O azar de Furihata Kouki escrita por Lyubi


Capítulo 2
Meu herói?




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— Nos encontramos de novo — emendei com a risada nervosa.

O recém-chegado se limitou a concordar com a cabeça e se ajeitou em sua poltrona no lado do corredor.

Olhei pela janela pensando em deuses e má-sorte mais uma vez. Mas talvez não fosse tão ruim; o vizinho tinha feições sérias e não parecia inclinado a conversar e isso sempre era algo bom em viagens longas. Como tenho uma feição gentil (palavras da minha mãe, não minhas), as pessoas sempre me alugavam por horas em suas conversas e, não que eu não goste de conversar, mas por que tinha que atrair pessoas tão exóticas? Senhorinhas querendo falar de remédios naturais para doenças nojentas, desconhecidos que falavam muito alto, crianças sinceras demais... Uma vez ouvi toda a história de amor e ódio de uma ex-presidiária que ainda cogitava esfaquear o ex-namorado e a namorada atual dele... Em fim, um imã para problemas, é isso que eu sou.

O avião decolou após todo o protocolo de avisos e checagens.

O frio na barriga que acompanhava a subida já tinha passado, mas permaneci de olhos fechados relaxando no assento pensando que dessa vez cumpriria minha meta e dormiria bastante durante o voo. Nada de tédio ou inquietação, pelo menos, não em ao menos metade da viagem. Cinco horinhas era o suficiente.

— Furihata Kouki. Camisa 12. Seirin.

Abri os olhos para retribuir o olhar do homem ao lado que tinha resolvido conversar.

Cabelos e olhos vermelhos, pele de alabastro, sobrancelhas muito finas, rosto triangular, olhos estreitos e longos, voz baixa e firme.

Pisquei duas vezes. E ri. Dessa vez com gosto.

— É você mesmo? Akashi-san? Ex-capitão da Rakuzan?

Agora que olhava direito, percebi que teria reconhecido ele se eu não tivesse ficado tão nervoso com a situação com a norueguesa. Akashi-san continuava basicamente o mesmo, as diferenças estavam apenas na idade; rugas suaves ao redor dos olhos, maxilar mais maduro e ombros mais largos. Ele vestia um conjunto social de calças azul escuro e camisa azul claro, um relógio discreto no pulso esquerdo. O fato de que ele vinha de uma família muito, muito rica acendeu no fundo da minha mente. Tentei não pensar no vexame de mais cedo com a minha roupa de funcionário aéreo.

— Desculpe não reconhecê-lo antes.

Ele fez um mini "não" com a cabeça como se não desse importância.

— Faz muitos anos — reiterei.

— Vinte anos desde que o vi pela última vez. — Olhei para ele assustado pela exatidão. — Na formatura do Ensino Médio. Fui para cumprimentar Kuroko, acho que você não me viu.

— Ah, eu vi! Eu vi sim, mas acabamos não conseguindo conversar...

— Sim.

O insistente olhar de canto que Akashi lançava na minha direção parecia querer dizer algo mais, mas eu não consegui receber o que as ondas cerebrais tentavam comunicar.

— Não te vi no casamento do Kuroko — ele apontou.

Olhei para frente.

— Ah, sim. Eu não pude ir... Minha mãe teve câncer nessa época e, como eles moravam no interior e eu na cidade, foi um período turbulento.

— Entendo. Ela está melhor agora?

— Sim. Ela se recuperou.

Não precisava dizer que a segunda família de seu pai também foi revelada no meio de tudo e eu achei que se a doença não matasse minha mãe, o desgosto iria.

— Com o que você trabalha?

A pergunta dispersou os pensamentos pesados.

— Ah, eu me formei em química com especialização em farmacologia.

— Isso é uma surpresa. — E as sobrancelhas erguidas indicavam que ele estava mesmo surpreso. Me senti lisonjeado.

— Ah, não é para tanto. A faculdade foi uma cruz, mas a prática é mais tranquila. Passo o dia no laboratório cuidando de testes e fazendo relatórios. Não é tão empolgante.

— Você viajou a trabalho?

— Sim. Uma convenção em Londres. Meu superior viria comigo, mas precisou descansar por motivos de saúde.

Ele anuiu brevemente.

— Costuma viajar muito?

O tom de questionário começou a incomodar, mas respondi da melhor forma que podia. Akashi parecia interessado nas respostas. Aquilo estava me deixando encabulado.

— Está casado? — emendou após algumas (muitas) perguntas.

— Não, não. — Tentei ser mais rápido que ele. — E você, Akashi-san?

— Divorciado. Não tive uma boa experiência, mas grande parte da culpa foi minha.

Fiquei surpreso pela sinceridade.

— Não posso dizer que entendo, mas meus namoros também não foram nada mais que frustrantes.

Desviei quando ele ergueu os olhos para mim.

Akashi-san voltou a falar após um instante.

— Casei por pressão do meu pai. Um acordo entre famílias.

— Como nas novelas? — o interrompi chocado.

Ele riu concordando com a cabeça.

— Não é tão dramático quanto parece, mas não foi bom. Eu poderia ter dito "não". Naquela época já era o melhor na minha área; mesmo que meu pai me deserdasse ou me desligasse da companhia, eu tinha vários outros ativos e contatos... Mas não pensei em nada disso, apenas aceitei o casamento como algo natural que eventualmente aconteceria.

— E não deu certo — concluí.

— Não. Não pude retribuir as expectativas dela. Nunca aprendi realmente qual era o meu papel; minha mãe faleceu quando eu era muito novo e meu pai não se casou de novo.

— Ela pediu o divórcio — incentivei-o, curioso para saber mais.

— Não. Ela foi uma esposa incrível, dedicada, compreensiva. Se eu fui criado para ser o sucessor do império do meu pai, ela foi criada para ser a mulher do imperador. Mas ela estava infeliz e eu estava infeliz sabendo que não conseguiria mudar aquela situação.

— Ela deve ter se sentido rejeitada... — soltei sem pensar se estava sendo desrespeitoso.

— Ela ficou arrasada, mas acabou entendendo minha decisão. E creio que nosso filho seja um consolo para ela também.

— Você tem um filho?!

Ele assentiu quase sorrindo.

— Tem doze anos. Akashi Koji.

— Meus parabéns.

— Obrigado. — Um quase sorriso brincou no rosto dele e seus olhos ficaram suaves. Percebi que estava o encarando quando ele me flagrou. — Mas por que seus namoros não deram certo? — ele continuou a conversa.

— Ah... — cocei a barba que começava a aparecer — Deixa eu ver... A primeira me traiu. Depois houve uma… Ahn… Incompatibilidade de gênios? É… Acho que foi isso… Depois eu fui traído de novo. E dessa última vez, ela só estava comigo por causa do apartamento...

Espiei Akashi-san pelo canto dos olhos e ele estava rindo em silêncio!

— Não é engraçado!

Ele cobriu a boca com uma mão e pediu um momento com a outra. Não conseguia parar de rir.

— Desculpe, isso foi rude. E você tem razão: não é engraçado. As pessoas parecem constantemente desrespeitar o seu espaço.

Sabia que estava corado, mas não tinha como negar.

— Eu pareço bonzinho demais. O defeito não está em mim, mas nos que se aproveitam disso — respondi emburrado a litania que mamãe sempre falava.

— Claro.

E apesar do significado da palavra e do tom de voz neutro, eu senti que havia um fundo de ironia em sua resposta. Estreitei os olhos e ele voltou a rir quase chiando.

— Só quero constatar que eu nunca rio assim, Furihata-kun, então: obrigado. Você sempre consegue deixar as coisas mais leves.

Bufei, mas secretamente já o perdoando pela zombaria. Eu era mesmo fácil demais.

— Mas á que custo, ne?! Só me acontece desgraça.

— Verdade? Foi tão ruim me rever?

Acenei com as mãos tentando me retratar, envergonhado de uma possível gafe quando ele tornou a virar o rosto e cobrir a boca.

Cruzei os braços, indignado. Adeus sono.


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