Kháos escrita por Alice


Capítulo 17
Raabta


Notas iniciais do capítulo

Urdu: Conexão única e emocional que pode existir entre duas almas.



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"Da-ra-ra-ra-ra-ra-ri
neol bogo isseum eumagi, babe..."

Ramona cantarolava enquanto dobrava a esquina de seu prédio, as mãos escondidas nos bolsos de seu casaco vinho preferido. Finalmente estava podendo deixar de lado os tecidos mais grossos, os dias estavam esquentando aos poucos, apesar de ainda ocorrerem momentos em que a temperatura lembrava a do fim de ano. O tecido macio a protegia do vento frio do início de maio, a estação estava mudando e sua barriga aumentando com o passar dos dias. Fechou os olhos por um instante, apoiando-se na parede fria de um prédio, em sua mente repassava suas ocupações daquela sexta-feira. Deveria levar as mudas de roupas para a lavanderia, descendo as escadas estreitas que tanto detestava, então iria descongelar seu almoço, uma porção leve de filé de peixe com macarrão feita por Jackson, após, teria a tarde para organizar o que possuía para o quarto do bebê. O local estava ganhando forma aos poucos, as paredes recém pintadas e as roupinhas novas espalhadas pelo local. Não era muito, mas aos poucos eles iam montando o quartinho de seu filho, ou filha, a qual ela estava mais inclinada.

Ainda tinha muito para fazer e tantas pessoas para enfrentar. Por vezes Ramona esquecia do que a esperava ao enfrentar seus pais, o que a deixava se sentindo péssima e pesada pelo sentimento de culpa. Mas, aquele não era o momento para pensar em situações que a fariam passar o resto do dia triste, tinha muito o que fazer em casa, ao menos o que Jackson a deixava fazer. Ele era teimoso de mais para o próprio bem. Se afastando da parede, recomeçou, acenando com um sorriso para a mulher que vendia flores em uma barraca ao lado da mercearia, mas logo sentindo o sorriso congelar ao perceber a pessoa parada na entrada de seu prédio. De costas, ela gesticulava enquanto falava ao telefone e ainda não a havia notado, mas Ramona reconheceria o casaco com estampa de onça e os saltos de solado vermelho em qualquer lugar. Kimmy Gibbler estava em Nova York, pior, Kimmy Gibbler se encontrava parada do lado de fora de seu apartamento.

Por um instante Ramona conseguiu visualizar perfeitamente seu futuro. A forma como o cabelo de sua mãe voaria ao vento ao virar-se em sua direção, sorriso largo e alegre que prontamente se desmancharia e daria lugar a uma expressão intrigada. Logo, um vinco familiar faria morada entre seus olhos, olhos que se estreitariam em fendas ameaçadoras e descrentes. Passos largos seriam dados, a colocando em uma corrida em sua direção. Então o mundo pararia, trovões soariam ao longe, gotas de chuva cairiam feito pedrinhas do céu, o chão tremeria e Ramona se veria sendo engolida pela decepção de sua mãe que choraria gotas tão grossas quanto as que cairiam das nuvens escuras. Era opressor e levemente fantasioso, mas seria a realidade para ela se não saísse logo dali.

Ramona começou a dar passos cuidadosos para trás, não ousando tirar os olhos das costas de sua mãe, temia que um movimento seu a faria se virar e correr em sua direção. A simples perspectiva de encará-la sem alguma preparação era aterrorizante. Inspirou fundo enquanto se forçava a caminhar mais rapidamente, contando até três antes de se virar e praticamente correr para longe. Com o coração acelerado e um frio de medo tomando seu corpo, Ramona só queria fugir, de preferência para outra parte do mundo. Mordendo o lábio fortemente, se concentrou na dor ao invés do frio que se espalhava por cada célula sua.

O caminho até o prédio alto e imponente foi feito em silêncio, apenas sua consulta no GPS a impedia de estar a caminho de outra sede. Nunca havia ido ao trabalho de Jackson, porém, agora compreendia o porquê dele não ter discordado quando encontraram o atual apartamento. Era consideravelmente perto de seu trabalho e era necessário pegar apenas uma estação e caminhar duas quadras. Mas naquele momento Ramona havia achado a caminhada cansativa e a lotação do vagão sufocante. Assim que chegou à superfície, respirou fundo, guardando o celular no bolso com as mãos trêmulas antes de seguir em frente.

Empurrou as portas giratórias assim que chegou ao prédio, encontrando um hall de entrada iluminado e lotado de pessoas, respirou fundo, novamente, antes de caminhar decidida até o balcão da recepção. Tentou aliviar o aperto na alça de sua bolsa, porém, o nervosismo havia tomado conta de todo o seu corpo, não conseguiria relaxar nem se tentasse. Parou em frente ao balcão polido, encontrando o rosto sorridente e simpático do recepcionista.

— Bom dia, em que posso ajudá-la?

— Gostaria de falar com o Jackson Fuller. - pediu em um tom meio embargado, arranhou a garganta a fim de clarear a voz quando notou o cenho levemente franzido do homem à sua frente. - Ele trabalha no quarto andar, será que você pode o estar chamando?

— Sim, só um segundo. - falou, ainda a encarando um tanto desconfortável.

A grávida respirou fundo, tamborilando as unhas no balcão, mas parou quando notou o quanto estava tremendo. Era por isso que não poderia ligar para Jackson, iria chorar no instante em que escutasse a voz dele e suas mãos tremiam de mais para que conseguisse digitar algo. Segurar o celular por todo o caminho até ali já havia sido uma luta, principalmente pelo nó de angústia que bloqueava sua garganta. Torcendo as mãos, virou as costas para o atendente, fechando os olhos e respirando fundo a fim de controlar seu nervosismo. Contou até vinte, depois retornou em ordem decrescente, tentou seguir o ritmo das batidas de seu coração, o qual soava descontrolado sob a palma da sua mão direita. Inspirou mais algumas lufadas de ar frio, a cabeça zumbindo em confusão, quando pulou assustada ao sentir uma mão pesada em seu ombro.

— Ah...

Não soube o que falar quando deu de cara com Jackson, apenas rodeou a cintura dele com seus braços, o apertando o máximo que sua barriga permitia. Não chorou alto, lágrimas quentes escorregaram livres por sua face enquanto pequenos soluços escaparam por seus lábios ressecados. Escondeu o rosto no ombro dele, tentando sumir entre os braços fortes que a prendiam contra o corpo quente. Apertou os olhos, sentindo as pálpebras ficarem doloridas, mas não se afastou, nem mesmo quando ele a impulsionou a caminhar para longe.

— O que houve?

A pergunta foi feita em um tom controlado, mas Ramona conseguia detectar as notas de medo em sua voz. Se permitiu ser sentada em um sofá macio, se encolhendo contra Jackson antes mesmo que ele tentasse separá-los. Ouviu seu nome baixinho contra sua têmpora, mas não conseguia falar naquele momento e agradeceu em silêncio por Jackson esperar por uma reposta. Conseguiu abrir os olhos após algum tempo, piscando letargicamente para se acostumar com a claridade. Fungou incomodada com o nariz entupido, se afastando para procurar um lenço dentro da bolsa e tentando assoar seu nariz em silêncio.

Urgh.

Virou irritada em direção à fonte do som, o Fuller se encolheu diante de seu olhar e fez um sinal de que iria ficar calado. Ramona bufou, permitindo que sua atitude a distraísse, então tornou a fechar os olhos, se recostando contra o apoio do sofá, sentindo a cabeça tombar para o lado como se o peso do mundo estivesse prestes a empurrá-la contra o chão.

— Mamãe está na porta do nosso apartamento. - não ousou encarar o namorado, mas sentiu um toque suave envolver seu pulso e, logo após, sua mão ser envolta pela dele em um aperto ancorador. - Eu... eu não consegui. - tentou engolir o nó que se formava novamente em sua garganta, girou a cabeça para apoiar a nuca contra o sofá. - Não tenho nem coragem d-de ligar meu celular.

— Está tudo bem, amor. - tentou confortá-la, a puxando para um abraço, mas a grávida recusou.

— Não está tudo bem, Jackson. - finalmente o encarou, com os olhos inchados e vermelhos. Uma risada incrédula saiu por seus lábios, o que a fez levar a mão à boca a fim de interrompê-la. - Não está nada bem há tempos, caramba! E-eu estou surtando... não sei... - parou, esfregando o rosto com as duas mãos e soltando um alto suspiro. Balançou a cabeça em desistência, as mãos caindo no colo em cansaço. - Eu não sei mais o que sentir.

Piscou letargicamente, sentindo o corpo dolorido da tensão que emanava em ondas de seu ser. Jackson a encarava mudo, mas em seus olhos ela podia compreender cada bagunça de sentimentos que também o invadia. Tentou novamente não chorar quando foi puxada para os braços dele, mas não conseguiu, parecia que as lágrimas que tanto impediu por meses finalmente haviam encontrado uma saída. Era desesperador não poder controlar o que estava sentindo e ainda mais aterrador ter que confrontar todas as suas mentiras e omissões. Não estava preparada, mas tinha a sensação de que talvez nunca fosse estar.

<♡♡♡>

— Não, não, não, Jackson. - tentou puxar sua mão do aperto dele, cedendo ao seu instinto de fuga.

— Temos que encarar tudo de frente, Ramona. - ele a puxou e a girou para ficar de costas para ele. - Coragem, mulher! Daqui a alguns meses você vai empurrar um ser humano para fora de você!

Ela nunca tinha sentido tanta raiva de Jackson quanto naquele momento. Parou de repente, jogando o peso de seu corpo para trás, sabendo que ele a seguraria e sorrindo quando sentiu os braços dele a puxaram contra si.

— Que ser humano mais inconveniente você é. - resmungou, soltando o ar pesadamente quando percebeu que estavam no começo da rua de sua casa. - Mas tem razão, precisamos arrancar o band-aid de uma vez.

Sabia que ele sorria em suas costas pelo simples fato dela ter dito que ele possuía razão, mas resolveu deixá-lo com essa pequena vitória, eles iriam precisar de qualquer resquício de força antes de enfrentar sua mãe. Respirando fundo, endireitou os ombros e fingiu a coragem que definitivamente não tinha. Jackson apertou sua mão na dele, o que a fez virar o rosto e encontrá-lo com um sorriso encorajador, porém, ela o conhecia bem o suficiente para saber que aquela era apenas uma fachada muito bem colocada. Então o puxou para baixo e o beijou na bochecha, franzindo o nariz antes de seguir em frente. Ele apertou sua mão duas vezes, a seguindo quando Ramona começou a andar em direção à Kimmy. Sua mãe os esperava na entrada do prédio, Jackson ligou para ela antes de saírem do trabalho, avisando que logo estariam em casa. A mais velha estranhou o fato dos dois estarem voltando juntos e era nítido em sua voz a desconfiança.

Ramona viu o momento em que sua mãe percebeu que eles estavam juntos, as mãos unidas eram um óbvio sinal, mas a forma como a Gibbler mais nova se inclinava contra o Fuller mais velho tal como ele, como se gravitassem ao redor um do outro era outro forte indício. Kimmy sorriu animada, provavelmente inúmeros planos para noivado e casamento se construindo aos poucos, mas logo o sorriso brilhante deu lugar a um cenho franzido e posteriormente a um brilho claro de lágrimas não derramadas. O queixo de Ramona tremeu, seus olhos ardendo quando percebeu a expressão chocada de sua mãe.

R-Ramona?

Seu nome saiu carregado de emoção, dentre elas as mais identificáveis eram a surpresa e a decepção. Jackson soltou sua mão para que pudesse passar o braço por sua cintura, Ramona se apoiou nele, cobrindo sua mão, que estava apoiada na lateral de sua barriga, com a dela.

— Melhor entrarmos. - ele opinou em um tom rouco, recebendo acenos das duas mulheres que não conseguiam proferir uma palavra.

Jackson indicou para que Kimmy os seguisse, dando início a uma caminhada longa e silenciosa até o elevador, o que acarretou nos três presos em um espaço fechado por alguns instantes torturantes e recheados de tensão. Quando finalmente chegaram ao apartamento, Kimmy soltou o ar ruidosamente pela boca e encarou Jackson com uma expressão completamente irritada, a qual deixou Ramona desconcertada.

O que aconteceu aqui?

O Fuller corou, levando a mão à nuca enquanto olhava de soslaio para Ramona.

— Bem... como eu acho que você não vai querer saber... nós, hum, meio que...

— Jackson Tanner-Fuller! Não é sobre isso o que estou perguntando! - Kimmy gritou indignada e Ramona franziu os lábios quando o viu se encolher. - Eu não quero saber exatamente como você engravidou a minha filhinha e sim quando resolveu esconder de toda a sua família!

— Mas, mãe...

— Não, Ramona. - a cortou com um tom definitivo, virando-se novamente para Jackson ao continuar. - Não venha defendê-lo, DJ está há meses preocupada, sentindo que ele está escondendo algo e na verdade ela estava certa. - bufou alto, inclinando a cabeça para trás em derrota. - Ela nunca vai deixar que eu me esqueça que estava certa o tempo todo. - rapidamente lembrou do Fuller e o acusou. - Você mentiu.

Espelhando o bufo irritado de sua mãe, caminhou para ficar entre eles, completamente irritada por Kimmy ter reduzido seu namorado a um amontoado de desculpas murmuradas.

— Mas ele não mentiu sozinho! - bateu um pé no chão, não se importando com o quão infantil pareceu. - Que merda, é preciso duas pessoas para fazer um bebê!

— Não grite comigo! - exclamou indignada.

— Então não grite com ele! - tentou não se encolher diante do olhar dela, permanecendo de queixo erguido e olhar desafiador.

— Ramona Gibbler, não use esse tom comigo. - avisou, a encarando desapontada.

— Mãe... - começou, respirando fundo, pronta para continuar a discussão, mas logo sentiu seus ombros caírem quando a mão de Jackson apertou a sua e ele se colocou ao seu lado. O leve aperto a lembrou de soltar o ar que se encontrava preso envolto em tensão. - Olha, mãe, será que podemos sentar e tentar conversar com calma?

— Eu vou fazer um chá. - Jackson propôs, apertando a mão de Ramona novamente, chamando sua atenção.

Ela assentiu suavemente quando percebeu um claro pedido em seu olhos antes dele se voltar para a cozinha. Retirou seu casaco, caminhando para colocá-lo no cabideiro que haviam ganhando de presente de Daisy. Antes de se virar para a área da sala, olhou na direção da cozinha, encontrando um olhar de incentivo no rosto do namorado, o que a fez franzir os lábios, mas assentir minimanente. Ela tentaria manter a calma. Escutou um leve pigarro vindo de sua mãe e se virou para ela, a notando tentar disfarçar a maneira curiosa com a qual os observava.

— Se você possuir alguns biscoitos eu também aceito. - falou alto para Jackson, mas sem desviar sua atenção da filha. Então sentou-se no sofá e deu tapinhas no assento ao seu lado. Assim que ela sentou, desconfortável e com os braços cruzados, Kimmy indagou desapontada. - Por que, Ramona? Por que você não me contou, filha?

— Por isso. - gesticulou para ela, sentando-se de lado para vê-la melhor, sentindo sua guarda baixar. - Eu estava com tanto medo da sua reação e, principalmente, da do papai, que apenas não sabia como... não sei, simplesmente contar. Não poderia chegar e apenas dizer que vocês vão ser avós sendo que nem eu estava acostumada a ideia de ser mãe. O Jackson quis que contassemos logo, mas fui eu quem pedi para ele manter silêncio.

— Por quê? Você sabe que sempre iremos apoiar você, meu bebê.

E a reação inicial foi ótima.
Pensou internamente, tentando não deixar que a irritação tomasse conta da conversa.

— Eu não sei... acho que, no fim, só estava com muito medo de tudo ser real. - cruzou os braços sobre a barriga defensivamente enquanto se recostava no sofá ao confessar.

— Oh, meu bebê. - Kimmy estendeu a mão, mas parou antes de tocá-la. - Você não está sozinha e sei que seu pai vai amar saber que vai ser vovô.

— Mesmo o bebê sendo metade Jackson? - brincou, relaxando minimamente ao vê-la tentar baixar a guarda.

— É, ele vai surtar um pouco, mas vai aceitar. - soltou um riso quando notou o olhar descrente da filha e continuou. - Mesmo o bebê sendo metade Jackson.

Ramona riu baixinho, descruzando os braços e se aproximando dela.

— E você? Está bem com tudo isso, mãe? De verdade?

— Claro que não! - exclamou alto, afastando-se apenas para fazer uma careta para ela. - Sim, estou eufórica porque vou ser avó! Quem não ficaria? E mais com a minha melhor amiga ao mesmo tempo. Mas não vou mentir, você escondeu meu netinho de mim, na verdade escondeu toda uma vida da sua própria mãe. - gesticulou para o apartamento decorado e naquele instante Ramona percebeu o quanto dela e de Jackson estava refletido em cada parte do local. - Estou magoada, mas você ainda é a minha filha e nada vai mudar isso.

Ramona tentou conter o soluço, mas ele escapou por seus lábios trêmulos. Kimmy a puxou para os seus braços, chorando copiosamente tal qual sua filha. As duas mulheres se abraçaram fortemente e Ramona se permitiu relaxar completamente no colo de sua mãe. Sentira tanta falta dela, de seus carinhos, de sua risada, de seu apoio... Ramona não sabia o quanto precisava de sua mãe até tê-la no momento. A sentiu tensionar ao seu redor, a apertando mais forte, revirou os olhos quando percebeu o motivo. Jackson estendia uma xícara de chá para cada, parado desajeitadamente em frente à elas. Kimmy a soltou relutante, aceitando seu chá com os olhos estreitos em ameaça. Ela não o deixaria escapar ileso.

— Obrigada, amor. - o agradeceu, sorrindo carinhosamente quando o notou corar. Escondeu o sorriso divertido ao levar à xícara aos lábios, porém, sua atitude teve o efeito desejado e logo sua mãe relaxou parcialmente.

Sabia que Kimmy Gibbler ainda não confiava em Jackson, não por pensar que ele fosse uma má pessoa, mas sim, por não o dar crédito suficiente como um adulto responsável. Agora ele seria o pai de seu futuro neto, namorado de sua filha e cúmplice da ocultação de uma nova vida, literalmente. Demoraria um pouco para ela baixar as armas e enquanto isso não acontecesse, Ramona mostraria que ela e Jackson eram uma frente unida. Não deixaria seu namorado encarar os leões sozinho, ou, no caso dele, leoas.

— Bem, quais são seus planos para a minha filha?

A pergunta de Kimmy pegou os dois desprevenidos. Ramona tentou não bufar quando viu um semblante momentâneo de pânico no rosto do Fuller, e desviou sua atenção para os sanduíches que ele tinha apoiado no braço do sofá. Pegou um triângulo de pão de forma com uma pasta laranja, deu uma mordida, gemendo satisfeita ao sentir o sabor de frango e abóbora com algo a mais explodir em sua língua. Não sabia quando ele teve tempo para fazer a pasta, ou até mesmo cortar os sanduíches, mas agradecia por isso. E pelo visto seu bebê também, se a suave movimentação fosse uma garantia.

— Ora, vocês vão me responder ou não?

Olhou de soslaio para a mãe que os encarava impaciente, voltando à atenção para Jackson que a observava divertido. Levantou uma sobrancelha em aviso, era melhor ele não começar a sorrir ou os dois estariam mortos.

— Kimmy. - ele chamou a atenção dela, afastando-se da parede e cruzando os braços em frente ao corpo. - Eu só quero o melhor para a Ramona e para o nosso bebê, acredite nisso. Vou fazer tudo ao meu alcance para sempre estar ao lado dela e apoiá-la em qualquer decisão que a faça feliz. - seu tom era sério e não deixava dúvidas de sua sinceridade. Ele encarou Ramona, que terminava de engolir o sanduíche com um gole de chá, abrindo um sorriso que a paralisou. Porém, logo retornou a atenção para a sogra que se encontrava de cenho franzido. - Eu os amo e tudo o que faço e irei fazer será sempre pensando no melhor para eles. Sei que vai demorar para que você perceba que o velho Jackson cresceu, mas estarei aqui pela Ramona e não sairei do lado dela. Independente da sua opinião.

Ramona sentia seu coração bater descontrolado, encarava Jackson com a boca levemente aberta, mal percebendo quando ele a puxou pela mão para se levantar e retirou a xícara de seu domínio. O seguiu para longe do sofá enquanto ele pegava seu casaco na entrada e a puxava para fora do apartamento, piscando atuardida ao escutar a porta fechar atrás de si. O encarou sem fala, eles nunca haviam dito em voz alta a famosa frase, mas era perceptível em cada interação sua que ele a amava tanto quanto ela era louca por ele. Porém, Ramona não conseguia parar de pensar nas implicações de toda aquela revelação. Se eles se amavam, o que fariam dali em diante? Continuariam do mesmo jeito? Se transformariam em pessoas voltadas apenas para o outro e o bebê? Ou eles apenas se amavam por causa do bebê? Será que teriam desenvolvido aqueles sentimentos se aquele serzinho não tivesse sido somado às suas vidas? Será que ele ainda iria amá-la se ela não fosse a mãe de seu filho? Será que ela ainda o amaria se não estivesse carregando seu bebê?

— Você está pensando demais.

Fechou a boca em uma linha fina quando sentiu mãos carinhosas segurarem seu rosto. Mas logo relaxou ao seu toque quando viu o olhar intenso que ele a dirigia. Jackson a encarava com tanto carinho e adoração que se tornou quase possível esquecer todas as questões que rondavam a sua mente. Ele sorriu minimamente, inclinando a cabeça para beijar a ponta de seu nariz e em seguida a sua bochecha. A grávida riu suavemente, esfregando seu nariz no dele em um beijo de esquimó.

— Preciso ir agora, mas a noite podemos conversar sobre tudo.

Apenas concordou com a proposta, um som estrangulado saindo de seus lábios assim que o viu se ajoelhar à sua frente. O Fuller piscou um olho em sua direção, rindo do quão obviamente vermelha ela ficou enquanto olhava ao longo do corredor à procura de alguém.

— O que você...

Shiu. Preciso ter uma palavrinha com meu bebê. - a interrompeu, nivelando o rosto com a barriga dela antes de levar uma mão para apoiá-la. - Oi, solzinho, papai vai ter que sair por um tempinho e sua mamãe vai ficar um pouquinho nervosa por estar sozinha com a sua avó. Mas eu quero que você a ajude, tudo bem? Não vai ser fácil, mas um pequeno "olá" seu quando sentir sua mãe nervosa ou apenas uma sonequinha quando ela também quiser dormir vai ajudá-la.

— Você é inacreditável. - afirmou, sorrindo amplamente quando o viu beijar o ponto onde costumava colocar a orelha para escutar as batidas do coração de seu bebê. Seus olhos marejaram com as próximas palavras dele e ela tentou a todo custo não começar a chorar no meio do corredor.

— Papai te ama muito e quer saber um segredo? - perguntou em um falso sussurro. - Eu também amo bastante a sua mãe, por mais teimosa e dramática que ela seja. - voltou o olhar divertido para ela, levantando-se e a puxando novamente para os seus braços. - Preciso ir.

— Tudo bem. - murmurou contra seu pescoço, suspirando inconformada por ter que se separar justo naquele momento.

Jackson a apertou mais forte e Ramona cantarolou feliz quando sentiu os dedos dele massagearem os fios de sua nuca. Como sempre acontecia, se viu derretendo contra o corpo dele, o sentindo se moldar igualmente à sua forma. Mas logo ele os separou, levando uma mão ao seu rosto e limpando com o polegar o rastro de algumas lágrimas teimosas. Ela inclinou o rosto e beijou sua mão.

— Vejo vocês mais tarde e tente não se estressar, amor.

— Eu vou ficar bem, nós iremos. - garantiu, recebendo contente um beijo de despedida. - Agora vá, temos que pagar as consultas do solzinho de alguma maneira.

Jackson riu enquanto dava passos de costas para longe dela. Ele levou uma mão ao coração e murmurou "Te amo". Ramona sentiu seu coração inchar e uma sensação calma cair como uma onda sobre ela, sem conseguir conter o sorriso, falou silenciosamente de volta um "Também te amo" que o fez se iluminar visivelmente antes de praticamente pular em direção ao elevador. Ela o observou ir embora, mal acreditando no quanto a certeza do amor entre os dois trouxe leveza para o seu coração.

— Agora somos só nós duas contra um dia interio de perguntas, meu amorzinho. - inclinou a cabeça para falar com seu bebê, passando a mão ao longo da barriga redonda. Sentiu a suave movimentação de sempre, mas logo ela começou a se agitar, talvez sua forma de realmente dizer "Olá, estou aqui com você", o que a fez abrir um pequeno sorriso antes de respirar fundo e abrir a porta de seu apartamento. Seria um longo dia.


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