Laços Inquebráveis escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 5
Capítulo 05 — Hora de Partir




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O cair da noite se aproximava. Isso fazia com que Emmett se sentisse ainda mais culpado e aflito com o sumiço de Makena. Embora tenha insistido em sair à procura dela, foi convencido por Carmen e Eleazar a permanecer na sede. Deixar que um grupo de pessoas, que conheciam a região, tentassem encontrá-la e trazê-la de volta. Brutos, o cachorro da família participava das buscas.

O tempo todo, Emmett andava de um lado a outro da varanda, sempre com o celular na mão, esperando notícias. Estava decidido ir, ainda que sozinho, caso demorassem aparecer com a menina.

Enquanto isso, Makena se preparava para fazer uma fogueira no meio da mata, colhendo gravetos e folhas secas. Os sons que o cair da noite trazia consigo, não a assustava mais como antes. Aprendeu a conviver com eles e amar cada pedaço daquele lugar. O que a assustava agora era a perda da mãe e do avô, quem tanto amava. A chegada repentina do pai que não via há bastante tempo e a ameaça de deixar a fazenda.

Terminou de juntar as coisas para fazer a fogueira, com um aperto no peito. Sentou no chão e se permitiu chorar. Percebeu o trotar lento de Ringo em sua direção, o animal parou e cutucou seu ombro com o focinho. Ringo bufou ao ser ignorado. Makena se virou para olhar para ele. Ergueu a mão e fez um carinho entre os olhos do animal. Nesse momento, ela ouviu vozes. Estavam procurando por ela. Alguém chamou seu nome perto dali.

Levantou-se de pressa, se colocando ao lado do cavalo, que se mostrou inquieto.

A pessoa que chamou por seu nome, estava ainda mais perto agora. Preparou-se para montar Ringo, quando a luz forte de uma lanterna a atingiu. Levou à mão a frente do rosto, formando uma espécie de escudo.

— Makena — reconheceu a voz de Sebastian, funcionário antigo da fazenda.

— Não irei voltar — avisou de forma decisiva.

— Há outras pessoas procurando por você. Não vai conseguir ir mais longe que isso. Seu pai está preocupado.

— Ele não se preocupa com ninguém a não ser com ele mesmo.

— Está enganada. Precisava ver como ficou agoniado ao vê-la se afastar daquele jeito.

Makena balançou a cabeça, aborrecida.

— Não está me procurando. Ele não está aqui.

— Acredite, ele estaria se todos não tivessem insistido que ficasse na sede. Acabaria se perdendo. Seu pai não conhece essas terras como nós as conhecemos.

Makena tornou sacudir a cabeça.

— Precisa voltar agora.

— Não preciso, não.

— Você sabe que precisa.

A voz soou com pesar ao dizer:

— Ele quer me levar. Quer levar Luna e eu para longe de nossa casa… Dos cavalos. Já perdi a mamãe e o vovô… Não posso perder mais nada.

— Veja pelo lado positivo.

Makena rolou os olhos como dizendo não haver essa possibilidade.

— Mesmo que não consiga perceber isso agora. Seu pai está esperando por você. E, não importa onde ele a leve, Luna estará junto. Se me lembro bem, você sempre quis que seu pai aparecesse.

— Não desse jeito. Não tendo de perder um para ter o outro. Assim, eu não quero.

— Claro que não. Nunca imaginamos algo assim. E jamais estaremos prontos para isso, não importa a idade que tenhamos. Uma tragédia é sempre uma tragédia.

Makena o olhou com compreensão.

— Sente falta do Elijah?

— Todos os dias. Ainda assim, minha esposa e eu, somos gratos pelo tempo que tivemos com ele.

Makena abaixou a cabeça.

— Se ele não tivesse participado daquele rodeio… — lamentou.

— Ele nunca aceitaria que impedíssemos de participar.

A menina concordou com um menear de cabeça.

— Evelyn e eu temos um ao outro. Você, seu pai e sua irmã. Tem a vida inteira pela frente. Leve sua mãe e seu avô no coração. Eles estarão sempre com você. Mas, saiba também aproveitar o tempo ao lado de seu pai e sua irmã. Eles te amam, e estão preocupados.

Makena voltou olhá-lo.

Sebastian finalizou:

— É hora de voltar… De recomeçar. Tenho certeza que sua mãe e seu avô gostariam que fosse assim.

Makena começou caminhar. Ringo sempre a seguindo de perto.

Sebastian pegou o telefone no bolso.

— Preciso avisar que estamos voltando.

— Ele me abandonou uma vez — lembrou Makena. — E se fizer de novo?

Sebastian parou a caminho de realizar a ligação.

— Quando tiver a chance, converse com ele sobre isso. Abra seu coração.

— Não há nada para conversar — esclareceu.

— Lembre-se, seu pai pode ter outra versão dos fatos. Fechar seu coração para o perdão pode te fazer perder a chance de voltar a ser feliz.

— Parece que você está do lado dele — observou. — E de todos os outros que estão nesse instante em minha casa.

— Seu pai não me parece uma pessoa ruim. Se você quer saber, eu estou do seu lado e de Luna.

— Não é o que parece — rebateu.

— Vai ser bom para vocês, estarem com ele nesse momento.

— Acho que está tentando se livrar de mim.

— Você é bem difícil, às vezes.

— Eu posso te demitir — fez-se silêncio antes de Makena voltar a falar: — Pelo menos, você fala a verdade.

[…]

A pouco, Emmett recebeu a ligação de Sebastian. Apesar de insistir em falar com Makena, a menina se recusou falar com ele.

Em meio às sombras, percebeu o trotar de cavalo cada vez mais perto. Ao olhar adiante, o clarão de uma lanterna. Sebastian segurava a lanterna e a rédea do cavalo. Do lado dele, Brutos.

Não aguentou esperar, foi a passos largos encontrá-los.

— Makena — sua voz soou carregada de alívio.

Movida pela emoção, Makena respondeu:

— Papai.

— Querida. — Ele se colocou ao lado do cavalo. Ergueu os braços para pegá-la. — Minha garotinha — murmurou, tomado pelo alívio. — Que susto me deu.

Makena abaixou a guarda um instante. Se permitindo ir aos braços do pai como quando era menor. O abraçou, chegando deitar a cabeça ao ombro largo dele.

Emmett lhe afagou as costas e beijou suas bochechas.

— Não volte a fazer isso — pediu.

A menina teve a confortável sensação de voltar no tempo. O aconchego do abraço e perfume familiar lhe trouxe segurança.

Carmen chegou à varanda trazendo Luna nos braços. Eleazar chegou logo depois dela.

— Graças a Deus — ouviram-na dizer.

 Sebastian levou Ringo de volta para o estábulo. Brutus subiu os degraus na varanda e se deitou junto à porta, resfolegando.

Emmett fez carinho no rosto de Makena.

— Senti tanto sua falta… — contou. — Todo esse tempo.

— Você pode me pôr no chão agora — Makena repeliu o momento carinhoso.

Com o coração em pedaços, Emmett fez como pediu.

— Que o aconteceu hoje, não volte se repetir — repreendeu.

Makena deu de ombros.

— Te amo, querida. — Ele pôs a mão no ombro dela.

Eles subiram os degraus na varanda, ao lado um do outro.

— Makena — Carmen chamou seu nome ao vê-la se aproximar.

— Preciso de um banho — disse a menina, indiferente a preocupação que causou a todos.

Emmett pegou Luna dos braços de Carmen. Teve a impressão de ela estar mais retraída, depois do que aconteceu hoje. Beijou-lhe o rosto.

— Está tudo bem — disse.

Eleazar fez uma observação em voz alta:

— Makena não tem limites. Esta menina…

Carmen tocou seu braço, em um gesto sutil para se calar.

— Ele tem razão — Emmett concordou.

— Há muitos culpados em tudo isso — alertou Carmen.

Emmett entrou na casa, levando Luna nos braços. No hall, ainda pôde ouvir Eleazar comentar:

— Sorte a nossa, essas crianças terem alguém com quem ficar. Uma é totalmente descontrolada. A outra, não diz uma palavra.

Diante essas palavras, Emmett abraçou Luna. Olhou nos olhos dela. Fez um carinho no rosto triste. E disse as próximas palavras com toda verdade de seu coração:

— Papai te ama muito. Você é especial para mim, Luna. Você é doce. É esperta.

Luna piscou os olhinhos enquanto o ouvia falar. Moveu os lábios como fosse dizer algo, mas não emitiu qualquer som.

Emmett segurou sua mão pequena.

— Eu te amo — voltou a dizer. — No momento certo, vai conseguir. Eu sei que vai.

Luna levou a mão pequena ao rosto dele, e então lhe tocou a cabeça.

Emmett sorriu para ela.

— Coisa linda — disse. — Minha surpresa linda.

Luna continuou a olhar para ele com olhos de amor.

[…]

Rosalie desceu a escada, usando roupão de banho. Os cabelos presos em um coque irregular, no alto da cabeça, e chinelos de dormir. Não esperava ninguém àquela hora. Olhou no olho mágico. Kate e Tanya estavam diante de sua porta, ambas com sacolas nas mãos.

— Como assim? — falou, chegando para trás, ao abrir a porta. — O que estão fazendo?

Kate passou para o lado de dentro, seguida por Tanya.

— Viemos te fazer uma surpresa — disseram.

Rosalie fechou a porta, sorrindo.

— Estou surpresa — admitiu. — Mas, por que tudo isso?

Kate tomou a palavra:

— Sabemos que Emmett não está…

Tanya prosseguiu:

— Você dormiu na casa do papai ontem.

Kate voltou a falar:

— Esme disse que saiu cedo, sem se despedir. Deixou somente um bilhete. — Olhou para a irmã. — Há algo que ainda não sabemos? Que talvez queira nos contar?

Os ombros de Rosalie cederam. Kate a abraçou. Rosalie deixou escapar um muxoxo, imaginando, talvez, pudesse chorar.

— Bem — avisou Tanya—, temos a noite toda. Essa noite é das irmãs.

Quando Rosalie a olhou, ela completou:

— Viemos preparadas — mostrou as sacolas. — Doces. Muitos doces.

Olhando para Kate, Rosalie questionou:

— E a Alyson?

— Aceitou ficar com o pai sem reclamar. Garrett é o maior puxa-saco que ela tem na vida.

Rosalie abriu os braços, acolhendo ambas as irmãs com afeto e carinho.

— Vocês são as melhores — disse.

As irmãs riram enquanto se abraçavam.

— Okay, vamos começar — se animou Tanya.  Então, se afastou. Começou retirar coisas da sacola e colocá-las sobre a mesinha de centro. As três ficaram de joelhos no tapete, não demorou estarem sentadas.

[…]

Assim como na noite anterior, Emmett confortou Luna na hora de dormir. Ela ficava inquieta e chorava antes de pegar no sono. Via nos olhos dela o desejo de reencontrar a mãe. De receber seus carinhos e cuidados.

Makena saiu do próprio quarto para sentar no corredor, junto à porta entreaberta, ouvindo o pai contar histórias para a irmã dormir. Histórias que antes contou para ela. Ouvi-lo outra vez, fazia se sentir novamente a garotinha do papai.

Ao ir de um corredor para o outro, Carmen a avistou, sentada no chão.

— Makena — chamou —, o que faz aí?

A menina indicou que fizesse silêncio.

— Por que não entra? — Carmen insistiu. — Vá ficar com eles.

Makena moveu os lábios, sem emitir qualquer som com um “não”. Em seguida, gesticulou, mandando que a deixasse sozinha. 

Carmen sacudiu a cabeça como a achasse tola.

Makena voltou se concentrar na história que o pai contava, cogitando ouvir Carmen e entrar no quarto. Passado um instante, o tom de voz dele mudou, logo percebeu que não falava mais para Luna. Esgueirou-se na soleira da porta, evitando ser notada. Luna finalmente dormia. Emmett havia se afastado da cama e falava ao telefone por chama de vídeo.

— Obrigado por cuidarem dela para mim — ele dizia a alguém.

Ouviu um murmurinho de vozes femininas. Então o silêncio. Ele olhando na tela do celular. Quando voltou a falar foi para dizer:

— Eu te amo.

O coração de Makena pulsou forte, movido pelo ciúme repentino. Não era para Luna aquela declaração de amor. Mesmo não conseguindo ver o rosto de quem recebeu a declaração, o monstro do ciúme reagiu. Levantou furiosa, carregando o cobertor, que usara para se encobrir enquanto ouvia histórias às escondidas. A caminho do próprio quarto, derrubou, propositalmente, um objeto de decoração do aparado, no corredor.

Ao ouvir o barulho, Emmett saiu do quarto, com o telefone na mão. Reparou no objeto caído. A porta do quarto de Makena batendo.

— Não faz isso — resmungou, olhando dentro do quarto, para ter certeza que Luna ainda dormia. A menininha estava sentada na cama, o coelhinho de pelúcia junto ao rosto. — Makena — ele resmungou. E para Luna teve cuidado ao falar: — Está tudo bem. Papai está com você. — Voltou se aproximar da cama. Sentou perto da filha e a pegou no colo. Beijou-lhe a testa e a aconchegou no peito largo. — Papai está aqui agora — murmurou. — Papai está aqui.

[…]

No início da manhã, Emmett bateu à porta do quarto de Makena. Levou uns poucos segundo para ela abrir a porta, vestindo pijama. Os cabelos revoltos. Nas feições, o aborrecimento indiscutível. Passou a mão na testa, afastando, num gesto agressivo, uma mecha dos cabelos escuros para detrás da orelha.

— O que você quer? — disparou. — Eu não vou à escola hoje. Não importa o que diga.

— Não é a escola que você vai. — Fez uma pausa, antes de voltar a falar: — Arrume suas coisas, por favor.

Ela lhe lançou um olhar de confusão.

— Arrumar minhas coisas para quê? Do quê está falando?

— É hoje que iremos para Carolina do Norte. Preciso que faça suas malas. Carmen está fazendo as malas de Luna.

— Não irei a lugar algum. Esta é minha casa. — Ela se afastou da porta, arredia.

Emmett entrou no quarto.

— Makena — chamou, tentando uma aproximação. — Preciso que colabore. Faça suas malas. Eu posso ajudar, se você quiser.

— Não quero sua ajuda — recusou de forma agressiva.

— Eu sei que está sendo difícil…

— Isso não é difícil — disse com a voz trêmula. — Isso tudo é uma droga. — Ela correu para junto da janela, de costas para ele, os ombros curvados, começando a chorar.

Emmett se aproximou, e a abraçou por trás. No primeiro momento, ela recusou o abraço, empurrando-o, mas ele não desistiu de tê-la perto. Ela acabou se deixando amparar, chorando como Emmett jamais vira. Ele sentou no chão, segurando-a no colo. Afastou os cabelos do rosto molhado de lágrimas e lhe beijou a testa.

Makena soluçou.

— Quero minha mãe de volta.

— Eu sei… — lamentou Emmett. — Acredite, eu a traria de volta se pudesse.

— Não quero ir com você, papai.

Emmett afagou o rosto dela.

— Você me abandonou… — ao dizer isso, o choro se tornou ainda mais sofrido. — Me abandonou. Mentiu para mim. Eu te esperei…

— Eu não te abandonei, querida.

Makena soltou um muxoxo, discordando do que dizia.

— Você não voltou… Disse que nada iria mudar…

Ele tornou beijar na testa da filha.

— Sinto muito.

— Não sente, não. — Repentinamente, se afastou dele, andando de joelhos no chão, até estar do outro lado do cômodo. Ficou de pé. — Saia do meu quarto.

Emmett se colocou de pé também.

— Por favor… — ele pediu, olhando-a com pesar. — Faça suas malas.

Ele a ouviu gemer, em desgosto.

— Me permita ajudar você.

Makena atirou nele uma almofada.

— Saia daqui.

Mesmo sem querer deixá-la sozinha, caminhou até a porta e parou para olhá-la.

— Saia, papai.

— Eu te amo, Makena.

Ela grunhiu, em uma mistura de tristeza e raiva.

Emmett saiu para o corredor. Olhou para trás ao estrondo da porta batendo.

— Eu não te amo mais — gritou, com intenção de feri-lo. — Vá embora de minha fazenda.

Em um murmúrio, mais para si que para Makena, falou:

— Cometi muitos erros. O maior deles, foi não lutar por você. — Então se virou, e começou se afastar. Viu Luna na porta do quarto dela, agarrada ao coelho de pelúcia. O rosto sonolento. Sorriu para ela, mesmo entristecido. Era difícil olhá-la e não sentir sua doçura. O equilíbrio que precisava. Deu alguns passos, então se abaixou para falar: — Vem com o papai, Luna.

A menininha foi com passos incertos ao seu encontro.

Emmett passou os braços fortes em volta do corpo pequenino, acolhendo-a com amor. Beijou o rosto sonolento da filha ao erguer-se com ela no colo.

— Vamos tomar café da manhã — disse. — Você está com fome?

Luna concordou com um sutil balançar de cabeça.

Ele sorriu e voltou beijar-lhe o rosto. Levou ela no colo por todo o corredor, escada, sala até estar na cozinha.

[…]

Makena, mesmo aborrecida, abriu o closet, subiu a escadinha de três degraus. Parou um instante, com os braços erguidos, a caminho de onde estavam as malas. Os sentimentos oscilando; tristeza, raiva, frustração e medo. O choro a fez fraquejar. As lágrimas turvaram a visão. Deixou as malas caírem uma a uma no carpete.

Desceu a escadinha, chorando. Sentou ao lado do jogo de malas brancas. Abriu a maior delas.

Uma batida à porta avisou a chegada de alguém.

— Vá embora — disse para quem quer que fosse.

— Makena — ela reconheceu a voz de Carmen. — Me deixe te ajudar. Já guardei as coisas de Luna.

— Traidora — esbravejou. — Não quero sua ajuda. Nem mesmo quero te ver.

— Querida…

— Não sou sua querida. Não sou nada para você.

— Um dia… — Carmen respirou fundo. — Um dia você vai entender. Fiz o melhor para você e Luna.

Makena levantou. Começou recolher coisas e jogar dentro da mala de qualquer jeito. Cada item que saía do lugar onde costumava ficar aumentava mais sua dor.

— Makena.

— Vá embora. Não quero te ver, ou mesmo ouvir sua voz.

— Tudo bem — Carmen respondeu se afastando da porta. — Espero que seja feliz em sua nova casa, ao lado de seu pai e de sua irmã.

Makena saiu do closet, atravessou o quarto e num gesto impulsivo abriu a porta. Decidida a magoar Carmen tanto quanto se sentia magoada, pôs a cabeça para fora ao lançar as palavras:

— Espero que seja profundamente infeliz.

Carmen olhou para trás, mesmo com tanta grosseira, ainda foi capaz de olhá-la com compaixão.

— Não tomarei para mim estas palavras, pois sei que é fruto da raiva. E da dor imensa que está sentindo. — Virou-se e começou se afastar. — Ainda desejo que seja feliz no seu novo lar.

— Eu te odeio — gritou Makena. Com o peito tremendo, bateu a porta e voltou ao closet, onde terminou de fazer as malas. Não colocou na bagagem um único troféu ou medalha. Ela pegou as fotografias, todas que estavam no painel e porta-retratos. Tinha no coração o desejo de voltar à fazenda algum dia.

Desceu para comer alguma coisa, quando percebeu a movimentação. Carmen e o marido estavam se despedindo. Emmett os acompanhou até a porta da frente. Ele estava com Luna no colo. Makena observou da janela, entrarem no carro e partirem.

Limpou o rosto ao sentir as lágrimas voltarem. Viu o carro do pai, com o porta-malas aberto. Os pertences de Luna já estavam todos lá. Isso lembrou que eles também estavam de saída.

Afastou-se da janela. Sebastian carregou suas coisas para o porta-malas do carro. Ela foi ao escritório do avô. Abriu as portas duplas, olhando o interior do cômodo, já sentindo saudade. Deu alguns passos em silêncio. Parou diante a mesa onde o avô costumava tomar importantes decisões enquanto fumava um charuto. Imaginou ele sentado na cadeira atrás da mesa, o charuto entre os dedos da mão. Sentiu-se acolhida com a lembrança.

“Um dia, você será dona de tudo isso aqui”. Teve a impressão de ouvi-lo dizer mais uma vez.

— Vovô… — murmurou com saudade. Chegou mais perto da mesa. Deslizou a mão na superfície dela. Os dedos esbarraram na réplica de bronze do Touro de Wall Street. Recolheu o objeto com ambas as mãos e o levou junto ao peito. Fechou os olhos, pensando no avô, com lágrimas no rosto. — Vovô…

[…]

Emmett parou no limiar da porta, segurando Luna no colo. Em silêncio, aguardou que Makena estivesse pronta para partir.

Ao notar sua presença, a menina limpou as lágrimas com uma das mãos.

— Nós vamos sair em alguns minutos — avisou.

Makena abaixou a cabeça, olhando a réplica do touro. Respirou fundo, passou por Emmett na porta sem nada dizer. Luna olhava cada movimento seu, da mesma forma que o pai fazia.

Já na sala, parou para olhar para trás.

— Quero me despedir dos animais.

— Tudo bem. Luna e eu vamos com você.

— Quero fazer isso sozinha.

— Desculpe, mas não será possível.

— Não vou fugir.

— Quem me garante. Já tentou uma vez.

Sem escolhas, Makena teve de aceitar. Emmett seguiu seus passos até o estábulo e ficou aguardando enquanto se despedia dos animais. Porém, a despedida de Ringo, foi mais dolorosa que qualquer outra.

Emmett viu a relutância dela em deixar o animal para trás. A tristeza estampada no rosto ao precisar se afastar. A maneira como encostou a testa ao focinho do cavalo.

— Não posso deixá-lo… — lamentou em lágrimas. — Não posso fazer isso. Eu vou voltar Ringo. Eu prometo.

Por último, as meninas se despediram de Brutus, o cane corso, que os olhou com expressão tristonha, e soltou um ganido.

Emmett colocou Luna na cadeirinha, que pegou do carro de Aurora. Makena sentou no banco de trás junto à irmã. Pegou a réplica Touro de Wall Street de cima do banco e abraçou, pensando no avô.

De detrás do volante, no espelho retrovisor interno, ele a viu olhando pela janela com lágrimas nos olhos. Luna tinha a expressão tristonha, segurando firme o coelho de pelúcia. O senhor Coala, estava no assento do meio.

— Vai ficar tudo bem — disse para as meninas. No entanto, nenhuma delas pareceu ouvi-lo. Pôs o motor do carro para funcionar. Olhou as meninas uma vez mais, antes de seguir viagem. Foi mais difícil do que imaginou vê-las tão tristes. Cada uma vivendo sua própria dor, reagindo aos últimos acontecimentos a sua maneira.

 


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