Sinistro escrita por Vinefrost


Capítulo 1
Prólogo: Perdoe-me, padre




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— Perdoe-me, padre, pois eu pequei — confesso assim que me acomodo no confessionário, os ombros retraídos, os olhos encaram o assoalho antigo e gasto.

— Diga o que lhe aflige, meu filho — incentiva padre Luiz, a voz rouca carregada de cansaço. Consigo imaginá-lo perfeitamente do outro lado, sentado completamente tenso. Deve achar que o assunto é de extrema seriedade.

E ele está certo.

É madrugada, no entanto, preciso me confessar. Um dos privilégios por ter crescido nesta paróquia é o passe-livre para o confessionário.

— Fui designado para um caso, o mais importante de todos, mas falhei — encosto a cabeça na estrutura de madeira, as mãos tremem.

— Ele é o motivo de não aparecer há meses? — questiona, preocupado.

— Sim, padre — respondo prontamente.

Sinto as mãos suadas, resultado do nervosismo constante nos últimos dias, as esfrego no tecido da calça antes de entrelaçar os dedos para tentar controlar os movimentos involuntários.

— O que você está autorizado a contar, Daniel? — Padre Luiz sabe como o protocolo funciona. Apesar de conhecer a síntese de como ganho a vida e até mesmo ter participado de alguns casos, só pode ouvir a versão censurada daqueles dos quais sinto a necessidade de buscar penitência após solucioná-los.

Algumas situações são intensas demais até para quem é treinado para enfrentá-las, por isso encaro a confissão como uma válvula de escape, de certa forma, até mesmo terapêutica. Umedeço os lábios secos com a língua, respiro fundo e continuo:

— O caso em questão é resultado de vários dos quais trabalhei nos últimos meses, entrelaçados em uma conspiração engenhosamente elaborada e executada — pauso ao sentir a frustração dominar o meu corpo, em seguida, a raiva.

Em um súbito ataque, saio do confessionário com os nervos à flor da pele. A adrenalina pulsando pelo meu corpo me desperta da inércia causada pela frustração por não cumprir o serviço, meu primeiro caso sem solução.

Padre Luiz me acompanha para fora com a expressão espantada, as rugas na testa nunca estiveram tão evidentes, devido tamanha preocupação. O senhor de idade aparenta ser dez anos mais velho do que sua idade real. É a primeira vez que presencia tamanha perturbação desde que me conhece por gente.

— Agora vejo com clareza que foi loucura pensar que conseguiria evitar… Tudo está perdido. — Lágrimas percorrem meu rosto, caio de joelhos no chão implorando para que algum milagre interceda na desgraça que está predestinada para ocorrer.

Sou completamente tomado por um misto de sentimentos e, o pior de todos, a falta de fé, algo essencial no meu ramo. Padre Luiz se aproxima e repousa a mão em meu ombro, um gesto singelo de consolação. Ele me ajuda a levantar e sentar no banco de madeira.

Ao meu lado, encaramos a figura crucificada de Cristo enquanto o silêncio paira pelo ambiente iluminado apenas por velas acessas. Conforme os minutos passam, a tensão cresce ao ponto de se tornar palpável. O padre quebra o desconforto ao finalmente dizer algo:

— O que você não conseguiu evitar, filho? — a temida pergunta.

— O fim dos tempos.

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Notas finais do capítulo

Comecei a escrever essa história há muito tempo, finalmente parei para revisar e mudar algumas coisas, era muito nova na época que postava.
Enfim, espero que gostem, estou animada para publicar essa versão.
Abraço!