Singularidade escrita por Ogum


Capítulo 2
Um mundo novo




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Havia ressuscitado a quatro meses, talvez cinco. O tempo passava diferente ali. Contou por várias vezes a extensão do dia até concluir que não haviam vinte e quatro horas e sim trinta, "o sonho de todo empregador, mais horas pra explorar funcionários". A diferença de seis horas entre aquele mundo e a terra levantava questões interessantes: Seria esse um planeta maior com mais tempo de rotação no próprio eixo? Ou talvez um planeta decadente com pouca força centrífuga? Era um mistério a ser desvendado.

Engatinhava pela casa o tempo todo tentando incessantemente sair para o quintal mas sendo barrado pelo poder colossal e intangível de uma porta de madeira maciça ou pelos fortes braços de sua mãe, que a propósito, havia o batizado por outro nome. Agora já não se chamava mais Theo e sim Morfeu. Um nome interessante, convenhamos, nada melhor parar alguém que havia ressuscitado em um "isekai" do que algo relativo ao sonho.

A casa possuía uma arquitetura que lembrava a era vitoriana da Europa e Morfeu odiava bastante, a estética nunca foi de seu agradado, não possuía sinais claros de tecnologia moderna exceto por luzes que se acendiam ao por dor sol através de pedras mal talhadas nas paredes. Talvez aquele fosse um efeito físico de cristalização de luz que acontecia naquele mundo ou uma possível tecnologia a qual não tinha altura o suficiente para explorar. Era algo a se perguntar para sua mãe.

Falando nela, Diana era uma mulher esplêndida: No auge de seus um metro e sessenta centímetros impunha uma aura assassina como ninguém que fazia contraste com seu olhar carinhoso e pele cor de mármore puro. Era mãe solteira e dividia seu tempo entre uma pilha enorme de documentos e uma criança inquieta, documentos esses que Morfeu nunca compreendeu.

Embora estivesse acostumado com diferentes linguagens na terra aquele mundo possuía uma escrita que lembrava a escrita da Ásia, as palavras eram como desenhos e a ordem de sua escrita era primeiro vertical e ao fim de cada coluna uma nova começava também verticalmente.

Por vezes recebia visitas de homens mais velhos em trajes finos que nunca passaram pela porta, apenas pegavam os documentos de sua mãe e traziam mais e mais pilhas de papel. Também deixavam alimentos como legumes e verduras, algumas completamente novas e outras que também existiam na terra o que o fazia refletir se o sistema econômico era alguma forma de escambo.

O trabalho de Diana provavelmente era feito em algum tipo de escritório e ela estava em algo como uma "licença maternidade" que já havia durado no mínimo quatro meses. Entre uma canetada ali e outra aqui ela parava para alimentar Morfeu que se sentia bastante constrangido por ainda ter suas memórias de adulto e portanto achar que estava de alguma forma tomando a vida que era de outra pessoa, sua mãe amava muito aquela criança mas não fazia a menor ideia de que carregava em seus braços alguém com mais de trinta anos de vida.

— Você vai crescer tão bonito. - Disse Diana ao suspirar - Tem o nariz do seu avô.

"Avô", eis algo que Morfeu nunca pensou a respeito, estava tão perdido em entender como as coisas aconteciam que quase nunca parou para se questionar: Onde estavam seus parentes? Na casa não haviam retratos e considerando a ausência de tecnologia até fazia algum sentido mas, porquê nunca recebia visitas por parte da família? Talvez estivessem todos mortos ou morassem longe demais para viabilizarem uma visita.

— Vô. - Repetiu Morfeu.

Diana se assustou ao ouvir as primeiras palavras de seu filho, não que ele não pudesse falar ou repetir palavras mais complexas, havia feito isso várias vezes para aprender a língua local mas manteve em segredo para um momento de oportunidade.
Ela deixou uma lágrima escorrer de seus olhos e expressou imensa felicidade apertando ao ponto de ficar difícil de respirar

— Agora fala "mamãe".
— Mamãe. - repetiu Morfeu.

Diana soltou um grito em ecstase como uma fã apaixonada ao ver seu ídolo no palco e jogou a criança pelo ar agarrando-o rapidamente.
Aproveitando o momento perfeito Morfeu decidiu fazer um movimento arriscado.

— Mamãe cadê o vô? - Questionou.
— Seu avô não habita mais esse plano Fe, agora ele mora com os deuses no vazio profundo.

"Com os deuses no vazio profundo? Ok, informação de menosEla podia ter dito só que ele morreu mas ao invés disso deve ter rolado uma licença poética aqui. "

— Mas a sua tia vem nos visitar em breve e ela me disse que vai te trazer presentes. - Completou Diana.

Agora sim Morfeu tinha uma resposta, embora seu avô "não habitasse mais esse plano" haviam outros membros da família para conhecer e presentes poderiam ser um ótimo jeito de entender a organização daquele mundo, era hora de fazer ciência.

Passaram-se duas, três, quatro semanas e nada.

"Fe" ficava divido entre tentar alcançar os móveis mais baixos para contemplar as árvores do quintal enquanto travava sua luta diária contra seu maior nêmesis - a demoníaca porta de madeira - e eis que em um de seus confrontos diários sentiu uma força vinda da porta o projetar para trás alguma centímetros chocando-o contra o chão. A força foi acompanhada de um grito feminino eufórico, sua tia havia chegado.

— Ana! Caralho Ana! Que coisinha mais linda. - Gritou a mulher enquanto agarrava Morfeu pelos braços. - Titia já ama.

— Lisa não aperta demais meu filho! Se quiser uma criança pra brincar faz uma pra você. - Respondeu Diana com as mãos na cintura.

"Hipócrita, foi você que quase me matou de apertar esses dias." - Pensou Morfeu.

Lisa aparentava ser mais nova que Diana apenas alguns anos, sua pele negra tinha o mesmo tom, eram diferentes apenas nos cortes de cabelo. Enquanto Diana possuía um cabelo cacheado abertos sua irmã tinha um corte mais curto e "moderno". Uma tia descolada na visão de Morfeu.

Enquanto segurava a criança em seus braços Lisa fez um movimento de chamado com sua cabeça e quatro homens entraram pela porta carregando várias caixas fechadas, todas de madeira, uma após a outra iam se empilhando e ao final haviam pelo menos quinze delas.

"Rapaz quem diria que a minha fase da tia rica ia chegar."

Lisa sentou no sofá com Morfeu em seu colo enquanto falava sobre coisas como o peso da criança e outras questões relacionadas a alimentação e crescimento e foi quando apontou seu dedo indicador e médio juntos fazendo um sinal de "arma" para uma das caixas, virou sua mão na horizontal e foi quando uma das delas se abriu e um pequeno cavalo de madeira flutuou até sua palma.

Morfeu entrou em estase total. Era magia. Olhou fixamente para o cavalo na palma de Lisa e não ousou toca-lo.
Um mundo de novas possibilidades havia acabado de se abrir. Ele não havia só ganhado uma vida nova mas uma vida nova em um mundo em que a magia era real.


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