Os olhos vermelhos dele queimavam nos meus.

Eu não sabia o que falar, não tinha reação. Se meu coração ainda batesse, eu sei que ele estaria descompassado nesse momento. Ele sorriu pra mim, seus caninos à mostra. Então, ele me puxou pra floresta. Eu deixei ele me puxar, pois meu cérebro estava tentando processar as informações que o invadia furiosamente.

Todd Royans estava me puxando pra floresta. Ele, que foi o meu primeiro amor, e único até agora, estava me fitando curiosamente, diante daquela escuridão tão insana.

Essa visita me trouxe algumas memórias...

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Fevereiro de 1824

-Todd, veja aquelas flores, que lindas!

-Nenhuma flor é mais bonita que você, baby.

Nós dois estávamos sentados num tronco de árvore, observando o grande esplendor da primavera, que acabara de chegar depois daquele tormentoso frio.

Todd e eu estávamos fazendo planos de casamento.Eu era jovem, mas em 1824, uma jovem de 17 anos se casando era mais comum do que vocês imaginam.

Eu e Todd namorávamos há 2 anos.

Naquela pequena clareira perto das árvores, nós sempre ficávamos observando a natureza em movimento. Eu sempre fugia do orfanato pra ver Todd, e era ali que nos jurávamos amor um ao outro.

Ele tomou uma flor em suas mãos e colocou em meus cabelos. Eu sabia que estava corando toda envergonhada, mas ele estava rindo.

E então infelizmente a guerra estúpida chegou. Nós tivemos que nos separar e ele foi pra fronteira.Na noite anterior, nós havíamos nos encontrado, e ele me pediu em casamento, mostrando um formoso anel dourado com uma enorme pedra. Obviamente eu aceitei, uma vez que não esperava mais nada da vida.

Ele se foi com a promessa de que quando tudo estivesse acabado nós iríamos ser muito felizes.

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Mas aquele rosto não era da mesma pessoa que eu havia amado há 175 anos atrás.

Os olhos vermelhos dele estavam quase pulando dos olhos, e por mais que eu me esforçasse pra encontrar qualquer mínimo detalhe do Todd que eu verdadeiramente amei, eu não encontrava nada.

Eu não sentia nada mais por ele. Eu tinha que admitir pra mim mesma esse pequeno fato.

-Val, eu estou de volta! – ele disse as palavras com uma alegria tão imensa que era impossível não reparar.

-É eu estou vendo.

Ele estava me puxando para um beijo, mas eu o impedi, me desculpando e dizendo que tinha um trabalho pra fazer aquela noite. Eu tinha que trabalhar no baile.

Entreguei-lhe as chaves da minha casa, e educadamente  mandei ele sumir, ele concordou e sumiu pela floresta.

Todd teria muito que me explicar essa noite.

E eu esperei por ela durante175 anos.

Rapidamente coloquei minha máscara interna, e entrei sorrindo, enquanto os homens à minha volta assoviavam.

Tontos. Mal sabiam eles o que lhes aguardava.

Ângela me encontrou lá. Ela me conhecia bem demais pra eu ter que inventar qualquer desculpa pra ela. Disse apenas o necessário e continuei normalmente à noite.

Eu trabalhei na barraca de bebidas com Mark durante 2h e então os outros vieram assumir seus turnos.

Eu aproveitei que o lobinho estava muito ocupado e chamei Ang pra dar um “passeio”.

Atraímos dois jovens ao nosso encontro. Eles vieram sem titubear.

Bom, o final vocês já sabem.

O baile estava animado e eu aproveitei pra fazer uma coisa que eu não fazia há muito tempo: Dançar.

Dancei animadamente durante a noite toda. Verdadeiramente, eu não queria chegar a casa e confrontar Todd. Ainda não.

O lobo veio ao meu encontro. E me arrastou com ele pela floresta.

Droga era a segunda vez que faziam isso comigo nessa noite.

-Escuto aqui – ele disse com um tom raivoso – Eu sei que tem outras sanguessugas aqui com você.

-Sim, a de sempre, Ângela. –eu disse com casualidade e tentando dissipar meu nervosismo.

-Sua sanguessuga idiota! Não pense que você pode me enganar. Eu vi você conversando com um antes da festa começar.

Droga! Esse lobo é realmente um detetive. Eu não disse mais nada. Soltei-me e olhei pra ele com olhos enfurecidos.

Quando eu estava saindo ele me puxou novamente.

- Se seus amiguinhos fizerem qualquer coisa contra qualquer pessoa nessa cidade e eu ficar sabendo, considere você e eles MORTOS!

-Ótimo. Só fico triste por saber que você não vai ter esse gostinho.

Finalmente eu me livrei dele. Chamei Ang e nós fomos embora. Ela me deixou em casa e me disse pra pensar com calma em qualquer coisa que eu fosse fazer.

Quando eu entrei, me deparei com Todd sentado em meu sofá com uma garrafa de sangue, das muitas que eu mantinha na geladeira. Aliás, havia muitas delas no chão da sala. Ele parou subitamente quando me viu. A TV que estava sintonizada num jogo qualquer de baseball estava silenciosa agora. Ele terminou de beber o sangue da garrafa e veio correndo em minha direção.

Ele novamente estava prestes a roçar seus lábios nos meus quando eu desviei a minha cabeça subitamente.

- Ei gatinha, o que tá acontecendo contigo? Tá me evitando, é?

-Desculpa Todd, mas eu acho que 175 anos mudaram um pouco as coisas entre nós.

-Eu não parei de pensar em você durante 1 minuto em todos esses anos.

-Ah é? Então porque você passou 175 anos sem me dar qualquer resposta. Eu pensei que você estivesse morto Todd. MORTO! E você nem pra me falar nada. Eu pensei em você durante um bom tempo, e você não sabe o quanto me doeu ver você estirado naquele chão sujo totalmente inerte.Eu sei como é passar pela transformação.Você sente tanta dor que não consegue se mexer.Parece que cada músculo do seu corpo pesa 25 quilos, mas por que você não me esperou? Por quê? Eu esperei mais de você Todd.

A verdade me dói agora, e apesar de eu ser uma vampira e não ter sentimentos vivos em mim, o que você fez comigo deixou marcas profundas, que nem mesmo a transformação pode arrancar.

-Me desculpa Val. Eu estava com sede demais. Nem raciocinei. Mas agora eu estou aqui. Isso que é importante não é mesmo? Nós podemos começar uma nova vida juntos.

-Posso ser sincera com você Todd? Preferiria que você estivesse morto, assim eu teria sido poupada de ouvir isso.

-Jamais esperaria escutar essas palavras de você, Val.

-E eu jamais esperaria que você me abandonasse. Eu te amava, Todd.

-E porque está usando o tempo pretérito?

-Porque isso é passado. Não sinto mais nada e ponto.

-Me dê apenas uma chance então, Val.

-Não.

-Pelo menos posso passar a noite aqui, e pegar um avião amanhã?

-Você nem dorme.

-Posso?

-Ok. Eu vou subir. Quero tirar essa maquiagem e tomar um banho. Pode descansar no quarto de hóspedes. Venho, eu te acompanho.

E nós dois subimos as escadas. Era fácil ver a decepção em seus olhos. Mas porque eu ficaria com alguém que não significa mais nada pra mim? Não valia a pena.

Além do mais ele arriscaria tudo o que eu tenho conquistado dia pós dia.

Ele não tinha controle e não poderia conviver com os humanos. Isso me causaria mais problemas ainda.

Nós trocamos algumas palavras, e ele comprou a passagem via internet. Antes de eu sair, lembrei-me de avisá-lo pra não se alimentar de nenhum humano enquanto estivesse nessa cidade.Desejei profundamente que ele tivesse me ouvido.Depois disso eu me refugiei no meu quarto, e juro que se fosse possível chorar, as lágrimas estariam encharcando minha cama nesse momento.

Eu me levantei bem cedo. Já tinha descansado o suficiente e queria me despedir de Todd. Sem fazer qualquer ruído, eu entrei em seu quarto, mas ele não estava lá.

Foi quando eu ouvi uma série de barulhos vindos da floresta.

Desci correndo as escadas e quando saí me deparei com o a cena mais perturbadora que poderia haver no meu pesadelo mais oculto.

Todd estava com a boca cheia de sangue e presas à mostra, enquanto um lobo pulava corria em disparada em sua direção.

Minha primeira reação foi:

-PAREM AGORA! –eu gritei o mais alto possível.

Droga. Por que simplesmente não me ouvia nesse mundo?