Confiança escrita por Liubovv


Capítulo 2
Sobrevivência




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Kakashi observava o céu à procura de orientação. Os tons lilás, azul e laranja misturavam-se, indicando um belíssimo fim de tarde de outono. Em pouco tempo as estrelas ganhariam notoriedade na vastidão enegrecida que os cumprimentava noite após noite. Entrou na caverna sentindo a umidade e a frieza do local que descansaria nas próximas horas, procurando uma área com o chão um pouco mais seco para que pudesse repousar o corpo adormecido de Sakura, tentando deixá-la o mais confortável, se é que encontrariam o mínimo de conforto naquele lugar.

Encarou-a por alguns instantes, lembrando-se de como a jovem estava determinada a salvar a vida de seu companheiro de time, e que, mais uma vez, provou não medir esforços para isso. Kakashi não poderia estar mais orgulhoso dela, uma vez que a médica sempre conseguia uma nova maneira de mostrar como havia amadurecido tanto pessoalmente como profissionalmente. Ao longo dos anos, ele teve o privilégio de acompanhar seu desenvolvimento, mesmo que às vezes de longe. Aquela criança meio perdida que virou ninja por um desejo miseravelmente bobo de chamar a atenção do garoto que gostava transformou-se numa linda mulher que sabia seu lugar no mundo, cuidando tanto de sua vila natal quanto de seus moradores. Kakashi sabia o quanto Sakura havia se esforçado, o quanto ela ainda estudava e se dedicava, dia e noite, para manter o respeito e a admiração conquistados ao longo dos anos.

Sem nem mesmo perceber seus movimentos, enquanto estava perdido nas lembranças, sua mão direita afastou uma mecha de cabelo que tampava parcialmente o rosto da kunoichi. Voltou o polegar novamente em direção ao rosto da jovem, acariciando sua bochecha e somente aí deu-se conta de seus gestos quando sentiu a pele fria de sua aluna em contato com seus dedos.

Preciso de sua ajuda para não morrer de frio. Preciso que me mantenha viva!

A recordação das palavras da médica cortaram seus pensamentos tal qual uma kunai precisamente lançada em seu alvo. Levantou-se abruptamente indo em direção à entrada da caverna para procurar madeira suficiente com o intuito de fazer uma fogueira capaz de aquecê-los ao longo de toda a noite. Do lado de fora ainda era possível enxergar os últimos raios de sol que abandonavam aquele dia. Kakashi não demorou a coletar a madeira, voltando rapidamente para o interior gelado da caverna.

Abaixou-se próximo ao local onde deixara Sakura repousando e organizou a madeira em uma pilha, tomando cuidado para que não estivesse perto demais para queimá-los caso voasse alguma fagulha. Fez os selos com a mão ao mesmo tempo que murmurava:

— Katon: Gōkakyū no Jutsu! *

Com a fogueira acesa e tendo a certeza de que Sakura estaria aquecida, sentou-se encostando as costas numa pedra e permitiu-se relaxar, sentindo o ferimento na costela ainda dolorido. Seria uma longa noite.

                                            ***

Naruto corria o mais rápido que conseguia, carregando Sai consigo. Estava cansado, seus músculos reclamavam pelo esforço contínuo mas ele não poderia se dar ao luxo de parar. Não enquanto seu companheiro não estivesse à salvo, não depois de presenciar todo o esforço de sua mais querida amiga para salvar o jovem em seus ombros.

Em dois minutos estaria cruzando os portões da vila, em cinco estaria na porta do hospital. Acelerou seus passos, suas mãos tremendo de ansiedade. Um único pensamento martelava sua cabeça, repetindo-se quase como um mantra: tomara que não seja tarde demais. Ao ver quem estava de guarda aquela noite na entrada da vila, ligeiramente adormecidos um usando o outro de travesseiro, Naruto não conseguiu conter um grito:

— OE!!! IZUMO!! KOTETSU!! SAIAM DA FRENTE, É UMA EMERGÊNCIA!!

Os guardas prontamente colocaram-se em suas posições novamente, amaldiçoando o ninja loiro por tamanho susto. 

— HEHEHE... DA PRÓXIMA VEZ TRAGO VOVÓ TSUNADE. APOSTO QUE ELA SERÁ UM DESPERTADOR MELHOR DO QUE EU – seguiu ainda correndo em direção ao hospital rindo da dupla, que o olhava num misto de pavor e ódio.

O prédio do hospital ficava ao final da principal rua comercial de Konoha. As lojas e restaurantes estavam começando a fechar as portas, findando mais um árduo dia de trabalho. Como era uma via movimentada, o jovem preferiu seguir caminho pelos telhados, tanto para não esbarrar em nenhum civil quanto para não assustá-los com o companheiro desacordado em seus ombros. Pulou do último telhado já na frente do hospital, que abriu as portas automáticas imediatamente. Entrou no local e dirigiu-se rapidamente à recepção, falando com urgência:

— Preciso da vovó Tsunade agora, Sakura nos enviou, ele está morrendo! – disse num só fôlego. A jovem atendente prontamente discou um número no telefone, informando a situação enquanto uma dupla de enfermeiras já trazia uma maca para amparar o corpo de Sai.

— Ela já está a caminho, as enfermeiras vão levá-lo para o atendimento – disse a jovem tentando acalmar o loiro – você pode acompanhá-los, a Godaime irá diretamente para o quarto.

Mal terminou de explicar Naruto saiu correndo para seguir as enfermeiras que levavam Sai em direção aos quartos do hospital. Quando chegaram, foi com alegria que Naruto percebeu que Tsunade já os aguardava, preocupação evidente em seu olhar analítico.

— Naruto, conte-me o que aconteceu! – disse com firmeza.

                                            ***

A luz cegava-o. Não conseguia distinguir nada a mais de um palmo de distância. Todavia, podia sentir um líquido viscoso escorrendo pela sua mão direita enquanto algo prendia seu braço. Aquela sensação lhe era muito familiar, morava dentro de si há mais tempo que gostaria de lembrar. A claridade foi diminuindo lentamente, os borrões iam tomando forma e, ao fixar seus olhos no que estava a sua frente, as orbes cor de chocolate miravam-no sem realmente enxergá-lo. Fechou as pálpebras recusando-se a olhá-la novamente naquela situação. À beira do desespero, puxou o braço com toda força e abriu os olhos.

Respirou fundo uma, duas, três vezes antes de finalmente entender onde estava. A fogueira ainda crepitava, deixando o interior da caverna parcialmente iluminado e timidamente aquecido. O ninja, porém, suava frio por reviver um recorte tão delicado de sua história. Acreditava que jamais conseguiria superar a morte de Rin apesar de não se sentir mais tão atormentado quanto num passado não tão distante. Enxugando a testa com a manga de seu uniforme jounin, virou-se em direção à Sakura e estacou, preocupação transbordando pelo seu único olho visível: a jovem estava ainda inconsciente e tremia de frio ao ponto de seus dentes baterem uns nos outros.

O ninja não pensou duas vezes e dirigiu-se ao canto onde a ninja estava, repousando a mão em seu braço. Pode sentir o tecido da roupa dela ainda molhado e extremamente frio, o que serviu para deixa-lo mais alerta.

Preciso de sua ajuda para não morrer de frio. Preciso que me mantenha viva!

Com as palavras da médica ressoando novamente em sua cabeça, o jounin não hesitou em suspender o tronco de Sakura, recostando-a na parede rochosa e, pedindo licença mentalmente, começou a tirar as peças do uniforme ainda encharcado. Retirou o colete e a camisa do uniforme igual ao seu, deixando-a apenas com as tradicionais faixas brancas cobrindo-lhe os seios. Estendeu as peças o mais próximo possível da fogueira para que pudessem secar. Deitou-a novamente, com cuidado para que ficasse minimamente confortável, para retirar a calça do uniforme. Por um momento, observou a pele exposta do colo da ninja, notando como estava mais pálida que o normal, resultado do frio intenso que estava sentindo, pensou. Desabotoou a calça e puxou-a junto com os sapatos e meias, depositando-os ao lado das demais peças.

O corpo alvo de Sakura ainda tremia e Kakashi notou os pelos dela eriçados e os músculos retesados. Os dedos das mãos e dos pés estavam arroxeados, o que fez o mais velho tirar as próprias luvas e colocá-las nas mãos pequenas e delicadas. Como sua mão era infinitamente maior que a dela, o tecido cobriu bem a área, deixando pouca pele exposta. Não fazia ideia em que momento suas mochilas tinham se perdido então suspirou e tirou seu uniforme de mangas longas e enrolou-o nos pés enrijecidos da jovem. Em seguida, tirou também a segunda pele que usa costumeiramente por baixo do uniforme, com a máscara acoplada, deixando o tronco desnudo e o rosto livre, colocando a peça por cima dos braços da médica que estavam cruzados em cima do abdômen. Por fim, recostou-se na mesma parede rochosa que havia sustentado Sakura há poucos minutos, abriu as pernas e trouxe o pequeno corpo da jovem de encontro ao seu, repousando as costas dela em seu peito e sua cabeça em seu próprio ombro. A pele fria de sua ex-aluna em contato com a sua causou-lhe um arrepio forte. Os cabelos curtos escorregaram para perto da nuca do mais velho, fazendo uma carícia leve, quase como um agradecimento pelo cuidado. Usou os braços para envolvê-la, numa tentativa precária de aquecê-la de maneira mais rápida. Com o queixo no topo da cabeça da médica, Kakashi logo adormeceu novamente, esperando que, pelo menos desta vez, sonhos tão turbulentos não viessem incomodá-lo.

 

 

 

    

*Liberação de Fogo: Técnica da Grande Bola de Fogo.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado.
Comentários e sugestões sempre são bem vindos :)



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