The Thorn's Secret escrita por Duda Mockingjay


Capítulo 2
Yor Briar


Notas iniciais do capítulo

Hello!

A two-shot virou three kkkkkkkk

Último cap sai ainda essa semana!

Boa leitura



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— Yor?

O cano prateado da arma dificultava sua visão, mas Yor reconheceria aquela voz em qualquer lugar.

— L-Loid?

Com o corpo travado no meio do movimento, suas agulhas douradas prestes a transpassar o pescoço do homem, a respiração presa na garganta, Yor viu Loid baixar a pistola apenas o suficiente para poder encará-la nos olhos, o cano frio agora encostado no peito dela. As mãos dele continuavam firmes sobre a arma, o corpo retesado e preparado para qualquer movimento repentino, mas os olhos azuis estavam opacos, anuviados, expondo toda a confusão e mágoa que borbulhavam dentro dele.

Os exatos sentimentos que Yor lutou para nunca ver naqueles olhos azuis tão bondosos. O medo de presenciá-los foi o que a fez nunca revelar sua segunda vida.

E ela quis! Tantas vezes ela se viu na iminência de falar, de revelar tudo porque Loid merecia a verdade.

A primeira vez foi logo no início de tudo quando ele a salvou daquela festa idiota da Camilla poucos dias após ele firmarem o acordo do relacionamento de mentirinha e disse coisas tão maravilhosas sobre ela mesmo mal a conhecendo, as palavras saindo com uma ferocidade e paixão que fizeram o corpo de Yor arrepiar. Eu não posso enganá-lo, ela pensou na época enquanto eles desciam no elevador do prédio e ela não parava de admirar o rosto belo do homem ao seu lado, não posso deixar que acredite nesse lado inocente e bondoso meu. Não posso deixá-lo viver numa mentira.

Mas então os pacientes dele os atacaram e tudo aconteceu tão de repente que quando Yor percebeu já aceitava o pino da granada como aliança e dizia um tímido “sim” ao pedido de casamento de Loid, o som da explosão ao fundo deixando tudo ainda mais surreal. Os olhos grandes e ansiosos de Loid sobre ela, a mão quente dele entrelaçada na sua, a respiração doce contra seu rosto. Tudo foi intenso demais, real demais e a expectativa nos olhos dele a mantiveram em silêncio.

Ela queria tanto ser a Yor que ele acreditava!

Depois disso, oportunidades de dizer a verdade surgiam e sumiam enquanto Yor perdia a coragem no momento que via os olhos atentos de Loid sobre si, esperando por suas palavras, alheios ao caos que elas causariam. No início ela deixou as chances passarem afirmando para si mesma que Loid também tinha seus segredos e que aquele nem era um relacionamento de verdade, era tudo por conveniência. Ela já era a Thorn Princess por mais de dez anos e seu trabalho como assassina nunca interveio em sua vida pessoal, ela era duas pessoas completamente diferentes e não fazia sentido nem traria nenhum benefício misturar as duas agora. Ela manteria tudo do jeito que estava pelo tempo que Loid e Anya estivessem na vida dela. Um ano talvez, apenas tempo suficiente para não levantar suspeitas na escola de Anya. Então viria a não-tão-surpreendente separação e cada um seguiria seu caminho, felizes e satisfeitos.

Até Yor perceber seu plano ir por água abaixo quando seu coração maldito resolveu seguir um rumo completamente diferente.

Primeiro ele começou a acelerar loucamente sempre que Loid sorria para ela, um sorriso antes simples e casual que fazia os olhos dele fecharem e covinhas surgirem na bochecha (como ela não reparara antes no quão adorável isso era?) agora era como jogar fogo no seu corpo banhado em gasolina. Então seu coração ia parar na garganta quando os dedos dele esbarravam nos seus e ele cobria sua mão com a dele, firme e possessivo, o calor da palma aquecendo a pele de Yor, o braço tão perto do dela que deixava seus pelos arrepiados. Claro, era tudo pelas aparências! Tinham que mostrar certa intimidade comum aos casais quando passeavam no parque ou nos encontros que Loid marcava nos melhores restaurantes de Berlint, mas o coração idiota de Yor não parecia capaz de separar a realidade da fantasia e, no fim, ela quem tinha que disfarçar quando o olhar curioso de Loid percebia sua respiração acelerada e seu corpo inquieto enquanto ela torcia para o ribombar no seu peito não ser audível.

Então seu coração começou a se descontrolar de vez por tudo que Loid fazia, até os mínimos detalhes. O jeito que ele mexia no cabelo quando estava preocupado ou irritado, o carinho nos olhos dele quando encarava Anya e o cuidado que ele tinha quando ia colocá-la para dormir, o mover dos braços e costas quando preparava algum prato complicado e o lamber dos lábios sempre que provava a comida e ela o agradava. Até o perfume amadeirado e com toques de canela faziam Yor delirar.

Isso já era ridículo!

Eu não posso... não posso estar me apaixonando por ele!

O golpe final foi uma semana antes, o que era pra ser um simples passeio no parque virou um completo desastre quando Bond se soltou da coleira e correu descontrolado para a rua. Yor o seguiu e empurrou o corpo enorme do cão para a calçada no exato momento que um carro buzinava, os faróis brilhando perto demais. O salto de Yor se quebrou na correria e ela sentiu o tornozelo doer feito o inferno, mal conseguia andar quanto mais sair do caminho do automóvel que vinha rápido demais, era impossível que freasse a tempo. Ela fechou os olhos ouvindo alguém gritando seu nome e apenas sentiu algo se chocando com seu corpo de repente.

Algo macio e que, ao invés de quebrar seus ossos, protegeu seu corpo quando rolaram pelo chão, recebendo a maior parte do impacto.

— Yor? Yor! Fala comigo! Tá tudo bem?

Ela piscou lentamente, os olhos finalmente se arregalando ao ver Loid com o corpo sobre o seu, os olhos preocupados dele focados em seu rosto enquanto os dois permaneciam jogados na calçada. Anya, Bond e algumas pessoas estavam ao redor e Yor ergueu o pescoço alguns centímetros vendo o carro que quase a atropelou sumindo no fim da rua. Ela deixou a cabeça cair na calçada, um suspiro aliviado saindo dos lábios, o peito subindo e descendo rapidamente, se chocando involuntariamente com o tronco firme de Loid que continuava com o corpo sobre o seu.

Loid. Deitado. Sobre. Ela.

Yor se sentou de repente fazendo Loid se afastar, os olhos dela arregalados e o rosto corado de vergonha.

— E-Eu tô bem sim. O-Obrigada, Loid.

Ele não parecia satisfeito, o cenho franzido analisando o corpo dela em busca de ferimentos o que a deixou ainda mais envergonhada. Quando percebeu que não havia nenhum machucado ele se ergueu e estendeu a mão que Yor aceitou. No momento que ela ficou de pé seu tornozelo latejou de dor e ela cambaleou, xingando baixo por ter esquecido esse pequeno detalhe.

— Você torceu o tornozelo, com certeza. – A voz de Loid soou preocupada e séria, perto demais do rosto de Yor. – Vamos Anya, Bond. Precisamos levar Yor para casa e cuidar desse pé.

Yor prendeu a respiração quando os braços de Loid rodearam seu corpo, um apoiando suas costas enquanto o outro erguia suas pernas com uma elegância e delicadeza surpreendentes. Ele ajeitou o corpo dela contra o seu com facilidade, os braços de Yor rodeando o pescoço dele para se firmar e talvez se aproveitando um pouco de toda a situação, e ele levou-a todas as cinco quadras até em casa no estilo noiva.

E assim começou a melhor semana da vida de Yor.

Ela nunca se sentiu tão querida, tão preciosa e cuidada. Com a morte precoce dos pais, ela agiu como uma mãe para Yuri, seu irmão mais novo, desde bem cedo e acabou esquecendo de si mesma para fazer o possível e impossível pelo irmão. Ela se mostrou forte mesmo quando se sentia fraca, se tornou uma assassina para arcar com a criação e educação dele, se manteve nas sombras para que ele pudesse brilhar. Aos poucos ela se convenceu que assim era melhor, que ela não poderia demonstrar fraqueza. Não queria preocupar o irmão, não queria preocupar ninguém.

Então Loid apareceu com seu jeito preocupado e carinhoso, ignorando todas as tentativas delas de mostrar que era forte para cuidar de si mesma e tratando-a como uma princesa. Ela gostava de ser forte, ela sempre tinha precisado ser forte, mas não daquela vez.

Naquela semana ela se permitiu ser cuidada, ser mimada. Ser amada.

Loid chamou o médico e seguiu todas as instruções dele: fazia Yor permanecer na cama, massageava seus pés estimulando a cura do tornozelo, buscava deixá-la o mais confortável possível. E ele ia além: fazia todas as comidas preferidas de Yor e as trazia na cama, encheu o quarto com as flores preferidas dela e até mesmo ajudou Anya a trançar o cabelo dela quando a menina insistiu. Muitas vezes ele apenas se sentava na beirada do colchão e passava horas conversando com ela, seu sorriso perfeito aquecendo o coração da morena, ou trazia seu caderno de desenhos e fazia esboços sem fim do rosto dela, os olhos azuis tão intensos que deixava Yor corada.

Ele cuidou dela com o mesmo carinho e amor que um marido tinha pela esposa.

Não uma esposa falsa.

Uma esposa de verdade, uma mulher que se ama e se preocupa.

E talvez ela estivesse sendo ingênua demais, mas duas noites depois do quase acidente, quando Loid se despediu à noite com um beijo delicado e quente sobre a testa dela, o “boa noite, querida” saindo baixo antes dele sair e fechar a porta do quarto, ela percebeu que não conseguia mais negar.

Um simples beijo em sua testa e tudo se encaixou.

Eu o amo. Eu amo o Loid.

Mesmo com tanta experiência na arte de matar, Yor era completamente alheia a arte do amor. Ela nunca nem ao menos se envolvera com ninguém, os dois encontros que tivera na vida foram tão ruins que ela sumiu antes do final da noite. Com tempo acabou se dedicando tanto ao seu trabalho no Jardim que deixou esse âmbito da sua vida de lado dizendo a si mesma que o amor por seu irmão era suficiente, que não precisava de mais ninguém.

Mas quando pensava em Loid todas as suas antigas convicções caíam por terra.

Ela precisava dele. Ela o queria. Ela o amava.

Ela tinha certeza de que nunca contaria a verdade sobre seu trabalho de assassina de aluguel.

Não, não contaria por que estava decidida a se demitir.

Ela já tinha pensado em desistir de ser a Thorn Princess antes, durante sua missão no cruzeiro Lady Lorelai, mas acabou mantendo porquê de uma forma estranha e meio maluca ela gostava do que fazia. De certa forma ela sentia que ajudava seu país eliminando ameaças, protegia pessoas inocentes e mantinha seu irmão seguro.

Mas, como um clique, ela percebeu que seu irmão já era adulto, sabia se cuidar muito bem. Não precisava mais dela tanto assim. Além disso, havia outros agentes tão bons quanto ela no Jardim.

Ela agora tinha uma família para cuidar. Uma família que queria manter para além do contrato. Uma família para conquistar.

Ela amava Bond, amava Anya. Amava Loid. Queria estar com eles para sempre.

Para isso as mentiras tinham que sumir e só havia duas formas: contado a verdade ou desistindo de vez de ser assassina.

Ela se imaginou contado tudo para Loid, ele a encarando com surpresa e então com medo ou raiva e enfim a mágoa. Ele dizendo coisas terríveis e nunca mais confiando nela. Ele se afastando e sumindo da vida dela com Anya para sempre.

Só pensar naquilo fez Yor sentir a garganta arranhar, os olhos ardendo. Não, não posso deixar isso acontecer. Não posso perdê-los.

Então no dia seguinte ela telefonou para o número confidencial do Jardim, deixou a senha requerida e quando ouviu a voz grave do Lojista contou sua decisão de forma séria e direta.

Quando desligou o telefone se recostou na parede e escorregou até o chão, os olhos arregalados, a respiração entrecortada, o peito acelerado com a ameaça final daquele homem que sempre admirou como a um pai.

 Anya e Loid Forger, a família de faz de conta. Ou nem tanto. Abandone o trabalho e não terá que se preocupar com o divórcio, será viúva antes disso. E não podemos deixar a garotinha sem pai, não é? Ela vai junto com ele!

Quando Loid chegou naquele dia ela ainda estava jogada no chão, as lágrimas descendo descontroladas. Ele ficou apavorado mesmo quando ela forçou um sorriso avisando que tinha ido ao banheiro e acabou usando o tornozelo e machucando-o de novo, nada demais. Ele ainda a encarou desconfiado, mas a acomodou na cama e deixou um aperto leve nos dedos dela antes de sair.

Ela segurou a blusa dele antes que se afastasse.

— Pode ficar aqui? Só...me conte como foi seu dia.

Loid piscou e sorriu, acenando e se sentando no colchão, tão perto que seu perfume invadiu a respiração de Yor, dominando tudo. E enquanto ele falava Yor apenas admirava todos os traços perfeitos daquele homem incrível, se sentindo o ser mais desprezível do mundo por colocar aquela família em perigo, por ter o homem que amava e a filha que adotou como sua na mira de um assassino.

Contar a verdade agora parecia ainda mais impossível, não apenas por causa do seu egoísmo e mesquinhez de manter Loid consigo acima de tudo, mas pela própria segurança dele e da filha.

Se Loid souber de tudo e agir por impulso, o Lojista pode colocar sua ameaça em prática mesmo eu permanecendo no emprego. Ele sempre cumpre suas promessas. Se eu sair da linha, mesmo com palavras, ele vai matá-los!

Não posso permitir isso. Não suportaria!

Então os dias passaram tão iguais, os cuidados de Loid parecendo ainda mais dolorosos quando Yor sabia que não merecia tudo isso, mas sendo incapaz de afastá-lo agora. O tornozelo logo melhorou e um dia depois ela recebeu sua nova missão: o assassino de políticos. Ela chegou cedo na mansão Desmond e se escondeu facilmente entre os arbustos altos ao redor do muro. O homem surgiu uma hora depois, vestindo preto dos pés às cabeça e nocauteando os dois guardas no portão com uma destreza surpreendente. Ele olhou ao redor e satisfeito por não ver ninguém, escalou o muro e saltou. Yor o seguiu de perto, mantendo-se distante das janelas iluminadas e logo entrando pela janela de um escritório, encurralando o homem que nem ao menos percebera estar sendo seguido até sentir o salto de Yor sobre seu peito, a testa sangrando com o golpe preciso que ela lhe deu, os olhos arregalados diante da lança dourada que ela segurava contra seu pescoço.

— Me concede a honra de tirar sua vida, Osborn Perkins?

O homem ainda soltou um grunhido apavorado antes da arma atravessar sua garganta, sangue espirrando sobre as botas pretas dela enquanto o odor cúprico já encharcava o ambiente. Ela limpou o sangue da lança na camisa do morto, afastando a franja dos olhos, um sorriso satisfeito por não haver tanta sujeira assim para limpar.

Agora, o que diabos eu faço com o corpo? Deixo aqui para os policiais encontrarem e apago todas as minhas digitais ou...

Nessa hora a porta se abriu e tudo aconteceu rápido demais. Yor lançou a lança recém limpa que se prendeu na madeira e correu com a outra lança preparada, a sombra do intrometido visível pelo umbral da porta segundos antes dele investir novamente, dessa vez com mais coragem.

Então o cano da arma, a agulha dourada empunhada, os olhos se encontrando, os azuis assustados sobre os vermelhos perplexos.

O reconhecimento.

Confusão. Descrença. Raiva. Mágoa.

Tudo estampado no olhar de Loid, tudo que Yor temia e que agora ela não poderia mais esconder. Ela deixou o braço cair ao lado do corpo, a lança dourada caindo sobre o tapete com um baque surdo.

— O que você está fazendo aqui?

A pergunta saiu dos lábios de ambos ao mesmo tempo.

Loid continuava com a arma apontando para o corpo da mulher, o rosto numa máscara de indiferença fria encarando a expressão dolorida que surgia nos olhos de Yor. Enfim os olhos deles se desviaram levemente para o lado e ele viu de relance um braço desfalecido por trás da escrivaninha na outra ponta do escritório. Yor tentou dar um passo para o lado a tempo de bloquear a visão de Loid, mas era tarde demais. Ele voltou a encará-la, dessa vez com os olhos arregalados não apenas pelo corpo escondido, mas por finalmente as peças se encaixarem.

Como fui tão idiota? Como não percebi antes?

Os olhos dele desceram pelo corpo dela, um ato que a deixaria envergonhada se não fosse a tensão e a minuciosidade calculista naquele olhar. Não havia nada de desejo, apenas uma observação crítica e indiferente. Loid encarou as agulhas-lanças no chão e voltou os olhos para o rosto dela, o punho livre cerrado, os dedos sobre a arma ainda mais apertados.

O vestido de combate, as armas douradas semelhantes a pequenas lanças de cerimônia, os cabelos negros, os olhos vermelhos com sede de sangue. Todas as características obtidas pela Wise estavam estampadas na minha cara esse tempo todo!

Que belo espião eu sou!

Estava tudo ali desde o início: o motivo dela ser tão boa em lutas, os sumiços inexplicáveis à noite, como ela conseguiu burlar a escuta que implantei na gola dela.

Ela é uma profissional.

Ela é...

— Você...- é a Thorn Princess!, Loid concluiu o pensamento para si, domando a língua no último minuto.

Revelar que ele sabia quem era a Thorn Princess, uma assassina profissional que trabalhava para um grupo secreto chamado Jardim e que tinha entrado no radar da Wise há pouco tempo, levantaria suspeitas sobre sua verdadeira identidade até porque como um simples psicólogo saberia sobre alguém que é um enigma até para a polícia secreta da própria Ostania?

Loid deu um passo para o lado se aproximando do corpo que Yor tentara esconder de sua visão, a arma sendo abaixada lentamente.

Apesar de tudo, ela ainda é a Yor, não é?

Eu não posso ter me enganado tanto assim. Sempre fui tão bom em julgar caráter!

Com um voto de confiança, ou talvez de ingenuidade, ele travou a arma e guardou no cós, desviando os olhos de Yor lentamente para encarar o corpo de um homem de meia idade, os olhos abertos encarando o nada, um furo preciso na garganta.

O assassino de políticos, com certeza.

Porque era isso que a Thorn Princess fazia, eliminava qualquer ameaça que a designassem, porém, diferente de um espião, fazia isso pelo dinheiro que receberia em troca, não por honra ou a necessidade de manter a paz.

Ela era uma assassina, a personificação do egoísmo e sede de sangue.

Loid voltou os olhos para Yor, o cenho franzido.

— Você o matou.

Yor tirou a agulha fincada na porta com um movimento rápido, as costas voltas para Loid, incapaz de ver o homem que amava a encarando como se fosse um monstro.

— Sim. – Ela respondeu baixo, finalmente criando coragem para se virar. – Mas eu posso explicar, Loid. Ele estava aqui para matar Donovan Desmond.

— Então você o matou primeiro. – Loid falou, os olhos cerrados, o corpo ereto. – Você é uma assassina de aluguel.

A afirmação saiu natural demais, calma demais. Yor arregalou os olhos diante da atitude fria e metódica de Loid. Ela esperava mais medo ou revolta, mas a verdade era que Loid sempre foi racional demais, em situações complicadas ele nunca se deixava levar pela emoção. Dessa vez, não seria diferente.

E, apesar de não ter sido um pergunta, Yor não via mais sentido em negar a verdade já tão escancarada.

— Sim, eu sou.

Loid caminhou para mais perto dela, as sobrancelhas apertadas.

— E você escondeu isso esse tempo todo? Mentiu para mim todos esses meses?

— Não, eu nunca menti! Nunca mentiria para você! – Ela respondeu dando um passo à frente, o corpo a centímetros dele. – Apenas omiti esse meu lado sombrio como venho fazendo há anos. Nem mesmo Yuri sabe sobre meu trabalho de assassina.

— Mas eu sou seu marido! – Loid rebateu, a mão se prendendo ao braço de Yor com firmeza.

— Não de verdade! – Yor vociferou, a mão livre se prendendo no paletó dele, o puxando para perto como se quisesse enfiar seus motivos nele com as próprias mãos. – É um segredo perigoso demais para revelar a alguém que tinha data marcada para desaparecer da minha vida!

O silêncio que se seguiu foi pesado e impenetrável. Loid arregalou os olhos, a mão trêmula ainda presa na pele quente de Yor, os lábios entreabertos, os pensamentos a mil.

Droga, ela tem razão.

Além do mais, quem sou eu para cobrar honestidade?

Mas, ainda assim, saber que Yor não confiava nele e o via como alguém tão passageiro em sua vida fez seu peito apertar. Claro, o tal contrato de casamento foi ideia dele, mas... tudo tinha mudado tanto!

Ao menos, para ele.

Talvez, só para ele.

Yor via tudo como realmente era, um relacionamento de conveniência, uma mentira, enquanto ele tinha sido ingênuo demais e deixado, pela primeira vez na sua vida de espião, os sentimentos se sobressaírem à missão.

Um erro de principiante, Twilight! O erro de um idiota!

Irritado e frustrado consigo mesmo, Loid fixou os olhos em Yor, os azuis frios e fuzilantes, os vermelhos angustiados e firmes.

É tudo um teatro. Não posso sair do papel.

— Você colocou Anya em risco. – Ele falou baixo, decisivo. – Colocou nossa... minha família em perigo.

Ouvir aquilo foi como um soco no peito de Yor.

É isso, eu o perdi.

Ela sentiu seus dedos se afrouxando da roupa de Loid, seus olhos ardendo, mas balançou a cabeça e firmou a mão.

Mas não vou desistir, não sem que ele me escute, não sem tentar fazê-lo entender.

— Eu nunca faria isso! Anya é minha filha! – Lágrimas de pura raiva e desespero desciam pelo rosto da mulher enquanto ela não desviava os olhos vermelhos do rosto de Loid. – Tudo que fiz foi parar proteger vocês do Lojista e suas ameaças! Eu morreria para manter vocês seguros...

Loid franziu o cenho, o rosto contorcido em confusão.

— Lojista? Quem é...?

— Senhor Forger? Está tudo bem? – A voz do mordomo soou distante, provavelmente ainda no corredor que dava na sala de estar. - Resolveu o seu… problema?

Loid xingou baixo, os ouvidos atentos ao som dos passos do homem que se aproximavam cada vez mais. Seus olhos se desviaram para o rosto de Yor enquanto ela olhava ao redor em busca de uma fuga rápida, os olhos vermelhos fixando-se em Loid no último momento, desesperados.

Suplicando que a deixasse ir.

Merda! Será que eu a deixo ser capturada?

Mas o simples pensamento de deixá-la ser levada pela polícia secreta fez o estômago de Loid revirar. Imaginar Yor torturada, ferida ou morta fazia a raiva e o desespero borbulhar nele. Ele simplesmente não suportaria!

Apesar das mentiras ele ainda a amava.

 E ela ainda tem muito o que explicar, principalmente quem é esse tal Lojista e…

Que diabos! Quem eu quero enganar? Com certeza a chefe me expulsaria por tamanha idiotice, mas é isso, eu tô apaixonado por uma assassina e não consigo mais negar!

Loid trincou os dentes, a mão ainda presa ao braço de Yor enquanto a mulher permanecia imóvel, os olhos sérios e insondáveis, a expressão antes suplicante agora parecendo determinada e irresoluta. Ela pode escapar se quiser! Quase acabou comigo naquele teatrinho do Bondman que a Anya e o Franklin inventaram, e ela estava bêbada no dia!

Então por que ainda está aqui?

Porque…?

— Se vai me entregar faça de uma vez. - Ela falou, o queixo erguido em determinação, os cabelos chicoteando com o vento que soprou pela janela. - Não vou fugir e te deixar como principal suspeito do assassinato. Não posso…

— Por que não? - Loid apertou-a ainda mais contra si, irritado e confuso com o ato tão abnegado dela, com a sinceridade que ela deixava tão explícita no olhar. - Porque se importar comigo agora se mentiu e me enganou por tanto tempo….

Loid deixou as palavras escaparem num suspiro quando Yor o puxou para ainda mais perto e num segundo de coragem louca tomou os lábios dele nos seus, frustrada e cansada das acusações totalmente plausíveis de Loid.

Disposta a matar seu desejo antes que Loid desaparecesse de sua vida.

Foi um simples selar de lábios tão rápido quanto uma respiração. Apenas para calá-lo, apenas para ela poder revelar seu segundo segredo. Ela ergueu os olhos para ele, nublados de desejo.

— Porque eu te amo, Loid Forger.

Loid piscou atônito ainda imerso na névoa que o beijo repentino o deixara. Se aproveitando disso, Yor subiu a mão para o pescoço dele e o beijou novamente, o corpo inclinado para a frente em busca de intensificar o beijo, os lábios inexperientes imóveis, os olhos fechados com força enquanto o coração batia enlouquecido no peito. Ela estava prestes a se afastar, a coragem sumindo aos poucos e dando lugar à pura vergonha, quando sentiu a mão de Loid soltar seu braço para rodear sua cintura com possessão, o corpo longo e forte dele fazendo suas costas arquearem para trás enquanto a boca dele se moveu sensualmente, os lábios entreabrindo e sua língua pedindo passagem para dentro da boca de Yor.

Céus, eu estou sonhando? Só posso estar sonhando!

Os pensamentos perplexos pareciam em segundo plano enquanto Yor se deixava guiar pelos instintos, abrindo os lábios para aceitar tudo que Loid tinha a dar, as mãos se prendendo às costas dele para manter o corpo firme diante da intensidade dos toques do homem. O beijo que começou inocente parecia evoluir para algo selvagem, necessitado ao extremo. Um desejo reprimido por tempo demais.

Yor controlava os gemidos enquanto Loid parecia ter esquecido tudo ao redor, seus sentidos voltados para o corpo de Yor, os toques de Yor, os lábios deliciosos de Yor.

Droga, por que isso é tão bom? Por que ela tinha que ser tão perfeita?

O beijo não durou mais que segundos mesmo que parecesse uma eternidade para o casal sedento. Loid se afastou primeiro, sua cabeça finalmente voltando ao lugar quando percebeu os passos e resmungos do mordomo a poucos metros de distância. Soltou o corpo de Yor lentamente e ajeitou os cabelos, a respiração acelerada, o paletó totalmente bagunçado. Ele encarou o rosto de mulher de relance e não conteve a satisfação interna ao vê-la corada e ofegante, tão desarrumada quanto ele.

— Ele está chegando. - Loid murmurou, a voz ainda rouca de desejo. - Você tem que ir.

Yor ergueu os olhos e negou, as bochechas ainda tão vermelhas quanto os olhos que brilhavam.

— Não, já disse. Não vou deixar…

— Você vai sair e sumir com o corpo enquanto eu distraio o mordomo e o Desmond. Não faça barulho e não deixe nenhum rastro. - Loid explicou antes que ela o interrompesse. Ele desviou os olhos para o corpo do assassino, a sobrancelha erguida. - Consegue carregá-lo?

Yor sorriu perigosamente, os lábios erguidos com malícia. Aquilo desconcertou e excitou Loid tanto quanto os sorrisos doces que ele já conhecia.

— Claro.

— Ótimo. - Ele falou rápido, desviando os olhos do rosto dela e engolindo em seco. - Pegue suas armas e vá.

— Mas…

Loid voltou os olhos para ela, intensos e sem deixar espaço para discussão.

— Conversamos em casa. Agora vá!

Apesar de odiar o tom autoritário, Yor nunca se sentiu tão aliviada. Em casa. Ele ainda vai me deixar voltar. Ela sorriu esperançosa enquanto Loid trancava a porta às suas costas. E ele me beijou de volta.

Talvez…

Yor balançou a cabeça e caminhou para o corpo enquanto prendia as lanças no cinto, analisando qualquer rastro que pudesse denunciar que esteve ali e ficando satisfeita por estar tudo limpo. Ela ouviu Loid falando do lado de fora com o mordomo, algo sobre ter dobrado a direita em vez da esquerda no corredor, o tom amistoso e cordial tão diferente da raiva de antes.

Tão diferente do tom grave e rouco após o beijo…

A mulher repreendeu a si mesma, o corpo do assassino já nas costas enquanto pulava a janela e corria silenciosamente pelo jardim da mansão, as sombras a camuflando.

Afinal ainda era a Thorn Princess e tinha um trabalho a concluir. Não tinha o luxo de divagar sobre o que aquele beijo significava.

Deixaria isso para Yor Briar.

Não, para Yor Forger.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado!

Até logo!



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