2009

O Castelo Demônio quase sempre estava desértico de tão vazio.

Mas isso não significava que ele era silencioso.

O que era a principal coisa que fazia os mordomos suspirarem pra si mesmos enquanto o Príncipe Shin corria pelos corredores, ecoando um barulho forte pelo castelo todo.

Príncipe Shin era o mais novo dos dois filhos. Jovem, poderoso, cheio de energia e absurdamente inconsequente.

É claro, sua grande aventura de correr pelo castelo foi brutalmente interrompida quando ele por pouco não bateu em alguém.

—...Eu quero saber pra onde você está indo?- Carla questionou.

—...Não?- Shin sugeriu.

Carla o encarou. O irmão mais velho não parecia ser assim tão diferente em questão de idade do mais novo. Mas sua postura provava bastante do contrário.

—Me siga.- Carla pediu. Ou melhor, mandou.

—Ah, não…- Shin bufou- Irmão, é que eh tenho outras coisas pra fazer e…

—Eu não me lembro de ter pedido sua opinião sobre isso. Foi uma ordem. Me siga.

Shin pensou em retrucar. Várias vezes. Rangeu os dentes. Achou melhor obedecer o irmão.

Eles desceram juntos um par de escadas, e Carla empurrou uma porta que Shin conhecia bem demais.

—Ah, não. Por que…

Carla o ignorou prontamente seguindo em frente.

Eles entraram juntos na galeria da família.

Carla parou com as mãos pra trás na frente do retrato de família. Shin o encarou, antes de repetir.

—Sabe que dia é hoje?- Carla questionou.

Shin riu entredentes:

—Como se o conselheiro, você e os mordomos me deixassem esquecer.

Carla o encarou feio novamente.

Shin murchou.

—Claro. É o dia que você se torna apto a virar rei.

—Muito bem. E sabe o que isso significa, acredito eu?

—...Que você vai virar rei?

Carla suspirou, exausto.

—Significa que agora, mais do que nunca, passamos de príncipes regentes a reais líderes dessa nação. Por isso, eu espero o mínimo de maturidade e noção da sua parte.

Shin pareceu ofendido.

—Como assim mínimo de maturidade e noção?!

—Não somos mais crianças nem adolescentes, Shin. Já passou a época que nos preocupamos em beber sangue de qualquer donzela ou só… curtir a vida.

—Fale por você mesmo.- Shin murmurou entedentes.

—Você quer ser visto pelo nosso povo como uma criança inconsequente?

Shin ficou meio assustado.

—É claro que não!

—Foi o que eu pensei. Precisamos nos tornar exemplos. Ainda mais do que…

Carla hesitou um pouco:

—Ainda mais do que nossos pais.

Os dois olharam juntos para o retrato de família. Krone e Giesbach pareciam os encarar de volta, vazios e mortos por dentro.

—Queria que estivessem aqui.- Shin admitiu meio suavemente.

—Nosso pai traiu nossa própria família quando jogou nossa mãe pra apodrecer numa jaula.- Carla disse com um leve tom de agressividade.

—Me pergunto se isso foi antes ou depois da nossa mãe humilhar ele.- Shin resmungou.

Os dois se encararam. Talvez fosse melhor desviar do assunto.

—Já foi díficil o suficiente cobrir sua reputação quando você assassinou os Víboras, Shin.- Carla retornou ao assunto- Você sabe o preço que teve que pagar por isso.

—É, eu sei. Não é como se eu não me lembrasse disso toda vez que eu me olho no espelho nem nada.- Shin apontou pra parte do rosto coberta pelo tapa-olho- E eu nem causei tanto assim.

—Não sobrou nenhum adulto vivo e as crianças morreram de desnutrição.- Carla retrucou.

—...Não precisa jogar na cara a parte das criancinhas.

—Mas precisamos de um plano pra dar continuidade ao poder que nossos ancestrais tinham.- Carla olhou ao redor da galeria, de todas as pinturas de reis e rainhas- E pra isso precisamos de…

—Um herdeiro. Eu sei. Eu sei.- Shin revirou os olhos.

—E pra termos um herdeiro precisamos de uma…

—Primeiro-Sangue. Qual é a de eu terminar suas frases? Tá achando que eu tenho 3 anos.

—Dois, na verdade.- Carla respondeu- O conselheiro quer que nós dois arrumemos uma esposa Primeiro-Sangue.

—Eu também?- Shin cruzou os braços.- Ele pirou de vez? Já tá díficil achar uma Primeiro-Sangue saudável, fértil e minimamente gost...quero dizer, inteligente. Quem dirá duas.

—Quem tiver herdeiros primeiro poderá subir ao trono.- Carla disse.

Shin parou.

—Espera. Isso significa que…

—Você poderá ser rei tanto quanto eu daqui a alguns anos.

Shin arregalou o olho.

—Nós dois sabemos bem demais que as chances de eu não chegar a ter um herdeiro são… existentes. Preciso te preparar para ser um líder de verdade.

Shin concordou com a cabeça.

—E onde vamos procurar essas meninas?

—Bem, olheiros pelo reino demônio todo. Que nem nos últimos dois anos.

Shin respirou fundo:

—Entendo, irmão.

—Agora precisamos ir. Temos mais assuntos a tratar.- Carla então parou.

Ele fraquejou um pouco, sua respiração fraca.

Quando seus joelhos cederam, Shin conseguiu o pegar a tempo de sua cabeça não bater contra a pedra:

—IRMÃO!

Carla tossiu várias vezes, puro sangue saindo da sua boca.

Shin o olhou aterrorizado:

—AJUDA, POR FAVOR, ALGUÉM!