Kháos escrita por Alice


Capítulo 6
Ukiyo


Notas iniciais do capítulo

Do japonês: 1. vivendo o momento. 2. desligando dos incômodos da vida. 3.
"O mundo flutuante".



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O som da cafeteira era o único ruído escutado na sala de descanso. Ramona encarava um ponto em branco em um quadro abstrato que decorava o local, sua mente em um ruído igualmente vazio. Exalando o ar em um suspiro baixo, retirou o copo com café e levou o líquido à boca, prontamente recuou quando o sentiu queimar sua língua. Afastou-se da bancada e caminhou devagar até uma cadeira vazia. Olhou para os papéis espalhados sobre a mesa, deveria organizar as aulas da semana e apresentar seu roteiro para a supervisora. Pela manhã tiveram uma rápida reunião com a nova sócia em relação às regras e a mais nova imagem do estúdio. Ela queria que tudo fosse muito bem organizado e que os funcionários espelhassem a boa imagem da empresa, o que quer que isso significasse.

Em resumo, pelo o que conseguiu absorver, suas jornadas de trabalho seriam diminuídas, assim como seus salários, a fim de que contratassem mais professores e aumentassem o número de salas. Mais dinheiro para a empresa, menos para os funcionários. Ramona já podia ver sua hora extra remunerada dando adeus enquanto sumia no horizonte. Poderia passar o dia em suspiros insatisfeitos, mas havia trabalho a ser feito antes de sua próxima aula. Mal escutou os passos adentrando o cômodo quando um corpo pesado sentou na cadeira ao seu lado. De relance notou os fios loiros brilhando à luz artificial, não precisava de mais para perceber que era a personificação do mal gosto que se materializou quando ela menos precisava. Em um tom descontraído, ele perguntou:

— Como foi o fim de semana?

Não fez questão de responder, quem sabe se ela o ignorasse ele iria embora? Torcia fervorosamente para quem sim. Tinha conseguido evitá-lo por mais de uma semana, mas pelo visto sua sorte havia chegado ao fim.

— Vamos brincar de dar um gelo no outro agora, linda?

Estremeceu com o apelido. Quis manda-lo ir para o inferno, mas sabia que seria apenas o combustível que ele precisa para atear fogo em sua fachada de calma.

— O que você quer, Liam? - tentou soar o mais seca possível.

— Saber como foi o seu fim de semana.

Obviamente não funcionou.

— Normal como sempre. - respondeu em uma voz falsamente doce. - Agora posso voltar ao trabalho?

— Estou apenas tentando ter uma conversa calma, Ramona. Não precisa ser tão agressiva.

Optou por não responder ou corria o risco de sua resposta ser uma agressão, e, sendo sincera consigo, ela não possuia dinheiro para pagar a fiança ou um processo. Liam puxou a cadeira para mais perto dela, ao ponto de suas pernas se tocaram. Ramona sentiu seu corpo entrar em alerta e se afastou o máximo possível dele. Porém, o homem não estava ligando para os sinais e prontamente colocou o cotovelo na mesa, apoiando o queixo no punho fechado enquanto se voltava completamente para ela. Em um tom despreocupado, tentou novamente uma conversa com ela.

— Se isso é sobre a nossa última noite, você sabe muito bem que eu me perco um pouco quando bebo.

Um som de desdém saiu de seus lábios, continuou com a cabeça baixa e o olhar voltado para as letras embaçadas no papel. Se perder um pouco era um eufemismo, Liam praticamente borrava as linhas do aceitável e invadia o espaço de todas as mulheres em um raio de dez quilômetros. O Smith poderia ser até tolerável em alguns raros e ínfimos momentos, mas a cada dia que passava a lista de contras em relação à sua personalidade aumentava cinco itens.

— Não precisa ficar irritada, estou aqui para dizer que sinto muito. - levou a mão direita ao coração como se estivesse sendo sincero. - Não queria ter tentado te beijar...

— Então não deveria ter tentado para começo de conversa. - o interrompeu, levantando a cabeça para encará-lo irritada. - Toda vez, Liam, toda vez que saímos juntos você tenta algo. É chato para caramba e extremamente desconfortável.

— Eu não faço por mal, Ramona. Simplesmente não consigo me controlar e isso é algo em que estou trabalhando com a minha terapeuta. - se defendeu, o tom beirando a indignação. - E eu só ajo assim quando tenho o mínimo de abertura.

— Como é? Não acredito que você está dizendo que é minha culpa o seu assédio.

— Uou, não é para tanto. - ergueu as mãos em sinal de pare. - Eu nunca assediaria uma mulher, não é da minha natureza. E não diga essa palavra por aqui.

Bateu a mão na mesa completamente irritada quando ele pediu enquanto olhava ao redor de maneira mal disfarçada. Ele sabia que estava errado, mas não iria admitir de maneira alguma. Seu gesto chamou a atenção de Liam, segurando a caneta em um aperto forte, falou entredentes:

— Você segurou o meu rosto e tentou me pressionar contra uma parede mesmo eu dizendo não. - o viu se mexer desconfortável por alguns segundos. - Se isso não é a porra de um assédio, então é o quê?

— Um erro de uma pessoa que estava completamente bêbada. - respondeu quase indiferente, soltando um suspiro frustrado em seguida. - Estou aqui tentando me desculpar, apenas isso, mas você fica batendo na mesma tecla, Ramona.

— Porque você sempre faz a mesma merda, Liam. Não é a primeira vez, mas naquela noite você foi longe demais.

— Caramba, mulher. Por que você tem que ser tão difícil? Fica transformando um deslize meu em crime.

Ramona resolveu não prolongar o assunto, Liam não queria entender e não seria ela quem iria passar o ABC para um homem adulto. Começou a recolher seus pertences, ignorando a risada incrédula do homem ao seu lado. Se abrisse a boca iria explodir e infelizmente as chances daquilo se tornar um problema para ela eram enormes.

— Certo, então você vai simplesmente fugir como se não tivesse acabado de me chamar de criminoso?

Respirou fundo, fechando o zíper da bolsa com agressividade antes de virar para ele.

— Qualquer interação entre nós será limitada ao trabalho. E apenas ao trabalho. - deixou claro, sentindo seu corpo tremer para que fizesse algo contra aquele rosto idiota.

— Você é inacreditável.

Sentiu seu sangue ferver. Liam não havia dito aquela frase com a ternura e o carinho palpável de Jackson, mas sim com uma mágoa sem sentido. Era ela quem havia passado por uma situação estressante por culpa dele e aquela homem ainda tinha a coragem de se achar no direito de vítima. Iria falar algo, mas a entrada de sua supervisora a fez engolir as palavras. Paty prontamente sentiu que algo estava errado, o leve franzido de sua testa e lábios eram a prova.

— Ramona, podemos conversar? - indagou à ela, desviando um olhar afiado de Liam para a Gibbler.

— Claro. - murmurou, terminando de recolher seus pertences espalhados pela mesa.

— Paty, como sempre mais linda a cada dia que vejo. - Liam gracejou, abrindo os braços em uma camaradagem inexistente com a supervisora.

Paty apenas estalou a língua em descrença, lançando um olhar para Ramona antes de sair da sala. A Gibbler inspirou fundo, estreitando os olhos para seu colega insuportável que a observava tentando aparentar firmeza, mas ela podia notar o receio em seus olhos. O babaca pensava que ela iria falar algo para Paty, bom, era melhor deixá-lo sentir um pouco de medo, era o mínimo que ela poderia fazer. Sem pressa, saiu em direção à sala de sua supervisora, esperando por boas notícias para acalmar sua alma.

<♡♡♡>

— Ramona?

Passou direto por Jackson, que se encontrava de pé na cozinha, deixando a mochila deslizar por seu ombro em direção ao chão antes de cair em um baque no sofá. Tombou a cabeça para trás, a nuca apoiada no encosto, os olhos fechados enquanto seu corpo tentava relaxar apesar da exaustão. A reunião com Paty não havia sido nada animadora. Saber que estava entre uma das pessoas da lista de possível demissão era assustador e tão injusto! Ela trabalhava duro, passava uma hora a mais de seu expediente todos os dias para poder ensinar quem não poderia ir em outro horário. Se esforçava em suas aulas, coreografava danças específicas para cada turma, ajudava seus colegas quando precisavam, até mesmo ensinava em outras turmas no lugar deles em alguns momentos. Ela era uma boa professora, gostava de ensinar, por que fariam algo assim com ela?

— Ramona?

Abriu os olhos quando sentiu Jackson sentar ao seu lado, apenas rolou a cabeça em direção à ele, franzindo os lábios descontente enquanto ele a encarava em busca de uma resposta. Não queria falar sobre o seu dia, se abrisse a boca para dizer o que atormentava seus pensamentos, corria o risco de falar mais do que o necessário ou chorar até o dia seguinte. Só precisava descansar e relaxar por alguns instantes.

— Quer falar sobre isso? - negou em reposta à pergunta. Jackson abriu os braços e a puxou contra ele. - Tudo bem.

Sentiu seu corpo amolecer ao contato com o dele, naturalmente se moldando e se encaixando da melhor maneira. Respirou aliviada quando se viu em uma posição confortável, nada de estranheza ou pensamentos perigosos rondando sua mente. Ainda era Jackson, apesar do que passaram e da situação na noite anterior, quem a estava abraçando era Jackson, seu melhor amigo e um dos melhores abraçadores do mundo. Fechou os olhos quando sentiu os lábios frios em sua testa, sorrindo inconsciente enquanto passava o braço sobre o torso dele, se prendendo mais forte tal qual um coala. Praticamente suspirou quando foi puxada para mais perto, puxando suas pernas para cima e as dobrando para o lado.

— Bastante confortável, heim?

A mão dele subia e descia pela extensão de seu braço, o carinho fazendo um calor gostoso se espalhar por seu corpo.

— Uhum. - apenas murmurou contente, sendo chacoalhada por conta da risada de Jackson. - Como foi seu dia?

— Bom.

Franziu a testa levemente para a resposta, esperou por um complemento que nunca veio. Agora isso não era normal, seu amigo sempre contava em mais de uma palavra como havia sido seu dia. Havia dias que Ramona precisava cala-lo para que conseguisse ouvir seus pensamentos. Em outros apenas o observava, seu olhar desviando para seus lábios em um transe que se forçava a sair quase na base de um tapa.

— Só bom? - insistiu, apoiando o queixo em seu ombro para encará-lo. Jackson apenas deu de ombros. - Quer falar sobre isso?

Como estava perto, pôde notar os olhos castanhos perderem levemente o brilho natural. Sentiu que algo estava muito errado quando Jackson desviou o olhar do seu.

— Foi apenas... cansativo.

— Algo ruim aconteceu? - indagou preocupada, levando uma mão ao rosto do Fuller para que ele a encarasse.

— Receber um aviso do superior é algo ruim? - tentou parecer despreocupado.

— O que houve?

Não iria recuar apesar dele estar tentando fazer a situação parecer menos importante do que era.

— Apenas adormeci na sala de descanso e passei do meu horário de almoço.

— Muito?

— Pode-se dizer que o suficiente para quase ser levado para o RH.

— Mas, Jackson, você está com problemas de sono? - ele começou a se afastar, mas Ramona o impediu, segurando seu pulso. - Por que você não está conseguindo dormir? E seja sincero, eu vou saber se você estiver mentindo.

Abrindo um pequeno sorriso, Jackson se recostou no sofá, puxando novamente Ramona contra si ao falar:

— Dores musculares. - continuou após vê-la o encarar confusa. - Dormir nesse sofá é um pouco complicado e por isso acordei sentindo dor. Quando cheguei no escritório, tomei um relaxante muscular que foi muito mais... relaxante do que o esperado. Então dormi no tatame da sala de descanso. Um sono muito bom, na verdade. - completou, como se ter dormido bem fosse relevar todo o incidente.

— Por que você não falou isso antes? - indagou séria, eles poderiam ter resolvido tudo isso antes dele quase ser despedido.

Certo, talvez ela estivesse exagerando, mas um aviso verbal era igualmente tão importante quanto um escrito. Ele tinha sorte de seu supervisor gostar dele. Mas não há como contar com a sorte pelo resto da vida.

— Eu ia comprar um colchonete...

— Então por que não comprou? - o interrompeu exasperada.

— Porque eu esqueci. - falou suavemente, segurando as mãos dela entre as suas. - Só lembro que tenho que comprar na hora que deito nesse sofá. É tipo uma memória física, ou corporal ou é selecionada?

Descartou a pergunta dele com um estalar de língua, logo retomando ao ponto principal.

— Você quase foi demitido por que esqueceu de comprar um mísero colchonete?

— Não é para tanto. Foi apenas um aviso. - tentou minimizar, tudo o que menos queria era discutir e Ramona percebia isso, mas não iria recuar.

— Um aviso de que na próxima vez você pode ser demitido.

— Eu conversei com o Lance, expliquei que estou passando por alguns problemas que irei resolver e que aquilo não iria acontecer novamente. Agora falo o mesmo para você, amanhã eu compro um colchonete e...

— E nada. - o cortou, se afastando para pegar seu celular na bolsa no chão ao lado do sofá. - Vamos comprar um agora e ele vai ser entregue amanhã. - declarou, abrindo um aplicativo para fazer a compra, muito distraída para ver a reação dele quando prosseguiu. - Por essa noite você dorme comigo.

— Posso sobreviver a mais uma noite, Ramona. - resmungou audivelmente.

— Mas eu não posso ver você sendo demitido em seu primeiro mês em Nova Iorque. - rebateu impaciente.

— Eu não vou ser...

— E se algo pior acontecer?

— E o que poderia ser pior do que acordar com um torcicolo? - riu de sua cara de indignação.

— Você pode provocar outra doença. Teve um episódio de uma série médica em que o homem apareceu com dores no pescoço, fizeram uma ressonância e descobriram que o nervo ciático, ou qualquer que seja seu nome, estava prestes a romper. Ele morreu, Jackson, morreu. E nem comece, só porque é uma série médica não significa que seja tudo ficção. Coisas ruins acontecem, esteja você esperando por isso ou não. Minha mãe sempre diz que se algo vai dar errado então dará, papai completa que é por isso que precisamos estar preparados para tudo. Dançar por cima das tristezas para que tudo fique mais fácil, mas espero que não precisemos chegar à esse ponto. Nem da morte por torcicolo nem da dança sobre uma sepultura.

Levantou o olhar do celular ao finalizar a compra, encontrando um Fuller a encarando boquiaberto. Ergueu as sobrancelhas em indagação, mas ele somente fechou a boca em um sorriso crescente com os olhos brilhando em algo que Ramona não conseguia identificar. Por fim, ele apenas balançou a cabeça quando declarou com notas de diversão na voz:

— Você é tão dramática.

— Como se você também não fosse. - rebateu irônica. - Ainda lembro de quando um certo alguém me fez comprar um sensor de movimento para colocar na minha janela.

— É para a sua segurança.

— Moramos no quinto andar, Jackson.

— Ladrões possuem escada, Ramona. - pontuou, sorrindo satisfeito consigo mesmo. - Você, no momento, está exagerando.

— Será mesmo, Fuller? - era uma pergunta retórica e ele sabia muito bem disso. - Você vai dormir comigo e ponto final.

— Se você insiste tanto.

Estreitou os olhos para o tom cadenciado de sua voz, a rápida piscadela não passando despercebida.

Não assim, seu pervertido.

— Ei! - tentou desviar do soco em seu ombro sem sucesso. - Eu não falei nada.

— Mas pensou. - declarou, tentando acertá-lo de novo quando o escutou rir. - Tire sua cabeça desse lugar sujo porque vai haver uma barreira enorme de travesseiros entre nós.

— De novo, eu não falei nada. - se defendeu, segurando o pulso dela antes de ser acertado novamente.

Ramona se levantou, ainda segurada por ele.

— Que continue calado então.

Empurrou Jackson para longe enquanto o escutava rir alto. Prensou os lábios para não sorrir quando foi abraçada por trás ao dar às costas para ele e ter um beijo estalado marcando sua bochecha. O deu uma leve cotovelada, saindo de seus braços para procurar seu jantar. Como em todas as noites, seu prato já estava feito e posto sobre a cooktop, apenas pronto para ser alegremente consumido. Naquele momento não conseguiu controlar o sorriso, o Fuller havia feito um nhoque com molho de queijo, um dos seus pratos preferidos. Sua atenção foi desviada pelos pratos cobertos por biscoitos em cima da bancada, não tinha notado o cheiro agradável de chocolate e canela quando entrou, mas agora não conseguia sentir outra coisa. Era óbvio que ele estava estressado, seu amigo apenas cozinha em grande quantidade quando queria esquecer algo. O que era ótimo para ela, mas péssimo para o Fuller. Ao menos ela teria algo para levar para o estúdio pelo resto da semana.

— O Edison enviou alguns apartamentos para darmos uma olhada. - informou, mudando de assunto e voltando para sentar ao seu lado. - Meu notebook está no quarto.

Jackson assentiu e levantou rapidamente para buscar o aparelho. Em pouco tempo analisaram atentos as fotos enviadas pelo corretor. Ramona tinha que admitir, até que ele estava fazendo um bom trabalho a julgar pelos lugares que os estava enviando, mas ela ainda iria fazer uma sondagem para saber se algum crime ocorreu naqueles apartamentos. Nunca mais confiaria naquele homem.

— Vamos escolher o top 5?

Franziu a testa pensativa, mastigando calmamente enquanto observava uma sala pequena dividida da cozinha por uma parede pintada de um verde vômito. Apesar de se imaginar detestando aquela divisão desnecessária, não faria sentindo mentir para si mesma de que o que a faria alugar um local seria um ponto crítico...

— O primeiro critério é o preço. - falou após engolir, tinham lugares que precisariam de algumas pequenas reformas, como era previsto, mas as grandes eles não poderiam arcar. - Caso você saia e eu fique sozinha, preciso conseguir pagar o aluguel.

— Por que eu iria sair? - perguntou confuso.

— Encontrar alguém? - opinou, suspirando alto quando ele continuou a encará-la como se aquilo não fosse uma opção. - Casar, ter filhos ou aceitar um emprego em outro lugar?

— Por acaso está querendo se ver livre de mim, Ramona Gibbler?

Sorriu, franzindo o nariz ao vê-lo se aproximar um pouco mais.

— Apenas sendo realista, Jackson Fuller.

— Por um futuro próximo e distante não tenho a menor vontade de sair do seu lado, então não se preocupe com isso.

Levou uma garfada à boca para ter tempo para formular uma resposta. Não era para ter gostado tanto da declaração quanto o seu corpo apontava, principalmente seu coração, se levar em conta o quanto ele batia enlouquecido. Mastigou para conter o sorriso crescente, ignorando os olhos brilhantes de seu melhor amigo.

— Hum, se você diz.

Jackson apenas riu, obviamente não acreditando em sua falta de interesse.

— Vamos, crédula, vamos encontrar um apartamento.

— Espero que eles tenham um bom seguro. - tentou mudar de assunto. - O daqui não é muito bom.

— A empresa em que trabalho tem um convênio com uma seguradora de imóvel e plano de saúde.

O observou, o rosto franzido em concentração enquanto analisava as fotos. Ele ficava fofo todo concentrado, era um lado dele que ela gostava.

— O meu é péssimo, só me dá direito a uma ambulância e três dias no hospital, além de uma pequena lista de remédios.

Riu quando o viu quase quebrar o pescoço para encará-la. Isso sempre acontecia quando falava de seu plano de saúde, por isso evitava ao máximo falar sobre esse assunto com seus pais. Ramona queria ser independente, ter seus pais pagando por suas contas ia contra o que queria.

— Consultas?

— Nop. - o "p" saiu estalado, levou outra garfada à boca.

— Remédios básicos?

Jackson estava começando a ficar realmente indignado e aquilo até que era hilário para ela.

— Nadinha.

— Antibióticos?

— Apenas uns três.

Soltando um som de descrença, ele murmurou impaciente:

— Por que você ainda está com esse plano?

— É o mais barato. - deu de ombros ao olhar incrédulo.

Agradeceu por ele não opinar que seria melhor pedir ajuda aos seus pais.

— Se pudesse colocava você no meu. Pelo menos ele cobre uma possível gravidez? - riu após ela praticamente o fuzilar com o olhos. - Não me olhe assim, só estou sendo realista.

— Não, ele não cobre. - resmungou sua resposta, desviando o olhar dele para o notebook em sua perna antes de continuar. - Apenas uma ultrassom a cada dois meses, mas isso é um bônus. Mais um motivo para não engravidar! - comemorou animada, sorrindo quando o fez rir. - É muito caro, apenas um ultrassom é quase quinhentos dólares e ainda tem o preço da consulta.

— Isso é horrível.

— Para nós sim, até porque crescemos com um bom plano pago por nossos pais, mas para a maioria dos americanos não é assim que a vida funciona.

Jackson assentiu solenemente, massageando o pescoço antes de apontar para o notebook.

— Vamos voltar à nossa busca.

— E evitar casas assombrados ou que pareçam o cenário para um massacre.

— Metade da cidade parece ter saído de um filme de terror. - declarou rindo. - Podemos nos contentar com um de suspense?

Deu zoom na fachada de um prédio de três andares, com porta preta e janelas estreitas. A árvore em frente estava seca, seus galhos se estendendo em direção ao imóvel, passando uma áurea de estranheza que somada a cor cinza desbotado da fachada, provocava arrepios em Ramona.

— Escolha essa e a próxima alma que vai ficar presa dentro dela vai ser a sua.

Sua ameaça causou uma onda de gargalhadas em seu amigo. Estreitou os olhos, enchendo a boca de nhoque enquanto tentava parecer ameaçadora, o que fez com que Jackson continuasse rindo alto antes de passarem para o próximo apartamento.


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