2010

Mas o luxo da realeza , infelizmente, não é para todos. Pelo menos, não no começo da jornada.

Numa estrada cheia de folhas e neblina, totalmente deserta, três garotas foram jogadas no chão de uma carroça.

Uma se levantou. Era a menor das três, com o cabelo azul curto e os olhos num tom mais claro da mesma cor. Usava uma roupa toda coberta, com uma capa que quase arrastava no chão:

—Eu avisei que não ia dar certo!

—Haruka, se for pra reclamar, faça isso quando eu não tiver acabado de cair de cara no chão. Literalmente.- Uma que ainda estava no chão bufou.

Ela se levantou. Usava uma calça preta e botas grandes. A blusa que usava era marrom e de gola alta, mas tinha uma pequena bolsa nas costas com um arco e flecha.

Limpou a poeira do seu cabelo preto longo, finalmente exibindo seus olhos dourados.

As duas se encararam, e logo depois encararam a que ainda estava caída no chão.

—Eliza, você morreu?- Haruka questionou.

—Já pensou que se ela tiver morrido, ela não vai responder?- A mais alta cruzou os braços.

—Nunca se sabe, Couse. Coisas loucas acontecem aqui.

—É claro que eu tô viva, suas… bestas!- A ainda caída parecia indignada- Quem morre caindo da carroça?

—Você ficaria surpresa.- Cousie deu um sorriso de canto.- Vem. Não dá pra ficar estarracada no chão.

Cousie estendeu as duas mãos, e Eliza pegou uma delas de mal gosto, antes de se ajudar a levantar.

Eliza tinha os cabelos ruivos trançados e de lado, apesar de totalmente bagunçados e sujos. Era de altura média entre as irmãs, e tinha os olhos verdes. Sua roupa consistia numa blus branca e um vestido vermelho por cima, além de um casaco tão longo que chegava ao seus pés. Parecia descalça.

Ela cambaleou um pouco:

—Ai, acho que devo ter machucado minha perna. Ou as duas.

—Podemos aproveitar que o Senhor Winderburg foi gentil o suficiente de nos expulsar da nossa carroça e descansarmos por aqui.- Cousie sugeriu- Faz uns 3 dias que não paramos pra dormir. E mal comemos.

—Boa ideia!- Haruka concordou.

As três pegaram a mísera mochila que tinham e se sentaram ao pé de uma árvore, todas suspirando de cansaço ao mesmo tempo.

—O que temos pra comer?- Haruka virou pra irmã do meio.

Eliza abriu a mochila, fazendo uma careta:

—Podemos escolher entre… geléia com pão, ou pão com geléia.

Cousie segurou uma risada:

—Quanta diversidade.

—É tudo uma questão de quantidade.- Eliza sorriu- Estão servidas?

Haruka fez uma careta, mas aceitou a torrada com geleia que Cousie fez pra ela. Eliza fez uma pra si e pra irmã mais velha, que agradeceu.

—Se eu tiver que comer pão e alguma mistura nojenta de frutas por mais um dia, acho que eu desmaio.- Haruka limpou a boca.

—Não pode ser mal-agradecida, Haruka.- Cousie a repreendeu- É o que conseguimos ter.

—O que a Eliza conseguiu roubar, você quer dizer.- Haruka retrucou.

Eliza deu de ombros.

—Exatamente. E por isso você deveria agradecer sua irmã por correr esse perigo pra nos alimentar.- Cousie franziu o cenho pra ela.

—Isso, me agradece.- Eliza brincou, fazendo Haruka mostrar a língua pra ela.

Cousie sorriu de leve pras irmãs:

—Falando em roubar, alguém quer ver se tem alguma pousada indefesa por aqui?

—Mais comida?- Haruka perguntou.

—Irmã, não acha mais gentil a gente perguntar se podem nos hospedar antes de só invadir?- Eliza questionou.

—Eliza, quem vai querer hospedar três meninas com cara de mendiga, sem dinheiro e sem família?- Cousie colocou as mãos na cintura.

—Sei lá, alguém legal?- Eliza sugeriu.

Cousie franziu o cenho pra ela.

—Vocês duas são tão amargas!- Eliza sorriu- Precisa ter um pouco de suavidade no coração pra sobreviver num mundo tão cruel, minhas irmãs.

—Você parece a mamãe falando.- Cousie opinou.

—E você parece o papai.- Eliza retrucou.

—Credo. Vocês duas só brigam.- Haruka revirou os olhos.

Eliza e Cousie trocaram um olhar debochado.

—Haruka, o que você acha de eu me transformar numa idosa faminta e indefesa e a gente fingir que você é minha netinha faminta e indefesa pra gente conseguir lugar na hospedaria?- Eliza sugeriu.

—Er. Não sei.- Haruka deu de ombros.

Cousie deu de ombros.

—Aposto que eles tem alguns livros legais lá.- Eliza sorriu de forma maliciosa.

Haruka olhou pra irmã com os olhos brilhantes num flash:

—Sério?

—Aham.

—Então vamos logo!

Haruka se levantou, correndo numa direção qualquer.

—Ei, cuidado!- Cousie falou mais alto.- Você não sabe quem vem por aí…

Haruka já estava longe.

—Relaxa.- Eliza se levantou- Ela sabe se cuidar, ensinamos ela bem.

—Você é muito maliciosa. Convencer ela com livros? Sério?

—Ei, eu preciso usar meus poderes pra alguma coisa aqui. Você sabe que eu não sou lá muito boa com espada.

—Você compensa em outras partes.- Cousie retrucou com um sorriso.

—Ownt. Obrigada! Acho que foi a coisa mais legal que você já me disse.

—E isso é uma mentira deslavada.- Cousie brigou.- Eu sou… muito legal.

—Tenho quase certeza que o último elogio que você deu pra Haru é que ela era "uma leitora ávida". 

Cousie bufou.

—Tá tudo bem, é seu charme ser coração de pedra!

Um grito se ouviu no fundo:

—GENTE! ACHEI UM LAGO CONGELADO AQUI! MÓ DAOR...AI!

As duas se olharam preocupada.

—É… se ela acabou de se afogar, eu quero deixar bem claro que não fui eu que ensinei ela isso.- Eliza retrucou.

Cousie correu até a direção do grito da irmã, e Eliza correu logo atrás, já mudando sua aparência pra de uma velha.

Um pouco de relance, seus olhos ficaram amarelados.

—ACHO QUE TEM UM BICHO AQUI TAMBÉM!- Haruka gritou.

—Meu senhor.- Cousie puxou seu arco e sua flecha pra mão, já mirando- Já estou indo!

—E eu vou logo atrás!- Eliza gritou.