Bons Momentos - ShinoKiba (Vol. 02) escrita por Kaline Bogard


Capítulo 8
Bons Momentos - Chocolate Amargo


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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Existem momentos na vida que são como chocolate amargo. Agradável ao paladar, mas que deixam na boca um gosto marcante.

Era assim que Kiba descreveria um banho de esperança e animo que recebeu certa vez, mesmo tendo prometido a si mesmo que não morderia a isca. Mas ele mordeu, engoliu com anzol e tudo. E machucou-se como já deveria ter esperado.

O dia em questão começou com a ligação de um número desconhecido. Kiba olhou a tela do celular e tentou puxar pela memória se estava devendo em algum lugar. Não conseguiu pensar em nada que justificasse uma ligação de cobrança e a curiosidade venceu.

— Alô — atendeu sem muito animo. E a pouca empolgação morreu totalmente ao reconhecer a voz que lhe respondeu.

Uma chuva de imagens desagradáveis passou pela mente do rapaz em questão de segundos. Desordem, humilhação, decepção, tristeza... todas relacionadas a uma pessoa. Aoyama Shigure.

O pai de Kiba entrava em contato depois de mais de dez anos sem dar qualquer notícia, deixando de lembrança apenas um triste dia dos pais que assombrava os sonhos do rapaz de quando em quando.

Por vários minutos apenas ouviu o pai dizer como sentia saudades, como estava mudado e queria conhecer os netos, a mão livre acariciando a barriga que ainda não revelava a gestação recém descoberta. Deveria dar essa chance ao homem? Depois de tantas e tantas falhas ainda existiria a chance de conserto? Ele suportaria uma nova decepção?

Mas metade do sangue que carregava era daquele Beta. Família era a coisa mais importante para Kiba. Além disso, aquele terceiro filhote foi uma surpresa que tirou Shino e Kiba da zona de conforto: Shino resolveu realizar um sonho de infância e até marcou uma data para tatuar o corpo, dentro de alguns meses! Talvez fosse um sinal para também dar esse passo rumo a mudança.

— Tudo bem — cedeu — Vamos marcar de comer no restaurante do Naruto.

Masako e Kaoru ainda não conheciam o avô, seria uma oportunidade boa para todos!

***

Shino recebeu a notícia com menos empolgação. Ele testemunhou quanto sofrimento Shigure trouxe ao filho. Era um Alpha rancoroso que não perdoava fácil, que jamais esquecia. No entanto seu companheiro pareceu feliz e convencido de que a mudança era real. Então a única coisa que ofereceu foi apoio.

Masako e Kaoru não seguravam a curiosidade. A menina era mais discreta, mas Kaoru lançava as perguntas querendo saber mais sobre Shigure-jiji, tentando saber se ele era tão parecido com Kiba quanto Shibi era com Shino!

No dia marcado, os três se arrumaram e partiram com as expectativas nas alturas. As crianças caminhavam na frente, e enchiam Kiba de orgulho. Masako era alta para a idade, parecia ter mais do que os doze anos. Kaoru não era tão alto quando a irmã quando ela tinha os mesmos dez anos, mas já era mais alto do que o Kiba em igual idade. Um indicativo que toda a estatura que não recebeu seria doada aos filhos...

— Maldito gene Aburame — resmungou com um bico.

— Kiba-tou? — Masako espiou por cima do ombro — Chamou?

— Não — o Ômega desfez da pergunta com um aceno de mão, como se não fosse grande coisa.

— Reclamou do papai — Kaoru falou baixo o suficiente para Kiba ouvir também — “Aquilo”, Masako-nee.

— Ahhh... “aquilo”...

Kiba arrepiou-se todinho:

— “Aquilo” o quê, pirralhos?! Que conversa é essa de...

— Altura!! — Masako e Kaoru responderam juntos, e saíram correndo em seguida para se abrigar no restaurante onde iriam almoçar.

Kiba ficou observando a duplinha, surpreendido por sua pequena frustração de vida ser de conhecimento dos filhos. “Pequena”! Quase se estapeou pelo uso do adjetivo. Afinal, era justamente isso que o incomodava!

Por fim avançou e foi de encontro aos engraçadinhos que já se sentavam em uma das mesas, sendo recepcionados por Naruto. O Alpha de cabelos loiros estava bagunçando os castanhos de Kaoru, como fazia consigo quando eram crianças. O menino tentava se defender em vão, exatamente como ele.

Emoção veio forte sem que soubesse porque ou pudesse controlar. Chamou a atenção dos três naquele saguão vazio, fazendo-os olhar de modo curioso para Kiba.

— A palavra “altura” está banida de casa — ele decretou forçando um mau-humor que não sentia, apenas para encobrir a emoção.

Os outros compraram a tentativa fraca de salvar as aparências. Até mesmo Kaoru, com seus inocentes dez aninhos captou as entrelinhas. Ele aprendeu a ser sensível à emoção de Ômegas, uma lição dura marcada em seu coração de criança.

— A que devo a honra, gordo? — Naruto perguntou esbanjando deboche.

— Gordo é o traseiro inútil do seu companheiro — a resposta veio ácida. Arrancou de Naruto uma expressão tão engraçada e sugestiva que as orelhas de Kiba esquentaram — Não é gordura. É minha caçulinha crescendo forte, saudável e...

— Altura! — Naruto praticamente berrou.

— Filho da puta! — Kiba não tinha muita esportiva quando pegavam no seu pé.

— Falando sério, cara. Vocês estão bem? Faz tempo que não aparecem.

— Ah, a molecada tá firme no Bukatsu. Masako arrasando no basquete, Kaoru no judô. Eu melhorei agora dos enjoos... esse tipo de coisa.

— Te entendo. Sasuke tá me deixando doido com esse lance de segunda graduação. Ele tá mais empenhado do que na primeira! Ou é mestrado? Pós-graduação? Caralho, é tanta coisa que ele faz que eu me confundo — riu — Vão pedir o de sempre?

— Com certeza! — Kiba concordou — E manda um a mais, hoje eles vão conhecer o avô.

O belo sorriso de Naruto foi sumindo gradualmente.

— O Shigure?

Kiba apenas balançou a cabeça concordando.

— Ele me ligou esses dias, conversamos um pouco. E acabei concordando em vir aqui apresentar os filhotes.

— Você está bem? — Naruto acompanhou de perto o drama de conviver com um pai alcoólatra e relapso, que recusava toda ajuda oferecida. Shigure amava a família, mas parecia amar ainda mais a bebida.

— Por enquanto sim. Cheio de esperança que dessa vez é a sério, Naruto! Vamos acreditar.

— Você é quem manda, gordo.

— OE!!

Naruto saiu fugido, tendo como trilha sonora a risadinha de Kaoru, que silenciou ao receber um olhar fulminante do pai. Até ele sabia que havia limite para cutucar a ferida. Os três nem tiveram tempo de emendar em uma conversa trivial qualquer, logo um Beta apareceu à porta, alguém que Kiba reconheceu de imediato. E que lhe trouxe um baque ao coração.

Aoyama Shigure estava velho. E acabado. Não em idade, pois tinha menos de sessenta anos. Porém o abuso do álcool estava visível em cada ruga sofrida daquele rosto, nos olhos empapuçados e nos fios de cabelo precocemente grisalhos. As íris dos olhos iam desbotadas por uma catarata em estado avançado e o rosto com barba por fazer passava longe do charme pretendido por Kiba e seu rascunho de cavanhaque, pois apenas revelava desleixo.

— Papai... — Kiba fez menção de se levantar. Em poucos passos Shigure alcançou a mesa e o impediu.

— Não se esforce — sentou-se junto a eles — Como você está, Kiba? Já faz um tempo, não?

— Mais de dez anos — o Omega sussurrou ainda abalado com a imagem do pai. Sua última lembrança era de resgatar o homem da sarjeta em pleno dia dos pais... conquanto ainda um Beta forte e saudável. Nem de longe imaginou vê-lo tão envelhecido. Que vida sofrida Shigure enfrentou naquela década?!

— São meus netos? — olhou para dupla de crianças que o fitava com curiosidade.

— Aburame Masako, essa jovenzinha de doze anos. Aburame Kaoru, o ranhento de dez anos — apresentou os filhos antes de descansar a mão sobre a barriga, apesar de as poucas semanas de gestação nada revelar — E essa filhotinha aqui veio para fechar com chave de ouro.

— Uma menina?

— Não fizemos exame. É minha intuição de Omega foda pra caralho apitando.

Shigure sorriu pela primeira vez.

— Olá, crianças.

— Olá.

— Oi, jiji.

Masako e Kaoru responderam em conjunto.

— Perdi tudo sobre eles — Shigure lamentou com a voz um tanto embargada. Havia pesar real nos olhos sofridos e fez Kiba baixar todas as últimas barreiras, defesas que ele nem se deu conta manter ao redor do coração.

— Eita, porra! Então vamos começar a colocar tudo em dia. Perdeu tudo sobre eles até hoje, mas cada segundo é um novo começo — acariciou a barriga mais uma vez. Coisas lindas podiam se iniciar no momento menos esperado.

Shigure agarrou a chance com as duas mãos. Aquele encontro avançou pelo almoço, pela tarde e durou até o final do dia, quando Kiba sentiu as pernas incharem por ficar o longo período sentado. A conversa foi rica, divertida e reveladora. Shigure deu chance para os netos falarem, coisa que Kaoru fez pelos cotovelos! Masako foi mais sucinta, embora gostasse bastante de estar perto de um vovô do qual nunca ouvia falar.

Quando foram embora, Kiba tinha consigo aquela sensação gostosa de comer um chocolate de qualidade, feliz por ter confiado e atendido ao pedido do pai.

Mas era um chocolate amargo e o gosto ruim veio durante a noite, quando o casal estava aninhado na grande cama, exatamente após Kiba terminar o relato de tudo o que aconteceu. Seu celular tocou sobre a mesinha de cabeceira e ele atendeu mais do que depressa ao número já não desconhecido.

— Papai...? Ah, sim. Isso. Eu... caralho — a última palavra trouxe consigo um baque que estremeceu o vínculo e atingiu Shino.

O Alpha tirou o telefone das mãos do marido e deu continuidade à ligação. Logo nas primeiras palavras compreendeu o abalo alheio: era da polícia. Associavam Shigure a uma briga de bar. O Beta muito alcoolizado feriu alguém com uma faca e fugiu do local. Queriam informações sobre ele. Shino explicou que não sabiam de nada e que ajudariam se descobrissem algo. Quando terminou a ligação e se preparou para apoiar o companheiro, notou Kiba virado de lado evitando contato visual. Não chorava, ele já havia esgotado todas as lágrimas que poderia oferecer ao pai. Mas havia tristeza e desilusão o suficiente para encher uma represa. Era como se o coração daquele rapaz sussurrasse: “Ah, no fundo eu já sabia”.

O casal teve poucos minutos antes de ouvir batidas na porta e uma duplinha de crianças se insinuar pela porta, para deitar-se junto ao pai Ômega. Um dia, quando Shino e Kiba tiveram a pior briga do relacionamento, Masako e Kaoru testemunharam um sofrimento visceral a nível do lado shifter. Desde então ficaram muito sensíveis as nuances de humor do pai que, naquela noite, se permitiu ser abraçado e aconchegado pelos filhotes para enfrentar uma dor conhecida. Decepção.

Depois disso, volta e meia faziam piadinhas com “aquilo”, a palavra banida de casa que deixava Kiba todo melindroso. Mas nasceu outra palavra delicada, que nunca se ouviu falar: o nome do avô com que se encontraram uma única vez.


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Notas finais do capítulo

Nem tudo o que reluz é ouro...

Esses são os piores, hum? Parece um bom momento, e a verdade passa longe.

Até sexta! :D



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