Insensível. escrita por hikcchi


Capítulo 5
Capítulo 05.




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Nem breves nuvens conseguiriam ocultar a magnificência daquele céu que se encontrava tão azul quanto aqueles olhos determinados. O sol projetava os seus raios cálidos, causando um mormaço intenso, entretanto, não seria empecilho para os planos do dia.

No momento em que passou, às pressas, pelo canteiro da escola, as cigarras puseram-se a cantar entusiasmadas — ou, quem sabe, amedrontadas — com tanto ânimo. Finalmente chegou o momento da seleção para entrar para a equipe de líderes de torcida da escola Teiko, algo pelo qual ela esperava ansiosamente e não podia mais adiar.

— Hika! — Gritou a amiga, ofegante. Acompanhá-la naquela velocidade não era tarefa fácil. — Por favor, não corra tanto. Se continuarmos assim, não teremos energia nem para realizar o teste!

A garota de cabelos escuros parou e virou-se.

— Desculpe, Teru. — Ela disse ao se aproximar. — Estou tão contente! Sinto que posso tocar as nuvens com um único salto. — Com um sorriso no rosto, ela esticou os braços para cima, tentando alcançar alguma nuvem passageira de verdade.

— Não se apresse… Você sabe que ainda não consegue saltar de alturas tão grandes… — A respiração de Terumi estava gradualmente voltando ao normal.

— Mas logo conseguirei! Quer dizer, se eu entrar para o time, poderei executar tantas coreografias difíceis quanto elas fazem em apenas um treino básico. — Hikari exclamou, demonstrando alguns passos.

— Está bem… — A ruiva disse, rindo. — Mas não esqueça que temos que passar no teste em primeiro lugar. Vamos nessa? Estou pronta agora!

— E nós vamos. — A garota motivada afirmou. — Você verá, Teru. Seremos aprovadas.

 

 

* * * * * *

 

 

Quando as duas chegaram, a quadra externa estava cheia. Elas observaram meninas de diversas séries com números grudados em suas camisetas, todas querendo aproveitar a mesma oportunidade: entrar para o time.

Isso não abalou Hikari de forma alguma. Ela sabia que precisava dar o seu melhor e sentia que estava verdadeiramente preparada.

— Peguem seus números, andem! — Vociferou uma garota. Aparentava ser a capitã da equipe. — Nunca vi garotas mais lentas do que vocês, novatas!

— Com licença… — Questionou Terumi. A azulada a acompanhava. — O teste para entrar no time de líderes de torcida é aqui?

A líder a encarou, demonstrando claramente seu descontentamento por estar ali.

— E o que você acha? — Respondeu rudemente. — Se bem que, com toda essa lentidão, este lugar poderia ser confundido facilmente com um campo cheio de lesmas.

Algumas das garotas no time riram da situação, enquanto outras permaneceram em silêncio, impossibilitadas de discordar da capitã.

— Acredito que uma líder não deveria agir assim em nenhuma circunstância — Declarou Hikari.

— Ah? — Debochadamente, a loira olhou para aquela que a desafiou. — E quem é você?

— Meu nome é Hikari. Huryome Hikari. Estou aqui para o teste e para entrar no time.

— Hm! Pois bem! Meu nome é Yukari. Sato Yukari, a capitã do time que você deseja entrar. Mas, pelo visto, você já sabia disso, não é mesmo? — Com desdém, ela pegou um número aleatório e o colou na camiseta da azulada. — Este será o seu número. Espero que passe, Hu-Ry-O-Me. — Disse, fazendo uma careta a cada sílaba pronunciada.

Terumi interveio para evitar a resposta da amiga, pois estava ciente de que ela não deixaria passar em branco.

— Calma, Hika! — Falou, puxando-a para um canto. — Vamos fazê-la engolir as palavras mostrando nossas habilidades no teste.

— Não gosto da ideia de entrar para a equipe com ela liderando. — Retrucou, emburrada.

— Bem, eu também não, mas vamos nos esforçar ao máximo, certo? — Sorriu para a amiga de cabelos azul-marinhos.

— Sim! — Respondeu, ainda que seu olhar se encontrasse fixado em Sato.

A avaliação havia começado há pouco tempo. Eram muitos exercícios que precisavam realizar com perfeição, ou, pelo menos, algo próximo a um movimento impecável. Huryome estava determinada e suas notas eram admiráveis. Ela era uma candidata excelente e certamente entraria para o time, se as outras integrantes permitissem.

Contudo, alguém não estava gostando nada daquilo.

— Muito bem, muito bem. — Pronunciou, Yukari. — Vocês demostraram fervor, tenho que admitir. Porém, os números que avançaram para a próxima fase, foram… — Em ordem crescente, revelou os números selecionados.

— Isso! — Com alegria, Hikari exclamou. — Consegui!

— Conseguimos, Hika! — Terumi abraçou-a com carinho. — Eu também passei!

— Estou tão contente por isso, por nós! — Retribuiu o abraço da ruiva.

Sato observou as duas, tentando conter a raiva que estava sentindo. Talvez estivesse incomodada pelo fato de a garota tê-la desafiado enquanto todas as outras apenas se mantinham caladas. E, mesmo que relutasse em admitir, ela era habilidosa. Muito habilidosa.

No entanto, as coisas não ficariam assim, não enquanto fosse a capitã.

— Que animação, aprecio garotas assim. — Ironizou, referindo-se às duas. — Mas vocês ainda têm uma etapa importante a atravessar.

Yukari deu ordens para as garotas do time se posicionarem em formação.

— Huryomezinhaaa… — Zombou novamente. — Você será a primeira. Deve pular daquela altura ali. — Indicou, enquanto as integrantes formavam uma espécie de pirâmide

— Yuka, não acha que está muito alto para uma iniciante? — Indagou uma componente da equipe.

— E eu te perguntei alguma coisa? — Respondeu.

— N-Não, mas…

— Então cale-se! Volte para o seu lugar. — Finalizou, furiosa.

— Hika… — Teru murmurou, preocupada. — Por favor…

— Eu vou, Teru.

Mesmo não surpreendida, a ruiva temia pela amiga.

— Não desistirei. Não cheguei até aqui para abandonar tudo por causa disso. — Falou, alongando as pernas.

Yukari manteve o sorriso no rosto.

— Tudo que você precisa fazer é pular. Entrará para o time se fizer bem.

Hikari encontrou-se cara a cara com Sato, por um instante.

Ela tinha consciência de que aquela altura não estava no programa do teste: a capitã fez propositalmente. No entanto, Hikari não treinara intensamente dia e noite, por meses, em vão. Mesmo que saltos de grandes alturas não fossem sua especialidade, ela não tinha medo.

Posicionou-se e analisou a formação à sua frente. Sabia que precisaria de impulso, espaço, velocidade e precisão, além de executar o salto de forma impecável. Ela faria aquilo e teria sucesso.

Correu, sem se importar com mais nada ao redor.

Ela tentou afastar pensamentos pessimistas, tudo que pudesse bloqueá-la. Sentiu o vento em seu rosto, permitindo que levasse embora suas preocupações.

Chegou à formação sem dificuldades, subindo até o topo com a ajuda das próprias formadoras. Dali, girou com tanta maestria quanto as integrantes experientes da equipe.

— Ela… Ela conseguiu? Não acredito! — Yukari atirou a prancheta no chão, com asco.

— Vai, Hika! — Terumi gritou, empolgada com o desempenho da amiga.

Entretanto, parecia bom demais para ser verdade. Um erro no trajeto, um obstáculo que invadiu seus pensamentos e permaneceu lá para desviar sua atenção, um pouso equivocado e uma torção preocupante culminaram no desfecho desastroso daquele instante.

 

 

* * * * * *

 

 

A angústia pode ser uma sensação abstrata, mas naquele momento, tornou-se extremamente tangível para todos que testemunhavam a cena. Hikari segurava seu tornozelo esquerdo, buscando de alguma forma aliviar a dor que sentia, no entanto, sem sucesso. Quanto mais pressionava, mais intensa se tornava sua aflição.

— Deixem-na. — Disse Yukari, sem demonstrar compaixão.

Os membros da equipe a encararam, questionando a ordem, mas nenhum deles ousou desafiá-la. Todos sabiam do que a líder era capaz caso alguém questionasse suas decisões.

— H-Hika! — Terumi soluçou.

— Se você intervir, será desclassificada imediatamente.

Terumi não queria acreditar, mas ao encontrar o olhar de Sato, viu a brutalidade prevalecer. A capitã simplesmente se aproximou da garota de cabelos azuis:

— Ah, veja só. Para alguém que demonstrou tanta convicção, pensei que conseguiria pular dessa altura tão… Insignificante. — Sorriu.

Hikari encarou-a. Não sabia se o enjoo que sentia era devido à dor ou ao digerir as ironias da loira impiedosa à sua frente.

— Por não ter conseguido, você está fora. E que fique claro para todos: quem ajudar também estará fora! Se um dia ela quiser voltar, terá que mostrar mais determinação do que isso. — Yukari fitou a garota no chão. — Se não consegue enfrentar a dor sozinha, não está pronta para fazer parte do time.

Terumi aproximou-se devagar. Queria apoiar a amiga.

— Não se aproxime! — Huryome gritou.

— Hik-

— Por favor, você lutou tanto para estar aqui, não quero que seja prejudicada. Eu estou bem. — Seus olhos azuis brilharam. — Você precisa entrar para o time, Teru.

Sato parou de sorrir. De alguma forma, aquela garota era forte e ele precisava reconhecer isso.

— Se ela quiser ajuda, terá que ir à enfermaria sozinha. — A capitã se afastou e fez um gesto para que a seleção continuar. — Vamos acabar logo com esse teste, estou farta.

— Não acha que isso é demais? — Uma das integrantes murmurou para outra.

— Sim! Poderia ter acontecido com qualquer uma de nós. Ela nos trataria da mesma maneira? — Respondeu.

— Eu estou considerando sair…

A voz autoritária de Sato cortou o ar:

— E quem quiser sair do time, as portas estão abertas! Não há espaço para fracotes aqui. — Ela concentrou sua atenção no grupo de meninas à sua frente, mas de relance notou Hikari empenhando-se em sair dali.

Terumi lançou um último olhar para a amiga naquele momento, recebendo um olhar de volta. Mesmo com o tornozelo queimando de dor, ela tentou não mostrar a amiga. Jamais permitiria que a ruiva perdesse sua chance por sua causa.

Com o apoio da grade ao redor, ergueu-se. Fechou os olhos devido à dor que se espalhou, mas tentou evitar e seguiu em frente. Passo a passo, sozinha. Não buscava ajuda de ninguém, queria demonstrar a Yukari que nada a impediria de perseguir seus sonhos.

Seria aquele o verdadeiro desafio?

Após mancar bastante, chegou até o longo corredor que separava as estruturas da escola, distante da agitação da quadra externa, e ali desabou. Apoiada em uma das colunas, desabafou em lágrimas. A humilhação diante de todas aquelas pessoas, inclusive de sua amiga Terumi, doía. Não conseguira ser forte o bastante para suportar.

Imersa entre a dor e a melancolia, não percebeu a presença até sentir os dedos tocando seu tornozelo com delicadeza, assustando-a.

Um garoto cortês estava ajoelhado diante dela e notara a vermelhidão no tornozelo ferido.

— Posso te ajudar? — Ele perguntou ao tocar o tornozelo da garota pela segunda vez.

Hikari recolheu o pé rapidamente.

— E-Eu estou bem. — Respondeu. — Foi apenas um tropeço.

Ele a observou atentamente, sabendo que não se tratava apenas de um tropeço.

Ao tentar se levantar novamente, Hikari começou a mancar mais intensamente, a dor se intensificando e a fazendo parar no meio do caminho. Lágrimas teimosas começaram a escorrer por seu rosto.

— Um simples tropeço não causaria lágrimas tão dolorosas. — Expôs o garoto, aproximando-se novamente. — Com licença.

Huryome apenas consentiu para que ele examinasse seu tornozelo, deslizando os dedos desde a região até a lateral do pé. Ele percebeu o calor da pele, compreendendo que se tratava de uma torção, considerando outros sinais que observou. Finalmente, pôde entender a dor, ou ao menos parte dela.

— Queria ser mais forte…. — Ela sussurrou, capturando a atenção dele. — Mas acho que não tenho a capacidade para isso…

— Posso saber de onde você veio antes de eu encontrá-la?

— Vim da quadra externa…

— Alguém que conseguiu chegar até aqui com o tornozelo nessas condições quer mostrar mais força?

Ela olhou para ele.

— Não sei exatamente o que aconteceu com você, mas acredito que força não é apenas suportar a dor sozinha. — Ele afirmou, sentindo a pele lesionada queimar abaixo de seus dedos. — Existem outras maneiras mais inteligentes de demonstrar força. Não se torture assim. — Seus olhos rosados cruzaram com os olhos azuis dela. — Posso te ajudar? — Ofereceu a mão a ela.

— Por favor… — Ela segurou a mão dele. — Sim.

Quando chegaram à enfermaria, o garoto a deixou sentada na maca.

Antes que pudesse agradecer, a enfermeira apareceu, sem permitir que Hikari sequer soubesse quem era ele.

— Apenas evite lesionar o tornozelo novamente, não quero vê-la passando por isso outra vez. — Sorriu ao sair, deixando-a sob os cuidados da responsável pela enfermaria.

 

 

* * * * * *

 

 

Esse foi o primeiro contato deles, mas não se encontraram mais depois disso. Passaram-se dois meses, então. No entanto, enquanto frequentassem a Teiko, a chance de se esbarrarem ainda persistia.

— Não entendo, ela não é a líder? — Exclamou Hikari. — Por que ela te obriga a fazer essas coisas?

— Calma, Hika! — Terumi tentou tranquilizá-la. — Faz parte do treinamento…

— Fazer você ir até o treino de basquete só para saber o horário do jogo que será no final do mês é treinamento? — Revirou os olhos. — E ela não deveria saber disso, afinal?

— Está tudo bem. — Terumi suspirou. — E, além disso, não protestei para que a Sato não me exclua da equipe. De qualquer forma, você está feliz, não é mesmo? Vou me apresentar com o time oficialmente antes do jogo, por isso estou contente em buscar os horários.

— Ela age como se fosse a rainha do mundo… Claro que estou! Fico muito feliz por você, Teru!

— Espero que um dia você também faça parte da equipe.

— Ainda não desisti. — Disse determinada, mesmo que as lembranças daquele dia continuassem a assombrá-la. — Eu vou conseguir.

O ginásio estava tomado pela euforia, mesmo que o treino parecesse entediante. Aquilo era algo esperado, afinal, o time de basquete da Teiko sempre foi muito prestigiado.

Ao chegar à porta, Terumi tentou avistar o responsável, conforme Yukari havia mencionado que já estava ciente da situação, no entanto, ela estava começando a se sentir inibida no meio de tantos garotos.

— Teru, está tudo bem? — Perguntou Hikari, observando o rosto corado da amiga.

— N-Não estou acostumada com isso… — Respondeu, envergonhada.

— Talvez tenha sido por isso que a Yukari pediu para você vir. — Suspirou. — Aliás, agora entendi por que estou aqui também…

— E-Eu estou bem!

— Com esse rosto mais vermelho do que um tomate?

— N-Não está! A-Ah! — A ruiva abaixou-se, tentando conter a timidez.

— Sério? Não parece…

— Vocês estão atrás da grade de horários, não é? — Questionou um garoto, aproximando-se ao notar que uma das meninas estava usando o uniforme das líderes de torcida.

Hikari percebeu que Terumi não responderia prontamente.

Ao se virar, ela reconheceu imediatamente aqueles olhos rosados.

— Você? — Exclamou Hikari, surpresa.


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