Entardecer escrita por mileiide


Capítulo 2
Fácil de Ler


Notas iniciais do capítulo

oooi,comentem please,hehe



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O dia seguinte foi melhor, e pior.


                Foi melhor porque não estava chovendo e também eu já conhecia a escola, Xaveco se sentou do meu lado na aula de português e as pessoas não ficaram olhando muito para mim. No recreio, sentei com Denise, Xaveco e seus amigos. Eu até tentei conversar com eles.


                Agora, foi pior porque eu estava cansada, disse em voz alta uma reposta errada para uma questão de matemática, precisei jogar vôlei e caí. E foi pior porque Cebola Melo não foi á escola.


                Passei uma parte da manhã com medo do recreio, não queria encontrar ele. Eu queria falar com ele e perguntar qual era o seu problema, e imaginei o que diria para ele, mas sabia não teria coragem na hora.


                Quando entrei na cantina com Denise, o procurei por todas as mesas. Seus irmãos adotivos estavam sentados na mesma mesa do dia anterior, mas ele não estava em lugar nenhum.


                Xaveco veio sentar junto de nós e percebi o jeito estranho que Denise olhava para ele. Tentei comer e conversar com eles, mas estava nervosa pensando que ele estaria na aula de laboratório.


                Ele não deu sinal de vida, e fui ficando cada vez mais nervosa com o passar da manhã.


                Fui para a aula de laboratório confiante, e Xaveco foi comigo, conversando. Ele também não estava ali e fui me sentar no meu lugar, Xaveco atrás ainda falando. Quando o professor entrou na sala, ele foi para o lugar dele.


                Repeti para mim mesmo durante a aula que estava feliz por ter a bancada só para mim, e também por Cebola não estar ali. Mas eu não conseguia parar de pensar que ele não estava ali por minha causa. Era ridículo pensar que eu poderia mexer tanto assim com uma pessoa, mas continuei preocupada.


                Quando as aulas acabaram, estava indo para o ponto de ônibus quando ouvi meu celular tocar. Era o meu pai.


                - Oi, pai.


                - Estou passando aí para te pegar. – ele disse.


                - O quê? Não precisa não! – tratei de falar rápido. – Estou indo de ônibus.


                - Sua mãe pediu para fazermos compras. – ele resmungou. – Já estou chegando.

                Suspirei e desliguei quando vi a viatura com as luzinhas vermelhas e azuis entrar no estacionamento da escola. Ele parou perto de mim e abri a porta do banco traseiro rapidamente, me jogando lá dentro e fechando a porta.

                Tentei fingir que não estava vendo todos os estudantes olhar a viatura chamativa do meu pai. Enquanto estava ocupada nisso, vi o resto dos irmãos Melo. Eles estavam vestidos de um jeito espetacular, mas eles eram tão lindos que não importava o que vestissem ainda iriam se dar bem. Mesmo eles sendo bonitos e tendo dinheiro, parecia que não eram aceitos na escola.


                Mas eu não acreditava nisso de verdade. Eu achava que eles se afastavam por conta própria de tudo e de todos.


                Nós finalmente ficamos distantes o suficiente da escola para que eu pudesse respirar, e o Extra não ficava tão longe. Nós saímos do carro e fiquei feliz por entrar em um supermercado. Parecia normal. Eu e o meu pai sempre saíamos para fazer as compras na nossa verdadeira casa, era quase rotina. O lugar era grande e eu não podia ouvir o barulho da chuva lá dentro. Parecia de volta ao Rio de Janeiro.


                Quando chegamos em casa mamãe guardou todos os alimentos e eu á ajudei a preparar um almoço rápido, enquanto papai voltava ao trabalho. Nós almoçamos juntas.


                Levei minha mochila para o meu quarto, tomei banho e comecei a fazer minhas tarefas de casa. Terminei e chequei meus e-mails pela primeira vez desde que tinha chegado ali.


                Haviam mensagens das minhas amigas e as respondi, contando que estava sempre chovendo e que a escola era legal. Também não disse nada para elas sobre Cebola, não achei que ninguém fosse me entender.


                Li um livro que o professor de literatura mandou e, quando dei por mim, havia perdido a hora.


                - Moni? – chamou meu pai da escada.


                - Oi, pai, estou descendo.


                Ele estava sentada assistindo televisão e fui ajudar minha mãe a terminar de fazer o jantar, e ela sorrio para mim. Fiz uma salada enquanto checava o bife no fogo, e mamãe cuidava das batatas.


                Colocarmos a mesa e chamamos papai, que adorou o cheiro enquanto passou.


                - Que cheiro bom, queridas.


                - Obrigada. – agradecemos.


                Comemos e eu escutei enquanto eles falavam de suas vidas na nova cidade, e ri quando contavam de alguma coisa engraçada. Eles falavam muito, minha mãe bem mais que meu pai, mas eu não era daquele jeito. Não consigo me expressar desse jeito, por isso acho que tem algo errado comigo.


                - E então, como foi na escola, Moni? Novos amigos? – minha mãe sorrio para mim e vi que ela tentava me fazer falar.


                - Tudo bem, conheci uma menina chamada Denise. E um garoto, Xaveco, que é muito legal. Todos são legais. – certo, nem todos. Mas não falei isso alto, claro.


                - Ah... Esse garoto, Xaveco, eu conheci os pais dele quando era criança. Lembra, Luísa? Os Silva. – dizia papai, comendo o bife. Mamãe sorrio.


                Meus pais cresceram naquela cidade. Pareciam conhecer o nome de todos os moradores.


                - Conhecem a família do Dr. Melo? – perguntei para eles.


                - Eles são novos na cidade, mas me contaram que o Dr. Melo é um bom homem. – e meu pai respondeu.


                - Os filhos dele... São diferentes. - eu disse, minhas bochechas pegando fofo.


                - Não ouça o que as crianças dizem, Mônica. O Dr. Melo poderia trabalhar em qualquer outro lugar do país, com um salário muito melhor do que ele ganha aqui, e ele está aqui ajudando as pessoas dessa cidade. E aqueles filhos adotivos... Os policiais pensaram que teriam problemas com eles, mas eles são muito calmos, nunca fizeram nada, todos muito maduros. – papai respirou fundo depois do discurso.


                Eu me encolhi.


                - Eles parecem legais, só que não falam com ninguém – eu disse. – E são todos bonitos.


                - Devia conhecer o médico. – papai sorrio. – O conheci hoje, quando demos uma passada no hospital. As enfermeiras nem conseguem trabalhar.


                - Jura?! – falou mamãe, erguendo os olhos do prato e parecendo bastante animadinha.


                - Luísa, Luísa... – resmungou meu pai, fazendo com que minha mãe risse. – Eu estou bem aqui.


                - Estou brincando. – ela prometeu. 


                Lavei meu prato em silêncio e subi as escadas para escutar um pouco de musica no meu iPod e tomar banho, para então dormir. Senti como se estivesse seguindo uma rotina.


                Não choveu naquela noite, e eu pude dormir bem.


                A semana passou calma. Me acostumei com minhas aulas e na sexta-feira podia reconhecer todos os outros poucos 206 rostos da escola. Na educação física, as meninas entenderam que não era muito inteligente me passar a bola na hora do vôlei, e que era suicídio ficar perto de mim caso eu tocasse na bola. Eu ficava parada o jogo todo, feliz da vida.


                Cebola Melo não voltou á escola.


                Eu esperava todos os dias até que seus irmãos entrassem na cantina sem ele, e então podia respirar e prestar atenção na conversa da minha mesa. Durante a semana eles falaram em dar um passei em umas das praias da cidade, eu aceitei por educação, pois sabia que estava muito frio para nadar.


                Na sexta-feira, entrei na minha aula de laboratório com Xaveco, como de costume, sem prestar atenção ao que ele falava. Nem estava preocupada com Cebola Melo estar ali ou não, mas ainda não conseguia parar de pensar que eu havia tirado ele da escola por algum motivo.


                Meu primeiro fim de semana em Osasco foi normal. Papai trabalhou durante todo o sábado, e eu e mamãe limpamos a casa, e fiz minhas tarefas de casa. Escrevi mais e-mails para minhas amigas do Rio de Janeiro mentindo sobre como a cidade era legal, apesar da chuva. No domingo eu e minha mãe fomos finalmente comprar um carro, mas não podíamos comprar algo caro, e levamos a coisa mais barata do lugar. Uma caminhonete vermelha que fazia um barulho enorme. Ainda assim, era melhor que a viatura.


                Choveu franco durante o fim de semana, e eu pude dormir alguma coisa.


                Na segunda-feira algumas pessoas falaram comigo enquanto eu atravessava o pátio, depois da minha ter me deixado na escola. Tínhamos vindo com aquela caminhonete vermelha. Estava frio, mas não chovia. Xaveco sentou ao meu lado na aula de literatura e fizemos uma prova surpresa.


                - Agente se vê no recreio, ok? – falei para ele, entrando na sala de matemática e me sentando ao lado de Denise.


                Na hora do recreio, Xaveco se juntou á mim e a Denise na fila da cantina, e olhei para a mesa dos Melo, só porque era costume. E então gelei. Havia cinco pessoas sentadas na mesa.


                Denise me cutucou.


                - Ei! Moni? O que você vai querer?


                Rolei os olhos para encarar meu tênis, minhas orelhas ardendo. Eu estava com vergonha, mas não sabia o motivo. Afina, não havia feito nada de errado.


                - O que há com a Moni? – Xaveco perguntou para Denise.


                - Nada. – respondi. – Quero só uma coca-cola, por favor. – eu disse, tirando dinheiro do bolso da calça e entregando para mulher resmungona da cantina. Ela me deu uma notinha.


                - Não está com fome? – perguntou Denise.


                - Não estou me sentindo bem. – eu disse, acho que ficando vermelha.


                Eles pegaram os lanches deles e minha coca. Bebi devagar, começando a me sentir mal de verdade. Xaveco me perguntou duas vezes se eu estava melhor, e disse que não era nada. Mas comecei a pensar se não devia fingir e pedir para minha mãe vir me buscar mais cedo.

                Eu olhei para Cebola Melo e percebi que tinha algo de diferente nele. Achei que era a pele dele, parecia menos branca. Mas havia outra coisa. Eu olhei.


                - Moni, o que você está olhando? – perguntou Denise, os olhos dela tentando ver para onde eu olhava.


                Então Cebola Melo se virou e olhou para mim. Virei o rosto morrendo de vergonha, mas não achei que ele estivesse chateado comigo.


                - Cebola Melo está olhando para você. – disse Denise.


                - Ele parece estar com raiva?


                - Não. – ela pareceu confusa. – Ele devia estar?


                - Eu acho que ele não gosta de mim. – suspirei.


                - Os Melo não gostam de ninguém... Eu acho. – falou Denise, e depois rio. – Mas Cebola Melo ainda está olhando para você.


                - Pare de olhar! – disse eu.


                No resto do lanche eu não olhei para ele de novo. Como ele não parecia com raiva, eu iria para a aula de laboratório. Me senti enjoada só em pensar isso.


                Xaveco foi comigo até nossa sala, como sempre, e estava chovendo quando chegamos lá. Fiquei confusa – e feliz – quando vi que minha bancada estava vazia. O professor me entregou um microscópio e eu olhei para ver a chuva forte pela janela.


                Ouvi quando minha cadeira do lado se mexeu, mas continuei olhando para a janela.


                - Oi. – a voz dele era musical.


                Olhei para cima, confusa por que ele estava falando comigo. Ele sentou bem distante de mim, e o cabelo espetado e preto dele estava molhado. O rosto dele era lindo, e ele sorria para mim. Mas alguma coisa estava errada.


                - Meu nome é Cebola Melo. – disse ele. – Não nos apresentamos na semana passada, desculpe. Você deve ser Moni de Sousa.


                Espera. Eu tinha imaginado as coisas da outra aula? Agora ele parecia muito educado. Não estava entendendo nada, e precisava falar alguma coisa.


                - Co-como você sabe meu nome? – falei nervosa.


                Ele sorrio mais.


                - Todos sabem o seu nome.


                - Não. – disse eu. – Por que você me chamou de Moni?


                Ele ficou confuso.

                - Prefere Mônica?


                - Não, gosto de Moni. – falei. – Mas todo mundo aqui pareceu me conhecer por Mônica.


                Achei que eu parecia idiota, então voltei á ver a chuva e ele deixou para lá. O professor nos mandou fazer uma atividade que eu já tinha feito na minha antiga escola, usando um peixe. Eu odiava cheiro de peixe.


                - Primeiro as damas? – sorrio ele, empurrando o microscópio para mim.


                Dei uma olhada no buraco do microscópio e já sabia o que tinha visto ali.


                - Prófase.


                - Posso dar uma olhada? – perguntou ele.


                - Claro.


                A mão dele bateu na minha quando ele foi pegar o microscópio. Era gelado como neve, e eu afastei minha mão por isso. Ele se desculpou.


                - Prófase. – concordou ele após olhar.


                - Foi o que eu disse. – sorri.


                - Anáfase. – ele disse para a próxima.


                - Posso? – perguntei.


                Ele empurrou o microscópio para mim, sorrindo. Eu peguei esperando que ele estivesse errado, para corrigir. Mas ele estava certo, que droga.


                - Anáfase. – disse eu.


                - Foi o que eu disse.


                Nós terminamos mais rápido que os outros viam nos livros e vi Xaveco se confundindo. Olhei para Cebola Melo. E então percebi a coisa que tinha de diferente nele.


                - Você usa lentes de contato? – falei se pensar.


                 Ele pareceu confuso com a pergunta.


                - Não.


                - Pensei ter visto alguma coisa nos seus olhos. – disse.


                Passamos um tempo em silencio e professor dizer que nosso trabalho estava ótimo, e ele acabou descobrindo que eu estava mais avançada do Rio de Janeiro em todas as matérias.


                - Que chato essa chuva, não é? – perguntou Cebola. Me perguntei por que ele ainda estava falando comigo... Parecia que ele havia escutado minha conversa com Denise na hora do lanche e estivesse querendo provar que eu estava doida.


                - É. – falei quase com nojo.


                - Você não gosta do frio. – não me parecia uma pergunta.


                - Nem de chuva.


                - Osasco não deve ser um bom lugar para você. – ele disse.


                - Você não faz idéia. – falei triste.


                Ele pareceu ficar feliz com o que eu disse, na verdade, mais do que feliz. Fiquei confusa e não entendi o motivo disso.


                - Por que você veio pra cá?


                - É... Complicado.


                - Temos tempo. – falou ele.


                Não falei nada e depois cometi o erro de olhar nos olhos dele. Pareciam dourado-escuros ou algo assim. Lembrava que da ultima vez eles eram muito pretos.


                - Meu pai recebeu uma promoção.


                - Isso não parece complicado. – disse ele, simpaticamente. – Quando foi isso?


                - Em setembro... Eu e minha mãe decidimos vir com papai. – minha voz parecia triste, até eu não estava agüentando.


                - Por que você não ficou com sua mãe?


                - Eu amo meu pai. Não podia deixá-lo vir sozinho.


                - Não entendo. – falou ele.


                - Ele iria ficar muito triste se ficasse aqui sozinho, e minha mãe também ficaria triste sem ele. – tentei explicar.


                - Mas agora você está triste. – disse ele.


                - E? – eu ergui as sobrancelhas.


                - Isso não é justo. – ele deu de ombros.


                - A vida não é justa, camarada.


                Virei os olhos para a janela de novo, tentando fazer com que Cebola parasse de perguntar da minha vida.

                - Você está muito mais triste do que parece, não é? – perguntou ele.


                Sorri para ele, por que se não acho que teria dado á linha para ele como uma garotinha de 5 anos de idade.


                - Estou irritando você? – ele disse confuso.


                - Mais ou menos. Eu estou irritada comigo. Minha mãe sempre disse que eu sou muito fácil de ler. – disse irritada.


                - Eu acho você muito de difícil de ler. – disse ele.


                - Você não deve ser um bom leitor, então. – falei sem pensar, e depois senti minhas bochechas ficarem vermelhas.


                - Na verdade, eu acho que sou.


                Quando o sinal tocou, Cebola foi embora o mais rápido que conseguiu. Fui com Xaveco até a educação física, ele ficou reclamando da aula o caminho todo. Ele disse que Cebola Melo parecia mais legal, e eu concordei.


                Quando a aula terminou, não estava mais chovendo, e fui até o estacionamento para esperar minha mãe. Meus dias de ônibus haviam acabado. Ela fazia tanto barulho que percebi que mamãe estava chegando uns 10 segundos antes de chegar de verdade. Entrei na caminhonete do banco de carona e fechei a porta, feliz por que estava quente ali dentro.


                Olhei ao redor e foi aí que percebi uma figura parada e branca. Cebola Melo olhava para mim de uma forma que fiquei com vergonha. Pedi para minha mãe se apressar e quase passamos por cima de um carro que teria virado sucata, mas mamãe freio. Quando passamos por Cebola Melo, fiquei olhando para frente, mas tive quase certeza que ele sorria.


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Notas finais do capítulo

comentem hehe



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