Segunda chance escrita por Laura Vieira, WinnieCooper


Capítulo 18
Capítulo 17




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Seu estômago estava revirado, estava se sentindo tonta, a vontade que tinha era de gritar e destruir tudo ao redor. A vida era tão injusta, Catarina já sabia disso, mas ver a injustiça acontecer na sua frente, não sendo ela, mas sim com seu afilhado, aquele que de certa forma ela ajudou a criar, que considerava quase como filho, lhe doía demais. Mal colocou os pés para fora do restaurante e se lançou nos braços de Petruchio o abraçando forte. Ele não sabia o porquê dela estar fazendo isso, mas retribuiu o abraço a enlaçando na cintura e deixando que ela encostasse seu rosto em seu peito. 

— Me abraça forte, me abraça forte como se me tirasse daqui, como se me transportasse para outro tempo, para outro espaço, para outra vida. 

Petruchio estranhou seu pedido, queria entender sua dor e seu desespero, mas a abraçou tão forte que ela retribuiu cravando seus dedos em sua nuca. Parecia desesperada.

Catarina sempre soube que um abraço poderia curar, só nunca tinha experimentado a sensação de cura e acalento quando precisava. Já tinha passado por tantos desencontros, tantas tristezas, tantos sentimentos sufocados dentro de si. As pancadas se acumulando em seu coração e só com um abraço reconstrutor podia voltar a respirar. E era o que fazia no momento, parecia que o abraço de Petruchio era seu respirar. O melhor lugar do mundo era ali, dentro de seu abraço. 

Petruchio deixou ela se acalmar, estava tão tensa, ombros rígidos, respiração irregular, acariciou suas costas e sentiu ela relaxando aos poucos, seu corpo amolecendo e sua respiração se normalizando. 

— É como se todos os problemas sumissem quando estou em seus braços. - ela confessou num sussurro nos ouvidos dele. 

— O que aconteceu? - ele perguntou preocupado ainda com ela enlaçando seu pescoço. 

— A vida aconteceu… todos me diziam que não era fácil, todos falavam que doía, mas eu nunca pensei que seria tão difícil, nunca imaginei que massacraria tanto meu coração,  nada dói mais que sentir na pele. E senti muito na pele durante esses dias de volta ao Brasil. E tudo se finalizou hoje e agora. Ver o Buscapé sendo humilhado e sofrendo racismo acabou comigo. 

Catarina desencostou sua cabeça do peito dele e o encarou, passou seus dedos de sua mão direita em seu rosto o acariciando agradecida.  

— A vida é mais fácil quando estou do seu lado. Seu abraço foi um remédio.

— Eu quero ser sua cura meu favo de mel. Conte pra eu o que tá acontecendo.

Ela negou com a cabeça cansada, não queria falar e nem explicar nada, era cansativo explicar como a atitude que presenciou contra Buscapé a feriu, era difícil explicar que o fato de precisar usar sua aliança para se sentir segura, para conseguir simplesmente trabalhar a machucava. Não queria falar nada. 

— Seja minha cura me levando para outro lugar? - pediu fugindo do assunto. 

— Podemos ir na fazenda. 

— Não, Júnior está lá e preciso saber como falarei com ele ainda e além disso, quero ficar a sós com você hoje, só com você. - Petruchio piscou duas vezes estranhando aquela Catarina diferente do que estava acostumado. Mas não reclamaria, não ousaria nunca reclamar. - O que você faria, para que lugar me levaria, se quisesse me conquistar? 

Ele tentou pensar uns segundos em uma resposta. 

— ...Ocê é rica, num restaurante? - ele arriscou. 

— Não sou rica Petruchio. - ela negou com a cabeça. - Pense, não quero que me surpreenda sendo uma pessoa que não é, eu te conheço. 

— Tá bem. - ele coçou a cabeça com uma mão, a outra continuava pousada em sua cintura. Catarina não queria desfazer o abraço. - Quando eu era moço, normalmente ia na praça, dava uma volta, lá sempre vendia cachorro-quente, sorvete, algodão doce, pipoca. A gente andava em volta do coreto e saía com uma moça. Era tudo muito simples e… 

— É isso! É exatamente esse encontro que quero ter com você. - ela o puxou pela mão quase desesperada e se encaminhou para a carroça. 

Como que para provar que ela não tinha vergonha de si e que queria mesmo uma segunda chance de recomeçar sua vida subiu na carroça ajudada por ele. Esperou que ele se encaminhasse para segurar as rédeas e enlaçou seu braço no dele. 

— Ocê não tem vergonha memo de eu. - ele sorriu feliz. Todas as ruas que passavam as pessoas pareciam os olhar. Chamavam a atenção. Mesmo assim Catarina não parecia se importar. 

Ele parou numa praça no centro, perto da loja de laticínios da fazenda Santa Clara. Petruchio a ajudou a descer da carroça segurando sua cintura para que não caísse. Seus rostos estavam tão perto que ele prolongou propositalmente a descida lenta da carroça só pra senti-la mais perto de si de uma nova forma. 

A levou para perto de um carrinho de cachorro-quente, deixou que ela escolhesse o que comer. Sentaram-se num pedaço de grama, a luz da lua os iluminava, começaram a jantar seu lanche como se fizessem um piquenique noturno, a praça tinha poucos casais, estavam quase sozinhos. 

— Sabe que eu dei é graças a Deus que ocê decidiu não comer mais lá. Na hora que vi o cardápio já tava imaginando como falaria pr'ocê escolher o prato mais barato. 

— Como assim? Achou que ia pagar todo jantar sozinho? - ela perguntou levantando as sobrancelhas. 

— Mas é claro. Como paguei o cachorro-quente agora. Às vezes eu esqueço o quão moderna ocê é. 

— Pagar sua própria refeição não devia ser coisa de outro mundo, nem trabalhar sendo mulher separada, nem ser um chef negro. Buscapé se veste de branco todos os dias para sustentar seus sonhos. Eu coloco essa aliança todos os dias para não sofrer represálias. Agora me diz, porque isso devia ser considerado moderno? 

Petruchio ficou momentaneamente sem fala. Estava achando ela triste, como se não enxergasse mais o copo meio cheio para nada. 

— Ocê tá triste com essa história do Buscapé, com a história da aliança. 

— Não estou triste. - ela negou com a cabeça olhando para baixo. - Não sei se estou triste. Estou cansada. Cansada de injustiças. Cansada de lutar sozinha. 

— Ocê não tá mais sozinha. - ele chegou perto dela, posicionou seu peito em suas costas e segurou a mão dela a acariciando. Catarina relaxou seu corpo deixando que seu tronco encostasse no dele. Aceitou seu carinho em sua mão. - Às vezes eu fico tentando imaginar como ocê conseguiu viver quinze anos sozinha nas Europa. 

— Eu não estava sozinha. - respondeu displicente, estava com os olhos fechados aproveitando o momento raro de carinho, foi quando se deu conta do que tinha falado. Abriu os olhos, tentaria consertar. - Quer dizer. Filomena foi morar comigo, era minha empregada, mas muito amiga. E além disso eu fazia muitos cursos, estudei bastante. Tentava de alguma forma fazer o tempo passar e não ficar pensando só no passado. 

— Eu tentei esquecer o passado, esquecer d'ocê. Teve uma época que eu bebia demais… 

Ela virou seu rosto o encarando, era a primeira vez que ele falava do passado só sobre si mesmo, sem falar do filho. 

— Bebia demais? 

— Bebia pra esquecer, mas só lembrava mais ainda d'ocê. Teve até uma vez que te liguei. - ele deu uma risada pelo nariz encabulado, mas uma vez que havia iniciado aquele assunto, prosseguiria. - Eu tentava não chorar ou não parecer fraco na frente do Júnior, mas toda vez que chegava perto do aniversário dele, do dia que ele nasceu e automaticamente do dia que ocê saiu da minha vida definitivamente, eu sofria, e saia de casa pra beber. Calixto brigava comigo… todos os anos… 

— Aposto que falava que as caveiras de seu pai e de sua mãe não gostavam dessa bebedeira. - ela tentou o descontrair. 

— Era exatamente isso o que falava. - ele deu um meio sorriso, mas prosseguiu com sua história. - Aquele dia o Júnior tinha 7 anos, eu fiz uma festinha pra ele, falei pra ele soprar a vela e fazer um pedido e não se esquecer que os pedidos se realizavam. Mas eu sabia que ele sempre pedia a mema coisa. Conhecer ocê, falar com ocê. 

Catarina entortou sua cabeça ouvindo a narração dele, Petruchio não a olhava, seus olhos miravam um ponto qualquer à sua frente. Mas sua fala continuava branda contando do passado. 

— Eu bebi além do normal naquela noite e parei na casa de Bianca, comecei a exigi que queria o número do telefone d'ocê. Ela me deu porque eu tava parecendo tão desolado e desesperado. Mas eu guardei. Não tive coragem de te ligar naquele dia. Se te ligasse ia ser tão triste e pior. Só que guardei e nunca esqueci onde tinha ponhado o papel... Na mema noite prometi que ia parar de beber. 

Catarina começou a acariciar a mão dele como que querendo lhe dar um conforto com anos de atraso. 

— ...Cinco anos passaram e a gente comprou a loja. Economizei tanto, vendi uns três leitão pra inteirar o dinheiro e a loja foi inaugurada. Júnior tava feliz, tínhamos um telefone. Então eu me lembrei do seu número e do papel guardado. A primeira coisa que fiz quando me vi sozinho na loja com o telefone foi ligar pr'ocê. Eu ouvi sua voz. Era como voltar pro passado, como materializar ocê na minha frente. - ele narrava ainda olhando um ponto específico em sua frente. Catarina parecia hipnotizada o observando. 

— Eu não me lembro desse telefonema. - ela confessou. 

— Eu não disse nada, eu só fiquei lá ouvindo o seu alô, ocê ficando impaciente e brigando do outro lado da linha, até que ocê desligou. Não durou dez segundos. Mas eu ouvi sua voz. - ele a encarou ao mesmo tempo em que Catarina acariciava seu rosto, passava o dedo por sua barba e seus olhos embargados. 

— A gente tenta começar de novo, mas parece mais um dado viciado desses de jogos, cai sempre no mesmo lugar. Eu sempre volto pr'ocê. - ela continuava a acariciar seu rosto. - Não me diz que ocê vai embora outra vez. Não me diz isso. - ele implorou. 

— Eu não vou mais embora. - ela garantiu automaticamente, ainda lhe fazendo carinho no rosto. - Eu quero viver tudo com você Julião Petruchio, quero a ansiedade dos primeiros encontros, o frio na barriga antes do beijo, palavras de amor ao pé do ouvido e o calor dos seus abraços. - ela passou seu dedo em cima do lábio dele que permanecia encarando ela. - Eu quero tudo com você. Tudo aquilo que não consegui viver com você antes. 

Ela lançou seu rosto para perto do dele e o beijou. Petruchio não estava acostumado com essa Catarina corajosa e com vontade de escrever sua própria história, mas já amava ela. Sempre a amou. Colocou sua mão em seu rosto e aprofundou o beijo. 

Era como estar ali e ao mesmo tempo não estar, era sentir uma felicidade imensa e pensar ser irreal, era estar vivendo o momento e já estar com saudade de vivê-lo. 

Por isso ele encheu seu pescoço de beijos quando separou seus lábios para respirar e ouviu a risada encabulada dela em seu ouvido. 

— Eu estou me sentindo uma adolescente. - ela sorria para ele com todos os dentes a mostra, Petruchio só queria poder guardar aquele momento para a eternidade. 

Já que ela não estava na defensiva, não queria lhe jogar um vaso, nem estava gritando, não estava fugindo do romance, mas sim querendo esse romance e se permitindo, ele lhe daria tudo o que pediu. Seria primeiramente romântico. 

— Ocê sabe que a gente nunca teve tempo de viver um romance…

— Ah eu me casei forçada com você, nunca quis romance. - ela estava com os olhos brilhantes e os lábios vermelhos. Ele amou perceber esses detalhes. - Eu era muito decidida naquela época, odiava ser contrariada, por isso demorei a me permitir sentir amor por você. 

— Era realmente uma fera. - ele sorriu. Estavam ainda enlaçados um no outro. Era impossível ficar longe mais de alguns centímetros. - Minha fera… - ele encostou sua testa na dela e permitiu que seus narizes se tocassem, acariciou o rosto dela com suas duas mãos. Ela estava esperando o beijo, que não aconteceu. - A melhor parte de um romance é o que leva até ele. Como se fosse um regar a rosa… ocê dá todos os subsídios para que a rosa cresça e floresça e só espera ela crescer linda e majestosa. - ele ficava roçando os narizes e falava com ela com os lábios lhe fazendo cócegas. 

— ...Esse regar a rosa é como uma tortura. - ela sussurrou em resposta esperando que ele finalmente selasse seus lábios no dela. - o que vem depois do regar a rosa? 

— Primeiro preciso fazê de tudo pra minha rosa crescer e florescer. - ele deu um último roçar de nariz e se afastou dela levantando do chão da onde estava sentado. - Ocê dança comigo Catarina? 

Ela abriu seus olhos e o encarou surpresa, mas se levantou do chão e pousou sua mão na dele. Não perguntou onde iriam dançar e como iriam dançar sem música, só aceitou o gesto romântico dele e se permitiu o improvável naquela noite. 

Petruchio a guiou até o coreto, subiram e ficaram no centro, ele pousou sua mão em sua cintura enquanto ela depositou suas duas mãos em seu pescoço. Começaram a mexer os pés numa dança lenta, sem música, mas mexiam no mesmo ritmo e se completavam na dança. Petruchio arriscou girá-la e trazê-la de volta a seus braços. Catarina sorria de olhos fechados e ele achou que seu coração poderia explodir de felicidade. 

A trouxe mais junto de si e ela o abraçou mexendo os pés lentamente. 

— ...A gente só danço três vez antes. A primeira aquele tango que te pedi em casamento e ocê fugiu, depois no noivado em que ocê me acusou de ter rasgado o seu vestido, e por fim no nosso casamento a valsa que ocê não deixou eu te beijar. - ela o olhou curiosa pela fala dele. - Foi tudo tão errado…

— Não foi… - ela negou com a cabeça acariciando a nuca dele. - Foi a gente. 

— Se eu te pedisse em casamento, rasgasse seu vestido ou te beijasse nessa dança, ocê fugiria? - ele perguntou tentando parecer ser uma pergunta qualquer, mas Catarina havia entendido o ato gigantesco dele. 

— Está me pedindo em casamento? - ela não sabia mais descrever as reações de seu corpo e de seus sentimentos todas as vezes que Petruchio dizia palavras como àquelas. 

— Eu sei que a gente não pode casar de novo, eu sei que assinamos aquele maldito divórcio e fizemos tudo errado. Mas eu quero ter um compromisso sério com ocê Catarina. - ele tirou momentaneamente suas duas mãos da cintura dela e tirou uma caixinha do bolso, abriu na frente dos olhos dela. - Essa aliança eu ia dar pr'ocê no dia do nosso noivado, no dia que eu pus ela no doce. 

— A aliança que havia sido roubada? - ela olhou surpreendida pra ele. 

— Eu achei essa aliança na fazenda, não sabe onde… nos pertences de Lindinha, ela tinha roubado do doce. 

— Lindinha? - Catarina ainda se surpreendia com as maldades de Lindinha com ela. - Ela nunca me aceitou, nem mesmo antes de eu ir morar na fazenda. 

— E eu guardei essa aliança desde que encontrei, porque era de minha avózinha Clara e ela é muito importante pra mim. 

— Sim a aliança de sua avó Clara. - ela repetiu lembrando-se da filha e os motivos dela ter aceitado se encontrar com ele naquela noite, precisava contar de Clara para ele. 

— E pensando num compromisso com ocê, nessa nova chance que estamos nos dando, eu quero começar de novo, do jeito certo, desde o começo. Por isso queria uma dança certa, e queria te entregar a aliança certa. - ele pediu para segurar a mão esquerda dela. Apontou o dedo anelar dela que levava a aliança de casamento. Catarina estava hipnotizada olhando ele falar e observando seus gestos com ela. - Eu sei que essa aliança te protege e que ela é muito importante pr'ocê por ser de sua mãe, mas eu te peço, tire ela. 

— Tirar ela? - ela perguntou com a voz fraca. Ficou anos sem usar a aliança, mas a verdade era que desde sua volta ao Brasil usar a aliança era sinônimo de proteção e de se sentir forte com ela. 

— Te peço permissão pra usar a minha na mão direita. - ele mostrou novamente a aliança que estava na caixinha. - E transformar essa num novo significado. - ele apontou então para a aliança da mão esquerda.

Ela negou com a cabeça, não porque não queria aceitar sua sugestão, mas por ainda estar se sentindo perdida e sem saber o que fazer. 

— Transformando ela num colar… 

— Um colar? - Catarina perguntou perdida observando ele tirar uma pequena corrente de seu bolso. 

Petruchio tirou lentamente a aliança de seu dedo da mão esquerda, a colocou na corrente e esticou o colar que havia feito a ela. 

— O círculo é o símbolo da perfeição, ele não tem começo nem fim, e representa a eternidade. Como o meu sentimento pelo ocê. - Catarina tinha os olhos marejados e não conseguiu responder ele, havia entendido o que ele queria lhe falar. - Eu quero começar do jeito certo, sem apagar o nosso passado e com a certeza que esse nosso sentimento vai ficar na eternidade e nunca terá um fim.  

Ela suspirou chorosa e se lançou nos braços dele o beijando com ardor. Ela nunca imaginou que sua volta ao passado lhe proporcionaria tantos momentos românticos, ela nunca sequer se imaginou vivendo um dia esses momentos românticos com o homem que amou e sempre amaria. Mas lá estava ela se permitindo, permitindo sentir seu coração acelerado, seus olhos marejados, seu coração preenchido, permitindo ouvir palavras românticas e viver momentos românticos. 

— Eu quero… - ela respondeu entre um beijo e outro, precisava confirmar em voz alta que aceitava tudo o que ele estava lhe propondo. - Eu quero. Eu aceito. Eu quero…

Ele sorriu recebendo o carinho dela e pediu para ela virar as costas para ele, começou a colocar a corrente em seu pescoço. Catarina deixou que ele fizesse isso e soltou pequenas lágrimas de felicidade de seus olhos. Petruchio terminou de prender o colar e deu um beijo em seu pescoço, o que a fez arrepiar sua pele e fechar os olhos, ele voltou a beijá-la no pescoço a abraçando pelas costas, Catarina parecia uma jovem descobrindo várias sensações de um romance pela primeira vez, amava seu coração saltando descompassado, o arrepio na espinha o desejo crescendo dentro do si. Por isso deixou que ele tocasse sua mão em seu corpo percorrendo caminhos até chegar em seu rosto, deixou que ele a beijasse no pescoço percorrendo caminhos até encontrar sua boca. 

— Petruchio… estamos numa praça. - ela disse com os olhos fechados ainda recebendo os beijos dele e o beijando de volta. 

— Eu sei. - ele se separou dela a contragosto. Mas pegou a aliança de sua avó. - Posso te entregar? Posso colocar no dedo d'ocê? 

Ela confirmou com a cabeça sorridente. Esticou sua mão direita como ele havia pedido. Petruchio colocou a aliança em seu dedo anelar ao mesmo tempo que falava: 

— Catarina, meu favo de mel, nesses quinze anos não teve uma manhã…

— Não teve uma noite… - ela completou. 

— ...todos os dias…

— Todos os dias. - ela confirmou ao mesmo tempo em que ele se lançava até ela lhe beijando apaixonadamente. Ele tirou então a aliança que levava em sua mão esquerda e entregou a ela para colocar em sua mão direita. Catarina sorria, quase tinha o maxilar doendo do tanto que sorria. Terminou de colocar a aliança nele selando enfim o acordo que tinham um com o outro de recomeçar. 

— Quem é você e o que fez com Julião Petruchio? - ela perguntou quando desgrudaram os lábios pela décima vez naquela noite mágica.

— Quem é ocê e o que fez com Catarina Batista? 

— Resolvi dar uma segunda chance, pro destino, pra minha vida. - ela respondeu acariciando o rosto dele. 

— Eu também. - ele voltou a beijá-la. 

— Petruchio a gente fez tudo errado… - ela falou quando pararam de se beijar e o abraçou. - Tudo ao contrário. 

— A gente aconteceu antes… a gente aconteceu agora… do jeito que eu mais ocê tinha que acontecer. 

Eles voltaram a se beijar e a viver o romance que mereciam viver. Mesmo que tivessem mais de quarenta anos, filhos adolescentes e uma história toda torta, escrita da forma errada, cheia de armações e imprevistos do destino, eles viveriam o romance do jeito que queriam e do jeito que achassem merecer viver. 

Se beijaram mais, abraçaram-se mais, fizeram mais declarações e promessas ao pé do ouvido. Promessas que só apaixonados poderiam fazer. Por fim, já tarde, Petruchio comprou um algodão doce para ela e confessou em voz alta enquanto se encaminhavam para a carroça. 

— Queria que ocê fosse pra fazenda comigo…

— Hoje? 

— Agora. 

Ela negou com a cabeça mesmo diante do olhar suplicante dele. 

— Hoje foi definitivamente nosso recomeço, com tudo o que vivemos, nosso romance se fortalecendo. Quero ir com calma… 

— Calma? - ele questionou ainda tentando a convencer do contrário. - Eu sei que o que tô pedindo pr'ocê pode parecer muito… rápido. Mas é que o desejo que tem dentro de mim Catarina… eu juro que é genuíno.

— …não é por causa disso. Já fomos casados e eu nunca… eu não vejo problema algum em… - ela não conseguia completar sua fala de também o desejar como ele a desejava. - Mas também quero esse começo, esse reinício, calmo, devagar...

— Então um novo encontro. - ele falou automaticamente. - Amanhã mesmo. Um cinema? 

— Um cinema. - ela confirmou com a cabeça sorrindo. 

No final da noite brigaram, como não brigariam? Eram Catarina e Petruchio afinal, fazia parte da essência deles brigar. Mas o motivo foi tão besta na visão de Petruchio e tão crucial para ela. Brigaram porque Catarina insistiu para que ele parasse a carroça numa esquina antes da porta de seu apartamento. 

— ...Eu só quero deixar ocê em segurança em casa, o que que custa ocê deixar?! - ele insistiu parando a carroça bruscamente uma esquina antes. 

— O que custa é que não quero. Quero ser independente. 

— Independente indo sozinha pra casa? A noite? - ele estava preocupado afinal. 

— Você me trouxe… me trouxe… - ela chegou perto dele que estava ainda chateado e o beijou na bochecha. - Vai se despedir de mim assim? - perguntou ao mesmo tempo que insistia em lhe beijar no rosto percebendo que ele tentava parecer bravo. - Hum? 

Petruchio virou o rosto para ela sem conseguir a repelir mais e dizendo a si mesmo que daria o tempo que ela precisasse contando que sempre tivesse um final de dia romântico como aquele. A beijou de volta. 

— Eu tenho um último presente pr'ocê. 

— Vou ficar mal acostumada. - ela sorriu observando ele tirar um pedaço de papel dobrado de seu bolso do paletó. 

— Um dia, a professora do Júnior, pediu pra ele desenhar a família dele. Ele tinha cinco anos e desenhou ocê. 

Catarina pegou o papel da mão dele, tremia com a menção do nome do filho, mas abriu o papel e viu um desenho todo desajeitado com traços incertos e iniciantes. Mas tão representativo para ela e tão gigante em significados.

— Ele fez eu… - Petruchio apontou o dedo indicador no desenho indicando um traçado trêmulo de um homem de barba e chapéu. - ele… a Carijó original. - mostrou um garotinho pequeno ao lado de uma galinha preta de bolinhas. - E ocê. 

Finalmente Catarina reparou nela representada nos traços de seu filho, tinha cabelos curtos e negros e um sorriso gigante. Dava as mãos para o filho e o marido. Estava no centro do desenho e um enorme coração conectava todos os membros como num quebra-cabeça. 

— É lindo… - foi tudo o que conseguiu dizer passando seus dedos delicadamente no papel. 

— Eu guardei esse desenho e acho que ocê merece ter ele agora… - ele não terminou de falar Catarina tinha se lançado em seus braços e lhe beijado agradecida. 

— Obrigada… - ela o abraçou segurando sua nuca fortemente. - Obrigada por ser esse pai maravilhoso pro nosso filho esse tempo todo, obrigada por essa noite e por confiar em mim, por desejar uma nova chance a nós dois. 

— Sempre Catarina, eu sempre vou querer recomeçar com ocê. Sonhar com essa família do desenho de Júnior, é o que quero realizar pra nós. 

Ela saiu do abraço e o encarou. Como ela poderia lhe contar da Clara depois daquele desenho? Depois de tudo o que Petruchio havia feito por ela e prometido. Como quebraria todas as promessas e toda felicidade explícita entre os dois e acabar com tudo dizendo que mentiu a ele por quinze anos?

— Amanhã? - perguntou a ele, mas respondeu a si mesma que deixaria a revelação da filha para o dia seguinte. 

Afinal ela merecia um dia todo feliz, seu começo romântico perfeito que nunca teve. 

— Amanhã a gente se vê no cinema então. 

Ele confirmou e se beijaram uma última vez em despedida. Petruchio a ajudou a descer da carroça e observou ela virar a esquina andando sozinha e chegando a seu prédio em segurança. 

Depois de toda aquela noite romântica ele esperava que pelo menos Catarina permanecesse confiando nele e conseguisse conquistar a confiança do filho, que ansiava pela mãe desde sempre. 

Clara estava na sacada observando a rua mesmo diante do adiantar da noite, viu a mãe chegar de a pé, sozinha, sem nenhum homem em seu encalço. Catarina entrou no apartamento suspirando. Clara ouviu a porta bater e foi correndo a olhar. 

— Isso é hora de se chegar dona Catarina Batista? - Clara perguntou com a mão na cintura. Observou a mãe a olhar toda sorridente, estava com um olhar brilhante e sem batom no rosto. - Mãe! Estava num encontro! Falou que ia jantar sozinha! 

— Estava sim num encontro dona Clara Batista. - Catarina respondeu feliz mexendo nos cabelos da filha e se encaminhando para o quarto. 

— Com quem mãe? Eu mereço saber como vai arruinar a sua vida e por consequência a minha! - Clara não desistiria tão fácil. 

Catarina a olhou e decidiu ser sincera com ela. 

— Com o único homem que amei em minha vida… Seu pai. 

Clara arregalou os olhos, sua boca estava aberta em surpresa. 

— Isso é verdade mãe? - Clara perguntou sorrindo. - Mãe finalmente está fazendo algo bom pra minha vida? Mal posso esperar a hora de conhecer ele! Mãe! - Clara correu e abraçou Catarina feliz. - Já falou de mim pra ele? 

Catarina sentiu seu coração se apertar enquanto a filha a segurava firme em um abraço. 

— Ele ficou feliz quando soube de mim? - Clara voltou a perguntar saindo do abraço. - Responde alguma coisa! - exigiu brava diante da mãe calada. 

— Tudo a seu tempo… - respondeu. - Curiosa! Vê se não corra na minha frente e conte do jeito errado. Eu preciso fazer isso e somente eu. 

— Se é para o bem de minha vida, que não vai ser mais nada trágica, eu espero seu tempo. - ela respondeu feliz. 

Apesar da angústia e do medo da revelação de Clara a Petruchio, Catarina sabia que estava fazendo pela primeira vez em sua vida, algo certo e que preenchia o seu coração em todos os aspectos. Ela reconquistaria seu amor primeiro para dar os passos para reconquistar sua família. Daria um passo de cada vez sem pressa. Seria a escritora de seu destino. 

Ela só não esperava que todos seus planos se arruinaram no dia seguinte. 


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