As Crônicas de Aethel (Vol.III): O Enigma de Atlas escrita por Aldemir94


Capítulo 3
Os Arquivos de Salazar




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Ao longo daquele dia de triunfo, Mabel Pines sentia-se como se estivesse em um grande parque de diversões, cheio de luzes, fogos coloridos, guloseimas e diversões fantásticas.

A garota estava tão animada que não fazia questão de conter sua imensa felicidade, sempre fazendo questão de rir alegremente, comer doces a vontade e aproveitar as distrações de Aethel (desatento desde que leu um misterioso bilhete) para lhe roubar beijinhos açucarados na bochecha.

Enquanto isso, Dipper Pines aproveitava o tempo livre para explorar os inúmeros recantos do palácio imperial, cheio de curiosidade.

A cada nova porta que era aberta, Dipper deparava-se com salões rodeados por ouro, móveis de madeira nobre polida, esculturas feitas de materiais preciosos, joias reluzentes e as mais extraordinárias vestes já confeccionadas!

Em determinada sala, o gêmeo deparou-se com um lago artificial, rodeado por um jardim interno e um viveiro de aves exóticas, das cores mais vibrantes.

Em outro cômodo, o rapaz encontrou um mini-teatro, com camarotes decorados no estilo barroco mineiro, madeira dourada no palco, grandes cortinas de veludo vermelho, como o sangue de Aethel, e pó de fada, que se materializava nos mais diversos personagens, para encenar as peças mais maravilhosas que já foram escritas.

— E eu achando que a Pacífica era rica! – exclamou Dipper, enquanto continuava a explorar aquele lugar maravilhoso.

Após adentrar mais alguns quartos e recâmaras, sempre cheios das mais fantásticas maravilhas, Dipper cruzou um corredor longo e seguiu até chegar em uma porta branca, onde se via um dos brasões da monarquia Ryu (um simpático dragão europeu em posição de combate), logo acima de uma pequena bandeira do império.

Em nome da boa educação, Dipper bateu na porta, mas como ninguém respondeu, resolveu apenas entrar, respeitando o instinto aventureiro que um bom mistério lhe instigava.

O lugar era um escritório, pouco menor que o de Aethel, com algumas estantes de livros, quadros nas paredes, retratando homens de tez garbosa e trajados com togas, uma mesa desorganizada e algumas pilhas de documentos no chão.

A pouca poeira comprovava que o lugar já não recebia visitas há algum tempo, mas era o ar pouco fresco (resultado da janela fechada, que o rapaz logo abriu) que não deixou margem para dúvidas: independente de quem estivera pela última vez naquele escritório, não tinha intenções de retornar.

Vasculhando a papelada jogada no carpete, Dipper encontrou um pequeno caderno de anotações, onde leu: “James Salazar – 2° Cônsul do Império”.

Olhando ao redor, o gêmeo ajeitou o traje formal e começou a organizar a mesa, enquanto sentava-se na confortável cadeira, ainda em busca de mais segredos do antigo ditador.

Além das anotações no caderno, o gêmeo não encontrou mais do que alguns bilhetes aleatórios e um álbum de retratos, cheio de fotografias (havia até alguns daguerreótipos sinistros), antiga e novas, do cônsul em vários momentos de sua vida: via-se Salazar cumprimentando diplomatas, posando com figuras ilustres e até explorando selvas misteriosas.

Como a curiosidade só aumentava, Dipper abriu o caderno e começou a ler algumas passagens aleatórias, enquanto olhava de relance para a porta:

— “Disseram-me que a revolução está prestes a chegar aos portões do palácio, mas não me preocupo muito com isso. Em verdade, lamento que aqueles matutos do senado (provincianos que envergonham toda sorte de patrícios e homens eruditos). Por mim, que Antônio vá de encontro aos deuses”, meu Deus – disse o gêmeo – Ele odiava mesmo o pai do Aethel… Bem, vamos ver o que mais encontramos – continuou, enquanto folheava mais algumas páginas – “‘Antônio e sua família estão mortos’; não entendo como essas poucas palavras podem ter efeito tão satisfatório em meu ser, assim como me surpreendo com a simplicidade com a qual elas são proferidas. O homem que foi imperador e tantos inconvenientes me trouxe, simplesmente, não existe mais… e só. Mas, enquanto me encho de alegria com a gloriosa notícia, admito que ela me lembra da finitude da vida e do quanto nossas conquistas são efêmeras. É estranho ver os vermes do populacho, que a poucos meses louvaram Antônio como um semi-deus, perseguirem-no com a fúria típica das turbas inferiores; esses parasitas que vivem às custas do império, deveriam sucumbir junto da casa Ryu”...

Caminhando até a janela e admirando a paisagem distante, Dipper ajeitou os cabelos castanhos e curtos, bateu o pé algumas vezes no parede, de leve, e começou a falar consigo:

— Cara… ele era mesmo um vilão. Acho que nem a Pacífica tinha tanto desprezo pelo povo. Como é que alguém assim consegue virar cônsul?! Bom, não é como se gente assim nunca conseguisse um empreguinho no governo; acho que político é tudo igual, independente do mundo…

Folheando mais o caderno, Dipper encontrou anotações referentes a coroação de Aethel, não podendo deixar de rir:

— “20 anos de trabalho extenuante… e agora, sou obrigado a ver um moleque ignorante e sem qualquer sangue nobre, se tornar a pessoa mais poderosa do mundo. Os deuses me testam! Eu só gostaria de saber de onde esse camundongo veio, mas isso não importa; talvez esse inseto acabe me servindo para alguma coisa. Apesar de tudo, tenho tido algumas ideias interessantes, a começar por um crescente interesse em Carlos – esse eterno tolo – e seu lixo histórico, que mofa na biblioteca imperial. Também tenho achado graça em fazer visitas aos arquivos do senado e ler sobre as decisões que, ao longo dos séculos, tornaram-se jurisprudência oficial. Naturalmente isso tudo é chato e, quase sempre, inútil. Mas, como temos um novo imperador agora, talvez estudar um pouco mais de lei não seja tão ruim”. Minha nossa, o Salazar era pior que o Gideon. – suspirou Dipper.

Fechando o caderno, o garoto explorou mais alguns cantos do escritório, na busca de portas e passagens secretas, porém, como não as encontrou, decidiu ir embora com o caderno em mãos.

A cada nova passagem das anotações, Dipper revirava os olhos, mas não perdia tempo em seguir para os escritos seguintes, que se tornava cada vez mais interessantes:

Uma lei antiga, escrita ainda na primavera dos tempos, talvez seja a chave para a queda de Aethel. Sua vitória em Nimrod foi um contratempo perigoso para mim, mas o mais incômodo foi descobrir que os jovens que ele tem abrigado não são meros pesos inúteis. Contaram-me que o tal de Jack é um dragão, talvez vindo das montanhas. Além disso, há boatos de que o menino de olhos azuis (Manny, Henry, Davy, ou qualquer lixo como esse) invoca os poderes do mundo inferior, como um príncipe dos exércitos infernais e, de forma diabólica, possui o poder dos mortos em suas mãos; temo que as almas dos antigos reis do passado estejam protegendo Aethel e aqueles a quem sua bondade puder alcançar. Naturalmente, ainda considero isso tudo apenas um monte de bobagens; mera propaganda monarquista. Presumo que seja apenas parte da mitologia que, cada vez mais, se forma em torno da criança Ryu.” Mas como ele era falso! Eu achava que o Bill Cipher era um cara de pau, mas o Salazar vence com folga!

Enquanto cruzava os corredores, Dipper acabou distraindo-se e indo parar em um jogo de escadas que o conduziram para um bonito e amplo quarto, mobiliado como nos tempos de Vitória, onde uma moça muito bonita afagava um gatinho de raça indefinida:

— Olá – disse ela, com um sorriso – Você parece um dos meninos que desfilou com o Aethel, hoje de manhã. Como se chama?

— Me desculpe, não queria invadir. Eu me chamo Dipper.

O garoto admirou os cabelos cor de trigo daquela mulher, seus olhos verdes como a grama do campo e o vestido simples de cetim azul, enquanto tentava esconder o rubor que já tomava conta de sua face, mas a moça não pareceu se incomodar com a invasão.

Apresentando-se como Agnes, a mulher alegou estar esperando seu marido, mas convidou o garoto a se sentar e comer alguns bolinhos de mel e tâmaras, enquanto bebia leite de cabra.

Enquanto apreciava a refeição (servida em uma pequena mesa de três pernas), Dipper contou a moça sobre suas explorações e, como Agnes parecia suficientemente confiável (tanto por viver no palácio, quanto por mostrar-se hospitaleira) o gêmeo decidiu confidenciar a ela sobre as descobertas que fizera no antigo escritório de Salazar.

Ajeitando os longos cabelos, ela pediu para ver o diário:

— Meu Deus! – exclamou a moça – Eu nunca li tantos absurdos. Salazar deve ter sido uma pessoa horrível. Veja o que ele diz nessa passagem, “Juba serviu-me como um cão treinado. Agora que Aethel salvou seus agregados das mãos do Cavaleiro Verde, sei que sai como o grande vencedor. O atestado disso foram os minutos em que o moleque coroado confabulou com o cavaleiro e aquela mulher ridícula, Nealie. Aethel ficou em silêncio sobre o conteúdo da conversa, mas sei bem de seu resultado futuro e, quando Deus buscar seu servo real, poderei enfim dormir tranquilo. Agora tenho outros problemas em mente: aniquilar a praga franco-armâniana e lidar com a questão dos ‘amigos do rei’’”. Não vi esse tipo de coisa nem com Vortigern. Acho que ele estava querendo se tornar rei no lugar do senhor Aethel.

— Ele estava – respondeu Dipper – Muita coisa aconteceu naquele dia mas… – de repente, o gêmeo percebeu uma avaria na lateral interna da contracapa do diário, que se revelou como sendo o esconderijo de um documento menor e amarelado. 

Não era grande coisa, deve-se dizer: um mero papel dobrado com relativo esmero, selado com uma pequena fita branca desbotada.

— Ei! – exclamou Dipper – Que coisa é essa?

Abrindo o papel antigo, o gêmeo arregalou os olhos, enquanto lia seu conteúdo:

— “Armário 293 – Bib. Imp. – Code. 1748 - A.W. – J.M.”; o que quer dizer? 

— Espera alguma ajuda? – perguntou uma voz pouco animada.

Levantando o olhar, o gêmeo deparou-se com Gael, a quem chamam “Sombrio”, encostado na porta, com ares de poucos amigos.

Suas botas pisaram firmes no recinto, os fios de prata reluziam no gibão negro e as capa parecia trazer a própria escuridão da noite, apenas para revelar pontos brilhantes, como estrelas do céu noturno.

De rosto jovem (algo entre 20 e 30 anos), seus cabelos curtos e negros não deixavam margem para dúvidas sobre serem bem cuidados, assim como a ausencia de barbas ou bigodes.

No entanto, era através de seus olhos cinzentos que Gael intimidava até mesmo reis.

A juventude estava no mago, mas sua idade real contrastava com a aparência física, considerando que esse era pouco mais novo que Merlin.

O mago questionou o gêmeo sobre a razão de estar ali, não se animando muito com a explicação do garoto, que centrava-se na mera coincidência que o permitira chegar até o quarto de Agnes.

No intuito de atestar a veracidade de suas palavras, Dipper mostrou o diário de Salazar, juntamente com o papel recém-descoberto, que muito interessou a Gael.

Enquanto o feiticeiro averiguava os documentos, o gêmeo não pôde deixar de se perguntar sobre a razão de Gael estar ali:

— Desculpe, Gael, senhor, mas… Porque está aqui? Esse quarto é muito mais afastado do que os outros.

—Porque ela me aguardava – respondeu Gael, sem tirar os olhos do diário.

— Ela? Espera, mas então quer dizer que vocês são… Entendi. Acho que Mabel não vai gostar disso. Ela vai reclamar que não pôde organizar a festa…

— Quando me casei com Agnes, senhor Dipper, sua irmã e você nem eram nascidos… Muito bem. Esse diário deve ser levado até Aethel; é minha obrigação, como conselheiro real. Mas acho que o imperador tem mais coisas com as quais se preocupar. – após uma pausa, Gael ajeitou os cabelos negros e fitou o gêmeo, com ares de dúvida – Algo me diz que as coisas vão ficar complicadas daqui para frente, mas não quero que Agnes se envolva nisso. Ouça, Dipper Pines: Aethel, o garoto fantasma e aquele dragão ocidental inconveniente; todos eles têm algo a oferecer a Távola Redonda. Até sua irmã, Mabel, serve para alguma coisa… Mas e você?

Dipper pensou em bater de frente com Gael, mas optou por baixar a cabeça e olhar para os sapatos lustrados, enquanto as palavras do mago lhe acertavam como facas.

— Gael – disse Agnes – Não precisa falar assim com o menino. Cada um ajuda como pode. 

— Não desejava ofender – respondeu o mago –, apenas constatar o óbvio: Dipper Pines, sem o diário 3, você é pouco mais que um inútil. 

Olhando para o lustre do quarto, Gael suspirou:

— Muito bem. É claro que Aethel vai querer explorar os segredos do diário, na busca de mais aventuras; um menino ainda é um menino. Mas acredito que isso não vai acabar bem. Nunca acaba… Porém, talvez sua descoberta, pequeno Dipper, seja fruto dos desígnios divinos. Considerando isso, acho que a Távola Redonda não pode carregar mais um “peso” nas costas; mas o que devo fazer? Tudo bem. Acho que Merlin não vai se importar se eu lhe der um presente…

Tendo dito isso, Gael abriu sua mão esquerda e fez surgir chamas verdes e sinistras que logo se dissiparam, revelando um antigo livro, de capa dura, reforçada com pequenas placas rebitadas de cobre em suas extremidades.

A capa também possuía o desenho de uma mão destra com seis dedos, feita com papel dourado, onde se via nitidamente um “4” pintado com tinta preta, provavelmente de algum marcador antigo e de baixo valor.

Dipper arregalou os olhos e disse, após limpar os olhos:

— E-eu, eu não posso acreditar. Existe um quarto diário?! O tivô Ford disse que só criou três!

— Não tenho certeza se isso foi obra do senhor Stanford (aquele tolo). Roubei o diário 4 de um gnomo cujo nome já esqueci; ele sofria com algum feitiço qualquer, mas como não tenho nada haver com isso (e como ele parecia feliz), apenas ignorei o fato… Quando penso no assunto, me pergunto se não fui eu quem o enfeiticei. Não importa, passado é passado. Espero que você não seja mais um imprestável, pequeno Dipper, até porque sua irmã vai precisar de toda a ajuda e proteção.

— O que quer dizer com isso? A Mabel está em perigo?

— Como um animal que pressente a tempestade – começou Gael –, a grande floresta sombria estremece com o aproximar de alguma coisa sinistra, que nem eu posso identificar. Alguém está chegando, seja para o bem ou mal. Mas não quebre a cabecinha pensando nessas coisas; o que tiver de vir, virá no tempo apropriado. Agora saia logo daqui, antes que eu o transforme em milho para meu corvo de estimação.

Sem esperar segunda ordem, Dipper correu dali, deixando Gael e Agnes sozinhos.

A mulher começou a rir gostosamente e, olhando para Gael, falou:

— Não precisava tê-lo deixado com tanto medo, hahaha. Ele não fez nada de mais, além de me fazer companhia; afinal, você estava muito atrasado.

— Eu sinto muito pelo atraso – desculpou-se Gael –, mas aquele garoto parecia estar aéreo demais, então achei que um pequeno susto o traria de volta a si, entende?

— Eu entendo, Gael. Mas não precisa fazer esse tipo de coisa. Agora vamos para o baile, está bem? Quero muito dançar com você, como fazíamos antes.

— Temos mesmo que ir? – perguntou o mago – Podemos passar o tempo em algum lugar mais tranquilo. Não gostaria de ver a Lua no bosque das fadas?

Agnes se aproximou do mago e encostou a cabeça em seu manto negro:

— Sei que não gosta desses eventos, mas quero vê-lo conversar com outras pessoas, rir um pouco; quero vê-lo feliz.

Gael abraçou Agnes, com ternura, respondendo a ela:

— Sou feliz, minha querida, desde o dia em que você despertou. Agora, vamos logo para o baile, antes que mais alguém invada o palácio e estrague a festa. Espero que Nealie não tenha sido convidada.

Agnes riu e, de mãos dadas com o marido, saiu do quarto; ambos sorriam, enquanto seguiam até o grande salão de bailes…


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