A Garota que Eu Conheci na Igreja escrita por Binishiusu Sensei


Capítulo 4
Pai, Eu Também Sou Talentosa!




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Sara e seu pai, Rodrigo, se sentaram à mesa nos lugares de costume, enquanto sua mãe, Natália, terminava de aquecer o almoço, que já havia sido preparado no dia anterior. Era um costume da família preparar o almoço de sábado na sexta, para não precisarem se preocupar em cozinhar no sábado, o dia santo de descanso na sua religião.

  Rodrigo ainda estava com uma expressão negativa no rosto, Sara percebeu. Natália parecia apressada em servir logo o almoço, ela tinha percebido que o marido estava descontente, então não queria dar mais um motivo para que ele perdesse a calma. Rodrigo se tornava um homem bastante irracional quando perdia a calma, mas não que ele fosse um homem não muito inteligente quando estava calmo, ele só era menos intragável quando não estava irritado.

  O pai de Sara era um homem pouco inteligente, que trabalhava como segurança de uma escola particular através de uma empresa terceirizada. Ele tinha uma vida profissional desinteressante, então a sua realização pessoal estava nos trabalhos voluntários e que ele fazia para igreja.

  Ela olhou para o rosto amargo do pai, olhou para a mãe que preparava o almoço e se levantou para estender a toalha sobre a mesa e colocar os pratos, os talheres e os copos no lugar. A mesa já estava posta, mas ainda faltava um pouco para o almoço terminar de aquecer. Natália sentiu a necessidade de quebrar o clima pesado e comentou:

— A amiga da Sara tocou muito bem hoje de manhã - ela disse isso num tom positivo.

— É - respondeu Rodrigo, num tom seco.

  Sara já estava calculando mentalmente que provavelmente era esse o motivo para o mau humor do pai. Ela sabia, por análise corporal durante as conversas, que o seu pai não gostava do pai de Yumi. Mas ela estava um tanto curiosa para saber o que o seu pai diria se a conversa se estendesse um pouco mais neste tópico, então ela disse:

— Ela tocou muito bem sim, o senhor Yuji estava muito orgulhoso da filha - disse Sara com uma expressão de felicidade um tanto falsa.

— Aquele metido, certeza que ele mandou a filha aprender tocar pra poder se exibir. - disse o como se sentisse nojo, e continuou - Ele acha que assim vai conseguir mais votos na próxima comissão de nomeações, ele tava preparando isso pra o final desse ano, safado!

— Verdade! - complementou a mãe de Sara, apenas para concordar com o marido.

— Como assim ele fez isso por causa da comissão de nomeações? - perguntou Sara.

— É claro que é por isso, - respondeu Rodrigo - ele virou ansião na eleição passada. Ele está tentando conseguir mais pontos no final do ano para virar o primeiro ancião no ano que vem.

  Na igreja de Sara, todo ano, eram decididos numa votação, quais seriam os membros da igreja que iriam ocupar os cargos administrativos. Rodrigo, pai de Sara, era um diácono, um cargo de serviço em que ele tinha o dever de recolher o dinheiro dos membros no momento do culto, servir como uma espécie de segurança, abrir a igreja no início do culto e outras funções para o funcionamento da igreja. Era um cargo necessário, mas que tinha pouquíssimo prestígio.

  Já o pai de Yumi, o senhor Yuji, era um ancião. Este cargo tinha bastante prestígio, ele o tornava o braço direito do pastor da igreja, por isso, o primeiro ancião era a pessoa com mais "prestígio eclesiástico" abaixo do pastor. Rodrigo tinha inveja do cargo de ancião que Yuji tinha, mas estava certo quanto a ambição dele em se tornar o primeiro ancião.

— Você vai se oferecer de novo para ser ancião pai?

— Claro! Eu é quem tinha que ocupar aquele cargo.

— Dessa vez vai dar certo querido. - disse a mãe de Sara enquanto trazia as panelas com o almoço para a mesa.

— Sim, tem que dar certo, eu estou naquela igreja há mais tempo, faz só seis anos que ele está aqui, eu estou a minha vida inteira. Eu tenho mais experiência e tenho mais fé do que ele - Rodrigo foi aumentando o tom de voz enquanto falava.

— Não precisa ficar nervoso, querido.

— Eu estou calmo - retrucou, num tom pouco amigável.

  Começaram a refeição. Sara comeu pouco, não estava com muito apetite, apesar de estar feliz por Yumi, ela estava receosa de que o seu pai ainda não tinha dito tudo o que iria dizer de negativo. Natália quebrou o silêncio mais uma vez:

— Você acha que a ideia de Yuji para somar pontos deu certo?

— Acho, ele precisa mostrar que é um bom pai de família para ocupar o cargo, precisa mostrar que sabe mandar na própria família se vai mandar no resto da igreja. - Ele terminou essa frase e olhou fixamente para Sara.

Ela, percebendo, desviou o seu olhar para a comida. Não tinha tido tempo de ler adequadamente o olhar de Rodrigo, mas sabia que não significava algo bom.

— Aquela filha dele também é uma metida - disse Rodrigo num tom de desabafo.

  Sara não gostou do que ouviu e respondeu de forma firme;

— Yumi não é metida, ela é uma ótima pessoa e minha melhor amiga. Por favor, não fale mal dela na minha frente, aliás, não dela, ela só merece elogios!

  Ela não avaliou as consequências da sua frase antes de dizê-la, apenas disse o que pensou naquele exato momento. Rodrigo perdeu a calma e disse quase gritando:

— Se eu disse que ela é uma metida é porque ela é. E você baixa a bola pra falar comigo menina, você me deve respeito, é um mandamento de Deus, eu sou seu pai.

— Eu não te desrespeitei, apenas pedi para você não desrespeitar Yumi - respondeu Sara, se esforçando para ficar calma e sabendo que tinha falado demais.

— Me respondeu de novo, tá pensando o quê? Yumi é filha daquele metido que quer o cargo que devia ser meu, ela é só mais uma metida - disse ele transtornado e perdendo o pouco de calma que ainda tinha, e continuou - você disse que ela é uma ótima pessoa né? Então pelo menos aprenda alguma coisa com aquela metida e faça seu pai ter um pouco de crédito na igreja antes da comissão de nomeação. Ah... Mas vai ser difícil, porque aquela metida da sua amiga pelo menos é uma menina talentosa, você é só um estorvo!

  Sara ouviu isso e teve um pouco de dificuldade para processar tudo. Ela estava com raiva por seu pai estar insultando Yumi e ao mesmo tempo estava ofendida por ele não a reconhecer como talentosa. Rodrigo tinha sido grosseiro e agressivo, Sara tentava não se sentir triste quando o seu pai a tratava assim, mas estava falhando em não sentir tristeza. Então ela se lembrou da frase que Yumi tinha dito há dois anos atrás: "Faz um ano que você está se esforçando pra melhorar no que você gosta, eu também quero ser boa em uma coisa que eu gosto, então eu decidi que vou me esforçar igual você". Ela sentiu um pouco de suas forças voltando e respondeu:

— Pai, eu também sou talentosa!

— Que mentira, - ele respondeu em tom sarcástico - você, talentosa? Que talento você tem? Aqueles desenhos ruins? Você não tem talento Sara, você só desperdiça tempo com uma coisa que você não é boa e que não serve pra nada - Rodrigo continuou - Aquele metido do Yuji pelo menos tem uma "boa" filha pra ficar mostrado na igreja, eu nem isso.

  O clima ficou indizível depois disso, Rodrigo apenas continuou comendo a refeição, Natália não se atrevia a falar nada e Sara estava emocionalmente destroçada. Ela não terminou o prato, se levantou em silêncio e foi para o seu quarto.

  Entrou, fechou a porta e deitou na cama chorando. Em poucas horas Sara tinha sentido uma total felicidade e uma completa tristeza. Agora ela sentia um cansaço emocional e uma dor que a faziam se sentir como num lugar escura - Por que o meu pai me trata assim? - ela pensava. Rodrigo era um homem cortês e agradável na igreja, mas em casa sempre maltratava a família. Sara o amava como pai, mas isso a machucava ainda mais, ela queria se sentir amada mas era desprezada. Sua mãe não a tratava mal, mas nunca ergueu a voz contra as grosserias do marido em defesa da filha, e nunca foi prestar apoio quando ela ficava triste por ser maltratada. Sara desde criança queria se sentir amada, mas sua família a fazia se sentir como um ser insignificante sem amor.

  Ela deve ter ficado mais duas horas deitada, chorando e olhando para o teto. Ao longo de sua infância, além das agressões verbais, ela também tinha sofrido agressões físicas. Por isso, quando Sara sofria alguma agressão significativa e começava a chorar, ela ficava imersa numa profunda tristeza, que era o resultado dos anos de maus tratos.

  Depois desse tempo, Sara refletiu sobre o que tinha acabado de acontecer e decidiu que nunca mais iria se permitir ficar abatida por causa das agressões do pai. Ela pensou na frase de Yumi mais uma vez "então eu decidi que vou me esforçar igual você". Dois anos atrás ela tinha servido de exemplo para uma decisão importante da sua amiga, ela tinha se tornado o norte que Yumi tinha escolhido como referência na sua jornada para aprender o que gostava. Hoje, o resultado dessa decisão era que Yumi tinha sido reconhecida por todos como uma garota talentosa e Sara tinha ficado profundamente feliz pela amiga. Agora ela também tinha tomado uma decisão e disse para si em pensamento - Yumi será a pessoa que irá nortear e inspirar minha jornada, eu também serei reconhecida pelos meus talentos, vou estudar e praticar muito até que isso aconteça. E a única pessoa que sei que vai me ajudar e apoiar é a Yumi, então farei isso por ela, a pessoa que se importa comigo. Sara se levantou da cama, se sentou diante da sua escrivaninha e começou a fazer um desenho pensando em Yumi.


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