Entardecer escrita por mileiide


Capítulo 3
O Facto


Notas iniciais do capítulo

gentemmmmmm, a história voltou!!! pra quem nao acompanhava, ela ainda ta no começo, dá pra acompanhar!! PFF leiam e COMENTEM!!bjss e obrigada



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Quando abri os olhos de manhã, havia algo diferente.

Era luz. Uma luz pálida de um dia nublado, mas de certa forma estava mais clara. Percebi que não havia neblina na minha janela.

Pulei da cama para olhar para fora e fiquei horrorizada.

As estradas estavam mais ensopadas que o normal, provavelmente deve ter chovido a noite inteira – a água cobria a grama e as árvores, fazendo do ambiente um escorrego mortal. Para mim, já era difícil não cair quando o chão estava seco; agora era mais seguro voltar para a cama.

Papai já havia saído para o trabalho quando desci para tomar café. Engoli uma tigela de Sucrilhos e um pouco de suco de laranja. Estava empolgada para ir para a escola e isso me assustou. Eu sabia que não estava animada por um motivo aceitável. Para ser honesta comigo mesma, eu estava ansiosa porque veria Cebola Melo. E isso era ridículo.

Eu devia evitá-lo depois de ter pago todos aqueles micos ontem. E eu estava desconfiada; por que ele mentiria sobre os olhos? Eu ainda tinha medo da raiva que ás vezes sentia nele, e ainda assim ficava sem fala toda vez que imaginava o rosto perfeito dele. Era muito óbvio que a minha praia e a praia de Cebola eram universos paralelos. Então eu não devia estar ansiosa para vê-lo hoje.

Na escola, quando saí do carro, mal vi minha mãe saindo do estacionamento e já fui escorregando em uma poça de água e me estatelando no chão, espalhando todas as minhas fichas ao meu redor. Estava parada juntando minhas coisas quando ouvi um barulho estranho.

Foi um som agudo e estava se tornando mais próximo. Olhei pra cima, assustada.

Vi várias coisas ao mesmo tempo e muito rápido. Cebola Melo estava parado perto da Secretaria, olhando pra mim apavorado. Seu rosto se destacava no meio de tantos outros rostos, todos com a mesma cara de choque. Mas a característica mais importante da cena era o Celta preto derrapando, os pneus travados com o freio, rodopiando como louco pelo estacionamento e vindo diretamente na minha direção. Eu não tinha tempo nem pra respirar.

Pouco antes do segundo em que eu deveria morrer, alguma coisa me atingiu, mas não da direção que eu esperava. Minha cabeça bateu com força no asfalto gelado e eu senti uma coisa sólida e fria me segurando. Eu estava deitada 1 metro pra a esquerda da minha posição original. Mas não consegui reparar mais nada, porque o Celta ainda vinha. Estava prestes a bater em mim de novo.

Alguém falou um palavrão baixo, me deixando ciente que não estava sozinha e era impossível não reconhecer a voz. Duas mãos longas e brancas me abraçaram protetoramente e o carro estremeceu até parar 30cm do meu rosto, as mãos grandes criando um amassado na lateral do Celta.

Depois ele se mexeu com uma rapidez tão grande que mais pareciam um vulto. Uma estava segurando a lateral do carro, e alguma coisa me arrastava, balançando minhas pernas como as de uma boneca de trapos. O Celta parou e o vidro estourou – exatamente onde, um segundo antes, minhas pernas estiveram.

O silêncio foi absoluto por um momento, e então começou a gritaria. Eu podia ouvir mais de uma pessoa gritando meu nome. Mas com clareza ainda, ouvi a voz baixa e assustada de Cebola Melo no meu ouvido.

– Moni? Você está bem?

– Estou bem. – Minha voz parecia nervosa. Tentei me sentar e percebi que ele me segurava junto á seu corpo num aperto de aço.

– Cuidado – alertou ele enquanto eu tentava me mexer. – Acho que você bateu a cabeça.

Na mesma hora uma dor latejante me atingiu no canto da cabeça.

– Ai – falei surpresa.

– Foi o que eu pensei. – Pela voz dele, tive a impressão que ele estava contendo o riso.

– Como foi que... – gaguejei, tentando por minhas ideias em ordem e pensar com clareza. – Como foi que chegou aqui tão rápido?

– Eu estava bem do seu lado, Moni – disse ele, o tom sério.

Tentei me sentar e dessa vez ele deixou, afrouxando o abraço e deslizando pra o mais longe possível de mim. Olhei pra a cara preocupada e inocente dele e de novo fiquei desorientada com seus olhos dourados. O que foi que eu perguntei a ele mesmo?

E depois eles nos acharam, uma multidão de gente chorando, gritando uns com os outros, gritando chamando por nós.

– Não se mexa – instruiu alguém.

– Tirem o Tikara do carro! – gritou outra pessoa. Tentei me levantar, mas a mão fria de Cebola me puxou pra baixo.

– Fique quieta por enquanto.

– Mas está frio – reclamei. Fiquei surpresa ao notar que ele ria baixinho. – Você estava lá – lembrei de repente,, e o riso dele parou rapidinho. – Você estava perto da Secretaria.

A cara dele ficou séria.

– Não estava não.

– Vi você. – Tudo em nossa volta estava um caos. Eu podia ouvir vozes de adultos que chegavam ao local. Mas me prendi na nossa discussão; eu estava certa e ele tinha que admitir isso.

– Moni, eu estava parado do seu lado e tirei você do caminho. – Ele tentou me convencer com os olhos, como se quisesse me dizer algo muito importante.

– Não. – Bati o pé.

– Por favor, Moni.

– Por quê?

– Confie em mim – pediu ele, a voz suave.

Agora eu podia ouvir as sirenes.

– Promete que vai me explicar tudo depois?

– Tudo bem – rebateu ele, irritado.

– Tudo bem – repeti com raiva.

Foram necessários 5 paramédicos para afastar o carro de nós o bastante para que as macas entrassem. Cebola recusou a dele e eu tentei fazer o mesmo, mas o traidor lhes disse que eu tinha batido a cabeça e devia ter uma concussão. Quase morri de vergonha quando me colocaram o protetor de pescoço. Parecia que toda a escola estava me olhando ser levada para a ambulância. Cebola andava na frente.

Como se minha situação não pudesse ser pior, o chefe Sousa chegou antes que pudessem me tirar dali em segurança.

– Mônica! – gritou ele em pânico quando me reconheceu na maca.

– Estou bem, pai – eu falei. – Não há nada de errado comigo.

Ele se virou para o paramédico mais próximo para pedir uma segunda opinião. Tentei me desligar para refletir sobre a confusão de imagens inexplicáveis que se misturavam na minha cabeça. Quando me levantaram, eu vi o amassado fundo no Celta preto – um amassado muito esquisito, que combinava direitinho com o formato dos ombros de Cebola... Como se ele tivesse se jogado no carro com força suficiente para amassar o metal.

E depois havia a família dele, olhando á distância, com expressões que iam de censura à raiva, mas sem a menor preocupação com a segurança do irmão.

Tentei pensar numa solução lógica para o que havia acontecido – uma solução que não fosse o confirmação que eu estava louca.

A ambulância teve escolta policial até o hospital. Me senti ridícula o tempo todo que me levaram. O que piorava tudo era que Cebola entrou no hospital andando com os próprios pés.

Eles me colocaram na emergência, onde uma enfermeira mediu minha pressão e temperatura. Tirei o protetor de pescoço um segundo depois da enfermeira sair de perto e o joguei debaixo da cama.

Houve uma agitação, outra maca trazia Tikara, de minha turma de história, ele estava com ataduras sujas de sangue que envolviam sua cabeça. Tikara parecia milhões de vezes pior que eu. Mas olhava angustiado para mim.

– Moni, me desculpe!

– Eu estou bem, Tikara... Você parece péssimo, tudo bem com você? – Enquanto falávamos, enfermeiras começaram a desfazer sua atadura encharcada, expondo os cortes superficiais em toda a testa e bochechas de Tikara.

Ele me ignorou.

– Achei que ia matar você! Eu estava indo rápido demais e derrapei na pista molhada... – Ele pareceu sentir dor quando uma das enfermeiras começou a limpar seu rosto.

– Não se preocupe com isso; estou sã e salva.

– Como saiu do caminho tão rápido? Você estava lá e de repente tinha sumido...

– Hmmm... Cebola me puxou de lá.

Ele parecia confuso.

– Quem?

– Cebola Melo... Ele estava do meu lado. – Eu sempre menti muito mal; não devia estar nada convincente.

– Cebola? Não o vi... Caramba, acho que foi tudo tão rápido. Ele está bem?

– Acho que sim. Está em algum lugar por aqui, mas ninguém o obrigou a usar uma maca.

Eu sabia que não era louca. O que estava acontecendo? Não havia como explicar o que eu tinha visto.

Eles me levaram na maca para fazer uma radiografia da cabeça. Eu disse para os enfermeiros que não havia nada de errado e tinha razão. Nem uma concussão. Perguntei se podia sair, mas a enfermeira disse que primeiro teria que falar com o médico. Então fiquei presa na emergência, atazanada pelas desculpas de Tikara. Não importava quantas vezes eu dissesse que estava bem, ele continuava a se culpar. Por fim fechei os olhos e o ignorei. Ele continuou falando cheio de culpa.

– Ela está dormindo? – perguntou uma voz musical. Meus olhos se abriram.

Cebola estava parado ao pé da minha cadeira, com um sorriso sugestivo.

– Aí, Cebola, me desculpe... – começou Tikara.

Cebola ergueu a mão para interrompê-lo.

– Sem sangue, sem crime – disse ele, os dentes brilhando em um sorriso. Ele foi se sentar na beira da maca de Tikara, voltado pra mim. Sorriu novamente. – E então, qual é o diagnóstico?

– Não há nada de errado comigo, mas não me deixam ir embora – reclamei. – Por que é que você não foi amarrado a uma cama como nós?

– Tem a ver com quem você conhece – piscou ele. – Mas não se preocupe, eu vim libertá-la.

Depois um médico apareceu e minha boca se abriu. Ele era jovem, cabelos pretos... e era mais lindo que qualquer astro de cinema que eu já vira. Mas era pálido e parecia cansado, com olheiras. Pela descrição do meu pai, este tinha que ser o pai Cebola.

– Então, Srta. Sousa – disse o Dr. Cebola Melo numa voz agradável –, como está se sentindo?

– Estou bem – disse. Esperava que pela última vez.

– Sua radiografia parece boa – disse ele. – Está com dor de cabeça? Cebola disse que bateu com força.

– Eu estou bem – repeti, lançando um olhar zangado para Cebola.

Os dedos frios do médico passaram pela minha testa. Ele percebeu quando estremeci.

– Dolorido? – perguntou ele.

– Na verdade não. – Já senti coisas piores.

Ouvi uma risadinha, olhei e vi o sorriso debochado de Cebola. Meus olhos se estreitaram.

– Bem, seu pai está na sala de espera... Pode ir para casa com ele agora. Mas volte se sentir tontura ou tiver qualquer problema de visão.

– Posso voltar para a escola? – perguntei, imaginando que causaria muita preocupação nos meus pais.

– Talvez devesse descansar hoje.

Olhei para Cebola.

Ele vai para a escola?

– Alguém precisa espalhar a boa notícia que sobrevivemos – disse Cebola, debochando de mim.

– Ah, não – me envergonhei, cobrindo o rosto com as mãos.

O Dr. Cebola Melo ergueu as sobrancelhas.

– Quer ficar aqui?

– Não, não! – me atirei pra fora da cadeira. Rápido demais. Eu tombei pra o lado e o Dr. Cebola Melo me segurou. Ele pareceu preocupado. – Estou bem – garanti de novo. Meus problemas de equilíbrio não tinham nada a ver com a pancada na cabeça.

– Tomo um Tylenol para a dor – sugeriu ele.

– Não está doendo tanto assim – insisti.

– Parece que vocês tiveram muita sorte – disse o Dr. Cebola Melo, sorrindo ao assinar meu atestado.

– A sorte foi Cebola por acaso estar parado do meu lado – corrigi com um olhar duro para o garoto da minha frase.

– Ah, bem, sim – concordou o Dr. Cebola Melo, de repente ocupado com os papéis diante dele. Depois desviou os olhos para Tikara e foi falar com ele.

Assim que o médico se virou, fui para o lado de Cebola.

– Posso conversar com você um minuto? – falei baixinho. Ele se afastou um pouco, o queixo travado.

– Seu pai está esperando por você – disse ele irritado.

– Gostaria de falar com você a sós, se não se importa – pressionei.

Ele olhou, depois deu as costas e andou pela sala. Quase tive que correr para acompanhar os passos dele. Assim que viramos um corredor, ele girou o corpo e me encarou.

– O que você quer? – perguntou, parecendo extremamente hostil. Seus olhos eram frios.

O humor dele me abalou. Minhas palavras saíram menos firmes do que eu planejava.

– Você me deve uma explicação – lembrei a ele.

– Eu salvei sua vida... Não lhe devo nada.

Eu vacilei com o ressentimento na voz dele.

– Você prometeu.

– Moni, você bateu a cabeça, não sabe do que está falando. – O tom de voz dele era cortante.

– Não há nada de errado com a minha cabeça.

Ele me olhou por um longo instante.

– O que quer de mim, Mônica?

– Quero saber a verdade – eu disse. – Quero saber por que estou mentindo por você.

– O que acha que aconteceu? – rebateu ele.

A resposta saiu num jato.

– Você não estava em nenhum lugar perto de mim... O Tikara também não viu, então não venha me dizer que bati a cabeça. Aquele carro ia atropelar nós dois... E suas mãos amassaram a lateral do carro, e você não está nada machucado. E o Celta devia ter atropelado minhas pernas, mas você o levantou... – Pude perceber como aquilo parecia maluquice e não consegui continuar. Estava tão irritada que podia sentir as lágrimas saindo; tentei me controlar.

Ele me olhava incrédulo. Mas parecia tenso, na defensiva.

– Acha que eu levantei um carro? – Ele parecia questionar minha sanidade, mas só conseguiu me deixar mais desconfiada. Era como se ele estivesse atuando.

Eu apenas concordei uma vez, ainda tentando não chorar.

– Sabe que ninguém vai acreditar nisso. – Agora a voz dele parecia me ridicularizar.

– Não vou contar a ninguém. – Eu disse cada palavra devagar, controlando minha raiva.

Ele pareceu surpreso.

– Então por que isso importa?

– Importa pra mim – rosnei. – Não gosto de mentir... Então é melhor haver uma boa razão para que eu faça isso.

– Não pode simplesmente me agradecer e esquecer isso?

– Obrigada. – Eu esperei, furiosa e esperançosa.

– Você não vai deixar passar em branco, né?

– Não.

– Neste caso... Curta sua decepção.

Trocamos um olhar zangado e um momento de silêncio. Fui a primeira a falar, tentando me manter concentrada. Corria o risco de me distrair com rosto maravilhoso de Cebola. Era como tentar encaram um anjo do mau.

– Por que se deu ao trabalho, então? – perguntei friamente.

Ele pareceu surpreendentemente vulnerável por um instante.

– Não sei – sussurrou ele.

E depois ele me deu as costas e saiu andando.

Eu estava tão furiosa que precisei de alguns minutos para me mexer. Fui para a saída no final do corredor, e a sala de espera estava lotada de pessoas que me encaravam. Papai correu para mim; eu levantei as mãos para mostrar que estava bem.

– Não há nada de errado comigo – garanti a ele, sem humor para conversinhas.

– O que o médico disse?

– O Dr. Cebola Melo me examinou e disse que eu estava bem e podia ir para casa. – Falei. Xaveco, Denise e Zé Luís estavam todos ali, começando a vir em nossa direção. – Vamos – puxei meu pai.

Papai colocou uma mão nas minhas costas e foi me escoltando até o carro. Acenei para os meus amigos, tentando dizer que eles não precisavam se preocupar mais. Foi um alívio – pela primeira vez – entrar na viatura.

Passamos o caminho em silêncio. Eu tinha certeza que o comportamento defensivo de Cebola no corredor era uma confirmação das coisas estranhas que eu ainda não conseguia acreditar ter visto.

Quando estacionamos no jardim, papai finalmente falou.

– Hmmm... Acho que sua mãe pode estar um pouco preocupada. – Ele inclinou a cabeça, se sentindo culpado.

Fiquei apavorada.

– Você contou à mamãe!

– Desculpe.

Bati a porta com mais força do que o necessário ao sair do carro.

É claro que minha mãe estava desesperada. Tive de dizer mil vezes que estava me sentindo bem, e ainda assim ela me mandou deitar e não me deixou fazer nada pelo resto do dia, sempre me entupindo de remédios.

Mas minha mente estava presa no mistério de Cebola. E um pouco obcecada pelo próprio Cebola. Idiota, idiota, idiota.

Dormi mais cedo naquela noite. Meus pais continuaram a ficar de olho em mim. Tomei 3 comprimidos de Tylenol. Eles ajudaram e caí no sono.

Essa foi a primeira noite que sonhei com Cebola Melo.




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Notas finais do capítulo

comentemmmm! bjs



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