Todolist escrita por AnaBorguin


Capítulo 3
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Demorei? ;D



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2° Capítulo

A semana passou rápido. Ao seu decorrer aproveitei para me preocupar com problemas chatos que sabia que uma hora teria de enfrentar. Fui ao banco e cuidei do – pouco - dinheiro da poupança e do – irrisório – seguro vida. Possuía apenas o suficiente para levar Julian umas cinco vezes ao McDonalds. Não importa.

 Foram dias mais exaustivos que os outros. Foram poucas noites que consegui pregar os olhos, e mesmo quando dormia meus sonhos eram repletos de tristes cenas de enterro. O trabalho pareceu mais – se é que isso é possível - sem graça do que nunca, afinal, a confusão da semana passada tinha se mostrado deveras divertida e senti uma estranha falta do velho e seu filho. O tal do Frank.

  Carreguei minha lista para todos os lugares, apertando em minha mão quando sentia que estava perdendo a força. Tinha muitas coisas a realizar nesses seis meses, e tive medo de não ter tempo.  Olha como a vida é estranha, uma das coisas mais difíceis de minha lista foi logo a primeira a começar a acontecer de fato.

No sábado cumpri um ritual que havia deixado de lado há algum tempo. Fui ao cemitério visitar meu pai. Nos primeiros meses após sua morte costumava ir todos os fins de semana, mas a rotina me impediu de manter isto.

Antes eu gostava muito de cemitérios. Eram locais cheios de paz, sossego, amor. Até a tristeza me parecia bela. Mas foi só chegar para sentir que aquilo já não significava o mesmo de antes. Dentro de certo tempo eu estaria enterrado em um lugar parecido com este.

E de longe eu o vi. De pé, frente ao túmulo de Donald Way. A mesma jaqueta com as mãos enfiadas no bolso.

- Bom dia – sério.

- Bom dia, Gerard.

- Tanto tempo, não é?

- Pois é.

A conversa era assim, dura e sem emoção.

- Não tem mais nada que te interesse em casa? – me surpreendi em perceber que a provocação saía d eminha boca e não da dele, como de costume. – Nem a mamãe...

- Ela está louca – disse simplesmente – e você bem sabe disso. Da ultima vez cismou que eu deveria rever meus antigos brinquedos, Mikey.

Fiquei incomodado com aquilo. Ele não tinha o direito de falar assim, foi ele quem promoveu este estado.

- Não custa nada passar pelo menos para dizer se está bem... Ou onde está morando... Ou se tem algo para comer...- numerei friamente.

- Estou bem, se é isso que quer saber. – não, eu não queria – Bert conseguiu um dinheiro com um amigo dele e...

- Ótima fonte de renda! Um amigo do tal do Burt!

- Bert.

- Que seja.

Ficamos em silêncio. Meus olhos passaram a fitar o túmulo. A vida inteira resumida em um nome e duas datas. A morte era real e fria, não?

- Era mesmo um idiota. – Gerard disse, supus que para a lápide.

- Por quê? – Indaguei.

- Morrer assim... Eu sempre disse que o cigarro o mataria – e tragou logo em seguida.

- Gerard... Você...

- Sim, fumo. – Soltou a fumaça da boca – Mas não tenho nenhuma família para deixar. - Chutou a lápide.

Aquilo me deixou com ódio, de verdade. Meu pai era um exemplo: trabalhador, ótimo marido e pai. Mas Gerard nutria um ódio que eu não conseguia compreender. Porra! Ele tentou fazer um papel de pai! Não teve culpa de perder o emprego e não poder mais bancar nossa boa vida!

- Não o culpe – disse, contendo a raiva – por você ser assim.

Ele ficou quieto. Queria dizer algo. Seus olhos se fecharam fortemente e balançou a cabeça.

- Eu tenho culpa? Tenho culpa por ser igual a ele?

Foi realmente inteligível, o fitei perdido.

- Gerard, você trouxe problemas. – despejei toda minha sinceridade naquela frase. Essa era uma das coisas que me arrependia de nunca ter dito. Perfeita ocasião.

- ELE trouxe os problemas! – gritou.

Juro que não entendi. Recuei um passo e olhei para seu rosto. Havia um vestígio de lágrima, pequena e sem força, mas havia.

- Você não sabe de nada – ele riu – Tudo bem, você não sabe nada... – se acalmou.

Mas eu não queria me acalmar. Por que ria? Por que tinha que ser tão arrogante? Por que tinha que dar esse ar de “sei muito mais que você”? .

- O que eu deveria saber? – o desafiei.

- Quer mesmo que eu conte? – E não foi uma pergunta retórica.

- Sim! – Mostrei firmeza. Pareci tão grande e decidido que me senti orgulhoso.

Tragou mais algumas vezes.

- Eu estava apaixonado, Mikey. – Coçou a cabeça – E ele me bateu.

Não me lembrava de ter começado assim. E, alias, desde quando Gerard se apaixonava?

-Infelizmente me achou boiola demais pra ser seu filho.

Bom, começava a fazer um pouco de sentido agora. É acho que estava muito na cara, talvez eu tenha fingido de não saber...

- Hipócrita. – cuspiu no túmulo.

Tentei entender o porquê daquela atitude, mas antes que pudesse formular uma teoria coerente, Gerard me interrompeu, o rosto indecifrável.

- Acho que papai me queria só pra ele. – seu sorriso estava cheio de segredos – Filho de bicha... bicha é.

Qualquer coisa que eu pudesse estar pensando no momento foi esquecida. Minha mente entrou em pane e travou naquela ultima frase.

- Como...? – soei retardado.

- Seu querido papai não era muito feliz no casamento, acredito – a voz dele era divertida. – precisava molestar o pobre filhinho.

- Cala a boca, Gerard! – Olhei para a lápide. Enxerguei meu pai ali. O pai perfeito! Meu pai!

- Tinha direito de me foder, mas não admitia ninguém mais! – A risada dele aumentou.

Recuei assustado. Louco! Só podia estar louco! – Não se assuste – se aproximou – Isso eu não puxei dele.

- CALE A BOCA! – bati em seu rosto e ele cambaleou. Eu estava aterrorizado. Meu coração batia desesperado. Minhas têmporas queriam explodir de dor.

- Me odiava tanto – chutou novamente, olhando fixamente para o túmulo – tanto – mais um chute – tanto!

Pensei que não pararia até que se quebrasse, mas ele cedeu. Estava chorando. Foi a primeira vez que o vi assim. Algo dentro de mim se quebrou naquele momento. Não o coração, acho que foi o pulmão, pois comecei a respirar com muita dificuldade. Por mais que inspirasse, não passava ar. Comecei a ofegar desesperado. Droga! Ótimo momento para se ter uma crise! Minha visão começou a escurecer. Eu desmaiaria. Ou morreria! Meus seis meses foram resumidos a uma semana. Impressionante, não?

  Senti sua mão fria no meu rosto. Abri os olhos. Estava ali, a face manchada de maquiagem borrada. Não parecia mais triste. Havia algo de... malicioso.

- Sempre quis – estava muito próximo a mim. Sua respiração quente me fez sentir menos frio. – saber se você... – e encostou os lábios nos meus.

Não me julguem. Vocês não sabem como ele tem um poder de te deixar envolvido só com meia dúzia de palavras. Era bem isso que eu admirava na minha infância, sua persuasão.

Mas a situação foi bem embaraçosa. Afinal, não é todo dia que você é beijado pelo irmão, molestado pelo próprio pai na infância. Foi...tenso.

Não me recordo se correspondi a altura. Cheguei a beijá-lo, mas tremia muito. Era confortável como um abraço. E nosso pai estava ali, do lado. Olhando-nos silencioso como um juiz.

Não protestei quando se descolou de mim. Sorriu ao me ver vermelho.

- Irmãozinho. – deu um pequeno beijo na ponta do meu nariz, exatamente como minha mãe quando éramos crianças. – Tenho que ir. – me avisou, indicando com a cabeça um vulto um pouco distante.

Não pude deixar de notar quem era. O tal do...Bert. Como eu o odiei naquela época. Tentei afastar a culpa de tudo dos ombros da imagem quase santa de meu pai, e colocar em cima dele. Era o culpado! Tirou Gerard de casa!

- Tchauzinho – se despediu.

- Hum... Gee. – o chamei.

Virou o rosto.

- Sim?

- Apareça mais. Mamãe – tossi – e eu – tossi de novo, bem falso – sentimos sua falta.

- Claro. – E se foi.

Não sei exatamente o que aquele encontro mudou em mim, mas parei no primeiro telefone público e liguei para o número anotado no guardanapo, ainda guardado no bolso da calça. Atenderam.

Não existia nenhum Frank lá.

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 Infelizmente, quanto menos queremos pensar em algo, mais nos vem à cabeça. Os rostos de meu pai, Gerard e, estranhamente, de Frank passavam como flashes a todo o momento. A versão de um gay enrustido que molestava o prórpio filho era algo que não entraria nos meus pensamentos tão facilmente.

 Procurando afastar aquilo, no fim de semana que se sucedeu àquele pus meu tópico mais simples em prática. Inventando uma doença no restaurante, e não dizendo nada à Kath, resolvi que sairia para me divertir.

 Como bom marinheiro de primeira viagem que era, não calculei algumas coisinhas básicas. Primeiramente eu não tinha companhia. Até pensei em convencer Bob de faltar ao trabalho também, mas o Chef desconfiaria, com certeza. E, em segundo lugar, eu não fazia idéia da onde ir.

Passei de carro na frente de vários bares. Os bonitos pareciam caros, os feios pareciam perigosos. Duas horas e alguns quilômetros depois me vi desesperado. O meu tempo livre estava acabando e descobri, com muito pesar, que realmente não sabia me divertir.

Com um desejo incontrolável de não terminar a noite como um loser, desci na primeira espelunca que achei. Um bar escuro, em uma rua escura, com um ambiente sombrio. Perfeito, não?

Logo ao entrar notei bem o que me aguardava. Havia poucas pessoas ali, das mais estranhas que eu já havia visto. Uma prostituta se aproximou de mim, mas eu a repeli imediatamente. Acho que minha atitude foi um pouco grosseira, pois se afastou resmungando algo que não entendi, só pude compreender com clareza, que tratava-se de uma voz masculina.

O barman secava os copos de maneira rápida para clientes inexistentes. Retirei os óculos de imediato, guardando no bolso da camisa, e me sentei ao balcão, onde só havia mais uma pessoa. E foi só após pedir uma cerveja das mais baratas, que percebi com choque quem era.

Frank mexia na azeitona de seu Martini, os olhos um pouco distantes. Deveria estar um tanto bêbado... Vestia uma roupa um pouco parecida com o do outro dia, mas um pouca mais informou. Calça jeans e camiseta justa, o tipo de coisa que fez me sentir um idiota vestindo calça e camisa sociais, de meu próprio uniforme.

Meu coração acelerou e - sem entender o porquê - o beijo que dei em Gerard me ocorreu insistentemente.

Pigarreei. Ele não notou. Pigarreei mais alto. Nada. Não sei da onde tirei a coragem, mas falei.

- Frank?

Demorou bastante para que ainda assim me notasse. Dirigiu-me um ar de profundo desconhecimento.

- Oi... – resmungou - Conheço você?

Fui reduzido a pó. “Que um buraco se abra no chão para que eu entre!”

-Do restaurante...

Continuou sem expressar conhecimento.

- O garçom...

- Aaaah... – exclamou – é! Eu realmente não lembro!

O barman riu. Acho que foi a coisa mais patética que eu já havia passado, e olha que se tratando de Michael James Way, isto era realmente incrível.

Sem dizer mais nada, coloquei meus óculos. Ele sorriu.

- Eu sei quem você é. O cara azarado que conheceu o meu pai. – estava se divertindo com meu embaraço.

- Eu te liguei. – droga! Por que eu tinha que ter falado aquilo? – Mas... O telefone estava errado. – e ainda por cima completei!

Sorriu.

-Óbvio. Acha mesmo que eu daria meu telefone para um total desconhecido?  - a risada do barman estava realmente me irritando – Para provocar meu pai vale qualquer coisa! – e disse cínico – Obrigado por tudo.

Já chega. Humilhação de mais para um dia só. Levantei-me, coloquei o único dinheiro que tinha em cima da mesa.

- Ei! Desculpe! – segurou meu braço. Nossa, o sorriso dele era perfeito – Não estou te ofendendo não. Mas é que você não faz idéia de como meu pai é!

- Faço sim – estava sério. Não faria mais questão de ser simpático.

- Aé! – ele gargalhou. É! Gar-ga-lhou! – Meu pai ficou puto! Engraçadíssimo!

- Super.– estava realmente irritado – Tchau.

Já estava na porta, quando resolveu se pronunciar novamente.

- Foi você quem me procurou. Quer o seu playboyzinho?

 Fiquei parado. Estava totalmente vermelho e sem saber o que dizer. Eu liguei, não é?. Afinal, o que eu queria?

- Sou Frank Iero. Qual o seu nome?

Voltei alguns passos.

- Michael... – Não, não! Melhor não! – Road.

- Road? Interessante. – Se levantou e me segurou pela mão. Virou para o barman – lá atrás está aberto, Donny?

- Claro, Frank. – Ele continuava a secar os copos assiduamente. – Só não suje muito, certo?

E antes que pudesse entender já era arrastado para os fundos do bar.

Entramos em um quarto bem destruído e sujo. Frank fechou a janela, encostou a porta e passou a chave. Fiquei analisando toda a cena muito quieto. Minha consciência havia me abandonado e meu estômago se revirava estranhamente me deixando enjoado.

Sem esperar muito ele me puxou. Um beijo. Tão diferente daquele de Gerard. Não foi aconchegante, fraternal ou carinhoso. Correspondi totalmente, segurando sua cabeça com força.

Suas mãos apressadas já passeavam em meu abdômen. Retorci-me com o contato gelado de seus dedos. Seus lábios escorregaram para meu pescoço. Parecia beber meu sangue, dando pequenas sugadas. Havia algo que eu só experimentei uma vez em minha vida, e foi no dia em que conheci Katherin Passey. Paixão.

Kath. Ela estava em casa naquele momento, providenciando o jantar, agüentando as reclamações infantis de Julian e os devaneios atordoantes de minha louca mãe.

A consciência voltou com força o suficiente para empurrar aquele cara longe.

- O que...? – ofegou, a boca avermelhada entreaberta.

- Não dá! Não posso! – balancei a cabeça muitas vezes, meio que pra provar para mim mesmo o que dizia.

- Esqueça aquilo que o padre disse pra você – ele sorriu, mas parecia um pouco irritado – Você não vai para o inferno e até mesmo ele gosta de dar uma alisada nos coroinhas. – se aproximou e me segurou com força, me beijando novamente.

O afastei novamente.

- Eu nunca... Eu tenho... – tentei explicar entre respirações cortadas. Acho que soaria muito ridículo falar “Tenho uma doença incurável e estou te usando para minha diversão.”

Mas eu o puxei pela nuca e o beijei novamente. Que sensação estranhamente boa me dava aquilo. “Kath! Julian!” me obriguei a pensar.

E pela terceira vez o neguei. Algo bem Pedro e Jesus, não acham?

- Desculpe – nunca fiquei tão embaraçado como naquele momento, nem quando minhas calças caíram no meio do pátio da escola. Poutz! Aquele dia eu quis sumir! – Eu não estou pronto... - Pareci uma virgenzinha falando. E de certa forma... Eu era.

Deu umas três voltas em torno de si mesmo, para se controlar. Estava nervoso e com razão. Sentei na cama e, sem planejar, já fazia meu olhar de “piedade” detestável. Funcionou. Acalmou-se e até sorriu.

- Tudo bem. É novato, só isso.

Consenti.

Colocou a mão no bolso, e por alguns segundo pensei que me pagaria pelo “serviço” – ou falta dele. Mas retirou um cartãozinho que me entregou.

- Agora sem mentiras ou máscaras. – analisei. “Frank Anthony Iero – sub gerente” – Se me procurar, eu o irei receber.

Naquela noite nos despedimos com a promessa de que nos encontraríamos de novo. Mas eu nunca tive de fato essa intenção. Eu nunca mais veria Frank Iero, e estava feliz com aquilo. Ou não.  


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