Sobre gatos, lobos e amizade escrita por Myosotis Fox


Capítulo 8
[VII] respirando


Notas iniciais do capítulo

bem, eu disse que sairia do hiatus se alguém estivesse lendo, e diz o registro de visitas que alguém leu tudo que tem postado aqui. então, tentemos de novo
e olá! espero que tenha tido uma boa virada de ano!
esse cap é um tanto longo pra média, mas cada pedaço é importante a seu jeito, pelo menos pra mim. aviso para uma breve crise de ansiedade e menções a invalidação de identidades lgbt+ (mas tirando isso, é um capítulo bem levinho, gosto bastante das ceninhas dele)



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Ouviu uma batida na porta, e Seonghwa gostaria de poder usar o som como desculpa para ter perdido a concentração, mas tinha perdido a partida no joguinho de celular antes disso. Seu rosto ainda demonstrava o desapontamento quando se virou para a irmã, o que a fez rir.

—Desculpa interromper tão importante momento... - brincou ela - Mas não quis sair sem te avisar.

—Tá indo onde?

—Dar uma passada no mercado, e tem mais umas coisinhas pra comprar também...

—Posso ir com você?

Nem precisaria perguntar, porque a resposta dela sempre era uma afirmação - e acompanhada de um largo sorriso. Já tinha algumas semanas desde a primeira vez que colocou os pés para fora de casa sem estar completamente coberto, mas a irmã parecia ostentar a mesma felicidade com isso toda vez. Okay, alguns dias eram melhores que outros, e às vezes ainda saía escondendo seus traços felinos, mas não era o caso da vez. Foi até Siyeon que insistiu que não deixasse o casaco para trás, advertindo que um vento frio corria naquela tarde e era melhor não se descuidar.

Na maioria das saídas, permanecia do lado de Siyeon, mas aquele era realmente um bom dia, e propôs seguir sozinho. A mais velha ficaria no mercado enquanto ele percorria as outras lojas que ela queria passar, para lhe adiantar. Ela ainda hesitou, mas acabou aceitando, e no momento ele riscava o penúltimo item da lista improvisada no celular. Estava pesquisando em que direção seguir quando sentiu alguém puxando a manga de seu casaco.

—Moço... – uma menina que parecia ter uns 6 anos lhe chamava – Você pode me ajudar?

Sem hesitar, Seonghwa se abaixou, se colocando na mesma altura da criança para lhe perguntar qual era o problema.

—Eu... eu me perdi... – choramingou ela – Eu fui brincar com um cachorro e ele saiu correndo, eu fui atrás... mas não sei como voltar...

—Okay, calma. – ele manteve a voz tranquila, tentando tranquilizá-la – Você sabe o celular da sua mãe?

—Não...

—Tudo bem. – o híbrido pensou por um instante, mas não tinha muitas alternativas do que fazer – Você não lembra mesmo onde estava antes?

—Não... – negou a menina – A gente tinha saído da igreja...

—Ah, eu sei onde tem uma igreja por aqui! – replicou, alegre por lembrar – Olha, talvez sua mãe tenha voltado lá pra te procurar.

E, mesmo caso se desencontrassem, possivelmente alguém da igreja reconheceria a garota, e também era um ponto de referência fácil.

—É verdade...

—Tudo bem se eu te levar pra lá, então? – indagou Seonghwa

A criança assentiu, e então ele pediu para segurar sua mão, a instruindo que não o soltasse, mesmo que algo lhe atraísse a atenção. E sua companhia parecia realmente prestar atenção em tudo, vez ou outra comentando com ele sobre coisas que via na rua que ele nem tinha notado.

—Moço... – ela chamou de novo, e fez um murmúrio para que continuasse – Você sempre teve essas orelhas?

O híbrido achou graça na pergunta.

—Sim, nasci com elas, assim como a minha cauda. – e Seonghwa não conseguiu reter a indagação – Acha estranho?

—Não. Eu queria ter também. – isso lhe surpreendeu, conseguindo uma risada – Um garoto na minha turma também tem, mas é diferente da sua. É de cachorro.

—É seu amigo?

—É sim, ele é legal. – sorriu ela – Minha mãe diz que eu não devia falar com ele.

Sentiu um aperto no estômago ouvindo aquilo, mas respirou fundo, tentando não ruir.

—E por que isso?

—Ela diz que ele deve ser agressivo. Mas é mentira, minha amiga bate mais nos outros do que ele.

—Bem, sua amiga não devia bater nos outros. – ponderou o mais velho – E sua mãe também não deveria falar isso, nem te impedir de ser amiga de alguém só porque ele é diferente.

—Ah, tudo bem, ela não fica na escola mesmo... – a menina deu de ombros – Aí eu converso com ele.

O híbrido não conseguiu não achar graça na simplicidade com que ela apresentou a solução, ainda que se preocupasse com uma criança ter tanta facilidade de fazer algo pelas costas da mãe. De qualquer maneira, seria melhor que a conversa não estacionasse naquele tópico, então a perguntou sobre os colegas de sala e se gostava da escola.

Em poucos minutos, entrou na rua onde já conseguia ver a igreja ao final dela. Teria a alcançado não fosse uma voz feminina chamando desesperada pelo nome da menina – deduzia que fosse, pelo menos, porque a criança se voltou automaticamente na direção do som. Pelo sorriso dela, deveria ser sua mãe, mas Seonghwa nem teve tempo de ficar feliz pelo reencontro, pois a mais velha puxou a garota de seu alcance.

—Fique longe dela! – chiou

—Tudo bem, mamãe, ele me ajudou... – interviu a menina, mas logo foi cortada

—Já avisei pra não falar com estranhos! Ainda mais com esses animais...

Não captou muito mais, visto que a mulher já tinha lhe dado as costas e saído andando, sequer lhe direcionando uma palavra de gratidão. Ao menos, a garota seguia indiferente ao veneno destilado por ela, porque sorriu e lhe acenou em despedida.

O rapaz ainda permaneceu alguns instantes imóvel, como que terminando de absorver o que acabara de acontecer, e então tudo desabou. Seonghwa desatou a dar passos rápidos, sem notar para onde estava indo, apenas focado em se afastar dali. Só queria escapar daquele momento e de todos os seus ecos, puxando o capuz para cima em uma tentativa estúpida de passar despercebido, como se todos já não tivessem o visto e apontado.

Queria alcançar algum lugar conhecido para que pudesse respirar, mas chegou um ponto em que não aguentou mais, se rendendo a sentar no meio-fio para poder parar por um momento, tentando fazer que o mundo parasse também. Não sabia quanto tempo tinha se passado, o ruído em sua mente lhe impossibilitando qualquer discernimento preciso, mas alguém se sentou ao seu lado. Ele nem percebeu quando isso aconteceu, só se dando conta que não estava mais sozinho quando sentiu o delicado toque em seu ombro. Mesmo que o contato fosse gentil, a surpresa o fez se sobressaltar, ao que a garota ao seu lado pareceu arrependida.

—Calma, calma... – ela se apressou em falar, em tom baixo – Consegue acompanhar uma contagem? Conto até 4 e você inspira nesse tempo, tudo bem?

Conhecia aquela técnica, inclusive a usara algumas vezes, então prontamente assentiu. O híbrido nem precisaria do resto da explicação, mas deixou que ela falasse, porque de alguma maneira aquela voz lhe acalmava. De fato, inspirar e expirar naquele ritmo sempre ajudava a relaxar, e dentro de alguns minutos sua mente estava propriamente funcionando de novo.

Foi quando finalmente pode melhor reparar na garota sentada ao seu lado. Seu rosto era gentil e muito bonito, e podia ver mechas de um cabelo alaranjado escapando do capuz que ela usava. Seonghwa também percebeu que as roupas dela pareciam de um tecido bom demais para não serem caras, e se sentiu mal que ela tivesse sentado no meio da rua com aquele outfit. Mas talvez o que mais lhe capturou a atenção foi como havia algo de conhecido naqueles traços, mas não conseguia se lembrar de onde.

—Acho que já te vi em algum lugar...

Ela deu uma risadinha antes de responder.

—Me dizem isso às vezes. – mas ela não se demorou ali, deixando a preocupação tocar sua voz novamente – Mas como você tá? Se sente melhor?

—Sim. Obrigado...

Talvez fosse falar mais alguma coisa, se sentia estranhamente disposto a conversar com ela e mesmo ser honesto sobre o que se passava dentro de si, mas o toque do celular o interrompeu – e atendeu de pronto ao ver o nome na tela.

—Ah, o-oi, Siyeon! – gaguejou – D-desculpa, eu... eu me perdi... ma-mas não tem problema, eu...

—Posso? – a garota lhe pediu o celular, e se viu acatando antes que pensasse direito na proposta – Oi! Calma, tá tudo bem, eu to aqui com seu...

—Irmão.

—Seu irmão, ele se sentiu mal, mas já tá melhor agora.

Mesmo sem ouvir com exatidão as palavras vindas do outro lado da linha, conseguia captar o tom de preocupação da mais velha, e isso lhe invadia com uma pontada de culpa. Apenas observou enquanto sua companhia instruía em qual rua estavam, se sentindo um fardo deslocado e grande demais para ser carregado.

—Pronto! Ela já vai chegar. – sorriu a garota, mas algo em sua expressão deve ter lhe entregado, pois ela perguntou – Algo errado?

—Não queria ter decepcionado ela. – murmurou o garoto – Eu realmente estava melhor... mas agora ela tem que cuidar de mim de novo.

—Você se sente decepcionado quando tem que cuidar dela? – questionou sua companhia

—Claro que não!

—Mesmo que seja a décima ou centésima vez, você sentiria isso?

—Não!

—Então por que acha que ela sente isso com você?

—É diferente... – porque sempre era com ele – Eu realmente tava melhorando...

—Você está melhorando. – ela colocou ênfase em como aquilo ainda era presente, e segurou sua mão antes de prosseguir – Saber quando precisa pedir ajuda faz parte de melhorar também, sabia? E tenho certeza que sua irmã quer te ajudar, quer estar ali pra você. Você faria o mesmo por ela, não faria?

Concordou sem hesitar, porque era verdade. Se a situação fosse invertida, não importasse quantos anos Siyeon precisasse de suporte, estaria lá por ela e nunca acharia que estava fazendo demais.

—Obrigado. – disse, por fim – Você é uma pessoa muito boa.

—Imagina... a gente tem que cuidar um do outro, né?

—Nem todo mundo pensa assim...

—Então a gente deixa eles estarem errados. – replicou ela, resoluta, e se deixou vencer por aquele sorriso

E, passados alguns segundos, vendo que a garota não fez menção de sair dali, percebeu a intenção dela.

—Olha, você não precisa ficar aqui...

—Tem certeza? Eu não to com pressa.

—Não, não, já te aluguei bastante. E minha irmã logo chega.

—Tudo bem, então. – ela finalmente soltou sua mão, fazendo menção de se levantar, mas decidiu se assegurar uma última vez – Mas você tá melhor mesmo, né?

Assentiu, e o sorriso que deu foi sincero.

—Como um garoto com sorriso tão adorável pode achar que alguém se decepciona com ele?

O elogio inesperado o pegou completamente desprevenido, e Seonghwa ficou muito sem jeito, até gaguejando para agradecer. A garota riu de sua timidez, mas sem zombaria, apenas achando fofo seu nervosismo. De qualquer maneira, ela se levantou, se despedindo e desejando que ele ficasse bem.

Algumas horas depois, o híbrido pensaria ter reconhecido aquele rosto de algum anúncio que interceptou um vídeo que assistia, mas provavelmente era só sua mente lhe pregando uma peça.

 

Apesar do incidente do dia anterior, quando Hongjoong o chamou para uma visita no dia seguinte, se sentia energizado para ir. Talvez a perspectiva de ir na casa de um amigo fosse o bastante para lhe deixar animado, e de qualquer jeito era melhor não pensar demais sobre isso, então apenas se deixou levar. Ainda ficou sem coragem de andar pela rua sem esconder os traços felinos, mas deixou ecoar as palavras da garota gentil e focar no que melhorava. E ser recebido com um largo sorriso certamente o ajudou a se centrar no que acontecia de bom.

—Bem-vindo! – uma mulher de curtos cabelos castanhos e expressão serena lhe recepcionou – Entre, por favor. Meu filho tem comentado tanto de você... e ainda assim se esqueceu de dizer como você é bonito!

—Ah, obrigado... – agradeceu, cobrindo o rosto por reflexo da timidez – É um prazer te conhecer, senhora Kim.

—O prazer é meu. Sabe, Hongjoong não é alguém que tem muitos amigos... ele é um menino muito bom, mas não se abre muito fácil. Então sempre fico feliz quando vejo alguém novo por aqui.

Talvez famílias fossem todas similares de alguma maneira, porque quase conseguia ouvir a voz de Siyeon naquelas palavras. De qualquer jeito, a mulher logo o guiou para uma escada ao fundo da sala de estar, que deduziu levar ao sótão da casa. A porta estava fechada, e, no espaço de tempo antes de se colocarem na soleira e ela bater, pedindo permissão para abrir, Seonghwa conseguiu captar um cantarolar baixo, acompanhando a musica que ecoava no cômodo.

I woke up from the same dream, falling backwards, falling backwards...

—Hongjoong, querido? Seu amigo está aqui.

Logo ouviu o barulho de passos, em poucos segundos a porta se abrindo e revelando um sorridente Hongjoong.

—Oi, Hwa, entra! Desculpa te chamar do nada assim... mas terminei uma tela de manhã e queria te mostrar.

Tinha pensado que entraria no quarto dele, mas, assim que colocou o pé dentro do sótão, percebeu que o local era reservado para o lado artístico do garoto. Havia diversas telas e materiais de pintura e desenho no fundo, e a parede à direita tinha algumas de suas fotos bordeando uma mesa com sua câmera e um computador. Além disso, à esquerda, além do rádio de onde escapava a música que ouvia, havia um teclado e alguns livros sobre música.

—Você também compõe?

—Me arrisco um pouco. – disse ele, modesto como sempre

—Tem alguma coisa que você não faça?

O mais novo hesitou, mas admitiu com um sorriso sem jeito.

—Nunca me deixe perto da cozinha.

Seonghwa riu com isso, mas em nada sentiu sua admiração por seu amigo diminuir, porque ele realmente sabia muita coisa. Não teve chance de expressar isso, contudo, pois o dono da casa já estava o empurrando para perto de um cavalete coberto por um pano. Foi quando finalmente absorveu como seu amigo falou sobre ter terminado uma pintura e querer compartilhar isso com ele. A perspectiva de que o garoto pensara nele com aquilo o preencheu de felicidade, e ficou ainda mais radiante ao que viu o quadro.

Era a imagem de uma praia, mas Hongjoong invertera as cores esperadas para aquele tipo de cenário. O sol brilhava em azul-claro no meio de um céu alvo, enquanto o mar que preenchia a metade de baixo do quadro era formado por nuances de laranja e amarelo, contrastando com a areia de um tom escuro de azul.

—Vou tomar sua reação como um “gostei”. – brincou ele, com um sorriso orgulhoso

—Ficou incrível! Adorei o que você fez com as cores... Obrigado por me mostrar.

—Foi a primeira pessoa que pensei.

Se já estava emocionado, depois daquele comentário em tom tão casual, Seonghwa poderia até mesmo chorar. E talvez sua emoção tenha transparecido em sua expressão, porque o mais novo deixou escapar um sorriso de canto antes de comentar.

—Você pode me abraçar se quiser, okay?

Não levou nem um segundo para responder, o enredando em seus braços. Sempre se sentia tão confortável perto de Hongjoong, e sabia que nunca conseguiria expressar isso em palavras, mas talvez um abraço conseguisse ser um início.

Havia apenas uma cadeira no cômodo, que provavelmente alternava de lugar dependendo do que o artista fazia, mas, no momento, ele preferiu se sentar no chão – logo sendo imitado pelo híbrido –, pegando uma tela menor que estava apoiada em uma das paredes. O objeto já tinha alguns leves traços em lápis, e o artista comentou que tinha iniciado pouco depois de concluir a última obra. Seonghwa temeu que estivesse atrapalhando, mas ele lhe garantiu que estava só rabiscando, “só para não perder a ideia”, e não se incomodava com sua companhia de qualquer jeito. Engataram em uma conversa que começou sobre o rascunho em questão, mas foi se desdobrando em várias coisas, um rio fluindo naturalmente por diversos campos. A música ao fundo era um bom complemento, e o híbrido ficou particularmente alegre quando reconheceu uma canção de Lauv, até cantarolando sem perceber – só se deu conta quando Hongjoong elogiou sua voz, e mesmo o incentivou a cantar mais alto apesar de seu rosto corado.

Nem sentiu o tempo escorrendo, só percebendo que horas já tinham ido embora quando a mãe de Hongjoong apareceu na porta trazendo um lanche para a dupla. Na verdade, até isso demorou a registrar, pois no momento estava deitado com a cabeça apoiada nas pernas do mais novo, e seu amigo tinha acabado de encontrar o ponto atrás de suas orelhas que quando acarinhado o deixava automaticamente relaxado e ronronando. E talvez realmente tivesse deixado de captar algo, porque Hongjoong interrompeu o toque bruscamente e já não tinha mais uma expressão tão leve, e revirou os olhos ao que ficaram sozinhos de novo.

—Algum problema? – indagou, colocando-se sentado

—Deixa pra lá... Não é como se eu já não esperasse isso. – resmungou, mas vendo que o mais velho continuava esperando uma explicação, ele completou – Estamos muito próximos, então obviamente eu quero “algo mais” com você.

Levou alguns segundos para entender o que aquelas palavras significavam, e então não escondeu o desgosto, porque era estranho demais pensar em Hongjoong como algo diferente de amigo.

—Ela não sabe que você é aroace?

—Eu me assumi tem alguns anos... mas parece que ela sempre esquece. A cada três meses eu tenho que lembrar a ela que não, eu não vou encontrar “alguém especial” e “mudar de ideia”.

Pelo tom com que falava, o garoto provavelmente já ouvira frases do tipo mais vezes do que poderia contar, e estava bem incomodado com aquilo. Seonghwa conseguia deduzir porque, mesmo que ainda não tivessem conversado muito sobre aquele tópico, mas o que constantemente ouvia de suas irmãs lhe dava uma ideia. Apesar de terem crescido em um ambiente acolhedor, ambas viviam também em contato com outras esferas sociais que não proporcionavam a mesma compreensão, e então era uma constante necessidade de dizer de novo e de novo e de novo. Um constante repertório de “você é nova demais para saber”, “vai aparecer alguém especial”, “você não sabe até experimentar”, como se os outros soubessem mais delas do que elas mesmas, como se elas não tivessem permissão de entender o que as deixava confortável ou não, como se suas maneiras de sentir afeto não fossem o suficiente. Elas precisavam sempre reafirmar, contestar, explicar, porque seu próprio entendimento nunca parecia bastar.

—Sinto muito.

—Ah, tudo bem. – Hongjoong deu de ombros, mas não soou tão convincente assim – Na maioria das vezes, eu fico mais confuso do que irritado. Sei lá, por que tenho que explicar que tava ansioso pra você vir aqui ou te abracei porque você é meu amigo? Isso não é o normal de amizade?

O mais velho estava pronto para concordar, mas foi distraído ao que propriamente entendeu o que tinha ouvido.

—Você tava ansioso pra eu vir aqui? – indagou, sem conseguir conter um sorriso

Hongjoong nem tinha se dado conta do que confessou, porque nem reagiu de cara, e pode perceber que ele estava sem jeito.

—Não desvia o assunto. – replicou o ruivo, sem olhar diretamente para Seonghwa, o que o fez rir

—Mas concordo. É estranho como esquecem muito fácil que amigos se amam também. Acho que dei sorte que a minha família é tranquila com isso.

—Ah, é? Sem pressão pra namoro ou coisas do tipo?

—Zero. Você nunca vai ver meus pais dizerem que to apaixonado por alguém porque eu tava de mãos dadas com essa pessoa. Também nunca vai ver eles pedindo pra gente arranjar um namoro... bem, eles até querem que eu namore, mas não porque acham que preciso disso pra ser feliz.

—O que quer dizer?

—Ah, você sabe... – tentou falar sobre sem mergulhar demais naquela sensação, bordeando o tópico – Você é a primeira pessoa que eu me aproximei desde que passei a ser dessa família. Eu... ainda to aprendendo a fazer isso. Eu nunca fiquei com ninguém não porque nunca quis...

—Mas porque você não se sentia confortável de chegar na pessoa. – seu amigo completou por si, e apenas assentiu – Só por curiosidade, você precisa ser mais próximo de alguém pra querer isso?

—Não sou demi, se é o que tá perguntando. – replicou o mais velho

—Ah, droga. – resmungou Hongjoong, em tom de desdém – Mais um amigo allo pra minha lista...

O híbrido riu com aquilo, sabendo que era brincadeira por estar acostumado com as reclamações de Hyeju – bem, até tinha um fundo de irritação genuína às vezes, mas sabia que não era uma crítica a ele, apenas cansaço de lidar com grupos onde a maioria destoava demais da sua maneira de sentir.

—Mas acho que eu só namoraria alguém que já fosse meu amigo. – completou – Não preciso disso pra me apaixonar, mas, sei lá, acho que me sentiria melhor se já conhecesse mais da pessoa... até pra saber se eu realmente gosto dela ou não.

—Mais inteligente do que 90% das pessoas que eu conheço. – comentou Hongjoong, mas adicionou depois de alguns instantes – Talvez o jeito que sua família te criou ajudou nisso.

—Você acha?

—Sempre penso que as pessoas se jogam em relacionamentos românticos sem pensar em mais nada porque, como a gente falou, todo mundo sempre trata isso como a suprema fonte de afeto e felicidade... O que importa mais do que isso? É melhor ter um relacionamento ruim do que ficar sem amor, porque elas acham que amor é apenas isso.

Não deixou de assentir, vendo lógica naquela perspectiva, e também não deixou de pensar em como tinha sorte de ter sido acolhido por uma família que sempre lhe deu espaço para sentir.


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Notas finais do capítulo

a fic é minha e hongjoong é fã de sleeping at last pq sim (e pq acho mesmo que ele gostaria dessas músicas, alguém sugere isso pra ele pfvr)



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