Laços de Esperança escrita por Olívia Ryvers


Capítulo 11
Capítulo 11




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Foram poucos os minutos que Lorde Roxton demorou para percorrer a distância entre o pub onde jantavam e a mansão. Todavia, para Marguerite pareceram horas. A angústia em seu peito aumentava a cada metro e ela procurou em seu íntimo algum tipo de crença ou espiritualidade há muito esquecida mas que lhe conferisse a fé que necessitava para não sucumbir ao desespero.

John estava igualmente nervoso, o silêncio estrangulador que operava dentro do luxuoso veículo só tinha sido rompido pela ligação que ele fez a Dr. Arthur Summerlee, o pediatra de Abigail. Marguerite não se concentrou no conteúdo da conversa, também não era preciso. Ela sabia exatamente o que Roxton solicitava com voz urgente ao médico, e ao que parecia, o profissional levaria um pouco mais de tempo para encontrá-lo na mansão. Isso não era bom, pensou Marguerite apreensiva.

Assim que chegaram à entrada principal da imponente edificação, John desligou o motor e saiu sem nem ao menos apagar as luzes ou fechar a porta, não foi necessário se ater ao cavalheirismo, pois Marguerite também já tinha saltado do automóvel quando ele alcançou seu lado. Em um aceno silencioso entrou correndo sendo seguido por ela com a mesma rapidez.

O quarto de Abigail estava iluminado confortavelmente por luzes secundárias embutidas no gesso ornamentado da parede. Embora não tendo acesso à luz direta, era possível notar que a menina estava com os lábios e olhos inchados e erupções rosáceas na pele, além de uma dificuldade óbvia para respirar. Mary, a governanta estava sentada a beira da cama segurando as mãos da pequena enferma, ao seu lado, no chão uma bacia de porcelana a postos para recolher o que quer que ainda restasse no interior do estômago da garotinha. Quando notou a chegada do patrão, a mulher se ergueu e o conduziu a um canto do quarto onde em voz baixa lhe esclarecia todos os ocorridos. Isto deu oportunidade a Marguerite assumir seu lugar na cama junto de Abbie.

—Querida, você vai ficar bem logo._acariciou o rostinho agora edemaciado.

Abigail não respondeu, ao contrário, seu fôlego pareceu ainda mais reprimido. Marguerite conhecia aqueles sintomas e sua intuição gritava por uma confirmação. Começou a esquadrinhar o ambiente em busca de uma comprovação para sua teoria. Não custou a encontrar o que procurava, logo na penteadeira ao lado da cama, embalagens prateadas lhe chamaram a atenção. Esticou o braço e com facilidade e apanhou um dos papéis. O rótulo não estava em inglês, mas ela era fluente em idiomas latinos e por isso identificou escrito em idioma português a composição do produto que outrora fora protegido por aquele envelope.

—Abigail é alérgica a amendoim?_interrompeu a conversa privada entre John e Mary, arrancando-lhes olhares confusos.

—Uma vez_começou John forçando a memória para recordar-se_quando experimentou manteiga de amendoim, Abbie teve uma fraca coceira. Na época, Dr. Summerlee receitou um antialérgico, embora tenhamos sempre na farmácia ela nunca mais precisou usá-lo. O que isto tem a ver?

—Veja!_Marguerite entregou-lhe o papel laminado. Ele passou os olhos pelo escrito sem entender do que se tratava, ainda que pela ilustração estava claro que não era um doce feito de amendoim._O que é isso?

—Um chocolate com recheio de castanha._respondeu ela. Era evidente que Lorde Roxton não estava associando as informações que lhe eram apresentadas._Castanha é uma semente oleaginosa típica da floresta Amazônica.

—Verônica trouxe esses chocolates para Abbie do Brasil._explicou ele._Mas ela sabia da alergia a amendoim, nunca lhe daria algo que lhe fizesse algum mal.

—Eu sei disso._concordou ela_entretanto, esse é um doce artesanal, nestas condições é impossível controlar a possibilidade de uma contaminação cruzada. Algum utensílio que foi utilizado no preparo do bombom pode ter sido usado anteriormente na fabricação de um lote de doces com amendoim.

—Mesmo que houvessem vestígios de amendoim, seria muito pouco para deixá-la neste estado._argumentou incrédulo_no episódio com a pasta houve apenas erupções na pele.

—Indústrias de grande porte costumam acrescentar a receita do creme uma enzima que quebra a proteína causadora da reação alérgica em pequenos aminoácidos, enganando o sistema imunológico. Porém, acho difícil que esse procedimento seja adotado em um local remoto da selva amazônica.

Ele abriu a boca para uma nova questão mas foi interrompido pelo arquejo agonizante da filha. A vermelhidão de seus lábios começava a tomar uma cor cianótica.

—Ela está piorando._concluiu_Mary, busque na farmácia o anti-histamínico._ordenou ele, depois tornou sua atenção para a criança._Vai ficar tudo bem, eu prometo.

Marguerite vasculhava a bolsa freneticamente até que seus dedos tocaram uma estrutura fria e cilíndrica. Jogou o acessório feminino sobre a poltrona e se aproximou de John com a ampola nas mãos.

—O que é isso?_perguntou ao ver o frasco que continha alguns mililitros de algo desconhecido e um dispositivo acoplado com uma agulha de calibre médio.

—John, precisa confiar em mim._começou ela com voz firme apesar de seus olhos fracassarem em esconder sua própria aflição._Abigail está tendo um choque anafilático._sua certeza era quase irrefutável._a traqueia dela vai fechar e ela não conseguirá respirar_tentou ser o mais objetiva possível_Eu preciso aplicar nela epinefrina_ergueu a ampola pra que ele pudesse ler o rótulo_é um antiasmático, vai ajudar a liberar as vias respiratórias dela.

—Mary já foi buscar o remédio da alergia._justificou ele.

—Por favor, John… confie em mim_implorou ela_não temos tempo.

Ele sentiu a filha debater-se de encontro ao seu corpo, ela estava convulsionando. Desesperado segurou o braço de Marguerite em um apelo.

—Eu lhe imploro, salve-a.

A mulher tirou o cobertor com estampa de princesa que cobria a menina e ergueu a camisola infantil até altura da coxa. John, agora de pé, observava o ato de forma silenciosa e apreensiva. Suas duas mãos seguravam os próprios cabelos e sua mente repetia um mantra: “Eu não posso perdê-la”. Prendeu a respiração quando Marguerite acionou o autoaplicador da ampola e injetou uma dose da droga no músculo frágil da perninha direita de Abbie. Ela estava quase inconsciente, incapaz de sentir ou reclamar da dor que a inserção da agulha lhe infligia. Os segundo seguinte passaram-se em câmera lenta. Os olhos de ambos estavam vidrados esperando a reação da menina. Depois de dois intermináveis minutos a pequena mãozinha apertou suavemente a de Marguerite. Ela quase nem notou a princípio, até que a intensidade do toque finalmente chamou sua atenção. Desviou os olhos do rosto da filha para o local onde seus corpos estavam em contato, esperava que a impressão não fosse apenas obra do seu desejo desesperado que Abigail reagisse, e, então ouviu sua voz fraca.

—O que aconteceu?

Nem ela, nem John foram capazes de responder. Lágrimas contrastavam com seus sorrisos de felicidade e alívio. Abraçaram a filha até fazê-la se incomodar com o gesto, ainda sim não a soltaram, queriam ter certeza que ela estava bem, e queriam ficar assim juntos para sempre.

Algum tempo depois Dr. Summerlee chegou a mansão e examinou a menina concluindo que estava em plenas condições novamente. Enquanto o agradável senhor rechonchudo e simpático acabava de verificar os sinais vitais da filha, John, afastou-se da cama, caminhou alguns passos até a mulher que salvara a vida de seu tesouro precioso. Ela estava próxima a janela, observando sem objetivo o céu tenebroso com a tempestade que se aproximava. Eles mesmo tinham sobrevivido a sua própria tormenta minutos antes. Abbie estava bem e falante novamente, a adrenalina havia baixado em todos e agora ele conseguia pensar racionalmente. Seria grato a Marguerite por uma eternidade, entretanto, uma dúvida o atiçava.

Ela não notou a proximidade dele até que sua voz rompesse seus pensamentos, ou a falta deles.

—Como sabia?_inquiriu John com suavidade, tentando não assustá-la.

—O que?

—Como sabia o que Abbie sofria? Como sabia todas aquelas coisas sobre proteína, e, por que tinha uma ampola de epinefrina na bolsa?

Marguerite o encarou. Não mentiria, não mais. Estava exausta emocionalmente para se esquivar de uma pergunta simples, então, com toda franqueza ela lhe respondeu.

—Porque eu também sou alérgica.

John teve a impressão de que aquilo não era tudo. Marguerite queria compartilhar mais alguma coisa, talvez uma experiência semelhante. Não conseguiu identificar em seus olhos a natureza do gatilho que toda a situação havia lhe desencadeado, porém não teve oportunidade de perguntar. Dr. Summerlee tinha terminado o exame clínico e depois de mais uma vez tranquilizá-los sobre a saúde de Abigail foi acompanhado por Lorde Roxton até a saída.

Provavelmente a conversa durou mais que um simples adeus, pois, nesse meio tempo Marguerite pôde ler para filha fazendo-a adormecer. Beijou-lhe a testa antes de apagar a luz e deixar o quarto.

O clarão de um relâmpago a assustou no corredor penumbroso e aristocrático da mansão Roxton. Ainda estava sobressaltada e confusa, quase perdida no imenso cômodo quando mãos fortes a seguraram gentilmente pelos ombros.

—John!_ofegou_Você me assustou.

—Desculpe, não foi a minha intenção._havia traços de indulgência em sua fala, mas algo na rouquidão de sua voz lhe diziam que suas intenções não era apenas se desculpar._Arthur disse que você fez um ótimo trabalho_ dizia as palavras tão próximo ao seu ouvido que Marguerite sentia sua pele arrepiar ao contato de seu hálito quente._Abbie está bem graças a você, eu vou ser eternamente grato.

Ela quase não podia respirar, o desejo clamando em cada célula de seu corpo. Fechou os olhos esperando que a inibição e um de seus sentidos lhe trouxesse a concentração necessária para elaborar uma resposta simples.

—Você não tem que me agradecer_conseguiu dizer_não me perdoaria se algo acontecesse a Abbie.

—Então, deixe-me mostrá-la o quanto estou agradecido._provocou lascivo.

Ela umedeceu os lábios, sabia que sua boca estava muito próxima da dele, e não tinha nenhuma pretensão de evitar o beijo que viria em seguida.

E ele veio, intenso, quente e inebriante. Talvez tenha sido a emoção da experiência traumática que haviam acabado de viver, entretanto, o fato era que Marguerite não lembrava de uma só vez em que se sentiu daquela forma. Nos braços de John o tempo parecia parar, não havia razão, apenas a emoção guiando suas atitudes como se fosse simplesmente um amontoado de sensações sem nenhum pensamento.

Roxton aprofundou o beijo, sua mão robusta emaranhou-se em vasto cabelo escuro que era seda ao seu toque. O perfume marcante invadia suas narinas deixando-o ainda mais ansioso por ela. Queria saborear cada parte daquele corpo feminino e a expectativa de tê-la nua em sua cama aumentava mais sua excitação. Se antes estava encantado com a beleza e sensibilidade daquela mulher, agora sua consideração em relação a ela evoluíra a um patamar surpreendente. A atitude rápida de Marguerite salvou sua filha e de certa maneira o salvou também, então, se no princípio estava interessado em conhecê-la melhor e deixar o destino decidir a respeito do futuro, isto havia mudado, John a queria em sua vida e definitivamente.

Um forte trovão interrompeu o frenesi, em seguida, o breu total. Ele a sentiu estremecer diante da escuridão. Segurou sua mão com firmeza enquanto sussurrava em seu ouvido.

—Venha… eu sei o caminho.


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