que ele era muito conhecido por mim, e que não era natural da casa, que possuía um perfume muito mais forte e diferente. Ele pertencia mais á casa da senhora. E imaginei que fosse uma visitante, já que o perfume era feminino, e como ele sempre a acompanha... imaginei que fosse a senhora.

-Então você sabe farejar? - perguntou Sonomi com uma expressão frustrada.

-Meu nome significa pequeno lobo, fiz jus á ele - falou Shaoran, com uma sombra de seu sorriso convencido. Fazendo Sonomi ficar mais irritada.

Masaki não expressava, mas ficava cada vez mais impressionado com o rapaz.

-Mas só tive certeza que era a senhora quando vi as xícaras, o bule e os doces arrumados da mesma forma que a senhora costuma arrumar em sua casa. Sem falar que ouvi os seus passos nos seguindo até o quarto.

-E como você descobriu sobre eu ser o bisavô de Sakura, meu jovem? - perguntou Masaki, querendo conhecer mais sobre Shaoran.

-Ah, esse é bem interessante - exclamou Shaoran com um meio sorriso - Primeiro foi o seu sobrenome que pelo o que Sakura um dia me disse, era o mesmo sobrenome de solteira de Nadeshiko Kinomoto, sua mãe. Depois o senhor mostrou o vestido, ele é bem parecido com outros vestidos que o bisavô da Sakura mandava para ela nos aniversários, natais, e nos White Day. Depois eu vi o desenho e reparei que a autora se chamava Nadeshiko Amamiya, até ali já não tinha mais dúvidas, mas mesmo assim eu decidi confirmar ouvindo a história de sua neta. Então eu pensei: É... ele é o bisavô de Sakura.

Masaki analisou o rapaz a sua frente por um tempo, ficara impressionado com as habilidades daquele jovem. Sonomi por sua vez continuou irritada com Shaoran, e o olhava com muita frustração.

-Você é um rapaz impressionante - disse Masaki por fim - gostaria de conversar um pouco mais, meu jovem?

-Não dá senhor, já está entardecendo e eu prometi voltar com Sakura nesse horário - disse Shaoran se aproximando de Sakura. O rapaz se curvou o suficiente para falar próximo ao ouvido da garota - Sakura... Sakura acorda...

Mas ela só fez resmungar e rolar na cama, ficando de bruços.

-Ela tem o sono pesado da Nadeshiko - comentou Sonomi com um sorriso acompanhado por Masaki.

-É, me contaram - disse Shaoran que ficou pensando em como acordá-la, até que se lembrou de algo. Esboçou um sorriso malandro. Ele se sentou na cama, próximo ao pé de Sakura, o pegou e começou á mexer nos dedos da garota. Demorou um pouco até eles começarem a ouvir risadas - Sakura... acorda, já está entardecendo.

As risadas pararam quando Shaoran largou o pé da garota, e ela se virou lentamente com o seu rosto sonolento. Olhou envolta e se sentou na cama dando um pequeno bocejo. Esfregou um olho e fitou Shaoran a olhando. Esboçou um lindo sorriso sonolento, e olhou para os outros dois presentes. Demorou um pouco para perceber que era Sonomi que estava ao lado de Masaki.

-Ué? Tia? O que faz aqui? - perguntou Sakura sonolenta.

-É... bem, eu... eu...

-Sua tia vai te explicar depois, mas agora precisamos ir, se não seu irmão vai ficar me enchendo a paciência...

-É... tem razão - disse Sakura saindo da cama.

-Eu os acompanho - disse Masaki.

Eles foram até o portão da mansão, e se despediram.

-Tchau, Tia. Tchau, vovô. Nos vemos amanhã, está bem? - disse Sakura enquanto seguia o seu caminho.

-Está bem, querida, se cuida - disse Sonomi.

-Até amanhã, Sakura - disse Masaki.

-Até amanhã - disse Sakura acenando olhando para trás.

Enquanto se distanciavam, Sakura disse:

-Shaoran, dê um tchau.

-Eles não estão se despedindo de mim, estão é se despedindo de você. Eles não gostam de mim.

-Ora, e por que não?

-Porque eu sou seu namorado.

-Ora, e porque você ser meu namorado faz o vovô te detestar? - perguntou Sakura, um pouco confusa. Entendia sua tia, mas o senhor que conhecera, ela não entendia.

-Bom... isso não conto.

-Ah, vai, conta - insistiu Sakura com um biquinho, ficara curiosa.

-Não adianta, Sakura - disse Shaoran.

-Então hoje eu durmo na minha cama, sem você.

-Faça isso, é o certo a fazer - disse Shaoran indiferente.

Sakura continuou emburrada o caminho inteiro. De vez em quando esquecia que não queria conversar com o Shaoran, e puxava conversa, mas se lembrava logo em seguida e ficava quieta. Ela continuou assim com ele durante o resto do dia. Puxava conversa, mas logo lembrava que não queria conversar com ele e se calava.

Mais tarde, era meia-noite e a única pessoa acordada naquela casa era Sakura que só sabia rolar na cama. Cansou por fim. Levantou-se e andou até o quarto ao lado. Olhou envolta, em busca do que procurava. Encostado á parede da direita á porta, estava o beliche onde seu irmão dormia na cama de cima e Yukito na cama de baixo, e encostada á parede da esquerda estava a cama onde seu namorado dormia tranquilamente. Andou até ele, se curvou ligeiramente e disse bem baixinho.

-Shaoran, me de um espacinho aí.

Shaoran á obedeceu inconsciente, se virou para a parede ficando de costas para Sakura. Sakura se deitou ao lado dele. Talvez por instinto, Shaoran virou-se para Sakura e a abraçou de modo que ela ficasse de rosto virado para ele, com a cabeça logo abaixo da dele. A menina aninhou-se aos braços do rapaz, e dormiu tranqüila aspirando ao aroma de banho recém-tomado que Shaoran exalava.

Continua...