Olhos Felinos escrita por Jodivise


Capítulo 45
Capítulo 44 Amores nunca esquecidos


Notas iniciais do capítulo

Na derradeira ponta final da travessia até Alexandria, o Black Pearl enfrentará mais um obstáculo. Será que os nossos piratas sempre conseguirão terminar a sua viagem?



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Capítulo 44: Amores nunca esquecidos

Das cordas gastas de um violino, saía uma melodia triste, que enchia o ambiente do navio solitário. Coberto por nuvens negras, que ameaçavam uma carga de água, e com o casco lambido por ondas cinzentas, o Black Pearl navegava pelo Mar Mediterrâneo. Poderia dizer-se que o pior tinha passado, rumavam em direcção ao Mar Egeu, tendo como objectivo desembarcar dois passageiros acidentais. Depois disso, apenas o derradeiro atravessar até Alexandria, onde ficaria aportado, esperando os seus dois capitães voltarem.

- Raios. – Alicia bufou. – Aquele velho marujo podia tocar qualquer coisa mais alegre.

- Alicia... – Will desviou o olhar do mar revolto, indo-se sentar num dos degraus das escadas de acesso ao convés superior da proa. – O ambiente não está para menos.

- Eu sei. – a morena sorriu, encostando a cabeça no ombro do amado. – Mas é que já tudo é tão triste. É preciso piorar com aquela melodia?

- Tens saudades da tua afilhada, não é?

- A Mary. – Alicia conteve um choro. – Eu amo aquela menina, Will. E agora mais do que nunca, eu sinto o desespero da Lara. Imagina, perder algo que geramos, algo que amamos antes mesmo de ver com os nossos olhos.

Alicia separou-se de Will, passando mão pelo próprio ventre. Embora estivesse grávida de apenas doze semanas, o facto de ser magra, já fazia notar a sua barriga um pouco mais saliente.

- Eu quero que ele tenha os teus olhos. – Alicia fixou o marido.

- Sejam os meus ou os teus, o que é certo é que será muito amado. – Will abraçou a mulher.

- Pior de tudo é que eu nunca pensei que iria sentir tanta falta daquele chato do Sparrow e do próprio Barbossa.

- Por falar nisso, como ela se está a sair? – Will apontou para a figura bonacheirona que saira do convés. – Ela e o Barbossa pareciam tão ligados.

- Grace é a mulher mais forte que já conheci. – Alicia arregalou os olhos. – Dá força a todos, ultrapassa todas as dificuldades com um sorriso na cara e... bem tem de ter muita coragem para aguentar o Barbossa!

Grace levava uma caneca na mão e ao passar pelo velho que tocava o violino em cima de um barril, este lhe fez uma vénia, começando uma leve Santa Lucia. A música napolitana, só viera a ser escrita em 1850, mas aquele velho marujo já a sabia. Tudo porque era uma das canções favoritas de Grace e esta, sendo do futuro, a cantarolava de vez em quando.

- Para você. – Grace passou a caneca ao homem que se encontrava no timão. – Deve estar cansado de passar uma noite inteira nesse leme.

- É o que faço desde que me conheço por gente, senhorita. – Teague deu um gole no rum.

- Pelo amor de Deus, me chame de Grace. Não sou mais uma senhorita há muito tempo. – Grace mandou a sua gargalhada típica.

- Mas continua encantadora como uma senhorita. – Teague elogiou, fazendo as faces rosadas de Grace se tornarem rubras.

- Ora... eu já tenho quem me diga esses elogios. – Grace ripostou, não olhando para Teague. – Ou tinha...

- Algum problema? – Lara apareceu de repente, olhando os dois.

- Nenhum! – Grace exclamou. – E eu vou ver como está o pequeno. Pena que a menina McLean logo nos abandonará. Gosto tanto do Ian.

- Ela não pode vir connosco, Grace. – Lara arqueou a sobrancelha.

A morena ficou vendo a mais velha descer as escadas. Lara era para Grace, a filha que nunca tivera. Consequentemente, Mary era como sua neta. O que valia ainda mais, visto Mary não conhecer seus verdadeiros avós. Com toda a confusão que se fizera nos últimos meses, a presença de Ian acabou por atenuar a dor de Grace. E Alicia andava também com o instinto maternal ao de cima.

Mas para Lara, a presença de Lady McLean e respectivo filho era algo que a estava deixando mais louca do que já estava. Além da preocupação com Mary e Jack, ver uma mãe ali e a sua melhor amiga grávida, a faziam acabar-se no choro em todos os momentos que ficava sozinha.

- James muito gosta de contar as suas aventuras para ela. - a voz de Elizabeth soou desagradável atrás de si.

- Como?

- Olha para eles! – a loira apontou para o tombadilho. Na amurada, Lady McLean e James Norington conversavam alegremente.

- Ah ela é gente fina. – Lara disse. – E ele também foi criado com toda a etiqueta.

- Eu fui criada com toda a etiqueta e não gosto dela.

- Elizabeth, o James sente-se sozinho.

- Ele agora é um pirata como nós! – Elizabeth desesperou-se.

- Mas não deixou de ter coração. – e acrescentou, picando ainda mais a loira. – E claro, quando não é correspondido, mais vale se distrair com...

- O que queres dizer com isso? – Liz apontou o dedo a Lara, mas uma onda de choro invadiu-a. – Eu amo o Thomas.

- Eu sei. – a capitã se emocionou. – Mas o Thomas se foi, Liz. Ele iria querer que continuasses com a tua vida.

- Eu sonhei com ele esta noite. Ele disse exactamente isso. Sabes, com aquele enorme sorriso dele.

- Eu não sou ninguém para te dizer o que fazer. És a Rainha dos Piratas. Um ser que já provou ser indomável. – Lara explicou. – Mas... eu acredito que todos temos almas gémeas. Algumas demoram a ser encontradas, outras surgem do nada. Mas em alguns casos... elas estão mesmo do nosso lado, passando despercebidas, esperando pacientemente até serem notadas.

- Mas o James é só...

- Pensa nisso. – Lara sorriu em resposta, descendo para o tombadilho.

Ao chegar-se até aos dois que conversavam, Lara notou que Olga estava mais à vontade. Mas talvez se deve-se ao facto de esta ainda não perceber o que se encontrava a bordo do navio. "Ou talvez, já nem se lembrasse mais do Darius", pensou. Não, isso era impossível. Ninguém se conseguia esquecer de um homem como Darius. Principalmente com uma relação tão próxima como este tinha-lhe jurado.

- Conversa animada, ein? – Lara sorriu ao se aproximar.

- Não sabia que dentro de uma tripulação de vagabundos e assassinos, existia alguém tão educado e acessível como Mr. Norrington. – Olga sorriu.

- Que é isso? Eu apenas tento fazer a viagem mais suportável. Sei que deve estar angustiada.

- Só pelo simples facto de ter de adiar a minha viagem. – Olga olhou o mar.

- O seu marido decidiu estabelecer algum negócio numa colónia britânica? – Lara perguntou.

- Ah... o quê? – a escocesa não percebera.

- O seu marido. Você me disse que ia para o Novo Mundo. Normalmente, pessoas de condição arriscam-se a ir para as colónias, como um modo de aumentar ainda mais a sua fortuna. – Lara sorriu. – Por isso perguntei se o seu marido estava a pensar estabelecer algum negócio.

- Ah... não. Quer dizer, sim. – Olga enrolou-se. – Na verdade nem eu sei muito bem. Apenas que ele quer urgentemente ir para lá.

- Qual o nome do seu marido? – Norrington perguntou com ar curioso.

- Collins... Peter... Collins. – a morena pode perceber o asco que invadira a escocesa ao pronunciar aquele nome. Estava estampado na sua cara. Olga McLean não era casada coisa nenhuma. – Eu vou descer. Está frio e Ian precisa de comer.

- Ela tem um humor peculiar. – James observou. – Mas é boa rapariga.

- James... a Elizabeth não está gostando dessa sua aproximação com a Olga.

- Acha que ela... – James se colocou direito, olhando Lara. – Não. Eu já tive demasiadas falsas esperanças.

- James... – Lara colocou uma mão no ombro deste. – A esperança é a última que morre.

Os olhos de Lara viram alguém descendo do cesto de gávea. Sem pensar, dirigiu-se a este.

- Você está doido!

- Eu? – Darius olhou a morena, surpreso.

- Nos últimos dias tem passado imenso tempo lá em cima.

- Ora, eu tenho boa visão. – os olhos claros deste lhe sorriram. – Se algum navio aparecer no horizonte, não me escapa.

- A questão não é essa. – Lara seguiu o atlante. – Você passa imenso tempo lá. Não come, não dorme. Darius! – Lara agarrou-o por um braço, fazendo-o virar-se para si. – Está na hora de enfrentar seus medos.

- Não sabe do que fala.

- Sei sim! Darius... eu acho que há algo de muito errado na história da Olga. Ela disse que estava em Sevilha com o marido. Ainda agora lhe perguntei e ela pareceu nem saber quem ele era. E quando o Norrington lhe perguntou o nome, ela disse... Peter Collins.

- Eles sempre casaram? – Darius ficou gelado. Não era o só o facto de Olga ter casado. Peter Collins era um canalha da pior espécie. Nunca conseguiria domar a sua escocesa.

- Não faço ideia. Não a conheço de lado nenhum. – Lara encolheu os ombros.

Quando a mulher de Jack Sparrow se afastou, Darius engoliu em seco. Há dias que se encontrava naquela situação. Fugindo dentro de um navio. Fugindo de alguém que pensara não mais ver em sua vida. Fugindo da mulher que ainda fazia seu coração queimar.

Num ímpeto, desceu até ao interior do navio, seguindo pelo corredor estreito que dava acesso às cabines independentes. Só a vira de longe. Olga era a mesma. Os dois anos que separavam a última vez que a vira, não tinham alterado a imagem que tinha dela. Os meus cabelos ruivos escuros. Os mesmos olhos grandes e negros, tão doces e selvagens ao mesmo tempo. O sorriso que sempre lhe emoldurava o rosto.

Como era linda a sua escocesa. Como fora lindo o que ambos viveram. Se nada tinha mais sentido para Darius no dia em que saiu daquela gruta e se viu num mundo completamente diferente, em Bothwell, na Escócia, fora feliz. Durante dois anos fora verdadeiramente feliz. E agora tudo se tinha transformado num pesadelo.

Um pesadelo que lhe provocava uma dor lancinante a juntar àquela que sentia quando soube que Circe poderia ter morto sua noiva Mayara. Os amores nunca esquecidos de Darius, lhe estavam a corroer a alma. Culpa, por ter traído o que sentia por Mayara. Culpa por ter deixado Olga quando mais precisava de si. Remorsos por tudo. E mais do que isso, a dor da rejeição. De esta não o perdoar, de nunca mais lhe querer olhar na cara.

Os seus passos pararam na porta. Não sabia o que estava ali a fazer. Sua vontade era mista. Entrar e ver Olga. Fugir e desaparecer até que esta abandonasse o navio. Por fim, prevaleceu a última e Darius deu meia volta. Mas os seus passos cessaram quando ouviu a porta se abrir.

- Marujo, você aí! Eu queria... – a voz de sua querida cessou. E Darius soube. Soube que esta o reconhecera mesmo de costas. Soube que não podia mais fugir.

Virando-se lentamente, deu de caras à média luz, com aquela que lhe roubara o coração. Olga jazia estática, os olhos arregalados, as pupilas dilatadas devido à fraca luz. Lentamente, a mão trémula desta apoiou-se na parede, tentando se equilibrar em meio ao balançar do navio.

- Não pode ser... – um murmúrio saíra dos lábios entreabertos da escocesa. No mesmo instante, vendo Darius se aproximar, os seus olhos se encheram de lágrimas. – Este navio está me colocando como doida! Até alucinação eu tenho.

- Não é uma alucinação. – Darius disse, sua voz rouca, denunciando a dificuldade em sair.

Olga ficou séria de novo. Cambaleante, caminhou até Darius. Quando a sua mão tocou o peito deste, sua boca se abriu num desespero só.

- Oh meu Deus. – Olga falou, não contendo a emoção. Suas mãos subiram pelo rosto deste, certificando-se que o homem na sua frente era real. – Céus, Darius! – sem se conter mais, a escocesa se atirou nos braços deste, enterrando a cara e o choro no seu ombro.

Poderiam ter ficado ali por toda a eternidade, mas Darius sabia que aquela tinha sido só a reacção inicial de Olga. Quando esta se tocasse para o que ele se havia tornado, tudo seria diferente.

- Diz-me que não é um sonho. – ouviu esta soluçar contra o seu ombro.

- Olga... – Darius passou a mão pelos cabelos desta. Quando enfim se separaram, este pode reparar no rosto da escocesa. – Você está tão linda.

- Eu? Você não se olha no espelho? – Olga perguntou entre risos e soluços. Até que, como Darius previra, esta se apercebeu do irreal da situação. –O que... que está fazendo aqui?

- Eu...

- É prisioneiro deles? – Olga arregalou os olhos. – Por isso nunca o vi e...

- Olga, eu faço parte da tripulação.

- O quê? – num primeiro instante, a ruiva sorriu. Mas o semblante sério de Darius não lhe deixou margem para dúvidas. – Como pode fazer parte se… eu teria dado pela sua presença! – Olga colocou as mãos na cabeça. – Você distingue-se de todos os arruaceiros deste navio, eu…

- Eu engajei-me na tripulação do Black Pearl há pouco mais de meio ano. – Darius explicou.

- Você me abandonou para se tornar um pirata? – Olga perguntou, não contendo as lágrimas.

- Não. Longe de mim. Eu viajei para as Antilhas. Só depois eu me tornei, mas porque era necessário e…

- Necessário? – Olga limpou as lágrimas e riu. Um riso recheado de raiva. – Darius, você me abandonou! Me deixou sozinha quando eu mais precisava de si.

- Nós não tínhamos outra hipótese que não essa. – Darius lamentou-se. – Em breve seus pais iriam descobrir e…

- DESCOBRIR? – a ruiva brandou. – Minha mãe se apercebeu logo no dia em que eu caí de cama. Sim Darius, mal você se foi eu me senti um autêntico cadáver. Passava os dias na cama, chorando, torcendo os lençóis com tanta raiva que acabava por me magoar. Sempre… sempre esperando da janela que você voltasse para trás.

- Eu sinto muito. – Darius baixou o olhar e se afastou.

- Sente nada. Se sentisse não me tinha deixado só. – Olga disse entre o choro. No momento seguinte, uma voz de criança foi ouvida. Ian chamava pela mãe de dentro do quarto.

Olga não hesitou, correndo para a criança, não notando que Darius lhe seguira os passos.

- Pronto meu filho. – Olga pegou em Ian ao colo, tentando o acalmar. – Logo, logo estaremos em terra. Fora desse balanço enjoativo e ambiente inóspito. – Olga tentava não transparecer o seu nervosismo, embalando Ian.

- Seu filho? – a voz de Darius soou atrás de si e Olga fechou os olhos.

Darius havia se tornado um pirata. Mesmo sabendo que ele era o homem mais honesto que conhecera, como o podia tomar como garantido depois de tudo? Darius a abandonara depois de se amarem durante dois anos, às escondidas da sua família. Fugira na calada da noite e a deixara sozinha. E tudo isso para ir atrás do Novo Mundo. E este nunca lhe explicara o porquê.

Finalmente percebera. Darius talvez quisesse enriquecer. E depois de a aventura dar para o torto, tornara-se pirata. Ela não merecia semelhante. O seu filho não merecia um legado desses.

- É. – a resposta da escocesa saíra seca.

Darius pode distinguir as feições do pequeno ser, à luz das velas. O cabelo castanho claro emoldurava o rosto miúdo e perfeito. Darius pode sentir algo se contrair dentro de si. Era como se o seu coração tivesse disparado ao olhar para a criança. Ian, assim se chamava, era claramente filho de Olga. Os seus olhos escuros não deixavam margem para dúvidas.

Mas como Peter Collins criara algo tão perfeito e lindo? O seu último encontro com ele, mostrara-lhe o crápula que este era. Um homem da alta sociedade, formado, mas sem escrúpulos nenhuns. Um homem que só lhe interessava casar com Olga para lhe ficar com a fortuna.

- É lindo. – Darius falou num fio de voz.

- Então, diga à sua capitã que temos de sair daqui o mais rápido possível.

- Porque casou com ele?

- Como?

- Com o Peter. Você o odiava.

Olga ficou um tempo calada, virando-se para Darius. – Quando descemos até ao inferno fazemos tudo para voltarmos à superfície. – Olga calou-se, sustendo um soluço. Um balançar mais forte indicou que o mau tempo se agudizara. – Por favor, me deixa descansar.

- Olga…

- Sai Darius! – Olga virou costas novamente, colocando Ian em cima da cama. – E me trate por Lady McLean.

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No convés…

- Capitão… eu acho que o tempo está a ficar bravo. – Gibbs acercou-se de Teague, que calmamente rodava o leme.

- Mestre Gibbs, quantos olhos tenho?

- Dois, meu capitão. E dizem algumas línguas que vê tão bem como uma águia!

- Pois bem, se contra factos não há argumentos… - Teague fez uma leve pausa. – Eu não sou cego e vejo muito bem. É claro que se aproxima uma tempestade.

- Não seria melhor procurar um abrigo? – Will berrou conforme o vento aumentava de intensidade.

- Estamos no meio do mar. A costa está bastante longe. E eu nunca fugi de nada, muito menos de uma tempestade. - Teague continuou a olhar em frente, ignorando o que Will ou Gibbs lhe pudessem dizer.

- Ele consegue ser mais louco que o Jack e o Barbossa juntos. – Will resmungou.

- Na verdade, todos eles têm uma quota-parte de loucura. – Gibbs coçou a cabeça. – E nenhum é de fugir. Salvo o Jack. Esse sempre arranja maneira de escapulir-se.

- Das responsabilidades… - o capitão amaldiçoado acrescentou.

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- Seu sogro é louco! – Norrington exclamou para uma Lara absorta no mapa de Sao Feng. – Não seria melhor colocar o navio à capa e deixar que a tempestade abrandasse?

- Só vai fazer com que nunca mais a viagem acabe. E eu já vi coisas piores. - Lara respondeu, não tirando os olhos do mapa. Algo em si lhe dizia que havia algo de errado com toda aquela história. Mesmo com Calypso dizendo que estavam bem, Lara sentia no seu coração de mãe, que Mary estava em sério perigo.

- Lara… Capitã… - Norrington emendou. - O Pearl está metendo água desde a última adversidade.

- É o melhor navio dos sete mares. – os olhos castanhos da morena se fixaram no ex-comodoro.

- Mas está ultrapassado. - James acrescentou. - Me desculpe a franqueza, mas de nada valerá corrermos atrás de seu marido, se naufragarmos. Esse Teague é ainda mais louco do que o filho.

- Louco ou não, ele é um dos homens mais experientes. – Lara levantou-se, enrolando o mapa e guardando-o numa arca antiga, decorada com motivos persas. - Ele sabe o que faz.

- E quanto à Lady McLean? Vai arriscar a vida do filho dela?

- Comunique-lhe que durante a tempestade, ela ficará no meu quarto, juntamente com a Alicia.

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O vento cortante aliado à chuva grossa que caía, fazia Olga Mclean se arrepender amargamente do dia em que meteu os pés fora de Bothwell. Amaldiçoava o dia em que conhecera Darius e amaldiçoava a maldita herança que a fizera ter de se deslocar até Londres quatro anos antes.

- Aqui ficará melhor. – Alicia ajeitou uma almofadas na cama de Jack e Lara. - Eu própria nunca quis dormir no porão. O ambiente é horrível.

- O ambiente é horrível seja no brigue ou no cesto de gávea. Tudo aqui é horrível. – Olga falou secamente.

- Olhe… - Alicia suspirou e olhou a ruiva. – Eu sei que você nunca quis estar aqui, que deve ser ultrajante para uma dama de calibre superior como a senhora… - Alicia disfarçou um sorriso, para raiva da outra. - … ter de conviver com bandidos e assassinos e com gente tão mal educada como nós.

- Nem faz ideia.

- Mas eu também já estive do seu lado. Eu e Lara éramos duas garotas que tínhamos tudo na vida e que de repente nos vimos num cenário surreal. - Alicia explicou enquanto a outra se sentava no leito, enjoada pelo balanço do mar. - Mas nos acostumamos.

- Mas eu nunca me acostumaria. – Olga ergueu um dedo no ar. – Eu sei que logo verei terra nessa maldita Grécia que nunca mais alcançamos, mas nem que eu estivesse a morrer eu escolheria juntar-me a piratas. - Olga parou para respirar. – O que vos fez desistirem de uma vida, para se juntarem ao inferno?

- O amor. – Alicia sorriu e Olga arregalou os olhos. Depois irrompeu num choro compulsivo. – O que foi?

- O amor? – Olga perguntou entre soluços. - É o sentimento mais traiçoeiro que existe. Morte a quem o inventou!

Alicia ficou calada. Algo naquela mulher era muito estranho. Por mais educada que fosse, algo de ruim lhe acontecera. Ninguém era tão amargo assim se não fosse por um grande desgosto. E disso, Alicia teve a certeza quando ao olhar para Ian, uma luz se iluminou na sua cabeça.

- O seu filho… ele é tão parecido com alguém que eu conheço… - a morena não completou a frase quando os olhos negros e marejados da ruiva apenas lhe deram a confirmação do que acabara de descobrir.

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O mar picado, com as ondas cavadas a provocarem verdadeiras armadilhas, faziam o navio balançar como se de uma casca de noz se tratasse. Teague e Lara estavam convictos de que o navio iria passar o tormento que o afectava, mas o céu escuro e as enormes vagas não encorajavam a tripulação.

- Sempre pensei que o Mediterrâneo fosse um mar calmo. – Elizabeth falou o mais alto que pode, encharcada até aos ossos.

- Regra geral, tudo o que parece calmo é o pior dos pesadelos. – James respondeu, ajudando Darius a recolher uma das velas.

- Jack Sparrow só nos mete em confusões! – a loira bufou.

- Ia dizer que simpatizava imenso com o senhor Sparrow. – James olhou Elizabeth de soslaio. Queria tanto poder dizer-lhe o quanto ficava bela com os cabelos molhados.

- CUIDADO! – o berro de Darius ecoou nos seus ouvidos. Viu o grego apontar para um raio que se abatera sobre o mastro principal, destruindo o cesto de gávea. Os pedaços em madeira voaram, precipitando-se para o tombadilho. Ao ver que Elizabeth não se apercebera do perigo, James correu até à loira, empurrando-a no preciso momento em que um dos bocados do antigo posto de vigia se desfazia ao embater no chão.

- Assim não vale. – James disse. Ao olhar para Elizabeth, notou o quanto inusitada a cena lhe parecera. Tinham caído ambos ao chão. Agora, Elizabeth o olhava intensamente, incapaz de dizer o que quer que fosse.

- Não… vale o quê? – Lizzie perguntou num fio de voz.

- Já não basta trabalhar como um cão e ainda tenho de a salvar. – James disse, levando a mão ao rosto molhado desta. – Mas é algo que o farei sem reclamar.

- Melhor se levantarem. – Will acercou-se dos dois, não dando tempo de Elizabeth responder ao ex-comodoro. – O mar está cada vez mais encrespado.

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- Valha-nos Santa Bárbara! – Grace rezou, enquanto fazia companhia a Alicia e Olga.

- Relaxa Grace. O Teague sabe o que faz. – Alicia olhou a mais velha.

- Sinceramente, apesar de achar o Capitão Teague um excelente marinheiro… confio mais no meu Hectorzinho. – Grace choramingou.

- Oh céus, não me faças vomitar. – Alicia levou a mão à boca.

- Eu acho que não me estou a sentir bem. – Olga fez o mesmo gesto, mas no seu caso, a tonalidade da pele não deixava margens para dúvidas.

- Nunca andou de barco? – Alicia ficou preocupada. – Deve estar sofrendo de enjoo de alto mar.

- Eu sou forte. Apenas não estou habituada a passar por solavancos como estes. – a escocesa falou, olhando de soslaio o filho. Incrivelmente, Ian parecia relaxado, brincando em cima da cama com um dos raros brinquedos de Mary. – Por favor, não diga nada a ninguém.

- O quê? – Alicia franziu o sobrolho.

- Sobre o assunto que tivemos, antes… - a escocesa baixou a voz. - … da senhora Grace entrar.

- Eu não digo nada, mas… acho difícil esconder um segredo desses. – Alicia disse. Olga acabara por se abrir com a pirata tão estranha aos seus olhos. Mas incrivelmente, tinha gostado daquela mulher. Alicia era destrambelhada sim, mas simpática e iria ser mãe. E só uma mãe compreendia o sentimento porque Olga passava.

- Ele não pode saber. – Olga engoliu em seco.

- Mas já a viu. Darius é suficientemente inteligente para perceber que…

- Ele nunca irá perceber, pois logo estarei fora deste navio.

Um estrondo fora ouvido, fazendo o navio balançar violentamente. A madame acabou no chão, com o vestido às avessas.

- O que foi isso?

- Não faço ideia, mas não deve ter sido boa coisa. – Alicia disse, correndo para a porta.

- Onde pensa que vai? – Grace repreendeu-a. – Não vai sair lá para fora com este tempo e ainda por cima grávida.

- Ah Grace, deixa-me em… - subitamente, luz se fez na cabeça da morena. – É ISSO!

Um sorriso cheio emoldurou o rosto da jovem ao mesmo tempo que saía porta fora.

- Ela é doida! – a mais velha levou uma mão à testa.

- Já tinha reparado. – Olga disse, se levantando do chão e voltando para a cama.

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- Que estás aqui a fazer? – Lara olhou Alicia subir até ao timão. A tripulação parecia mais agitada que o costume. Algo de grave se passara.

- Acabar com a tempestade. – Alicia disse.

- Mas tu és doida? – Lara perguntou.

- E tu esqueceste que eu tenho o poder da Serena? Já consegui derrotar um Maelstrom, também consigo fazer frente a isso.

- As coisas mudaram Alicia. E tu estás grávida.

- Também o estava da outra vez. – a morena de cabelos lisos não largou a ideia para desespero de Lara. – Confia em mim.

Olhando para o céu enegrecido, atravessado por raios, Alicia fechou os olhos. Tentou abstrair-se de tudo e pensar numa única coisa: que tudo aquilo passasse. Ao princípio não notara de extraordinário, mas quando um desânimo começava já a tomar conta de si, eis que as vozes da tripulação começaram a ficar distantes aos seus ouvidos. Quando o mínimo som deixara de se ouvir, Alicia abriu os olhos.

Sentindo uma força incrível dentro de si, levantou as mãos para o céu, vendo algo luminoso se formar nas palmas. Dois raios de um branco reluzente saíram de si em direcção ao céu, tocando as nuvens concentradas que transformavam o dia em noite.

Aos poucos, como atingidas no seu núcleo, as nuvens começaram a dissipar-se, deixando os raios solares penetrarem, transformando as águas escuras num manto prateado.

- Sério, eu começo a ter medo de ti. – Lara disse, quando Alicia saiu do seu estado catatónico.

- Eu sou a melhor! – Alicia exclamou, mas uma tontura fez esta desabar nos braços de Will. – Eu estou bem. Só um pouco cansada.

- Então, é a melhor a senhorita descansar. – Will pegou Alicia no colo, beijando-lhe a testa. – Se eu não for mais preciso…

- Todos vão ser precisos. – Teague falou, interrompendo a conversa. – Estamos à deriva.

- O quê? – Lara arregalou os olhos numa expressão de horror.

- O leme deve ter quebrado. – Gibbs acrescentou. – Vai ser difícil repará-lo.

- Céus, mas que mais falta acontecer! – Lara exclamou levando as mãos ao cabelo, puxando-o numa fúria cega.

- Lara, acalme-se. – Darius colocou a mão no seu ombro. – Algo se passa no mar.

Os piratas debruçaram-se no parapeito, olhando aquilo que parecia ser uma estrada prateada, por onde o Black Pearl avançava lentamente.

- Só pode ser dedo da Calypso, aquela danada! – Gibbs sorriu.

- Mais respeito. – Teague repreendeu-o, fazendo o mestre se encolher.

- Afinal quando posso ir para a Grécia? – uma voz soou atrás deles. Olga McLean olhava-os estática, com o nariz empinado. Porém, mal os seus olhos bateram em Darius, sentiu um choque passar pelo seu corpo.

- Oh bugger… - Lara olhou a escocesa e Darius.

- Tudo bem, ela já sabe. – Darius falou, cravando os olhos na dama.

Lara sentiu-se esquisita, alternando o olhar entre os dois. Fariam um belo par, só que algo em si se remoía. Sem se controlar, sentiu uma onda de ciúmes apossar-se de si.

- A corrente… afasta-nos do Mar Egeu, senhora. – Teague disse.

- O que quer dizer com isso?

- Que provavelmente, terá de nos acompanhar até Alexandria. – James Norrington esclareceu para horror de Olga.

- Ah não! – esta levou as mãos aos cabelos.

- Porque raio quer ir para a Grécia se o que queria já encontrou aqui? – Lara perguntou secamente, baralhando a escocesa.

- Lara… - Darius tentou explicar, mas a morena afastou-se deste.

- Estou nos meus aposentos. – falou secamente, olhando Olga, com um misto de raiva e tristeza.

Fechando a porta atrás de si, Lara cerrou os punhos. Quando lágrimas brotaram finalmente dos seus olhos, varreu com tudo o que estava em cima da cómoda, num grito de raiva. Olhando no espelho, viu o seu reflexo. No entanto, algo era diferente. Os seus cabelos desgrenhados, estavam apanhados numa trança, decorada com pérolas. As suas vestes masculinas, tinham dado lugar a um vestido branco, leve como o vento.

- O que queres de mim! – Lara berrou, arrancando o espelho da parede e jogando-o no chão. – Eu te odeio. Odeio por seres parte de mim. Odeio por me fazeres sentir algo que eu não quero. Odeio… - esgotada, Lara deixou-se cair no chão. – Odeio por me teres feito trair o homem que eu amo.

Continua…


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Notas finais do capítulo

Oi leitoras e leitores! Finalmente um novo capítulo! Desculpem o atraso, mas como disse anteriormente, eu não tenho tido tempo de actualizar com frequência a Olhos Felinos. Mas já devem ter percebido que a história já está na sua recta final... =/
Um muito obrigada do tamanho do MUNDO, a todos os leitores que comentaram. Sem vocês, esta saga nunca teria chegado onde chegou. =) Um beijo enorme em especial à leitora SARAH, que comentou capítulo a capítulo desde a Força dos Desejos. Muito obrigada, menina! =D
Espero que gostem!!!
Saudações Piratas!!! :D
JODIVISE