Café com Hollywood escrita por Guillherme DiCarmello


Capítulo 2
Capítulo 2:...e realidade




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A sala de reuniões era grande e por ser parte de uma revista de decoração se era esperado que fosse digna de uma decoração incrível, bela e estonteante, mas para quebrar as expectativas, não era. A realidade era uma sala de reuniões igual a todas as outras: Uma mesa preta e grande, feita de um material que definitivamente não era madeira (Noah achava que era alumínio e Tiago achava que era granito) no meio da sala com cadeiras giratórias pretas para combinar com a mesa. No lado da sala que ficava de frente para mesa, uma televisão para apresentações e chamadas de vídeo e na lateral da sala, a típica parede de vidro que podia ficar fumê em casos de privacidade.

—- É o Michael que não usa essa sala ou é a  gente que não comparece as reuniões? – Tiago sussurrou para Noah

—- A primeira opção, com certeza – Noah se sentou ao lado do amigo – Olha essa sala! Todo esse tempo a gente discutia sobre o trabalho nos nossos escritórios e tínhamos isso.

—- Eu sei, é inacreditável. – Tiago balança a cabeça em reprovação – Eles deviam avisar sobre isso pra gente.

Depois de alguns minutos esperando, Michael entra pela porta. Um homem branco que não parece ter os seus 65 anos, com um belo cabelo loiro e olhos cor de mel que dão um ar simpático para seu rosto. Normalmente, o rosto de Michael sempre tinha o seu famoso sorriso, formado pelos seus dentes brancos que Michael adora se gabar de terem sido clareados no tom perfeito (e que foi tudo um achado de um app de cupons), mas naquele dia, ele não estava tão sorridente.

—- Olá pessoal, como estão? – O pessoal respondeu e Michael assentiu – Bom, bom. Eu juro que eu realmente não sei como botar isso de uma maneira que seja fácil de lidar.

—- Lá vem bomba...– Noah sussurrou no ouvido do amigo

—- Chegou a hora, Noah – Tiago respondeu – Vamos participar dos Jogos Vorazes da empresa

—- A DecoRama está passando por um momento delicado financeiramente e os superiores decidiram que a revista vai passar por um rebranding para não falir. Então, infelizmente vamos ter que fazer cortes de gastos e isso significa – Michael respirou fundo – Que vamos ter que demitir alguns de vocês.

—- Mas quantos de nós? – Uma funcionária ruiva que Tiago reconhecia como Gia perguntou – E é só no nosso setor?

—- Não Gia, não é só no setor de vocês – Michael disse – E os demitidos, serão todos os que estão nessa sala.

—- O quê?! – Noah exclamou, incrédulo – Como assim, todos nós? Michael, por favor, pense melhor, isso não é justo com a gente.

—- Ele tem razão – Gia assentiu – As duas últimas edições estão fazendo um sucesso em vendas e nós somos as pessoas que tivemos essas ideias. Nos mandar embora pode fazer a DecoRama falir de vez!

A reunião começou a sair do controle quando os protestos começaram a ficar mais altos e com tons mais agressivos. Gia, Noah, Dalila e os outros funcionários estavam querendo respostas enquanto Tiago só sabia olhar para os rostos de seus colegas de trabalho e abria a boca para dizer algo, mas não conseguia achar a maneira de começar a protestar pelo seu emprego. Mesmo com a notícia sendo um tapa na sua cara, Tiago estava sentindo que a ficha ainda não estava caindo e sentia como se um balde de água gelada tivesse caído sobre ele.

Mas aos poucos, o choque deu lugar a um outro sentimento, o de desespero. Inúmeros pensamentos começaram a correr pela mente de Tiago naquele momento.

“Nãonãonãonãonão, isso não tá acontecendo.”

 

“E agora?”

 

“O que eu faço?”

 

“O Cadu também trabalha aqui, será que nós dois fomos demitidos?”

 

“Como eu vou contar pros meus pais?”

 

“Será que eu vou ter que voltar pra casa deles?”

[...]

Tiago não lembra quanto durou a reunião e quando se deu conta, já estava de volta no próprio escritório. Tudo aconteceu tão rápido que quando ele se deu conta, estava colocando a primeira edição que teve uma ideia sua, com a entrevista e a assinatura de uma cantora que ele cresceu ouvindo que as lágrimas começaram a cair pelo rosto. Ele estava com medo, medo de não conseguir outro emprego, medo de não conseguir achar um lugar tão bom quanto esse, medo de ter que largar o lugar que sonhou tanto em morar e ter que voltar para a casa dos pais.

Não conseguia entender a razão de tudo aquilo, tudo parecia tão óbvio, mas ele não queria aceitar o que estava acontecendo. Será que ele se distanciaria de Noah? E os amigos que eles fizeram ali? Eles continuariam? Ele tinha lutado tanto para realizar as suas expectativas e no final, tinha tudo ido pelo ralo.

—- Oi? – três batidas na porta – Ti? Cê ta bem?

—- Oi, amor. – Tiago limpou as lágrimas do rosto – Eu nem sei, pra falar a verdade.

—- Dante acabou de me contar sobre o que tá acontecendo – Tiago sentiu os braços de Cadu o abraçando por trás e o seu beijo no pescoço – Não pensei que você seria um dos demitidos, você fez um trabalho até que legal aqui.

—- É, eu fiz – Tiago fechou a caixa com seus pertences

Carlos Eduardo, ou Cadu como os amigos ou o namorado chamava ele, era o tão declarado amor da vida de Santiago. Os dois se conheceram depois de uma festa de um dos amigos de Carlos no segundo semestre de faculdade quando um garoto desastrado derrubou um mojito de pink lemonade na camisa novinha dele e Tiago foi o único que se importou o bastante para o ajudar a tirar a mancha da camisa. 3 semanas depois, eles estavam juntos, planejando o futuro e sonhado em um lugar só para eles.

Cadu e Tiago tinham suas diferenças e a maneira que foram criados era uma delas. Enquanto Tiago levava seu emprego e as oportunidades a sério por vir de família humilde, Cadu podia se dar ao luxo de não levar tudo muito a sério já que veio de uma família rica, com direito a viagens para a Europa no verão e carro do ano no aniversário de 18 anos.

— Agora que eu perdi o emprego, o que a gente faz? Qual o próximo plano? Você também foi demitido?

—- Não, não. – Cadu diz – Amor, eu não perdi o emprego.

—- Quê? Você não perdeu? – Tiago pergunta e o namorado confirma a resposta, tirando um suspiro de alívio de Tiago – Mas, nós fomos contratados na mesma época, eu pensei que...

—- Que...? – Cadu deu ombros – Não acho que eles demitiram com base nos últimos a serem contratados. Podem ter sido outros motivos, entre alguns do pessoal aqui, tinha gente contratada faz um tempo, coisa de cinco, seis anos.

—- Bom, pelo menos você continua no emprego, uma coisa boa no meio desse desastre – Tiago lamenta – E pensar que aqui era meu sonho e eu não consegui ficar nem 1 ano direito. Pensei que depois de tudo que tinha feito aqui, eu já tinha carreira garantida aqui.

—- Não é como você tivesse feito tanta coisa assim, amor – Cadu debocha – Não é pra tanto.

—- Quê? Cadu, eu fui contratado pra ser secretário de um organizador da revista – Tiago se solta do abraço do namorado – Ele foi demitido um mês depois da minha contratação e eu consegui convencer o próprio Michael que eu poderia ficar no lugar dele, me saindo melhor que o cara. E eu consegui manter números maiores e uma recepção superior que a do cara que era pra ser o meu chefe.

—- Tá amor, mas vamos ser sinceros, se fosse tão superior assim, você teria continuado aqui, não é? – Cadu se aproximou – As vezes a gente...

—- E aí, Carlos Eduardo? – Tiago falou, em tom de indignação – Custa você me dar um apoio nesse momento? Eu não to pedindo pra você beijar meus pés, mas pelo menos tenha a porra da empatia.

—- Mas o que foi que eu fiz? – Cadu questionou assustado

—- Eu to aqui sofrendo por que eu acabei de ser demitido do emprego que eu sempre quis ter – Tiago esbravejou – E primeiro você fala que eu fiz um trabalho “até que legal”, depois fala que eu não fiz tanta coisa aqui e agora tá desmerecendo todo o meu esforço aqui como se eu não tivesse feito nada

—- Santiago, eu sei que você tá triste – Cadu revirou os olhos – Mas eu sei como você fica quando tá assim e você vai ficar se remoendo por dias e dias e eu to aqui tentando só impedir que você entre nesse buraco.

—- E a sua maneira de fazer isso é desvalorizar o que eu fiz nessa revista? – Tiago rebateu – Cadu, eu recebi essa notícia não deve ter nem 1 hora e meia. Pra você ver, eu nem sei quanto tempo durou aquela reunião, eu fiquei em um puta estado de choque. Que é que tá acontecendo pra você tá tão grosso e insensível desse jeito?

—- O que tá acontecendo é que eu cansei, isso não tá funcionando. – Cadu disse, bravo – Já tem um tempo que não tá funcionando mais. Você só liga pro trabalho, eu tenho que ficar tendo cautela pra falar com você senão você fica todo bravo, gritando comigo.

—- Quê? Da onde que você tá tirando tudo isso? Eu sempre te tratei bem, sempre te dei atenção. – Tiago, disse com os olhos marejados – De todos os momentos, você tá escolhendo esse pra dizer que quer acabar com tudo?

—- Quer saber, chegando em casa, a gente conversa – Cadu foi para a saída do escritório – Não vou ficar fazendo barraco na empresa que eu trabalho.

[...]

—- Ele o quê?

—- Ele disse que não tá mais dando pra ele – Tiago repetiu as palavras dele – E eu acho que é isso mesmo.

—- Que babaca. Você perde o emprego e ele não espera nem um dia passar pra já falar que quer acabar com tudo? – Tiago assentiu, fazendo Noah desaprovar com a cabeça – Cadu não era assim não, ele tinha respeito, ele te amava, o que que aconteceu?

—- Eu não sei, amigo, eu não sei. Mas pelo menos a gente pode conseguir aproveitar a noite né? – Tiago deu um gole da sua bebida – A gente pode ficar de bobeira essa semana até ir procurar por um emprego novo.

Depois da briga entre os dois, deu algum tempo até Noah aparecer, chamando para se juntar com o resto dos demitidos que iam se encontrar para tomarem uma bebida já que não havia como serem recontratados. Tiago achou uma boa ideia, assim ele poderia esquecer um pouco do dia caótico que foi e pensar um pouco no seu próprio futuro

—- Fale por você – Noah sorriu – Assim que meu pai souber da novidade, ele vai achar algum lugar pra me colocar pra trabalhar enquanto eu não acho coisa melhor. Ele sempre foi assim.

—- Parando pra pensar, eu já vi seu tio e tia, mas você nunca falou muito dos seus pais – Tiago questionou, se arrumando na cadeira do bar – Como eles são?

—- Eles são gente boa – Noah contou – Eu não morava com eles na época da escola por causa do meu primo, ele trabalhava bastante, tava viajando toda hora e meus pais o ajudavam. Mas somos uma típica família latina: somos companheiros, adoramos uma festa e o mais importante, aproveitamos a companhia daqueles que confiamos.

Quando Noah e Tiago se conheceram, Noah estava se escondendo dentro do banheiro do colégio no segundo ano do ensino médio por alguma razão, talvez fosse medo de sofrer bullying de alguém por causa da mochila das Winx que ele usou durante o primeiro mês de aulas (o cachorro do tio tinha destruído a dele e só sobrou a da prima) ou por causa dele estar começando em uma escola nova, longe dos pais e morando com os tios. Ao ver Tiago entrando no banheiro, acabou se descuidando e deixou sua mochila cair no chão, o que fez o tema de abertura do desenho tocar e fez Tiago contar uma piada sobre necessidades físicas das fadas (e de quebra, cantar uma paródia da música). Noah decidiu abrir a porta e eles têm sido inseparáveis desde então. Fizeram projetos escolares, apresentações, amadureceram, fizeram a mesma faculdade (com os pais de Noah agradecendo por conseguir trazer o filho para a cidade deles) e até na mesma empresa entraram. Juntos em tudo, nos altos e nos baixos.

—- Quem diria, entramos na mesma faculdade, na minha empresa – Tiago riu – E até fomos demitidos no mesmo dia.

—- Estamos conectados, meu amigo. – Noah levantou seu copo em um brinde – Um brinde às amizades eternas.

O celular de Noah começou a tocar, seu ringtone lembrando uma música de EDM que você consegue encontrar em uma rave ou festival com o nome e foto do pai dele, Edoardo. Noah atendeu com um sorriso no rosto e Tiago acompanhou enquanto o sorriso ia desaparecendo do rosto dele e seus olhos ficando mais arregalados e a preocupação ficando nítida em sua voz.

—- Mas alguém sabe o que aconteceu? – Noah perguntava – Ele já ta no hospital? Claro, claro, tá bom, eu to indo pra aí. Para com isso pai, ele precisa da família com ele. Tá bom, tá bom. Eu to indo, tchau, te amo também.

—- O que houve? – Santiago disse

—- Meu primo tá no hospital. Ele tava trabalhando em um set de filme, se sentiu mal e desmaiou no meio da comemoração de encerramento e na hora da queda, acabou atingindo a cabeça. – Noah explicou – Eu tenho que ir no hospital, quer vir comigo? Você sabe que você é da família e eles não vão achar problema com isso.

—- Não, não. É melhor você ir sozinho, você precisa ver como ele tá e eu nem conheço o seu primo, imagina conhecer ele pela primeira vez quando ele sofrer um acidente? – Santiago bebeu o resto da sua bebida – E além do mais, eu tenho que me resolver com o Cadu. Vou tomar mais uma com a galera aqui e já vou indo pra casa.

—- Ok, então, fica bem! Aproveitem galera! – Noah se dirigiu pra saída do bar, se despedindo – E pede um Uber hein, Santiago!

—- Não se preocupa, eu não vim de carro. – Santiago gritou de volta – Quem quer mais uma rodada?

[...]

Eram 1h30 quando Tiago tinha chegado em casa, tinha bebido mais três mojitos maravilhosos, tinha sido levado para casa por um Uber muito lindo (e que ele tinha certeza que queria levar ele em um encontro) e tinha recebido uma mensagem de Noah dizendo que o primo estava bem. Ao chegar em casa, percebeu que a luz estava acesa e a TV ligada em um canal de notícias de celebridades, com dois apresentadores com expressão séria conversando em uma mesa redonda do estúdio, no fundo a imagem de um homem moreno, de cabelos cacheados, olhos da cor de âmbar e um sorriso lindo, que chama a atenção. Tiago reconheceu na hora o moço como Manny Moraez, um ator de Hollywood que estava muito popular no momento.

URGENTE: O astro de filmes de Hollywood, Manny Moraez acaba de dar entrada em um hospital. A razão é desconhecida, mas hiato na carreira pode ser anunciado de acordo com fontes próximas”

—- Nossa, tá todo mundo no hospital. É o primo do Noah, agora o Manny Moraez – Tiago balançou a cabeça – Tá todo mundo ficando mal.

Algo se mexe no canto esquerdo da visão de Tiago, o fazendo virar para encarar com receio, mas relaxando ao perceber que a janela da cozinha estava aberta, fazendo o vento lá fora abrir a porta do quarto do casal. A luz estava aberta e Tiago sabia que Cadu estava em casa, ele nunca deixava a luz do quarto acesa. Tiago foi caminhando lentamente com medo de acordar o namorado, caso ele estivesse dormindo (e também porque ele estava meio lento por causa das bebidas), mas quando na porta, se deparou com uma visão que ele definitivamente não esperava.

Na sua frente, estava Carlos Eduardo, deitado na cama, nu e com um outro homem com os braços entrelaçados no pescoço dele. Seu rosto estava enterrado no espaço que havia do lado de Cadu e ele não conseguia identificar quem era o outro homem. A visão que estava a sua frente levou um tempo para que fosse entendida por Tiago, por causa das bebidas, mas não levou muito tempo até ele entender e até ele saber como reagir.

—- COMO VOCÊ PODE?! – Tiago berrava – COMO VOCÊ PODE FAZER ISSO COMIGO, SEU BABACA?


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