Emerald Heart escrita por SeoLunz


Capítulo 4
IV - The Tale of the Emerald Lovers


Notas iniciais do capítulo

Este é o último capítulo de Emerald Heart. Finalmente! Como prometido, nas notas finais tem um pequeno bestiário com as criaturas que apareçaram/foram mencionadas na narrativa. Espero que gostem!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/802761/chapter/4

 

Os dois irmãos se encararam rapidamente e sacaram suas espadas, apontando-as para o peito de Huang Zitao. Minseok, que parecia perdido após as palavras de Baekhyun, se levantou e colocou-se na frente do feiticeiro com uma flecha posicionada na corda do arco. Park olhou rapidamente o amigo, mas eles não moveram — não sentiam qualquer ameaça vinda do necromante.

— Vai nos entregar o Coração das Esmeraldas — ameaçou Jongin.

— Não existe qualquer possibilidade disso.

— Nossa mãe está doente e precisa dos poderes de cura do Coração. — Jongdae falou com firmeza, a máscara calma e paciente se dissipando.

A menção de Mei Lan chamou atenção de Zitao. Por mais que ela tenha o abandonado com os afazeres e a responsabilidade sobre a vida de todos que habitavam a Floresta das Trevas para viver a ilusão do amor, ainda a considerava parte da sua família — mesmo que seus pais a tivessem exilado e riscado seu nome do registro do clã — e se preocupava. Geralmente, quando sentia muita saudade, se transformava num corvo ou morcego e voava até Lamuria para vê-la.

— Minha irmã está doente?

Chanyeol, Baekhyun e, talvez, Minseok, foram os únicos a perceberem a desconfiança nos olhos amarelos. 

Ele inclinou a cabeça levemente e apertou os olhos.

— Mas isso não é possível — falou. — Bruxos não adoecem, ao menos, por enfermidades mundanas.

— Está insinuando- — Jongin tentou dizer antes de ser interrompido.

— Que ela não deve estar doente de verdade. Minha irmãzinha é ardilosa, sempre desejou o Coração das Esmeraldas e, por ser a mais a velha, se ressente de mim por ter tomado o lugar de guardião. 

— Eu vi os efeitos da doença.

O príncipe mais velho tentou dizer, mas Huang o dispensou com as mãos como se não passasse de um mosquito o incomodando. O necromante nem sequer se importou com as espadas apontadas para ele quando tornou a se sentar. Os demais homens na sala permaneceram em silêncio, esperando o rompante de raiva dos príncipes.

— Você viu o que queriam que visse — zombou Zitao. — Quando se trata de amor e família, você enxerga o que quer. Além disso, porque acreditam que o Coração das Esmeraldas pode ajuda-la com sua suposta doença?

Os irmãos se entreolharam e, relutantes, guardaram suas lâminas. Chanyeol se lembrou do que Kyungsoo havia contado sobre a lenda do Coração das Esmeraldas, mas jamais terminou sua narrativa — sequer sabia sobre suas propriedades mágicas. 

Ele pigarreou, chamando a atenção de todos, mas focou o olhar no necromante.

— Meu mestre nos contou um pouco sobre como conseguiu o objeto. Mas nunca continuou a narrativa, não sabemos quais são os poderes dele. Poderia nos esclarecer.

— Não há nada para esclarecer. — A voz forte de Jongin atravessou-o como uma lâmina posta em sua garganta, querendo valer sua versão da história aparentemente. — Meu pai disse sobre as habilidades curativas do Coração.

— Nada além de mentiras. — Terminou o necromante com sua voz mansa. — O Coração das Esmeraldas não possui esse tipo de poder.

Jongdae parecia mais disposto a ouvir as palavras de Zitao. Seu irmão, entretanto, andava de lado para o outro, os olhos baixos encarando cada passo e os ombros caídos deixavam claro seu cansaço; não estava disposto a discutir verdades e mentiras. O desespero o impedia de raciocinar com clareza. 

O jovem príncipe confiava veemente em sua família, principalmente em seu pai, não queria acreditar que ele mentiria sobre a saúde da mulher que lhe deu a vida apenas por um objeto que poderia ou não a salvar. Mas a dúvida fora plantada em seu coração e ela estava crescendo rápido. Mesmo com o relógio correndo contra eles, precisou lutar contra todos os seus ideais para ter disposição de ouvir o necromante.

Doía o coração de Chanyeol ver o amado daquela forma. Ele nunca imaginou ver um homem tão destemido e alegre com um sorriso fácil, que quando se abria fazia seus olhos brilharem — como quando adultos miravam uma criança que havia acabado de ganhar um presente — acuado como uma lebre cercada por cães de caça. Mesmo que tenha sido tratado de forma tão brusca por ele e aquilo machucasse profundamente, nada o impediria de confortá-lo.

O feiticeiro se sentou ao lado dele e tomou suas mãos calejadas, apoiando-as em seu colo. Jongin sentiu-se amparado e, mesmo que não tivesse contado que seu pai jamais permitiria que se casassem, estava grato por seu Channie estar ali; não aceitaria ser confortado por mais ninguém.

— É uma dor terrível ser enganado pela própria família, aqueles que deveriam protegê-lo e orientá-lo para se tornar uma boa pessoa. — Continuou o necromante em sua tranquilidade inabalável. — Mas seu pai é uma pessoa gananciosa e minha irmã sabe o poder que o Coração das Esmeraldas poderia dar a Goguryeo; os demais reinos seriam obrigados a se curvarem ou correriam o risco de serem dizimados.

— Por favor, não fale sobre nosso pai — pediu Jongdae com a voz baixa.

Era difícil desvencilhar-se das ideias que conceberam sobre os próprios pais. Mas embora estivessem duvidando da versão do rei, seria idiotice dizer que confiavam no necromante. Na mente de Chanyeol martelava as palavras de seu mestre dizendo “...nem sempre o que parece ser de fato o é” e, por mais que acreditasse piamente que Huang não lhes faria mal, seria uma enorme tolice confiar plenamente nele.

Minseok ainda estava em frente a Baekhyun, um pouco tenso. O meio-elfo segurou uma de suas mãos por trás, atraindo o olhar do arqueiro para ele. Eles sorriram um para o outro, conectando-se pelo ar da mesma forma que acontecia com Kim e Park, como se pudessem conversar apenas por sensações. O de cabelos rosados estava mais tranquilo, principalmente pelo atraente arqueiro não ter o repudiado ao saber de suas origens; sabia como era difícil para os humanos se relacionarem com aqueles odiosamente rotulados “mestiços”.

— Se a cura não é uma das habilidades do Coração das Esmeraldas — questionou Minseok, inconscientemente acariciando as costas da mão de Baek. — Quais são elas? E como podemos confiar que não está mentindo?

Zitao olhou para o arqueiro com divertimento.

— Por que ainda estão vivos. — Sua voz aveludada estava mergulhada em simplicidade e o bruxo se deleitava com aquela resposta, deixando evidente que não os considerava uma ameaça potencial. — E não é comum que eu saia da minha casa para salvar a vida de aventureiros despreparados. Quanto às habilidades mágicas do Coração das Esmeraldas, são inúmeras. Mas podem ter certeza que se cura fosse uma delas, eu não teria essa cicatriz horrível em meu rosto absurdamente belo.

— Que autoestima — murmurou Byun.

Huang não deu muita atenção ao comentário.

— O Coração das Esmeraldas é como as pedras e cristais que os feiticeiros carregam em suas varinhas ou báculos. — Ele encarou as unhas e retirou alguns pedaços de pele da cutícula. — Conhecem o conto dos amantes esmeralda, os primeiros guardiões do Coração?

O grupo se encarou e, aparentemente, apenas Baekhyun e Chanyeol conheciam a história do objeto apesar de terem ouvido um relato bem resumido de seu mestre. Jongin apertou as mãos de Park, buscando apoio — não tinha cruzado olhares até então, mas apoiavam-se mutuamente como sempre faziam.

— Mestre Do nos contou um pouco sobre a história do Coração das Esmeraldas — relatou Chanyeol. — Como os nativos imploraram aos deuses para que fossem salvos da fome e eles enviaram um imenso cristal verde que caiu sobre essa montanha. Ele nos disse que a história sobre o poder da esmeralda chamou atenção de bruxos, magos e feiticeiros de todo o mundo, inclusive a sua.

O necromante riu anasalado.

— Obviamente ele contou essa versão a pedido meu, além de me ajudar a espalhar a minha fama de necromante cruel e infame. — Os olhos amarelos do bruxo focaram-se em um ponto nas chamas e na madeira crepitante na lareira, encarando uma memória perdida no tempo. — Kyungsoo era um aprendiz esforçado, contudo, tinha um espírito impetuoso e teimoso que muitas vezes o impedia de seguir ordens; uma das características que qualquer magista que se preze precisa possuir.

Os feiticeiros presentes não acreditaram no que ouviram. 

Chanyeol encarava o necromante com o queixo caído e os olhos esbugalhados, enquanto Byun cobriu a boca com as mãos. Em nenhum momento, chegaram a cogitar a possibilidade de o que temido bruxo que perambulava pela Floresta das Trevas havia sido o mestre do seu mentor.

— Não façam essas caras. — Ele riu alto. — Muitos bruxos e feiticeiros aprenderam comigo. Menos magos, detesto os magos, são sábios, mas muito mesquinhos e relutantes em dividir conhecimento; monopolizam quase que totalmente a magia.

— Esperem aí — disse Minseok de cenho franzido. — Existem diferenças entre magos, bruxos e feiticeiros?

Baekhyun virou-se para o arqueiro.

— O mundo da magia tem seus títulos que são dados às pessoas que buscam o poder da magia ou já nascem com ele. — Park olhou para o amigo com um brilho nos olhos, ele sempre fora um excelente professor, embora muito travesso. — Feiticeiros, geralmente não seguem qualquer seita ou religião e seus feitiços são relacionados a encantos e seduções que são utilizadas para transformar algo através de gestos e palavras. Os Bruxos retiram seu poder da terra e da natureza, estão sempre em comunhão com tudo o que é natural e não é incomum, quando estão em perigo, que a Terra ouça seu chamado e envie ajuda; são os únicos que já nascem com seus poderes, sendo conhecidos por nomes como tocados pela magia ou coração de prata. Os Magos aprendem a Arte através de estudos intensivos de sistemas mágicos, runas e encantamentos, são muito inteligentes e sábios. Infelizmente, grande parte deles é arrogante e egoísta, embora sejam boas pessoas.

— Foi uma ótima explicação — comentou Huang Zitao, lançando um olhar indecifrável para o meio-elfo. — Será um excelente mentor um dia.

Jongdae pigarreou.

— Com licença, mas podemos voltar ao assunto principal!?

— Ah, sim. — Lembrou o necromante. — O Conto dos Amantes Esmeralda.

— Quem são eles? — Chanyeol estava curioso, assim como todos, mas nunca ouvirá falar sobre eles e seu mestre nem chegou a comentar. Entretanto, ele quase não falava nada além do considerava necessário que soubessem. — Não estão em livros ou quaisquer registros que já tenhamos lido.

— Foram os primeiros guardiões do Coração das Esmeraldas — contou Tao encarando as chamas.

O mundo do lado de fora já se encontrava nas mais profundas trevas. Noite adentro, ouvia-se apenas o bater de asas das Corujas-Fantasma e o uivo distante dos Lobos do Advento. Os rapazes estavam tão absortos naquela conversa interminável que nem sequer notaram a ausência do sol.

— Pensei que você tivesse sido o criador do Coração — disse Jongin.

— Quem me dera — admitiu o necromante. — Posso ser poderoso, mas não o suficiente para manter a minha vida por tanto tempo e sou apenas um entre os muitos de meus ancestrais que protegeram o Coração das Esmeraldas no passado.

— Então... — Começou Chanyeol antes de ser interrompido.

— Há muito tempo esta floresta não existia. — Ele esclareceu com um movimento das mãos. — Isso não passava de arbustos e árvores mortas, uma terra seca que não produzia nada além de fome e doença. Um grupo de xamãs da aldeia que vivia aos pés dessa montanha, imploraram aos deuses por ajuda e pediram que sua tribo jamais sentisse fome novamente, que sacrificariam seus próprios corpos e seus espíritos atuariam como guardiões da terra. Os deuses xamânicos são complicados, geralmente são neutros e representam forças naturais se apresentando como animais ou algo disforme; não são como os nossos que têm nome, personalidade e aparência. Bom, eles ouviram o apelo de seu povo e mandaram uma estrela verde que caiu do céu e atingiu o topo dessa montanha, os corpos dos xamãs foram desintegrados, mas seus espíritos permaneceram cuidando do local e do que havia caído no cume de pedra.

“Nos dias que se sucederam ao grande evento, as águas dos rios clarearam e os peixes voltaram, reapareceram; os ventos frescos sopraram trazendo chuva e a terra se tornou fértil para o plantio novamente. Tudo ia bem até que, depois de dois anos mais tarde, sonhos estranhos passaram a incomodar os habitantes. Para as pessoas comuns eram muito incômodo, mas para os xamãs, eram sonhos proféticos alertando-os de que alguma coisa estava errada com a estrela verde. Ele entrou em contato com o espírito de seus ancestrais — os xamãs que tinham se sacrificado — e pediu conselhos. Em visões, lhe foi revelado que o grande cristal precisava de dois jovens, almas interligadas pelo destino, e um deles deveria abdicar de sua vida, seus objetivos e suas paixões para proteger a pedra-verde até que outro guardião ou guardiã fosse escolhido. O velho passou a observar os jovens, atento a alguma coisa que parecesse ser como o conceito de ‘almas gêmeas’ que temos hoje, mas durante os longos meses que procurou, não conseguiu encontrar.”

“A terra morria cada vez mais, embora ainda não fosse suficiente para colocá-los na situação antiga que se encontravam antigamente, os aldeões começaram a perceber que alguma coisa não andava bem, e o xamã sempre pedia para que se acalmasse e que logo tudo se resolveria. Num certo dia, dois jovens brincavam próximos de um rio e o xamã contemplou aquilo que parecia ser ‘duas almas entrelaçadas pelo destino’ — um fio vermelho ligava ambas as crianças, preso em seus dedos — foi então que percebeu que uma delas deveria abdicar de tudo para que a tribo pudesse sobreviver. Durante a noite, ele reuniu toda a tribo ao redor de uma fogueira e chamou as duas crianças. O velho xamã explicou o que os antigos espíritos haviam dito e como os dois eram importantes para a tribo e a necessidade de subirem a montanha numa jornada para um deles se tornar o guardião da pedra verde. Mas ele deixou de fora que um deles não retornaria.”

“Os dois foram levados até o pé da montanha e se despediram do restante da tribo. Em seus corações, sabiam que seriam separados e nunca mais se reencontrariam, mas ainda assim continuaram com a jornada. Mesmo sendo muito jovens, entendiam que as necessidades de sua tribo vinham em primeiro lugar. Levaram um dia de caminhada até chegarem à caverna onde a grande estrela tinha caído, seu brilho verde era tão intenso que poderia agir como um farol para as cidades mais distantes. Os espíritos dos ancestrais da tribo, ou seja, os xamãs que tinham se sacrificado apareceram diante dos dois e disseram: “A Grande Esmeralda é o legado de nosso povo e ela precisa que um grande sacrifício seja realizado; e existe maior imolação do que abster-se das necessidades mundanas em prol do bem-estar de seu povo?” e, no fim, eles estavam certos. Seus ancestrais iriam separá-los e, mesmo sendo tão jovens, sabiam que tinham uma conexão que em breve seria rompida.”

“Rituais foram realizados durante a noite ao raiar do sol, quando brilho da esmeralda se apagou. Uma pequena esfera de luz apareceu e rodeou os escolhidos por vários minutos antes de parar sobre um deles; o garoto havia sido escolhido para guardar a pedra-verde. Todos os seus laços com os amigos e com a família foram rompidos, principalmente sua alma gêmea. Foi doloroso, é doloroso! Ela voltou para casa sozinha e desolada — para uma criança, perder uma conexão como aquela é assustador e vem com um grande sofrimento. Quando chegou à aldeia, questionaram-na o porquê do menino não ter vindo e ela explicou o ocorrido. Os aldeões foram perguntar ao xamã se era verdade e o velho não podia fazer nada além de confirmar. Muitos deles repudiaram a atitude do sacerdote e outros apoiaram. Os pais do menino não ficaram nada felizes por seu único filho ter sido abandonado. Naquela noite, eles invadiram a casa do xamã e o mataram. Porém, tal ato não vem sem punição e eles foram amaldiçoados, qual a natureza da maldição eu não sei dizer. Tem sido assim desde então, um casal é escolhido, sejam eles irmãos ou amigos, e um deles tem de sacrificar toda sua vida pelo bem de sua tribo e, com o passar dos anos, a floresta passou a ser protegida por nós.”

Os feiticeiros estavam cheios de pergunta quando Huang Zitao terminou sua narrativa — eram curiosos como exigia seu ofício — queriam sobretudo entender sobre o xamanismo e seus deuses, o tipo de magia que realizavam e como uma esmeralda gigante tinha caído do céu. Os demais rapazes não estavam tão contentes com aquilo tudo, principalmente Jongin que não tinha entendido porque a história daqueles dois era importante.

— Eu não entendo o que isso tem a ver com minha mãe e o Coração das Esmeraldas — questionou o príncipe.

— É simples — falou o necromante. — Os antigos deuses enviaram o Coração das Esmeraldas para que a floresta pudesse ter vida e fartura, para que os povos daqui jamais conhecessem a fome e o sofrimento novamente. Se retirá-la daqui, em poucos dias, quem sabe um mês, nada mais sobreviva. É o Coração que mantêm esse lugar vivo. Ele não cura, pois se curasse, estas terras não precisariam dele para permanecerem vivas.

Jongin levantou-se e se prostrou de frente para o necromante. Os ombros caídos e a tez pálida eram indícios do cansaço devido à luta interna que estava travando naquele momento — era muito difícil ir contra seus pais e não podia ignorar a possibilidade de sua mãe realmente estar doente. Chanyeol se levantou junto e fez menção de tocá-lo, mas se afastou, imaginando que apenas pioraria as coisas.

— Entendo o significado de dever e que precisa proteger seu povo. Mas também preciso proteger o meu, é minha função como futuro rei. E não posso ignorar que minha mãe, sua irmã, possa estar doente. Por isso lhe peço que me empreste o Coração das Esmeraldas. — Jongin surpreendeu a todos, especialmente a Huang Zitao, quando se ajoelhou diante dele com um olhar suplicante. — Temos o mesmo sangue e isso não mudará, ainda que não nos conheçamos, devemos proteger nossos familiares acima de qualquer coisa. — O príncipe tirou uma adaga da bota e fez um corte na palma da mão, deixando o sangue pingar diante do bruxo que o encarava de olhos esbugalhados. — Deste modo, peço que confie em mim e lhe faço uma promessa de que, se minha mãe não estiver doente e meu pai tiver mentido para mim, voltarei para entregar o Coração pessoalmente e se sua casa sofrer neste meio tempo, poderá fazer o que desejar com minha vida.

Jongdae pulou do sofá, assim como Chanyeol, ambos abismados com o que tinham acabado de ouvir.

— Jongin! — exclamaram em uníssono.

— Não tenho outra alternativa — bradou o príncipe, seus olhos encontrando-se com os do irmão e depois os de seu amado. — Sou incapaz de deixar que ela morra, mesmo com a minúscula possibilidade de ser uma mentira.

Chanyeol se ajoelhou ao lado do namorado e colocou as mãos sobre seus ombros. Durante os meses que passaram juntos, passou a compreender a necessidade de ele se provar cada vez mais, em especial para o pai, mas nunca imaginou que ele abriria mão de sua própria vida dessa maneira. 

Ele encarou o namorado, desesperado.

— Meu amor, você não pode abrir da sua vida — pediu Chanyeol com os olhos lacrimejantes.

— É minha família, Channie. Faria qualquer coisa por eles.

— Me prometeu que sempre ficaria ao meu lado.

— Algumas promessas não podem ser cumpridas. — Ele disse com pesar. — Por mais que tentemos.

Quando se é um rei, infelizmente, não se pode ter o que deseja.

As palavras de Junmyeon martelavam em sua mente, enquanto tentava não encarar o namorado a sua frente, implorando para que não abrisse mão da própria vida. Mas o que mais ele poderia fazer? Já tinha cortado sua mão num antigo ritual que os cavaleiros de Lamuria utilizavam para realizar suas promessas e juramentos — não poderia voltar atrás agora, era impossível.

Minseok e Baekhyun encaravam tudo boquiabertos, jamais teriam imaginado que algo assim poderia acontecer. O arqueiro tinha o príncipe mais velho em alta estima, contudo, agora não sabia se este fora seu ato de mais pura coragem ou a coisa mais burra que já tinha feito. 

Jongdae, por outro lado, sentiu que seu chão estava prestes a ruir — o irmão tinha assumido um compromisso sério com um necromante que mal conheciam. Ele encarava Jongin ajoelhado, a expressão rígida como uma estátua de mármore, ignorando tudo e todos ao redor, especialmente o namorado que chorava aos seus pés inutilmente implorando para que reconsiderasse. 

O jovem príncipe admirava o amor que o feiticeiro tinha por seu irmão para se humilhar daquela forma, mesmo sabendo que seus pais jamais permitiriam que ambos tivessem um futuro juntos — talvez aquela fosse a forma do irmão não viver uma mentira; preferindo se sacrificar do que ter que viver sem Park Chanyeol.

— Isso é muito interessante. — Huang Zitao quebrou o silêncio.

— Como ele abrir da vida pode ser interessante? — perguntou Chanyeol, encarando o necromante com raiva mesmo sendo cegado pelas lágrimas.

Zitao se ajoelhou diante de Jongin e Chanyeol. O bruxo limpou as lágrimas que escorriam sobre a face rubra do feiticeiro para que pudesse enxergar o sorriso mínimo que cobria seu rosto. Tao levou os dedos esqueléticos e compridos até o chão e tocou o sangue que tinha escorrido da mão do príncipe — sentindo o poder latente que continha, embora os irmãos não soubessem que também tinham dons para a magia. Ele encarou o sobrinho que não mudou a expressão em momento algum.

— Eu consigo enxergar seu coração e a dor que carregou desde o início da jornada — revelou o bruxo encarando o sangue em seus dedos com falso carinho, escondendo uma profunda tristeza que ardia em seu peito. — O amor que você tanto deseja, mas não permitem que você tenha. Quando o viu pela primeira vez, acuado na floresta, você se apaixonou e entregou seu coração; ele fez o mesmo por você. Mas sabia que não haveria futuro para vocês dois, pois você é da realeza e esperam muito de você, enquanto ele é um simples plebeu. Ele é livre, porém você não é. — A voz do necromante se tornava mais etérea e o olhar enevoado. — E mesmo sabendo que um dia teria de abandoná-lo, encontrou-se com ele às escondidas na floresta e o amou. Deu-lhe falsas esperanças e acredita que o juramento que me fez poderá libertá-lo de seu sofrimento, pois não consegue mais imaginar um mundo onde Park Chanyeol não esteja contigo. Sua dor não irá desaparecer, acompanhará você para o Outro Mundo e terá de assistir seu amado sofrer por suas escolhas.

Jongin estremeceu ao ser despido de maneira tão abrupta. Sua expressão estava paralisada num misto de surpresa e terror — os olhos esbugalhados e boquiaberto, enquanto mergulhava nos profundos e indecifráveis orbes dourados do necromante. 

Ao seu lado, Park encarava o namorado, enquanto ouvia as revelações de Zitao como se ele estivesse lendo cada pedacinho de Jongin. O feiticeiro não queria cogitar que ele fosse tão burro a ponto daquilo: se sacrificar apenas porque não poderia viver com ele. Foi então que sua mente o jogou na conversa que tiveram aquela noite no acampamento improvisado na floresta — seus pais não tinham dado benção ao amor dos dois. 

Seu coração encheu-se de compreensão e angústia, afinal, era impensável abrir mão do que sentia por ele. Porém, sua consciência falou mais alto e não podia permitir que ele se sacrificasse por algo tão pequeno e sem importância como ele.

— Eu não acredito que esteja pensando nessa besteira por minha causa, Kim Jongin — esbravejou Park, reunindo toda a frustração e raiva que sentia em suas palavras. — Por algum momento pensou em como isso me afetaria, seu bastardo egoísta? Como acha que eu me sentiria sabendo que pode morrer?

Jongin encarava-o espantado, da mesma forma que Baekhyun que nunca o tinha visto perder a calma. 

— Eu nã-

— Cale a merda da boca — interrompeu-o com sangue nos olhos. — Não pode abrir mão de tudo por causa de alguém insignificante como eu. Eu já visitei Lamuria diversas vezes para saber que todos esperam que você seja o melhor dos governantes que já tiveram, imagine o que seu povo vai pensar quando descobrir que deu a vida por um ninguém?

O ambiente desapareceu ao redor dos dois quando Jongin pressionou seus lábios contra os de Chanyeol. O feiticeiro mal teve tempo de reagir e sua mente pintou-se de branco, se entregando ao sentimento que apenas o namorado conseguia produzir. 

O príncipe circundou o corpo do moreno com os braços fortes e o trouxe para junto dele, pouco se importando com o desconforto que poderia causar naqueles que estava assistindo à cena; estava focado em sentir o gosto do beijo de Channie enquanto ainda podia. As lágrimas que escorriam pelas bochechas dos dois, misturaram-se ao ósculo dando-lhe um gosto salgado e fazendo surgiu uma vontade selvagem de continuar ali — Chanyeol estava entregue ao abraço aconchegante de seu namorado e Jongin não queria soltá-lo. Quando se separaram, encaram-se. Suas respirações se mesclavam devido à proximidade das faces; o vermelho pintava os olhos inchados.

— Você não é ninguém e nunca mais diga que é insignificante. — Jongin sussurrou, preferindo que suas palavras fossem ouvidas apenas por eles. — É o meu tudo, se tornou o meu mundo. Sinto que nada mais teria sentido se você não estivesse junto de mim, por isso prefiro abrir da minha vida a ter que viver uma mentira para agradar aos meus pais.

— Ao menos estaria vivo. — Park tentou argumentar.

— Viver não me importar se você não estiver comigo — suplicou acariciando a face de seu amado. — Desde muito cedo, fui criado para assumir as responsabilidades de meu pai e garantir a segurança da cidade, prover a felicidade do povo acima de tudo e, sinceramente, isso é uma atitude linda que todo governante deveria ter. Mas porque deveria abrir da minha felicidade para isso? Boa parte da minha adolescência, busquei por algo que desse um sentido mais profundo a minha existência; uma peça que estava faltando aqui dentro — apontou para seu coração sem desviar o olhar — e encontrei você. Se tornou o meu mundo, Park Chanyeol, a única pessoa por quem moveria montanhas e começaria guerras. Contato que esteja ao meu lado, sinto-me invencível. Me chame de egoísta por pensar em mim ao invés do meu povo, mas abriria mal da realeza e tudo para ter você comigo.

— É fascinante! — exclamou o necromante.

Eles elevaram o olhar, finalmente se lembrando que não estavam sozinhos. Suas faces pintaram-se de vermelho. 

— O que quer dizer? — Jongin perguntou, confuso.

— Não conheço muitas pessoas dispostas a abrirem mão de suas próprias vidas por aqueles que amam. — Huang Zitao estava sorrindo. — E é mais raro encontrar duas almas que estão destinadas a ficarem juntas. Eu aceito sua proposta, Kim Jongin. Sua vida, em troca de salvar sua mãe.

— Não. 

Chanyeol se prontificou a colocar-se na frente do namorado para protegê-lo.

— Que bruxinho adorável — disse o necromante com um sorriso misterioso. — Mas seu namorado lançou o acordo e estou aceitando. Entregarei o Coração das Esmeraldas e deverá abdicar de tudo e tornar-se o próximo guardião desta floresta.

— Não foi esse o combinado — bradou Jongin.

— Você quis me entregar sua vida, mas isso não quer dizer que deva morrer. — Tao sorriu solidário como se tivesse acabado de fazer o pedido mais natural do mundo. — Existem diversos significados que são atribuídos a sacrifícios.

Jongdae levou a mão até o punho da rapieira, preparado para retirá-la da bainha. O príncipe entendia em partes o sacrifício — ainda que ridículo — do irmão, contudo, não poderia deixar que o jogo fosse manipulado por um homem que acabaram de conhecer.

— Isso não está certo.

— Pedir por algo que prejudicará diversas formas de vida também não — disse o necromante. — Mas ainda assim, vocês me ameaçam com armas e imploram pelo Coração das Esmeraldas. Se fazem um pedido absurdo, porque eu não posso?

Park entrelaçou seus dedos aos do namorado, fazendo com que Jongin o encarasse. Eles ficaram ali por vários minutos como se nada mais existisse, decorando os traços alheios a cada um. Chanyeol amava a forma como o cabelo caia sobre sua testa, tapando as sobrancelhas grossas que sempre se arqueavam quando ele sorria; já Kim adorava o nariz alongado e a forma que os seios da face se tornavam proeminentes ao menor dos movimentos e, ainda que o namorado detestasse, as orelhas que o deixavam mais fofo.

— E então? — perguntou Huang. — Você aceita os meus termos?

— Jongin... — choramingou Park.

O príncipe se virou para ele, deixando um beijo rápido da ponta do nariz.

— Confie em mim. — Ele disse e voltou-se para Tao. — Sim, eu concordo.

O bruxo sorriu com aquilo, não esperava menos de seu sobrinho. Ele abriu a lapela da camisa cinzenta, revelando a parte do peito pálido e posicionou uma das mãos sobre a pele. Durante alguns segundos, nada de mais aconteceu, até que veias pretas pintaram a tez leitosa seguindo em várias direções e sua mão se afundou dentro da carne. O espanto tomou a todos no recinto, onde arfares tensos e assustados puderam ser ouvidos, mas logo substituídos por admiração quando o necromante retirou de dentro de si, um cristal verde e brilhante; rolado, pouco menor que um punho fechado.

— Tome, Kim Jongin. — Huang estendeu a joia para o sobrinho, alternando seus olhares entre ele e o namorado. — E que você não se arrependa. 

Jongin pegou a pedra com cuidado como se fosse a coisa mais frágil do mundo. O príncipe conseguia sentir o poder do Coração das Esmeraldas passando através dele. Ele entregou para o irmão que teve a mesma delicadeza, guardando-o no alforje.

— Não irei me arrepender.

— Evite dizer coisas nas quais nem você acredita. — O bruxo com seus olhos amarelos, encarou cada um dos meninos que estavam ali, imaginando como seria o futuro de cada um quando saíssem pela porta. Num estalar de seus dedos, as chamas da lareira se desfizeram e as louças do chá flutuaram e voltaram para a cozinha. — Três cavalos esperam por vocês aos pés da montanha, aproveitem que o dia está nascendo e chegarão às fronteiras da floresta até o meio-dia.

Jongdae se encaminhou para uma das janelas e encarou o céu. Um azul-claro se aproximava lentamente no horizonte, enquanto as estrelas se apagavam acima deles; o céu ainda parcialmente enegrecido. 

— Passamos um dia inteiro aqui. 

— Boas conversas fazem o tempo voar. — Com um novo estalo do dono da casa, a porta de entrada se abriu, permitindo que o vento fresco da manhã adentrasse o local. — Não percam tempo.

O necromante olhou para o grupo de esguelha e, no escuro, seus olhos amarelos brilharam de maneira sinistra. 

— Não me desaponte, sobrinho.

...

A descida até a base da montanha foi lenta.

Mesmo tendo passado a noite toda conversando com um bruxo que por muito tempo consideraram como uma das piores calamidades que surgiram no mundo. Eles não estavam nem um pouco cansados, como se as leis do tempo no alto da Colina do Desespero fossem diferentes.

Quando chegaram no local do qual tinham partido, três garanhões esperavam por eles com as selas ajustadas para carregarem duas pessoas. Era raro verem cavalos selvagens e aqueles não pareciam nenhum pouco comuns — como nada naquela floresta era —, sendo perceptível devido às brasas incandescentes que levavam no lugar dos olhos. Baekhyun reconheceu-os como Belssínios, um grupo de corcéis que corriam pelo mundo e guiavam os espíritos perdidos para o Outro Lado — se desse sorte de encontrá-los.

Mesmo com um medo natural dos equinos, eles perceberam que já tinham visto tantas coisas estranhas desde que embarcaram naquela jornada que nada mais os impressionava. Jongin montou sobre um dos cavalos e ajudou Chanyeol a subir; Minseok agiu da mesma forma com Baekhyun, enquanto Jongdae pegava uma montaria apenas para ele.

Os cavalos pareciam ter sido instruídos do que deveriam fazer, então não foi necessário que os rapazes indicassem um caminho. Eles se dirigiram para uma parte diferente da floresta, onde as árvores eram mais espaçadas, abrindo espaço para um caminho pré-definido no chão — a copa das árvores não se unia acima deles, possibilitando que vissem o céu enquanto o dia ia amanhecendo.

Jongdae seguia na frente mergulhado em silêncio mortal. Ele deixou bem explícito enquanto desciam a montanha que não concordava nem um pouco com o que o irmão havia feito. Sempre viveu à sombra de Jongin e jamais se importou com isso, ser o filho mais novo lhe garantia uma liberdade que o mais velho não possuía. Mas não imaginaria a vida sem ele, principalmente por causa de um garoto que mal conhecia. Não tinha nada contra Chanyeol, até achava-o interessante, porém percebeu que aquele relacionamento deixava Jongin inconsequente como se ainda fosse um adolescente.

Minseok e Baek iam no meio da caravana. O arqueiro segurava o arco em uma das mãos, enquanto a mão livre se prendia na crina espessa do equino para que pudesse se equilibrar. Baekhyun estava em silêncio e isso estava deixando o arqueiro incomodado.

— Segure-se em mim ou vai acabar caindo — disse Minseok, levando os braços do feiticeiro até sua cintura, incentivando-o a se agarrar nele. — Por que está tão quieto?

O de cabelos rosas olhava para as costas do arqueiro, as mãos agarradas em seu colete de couro coberto por uma manta com o símbolo do reino de Goguryeo. O cheiro de Minseok adentrava suas narinas quando uma brisa batia nele e enviando correntes elétricas sobre seu corpo quando sentia o calor de sua pele e a aspereza dos dedos contra sua mão.

— E-eu n-não sei... — Ele gaguejou.

— Está preocupado com alguma coisa, não é?

O menor deu sorriso mínimo; realmente, ele não deixava que nada passasse por seus olhos. Contudo, o meio-elfo não sabia se poderia expor suas preocupações, principalmente sobre o sentimento especial que tinha surgido pelo arqueiro durante a jornada. Ainda que não fosse um elfo completo, o sangue do povo das árvores corria por suas veias, e esse lado seu falava mais alto que o humano — elfos se apaixonavam uma única vez e temia que caso amasse Minseok, isso poderia lhe trazer grandes dores.

— Talvez. — Ele encostou a testa na nuca do outro, cansado. — É que... me lembrando das conversas com meu irmão e vendo como ele e Jongin se relacionam, fico imaginado se-

— Se algum dia vai ser amado por alguém?

Baekhyun sentiu as bochechas esquentarem.

— Sim...

— Com certeza você será. — Minseok apertou levemente as mãos do menor. — Na verdade, eu me sentiria honrado em ocupar o lugar de amor da sua vida.

O pequeno elfo arregalou os olhos, surpreso.

Imaginava que tal declaração não passasse de uma ilusão devido aos desejos de seu coração, mas ao encarar os orbes escuros do arqueiro que o fitava por sobre os ombros, pôde ver a sinceridade em meio aquele caos misterioso idêntico à escuridão do mais profundo abismo. 

Byun apertou mais o abraço na cintura dele e escondeu seu rosto nas costas dele, envergonhado.

— Não chegou a terminar sua história.

Ele se virou para encarar Minseok, a ponta do nariz roçando na pele exposta do pescoço. O feiticeiro observou a cabeleira escura, as mãos coçando para prender os dedos ali; seus olhos desceram e os fios foram diminuindo de tamanho até a tez branca da nuca.

— Não tinha muito para saber, na realidade — comentou Baekhyun. — Eu nem deveria ter tocado no assunto.

 “...Tenho assuntos pendentes com o meu passado, preciso resolvê-los”. — Ele disse. — Foram suas exatas palavras. Ninguém pode forçá-lo a reviver o que já foi esquecido, mas pelo que pude notar, guardava um enorme rancor do Sr. Huang.

Byun encarou a vegetação perene espalhada aos lados da pequena trilha. Sua mente vagou para o passado como um barco avançando lentamente sobre a água; ele havia visto Huang Zitao uma única vez em sua vida, quando ele foi até Contra Maré para conversar com o chefe. Foi uma visão de relance, apenas se lembrava de sua pele lisa e, aparentemente, tão frágil quanto porcelana, marcada por aquela cicatriz atormentadora.

— Eu acho que já deve imaginar o que houve. O necromante disse que todos os seres vivos dentro dessa floresta são de responsabilidade dele. — O feiticeiro apertou mais o abraço na cintura de Minseok. — Nossa aldeia ficava do lado oposto ao litoral em Silla, próximo às fronteiras de Baekje. O rei de Silla estava destruindo a floresta já tinha muitos anos, principalmente para que pudesse fazer seu território crescer. Contra Maré ficou no caminho e grande parte do meu povo morreu, incluindo meus pais. Era para o Sr. Huang nos ajudar, mas ele nunca veio e, até onde soube, nunca foi atrás dos culpados.

— Sinto muito por isso.

Suas palavras eram sinceras e Baekhyun sentiu isso como uma suave brisa de ar fresco. Em sua pequena jornada, ele descobriu como gostava da companhia dos rapazes, principalmente de Minseok, que tinha se mostrado atencioso para com ele. Byun não disse mais nada, assim como o arqueiro. O menino de cabelos rosados que voltou a ser uma criança por um curto período, descansou a cabeça em suas costas e se permitiu descansar pelo embalo calmo do andar do cavalo.

Jongin podia sentir que seu namorado não estava bem. Suas mãos prendiam-se na base de sua camisa com força e seu corpo estava um pouco distante do seu, ainda assim desconfiava que tinha alguma coisa errada com ele e não ouvir sua voz estava o incomodando.

— Eu gostaria que não ficasse em silêncio durante o restante da viagem.

— Não pareceu se importar com o que eu tinha a dizer quando entregou sua vida. — Ele resmungou.

O príncipe sabia que havia sido uma decisão precipitada, mas não poderia ignorar a possibilidade de sua mãe estar realmente adoecida. Além do mais, seu pai estava correto em uma coisa: a realeza estava presa à honra e ao dever. Sua alma era dilacerada todas as vezes que olhava para Chanyeol quando se encontravam na Floresta das Trevas, porque sabia que algum dia teria de abandoná-lo.

— Fui forçado a amadurecer muito rápido, meu amor. Desde que era criança, entendia quais eram meus deveres e dos sacrifícios que teria de fazer, e isso doía, porque sabia que não poderia viver com alguém que amasse, mas que meus pais escolheriam uma esposa para mim; ainda que eu soubesse que sempre me interessei mais por homens que por mulheres.

Chanyeol olhou para ele, pesaroso. A fragilidade era uma das características que jamais esteve presente em Jongin enquanto estavam juntos durante a noite. Mas agora, apesar de sua voz estar calma, carregava doses perigosas de medo e aflição.

— Quando Jongdae nasceu, eu já estava sendo inserido nos ensinamentos políticos e começando a compreender estratégias militares e econômicas para garantir a segurança e prosperidade de Goguryeo. Mas quando ele nasceu imaginei que, caso ele demonstrasse interesse pelo trono, eu poderia ser livre para fazer o que quiser e me casar com quem amasse — comentou calmamente, porém sua voz estava quebradiça demais para que Chanyeol não percebesse que havia alguma coisa errada. O magista encarou por sobre os ombros largos do namorado e viu o brilho fraco das lágrimas em seus olhos. — Estava enganado. Meu irmão sempre foi mais responsável, porém jamais demonstrou interesse pelo trono, era uma alma livre que vivia um dia de cada vez sempre fazendo o bem para qualquer um; é mais humilde que eu, gosta de ajudar as pessoas. Não poderia cortar suas asas, então nunca reclamei, porque sabia que se me mostrasse insatisfeito, ele assumiria o fardo de ser rei.

— Não entendo onde quer chegar.

O príncipe olhou para ele por sobre os ombros. Uma única lágrima escorreu por suas bochechas e Chanyeol pode ver todo o amor que ele sentia refletidos em seus olhos, mas também tinha muita dor acumulada.

— Desde que nos conhecemos, uma parte da minha que não sabia que precisava foi encontrada. É o meu tudo e o meu nada, Channie. É tudo o que eu quero, mas não posso ter. — Uma nuvem de melancolia nublou seu olhar, acompanhando a voz trêmula que atravessava o corpo de Chanyeol. — Você é minha maior fraqueza. Só que também é aquele que me faz mais forte. Sabe como dói ter que abrir mão do nosso amor?

Chanyeol sentia o mesmo que ele. Por muito, durante suas conversas com Baekhyun, o mais velho o alertou que um relacionamento com o príncipe seria impossível e o máximo que poderia alcançar era a posição de concubino; um mero amante do governante do império Goguryeo. Porém, o mágico também tinha seu orgulho e ainda que fosse doer pelo restante de sua vida perder um grande amor, jamais se rebaixaria ao ponto de ser rotulado como “apenas um prostituto da realeza”. 

— Teve uma atitude impensada, Jongin — retrucou o feiticeiro tentando, em vão, parecer zangado. — Como pôde oferecer sua vida para seu tio? Entendo que a vida de um príncipe é difícil, só que nem sequer pensou em como isso poderia me atingir.

— Tem razão. Não pensei! — exclamou em disparada. — Tive um lapso de memória e me ocorreu que preferia morrer a abrir mão do que tinha conquistado. Fui um tolo por ter colocado as minhas necessidades acima das suas. Não posso imaginar como pode estar sofrendo também.

— Durante toda a viagem tem tentado se afastar de mim, não é? — Não havia como negar um fato e Chanyeol podia não ser o bruxo mais inteligente, porém quando se tratava de Jongin, conseguia perceber detalhes que passariam até pela visão perfeita do arqueiro. — Imaginou que seria melhor se deixasse claro que não me queria mais ao seu lado.

— Sim, eu tentei e não consegui — admitiu. — Existem momentos que nos fazem acreditar que nos afastar e magoar aqueles que amamos, seja a melhor saída para evitar desastres maiores.

— E a que conclusões chegou sobre isso?

— Duvido que exista atitude mais idiota. — Ele declarou. — Ninguém que realmente ame alguém, cogitaria que abandonar seu amor seria uma opção. Vejo isso agora.

— A vida é um eterno aprendizado, meu amor. — Chanyeol precisou parar um pouco e escolher suas palavras com cuidado, já que não era dado a divagações existencialistas. — Uma estrada tortuosa que às vezes não podemos seguir juntos. Mas eu acredito que sempre existe uma alternativa, por mais difícil que seja alcançá-la.

— Acha que não terei que abrir mão das pessoas que amo quando essa jornada terminar?

O bruxo pôde sentir a ansiedade atravessar o corpo de Jongin e fazer seu coração bater mais rápido. Chanyeol olhou para trás. O topo da Colina do Desespero estava borrado, cercado por uma densa bruma cinzenta, mas era possível enxergar seus contornos abstratos. 

— Preciso acreditar que você terá êxito, independente de qual seja o final. — O emblema hipnótico do reino de Goguryeo que se desenhava através das lágrimas que se acumulavam e nublavam sua visão. Ele aproveitou que estava escondido atrás das costas largas do namorado, sentindo os movimentos suaves do equino caminhando abaixo deles. — Você ainda tem a chance de amar alguém além de mim e me doeria muito se tivesse que abrir de sua liberdade e viver uma vida solitária no topo daquela montanha.

Ainda que Chanyeol não pudesse enxergar, o semblante de Jongin endureceu.

— Está me dando sua bênção para encontrar outra pessoa?

— Eu não faria isso se tivesse outra escolha. — Jongin sentiu as lágrimas dele molharem sua camisa quando sua cabeça se encostou em suas costas.

— Não traia suas próprias palavras, Chanyeol.

— Como é?

Ele elevou o olhar e encontrou os olhos amendoados do amado sobre ele.

— Disse que sempre existiam alternativas ainda que sejam difíceis de alcançar. — Ele falou com um sorriso. — Vou me agarrar a isso e encontrar uma forma de ter você ao meu lado.

...

Já estava perto do meio-dia quando eles abandonaram os cavalos em uma pequena clareira. Os corcéis seguiram para dentro da mata e, quando a luz do dia já não os tocava mais, misturaram-se as sombras e desapareceram. Era a mesma clareira que ele percorreu na primeira vez que estava ali, sua cabeça girou para o lado que seguiu e acabou se perdendo, antes de Jongin encontrá-lo. Memórias tomaram a mente do mágico e ele não queria imaginar como seria sua vida quando saíssem da floresta. Cada passo que davam faziam como sinos soassem em seus ouvidos; um indício de que quando se separassem, poderiam nunca mais se ver.

Jongin estava ao lado de Chanyeol o tempo todo, as mãos entrelaçadas nas dele enquanto os ombros se encostavam à medida que caminhavam — o bruxo percebeu um padrão nas árvores, notando ser onde Byun e Park haviam entrado para alcançar a pequena caravana que havia saído de Lamuria. Tentou focar na sensação calorosa que ele passava, seus toques faziam seu coração vibrar como as asas de uma abelha e o contato com sua pele era suficiente para aquecê-lo no pior dos invernos. 

Park também olhava para a felicidade que brilhava singela nos olhos de Baekhyun, seu dedo mindinho entrelaçado ao de Minseok de uma forma discreta — ainda que todos tenham percebido. Ele estava contente pelo amigo, não podia imaginar como ele merecia ser feliz. E também havia Jongdae andando calmamente e observando o topo das árvores com um belo sorriso, aparentemente sua raiva pelo juramento do irmão havia diminuído e se tornado um leve desconforto.

A paisagem começou a mudar enquanto se aproximavam da orla da floresta e o medo dentro de Chanyeol crescia. Durante o percurso, ele tentou imaginar como seria sua vida sem Jongin, entretanto notou que assim que ele se fosse iria cair em uma profunda tristeza. Não morreria, contudo, podia vislumbrar uma brecha no futuro onde se tornaria um feiticeiro solitário e rabugento como Kyungsoo, com saudades de alguém que jamais veria.

As árvores tornaram-se mais espaçadas na trilha, abrindo-se para a luz do meio-dia quando a fronteira da floresta estava próxima. O grupo parou por alguns instantes quando ouviram o som do trotar de cavalos e o soar de um chifre ao longe. Jongin se retesou e olhou alarmado para o irmão antes de começar a correr em direção à luz, sendo seguido por Jongdae e Minseok. Chanyeol olhou para Baekhyun que tinha a mesma expressão confusa e correram atrás do trio.

Um grande acampamento havia sido montado onde antes havia sido um campo aberto. Diversas tendas foram erguidas pelo perímetro e uma maior no meio, mas não havia um exército — tinha cerca de trinta soldados. Flâmulas azuis em altos mastros foram erguidas e se moviam com a dança do vento, revelando o símbolo do reino de Goguryeo. Novamente, o som da trombeta cortou o ar e a atenção foi voltada para a orla da floresta, onde os cinco meninos se reuniam.

— O que é isso tudo? — perguntou Baekhyun, curioso.

— Irão conhecer nosso rei — respondeu Minseok, agitado.

— Mas o que o rei Kim estaria fazendo aqui?

— Receber os filhos... ver se tudo saiu como planejado... — Desta vez, quem respondeu foi Jongdae. — Não tem como saber até que ele venha.

Eles permaneceram parados e inquietos enquanto uma frota de cavalos se aproximava calmamente. No maior e mais forte dos garanhões, um homem muito bonito de cabelos castanhos escorridos cavalgava de queixo erguido e coluna ereta, uma coroa brilhante sobre sua cabeça com pontas que se assemelhavam a chifres cada qual contendo um diamante ao centro. Um manto vermelho pendia sobre suas costas — lembrava uma pintura antiga onde antigos reis eram retratados em momentos falsos de coragem em meio a uma batalha sangrenta.

Logo atrás dele, uma égua branca trazia a mulher mais bonita que Chanyeol já tinha visto. Seus cabelos eram escuros como piche e escorriam por sobre seus ombros até o meio do peito, manchando o vestido branco e pesado que trajava. Ela também tinha traços marcantes, um rosto fino e um nariz alongado e delicado, porém o mais impressionante eram os seus olhos da cor de âmbar — era a irmã do necromante.

— Mamãe... — murmurou Jongin não acreditando no que estava vendo. — Então o que o necromante disse estava certo, eles mentiram para nós.

— Não se apresse, irmão — pediu Jongdae. — Eles podem ter uma explicação.

— Melhor que tenham.

Chanyeol ficou tenso ao lado do namorado, a forma como encarava os pais se aproximando chegava a dar medo. Tudo acontecia tão rápido que mal teve de processar quando o casal real desmontou dos cavalos, alguns guardas marchando atrás deles como abelhas buscando mel — Jongdae estava feliz por estar novamente em casa, ainda que estivesse ansioso pelo que aconteceria; Minseok sussurra alguma coisa para Baekhyun que estava nervoso ao extremo com toda aquela comoção e para Jongin não eram necessárias palavras, o maxilar já era evidência mais que suficiente sobre como os espinhos da traição feriam seu coração.

— É muito bom revê-los, meus meninos. — O rei tinha uma voz suave como Jongdae e um olhar penetrante. Seus olhos fitaram Baekhyun e Chanyeol com curiosidade. — E quem são esses dois belos jovens?

Apresente-se, uma voz ecoou na mente de Park.

— Somos dois aprendizes das artes mágicas, Vossa Majestade. — O bruxo de cabelos escuros fez uma leve mesura. — Meu amigo é Byun Baekhyun e meu nome é Park Chanyeol.

Junmyeon abriu um sorriso forçado para ele e o amigo, virando-se para encarar Jongin. Para os que conheciam o rei, sabiam que ele não estava nada feliz, principalmente com seu filho mais velho. Entretanto, Jongin apenas o encarou; uma encarada fulminante que teria amedrontado o magista se tivesse sido direcionado a ele.

— Vamos conversar sobre isso mais tarde.

Foi tudo o que ele disse antes da rainha se colocar ao seu lado.

Diferente de Kim Junmyeon, ela não direcionou nenhum sorriso para qualquer um ali, com exceção dos filhos. Chanyeol percebeu que ainda que fosse uma mulher absurdamente bonita, exatamente como o irmão, porém havia algo em como ela se portava que dava a entender que todos ali deveriam se curvar. Baekhyun pareceu ter sentido a mesma coisa, pois assim como Chanyeol, Minseok e ele o acompanharam com uma leve mesura, incapazes que encará-los nos olhos.

— Vossa Majestade, a senhora não estava doente? — Jongin cerrou os punhos, as unhas cravando-se profundamente na pele deixando as palmas esbranquiçadas.

Kim Mei Lan encarou o filho dado o tom acusatório e sorriu como uma mãe sorria quando sabia que não tinha que dar satisfações a um filho. Mesmo assim, ela tomou o lugar de seu marido e acariciou uma das bochechas do rapaz. 

— E estava muito doente, meu filho. — Os lábios pintados de vermelho pressionados numa fina linha. — Mas devido à pressa e aos esforços de seu pai em encontrar magos e feiticeiros competentes, consegui me livrar da minha doença.

— Entendo.

Relações familiares eram complicadas e aqueles que faziam parte da realeza desde sempre aprendiam que não se podia confiar em ninguém além da família. Jongin e Jongdae cresceram ouvindo essa filosofia, mas o encontro com o suposto tio havia lhes mostrado novos horizontes — mesmo que não confiassem plenamente no necromante.

— Mas conseguiram, não é? — O rei tomou o lado da esposa, ansiedade transparecendo em sua voz. — Conseguiram o Coração?

Jongdae levou as mãos ao alforje, inconscientemente. Ele confiava demasiadamente nos pais, mas não podia dizer que aquela situação estava estranha; seus pais fitavam o mais velho com ansiedade e os ombros tensionados e inquietos. A rainha voltou-se para o filho mais novo, passando por Chanyeol como se ele nem sequer existisse.

— Meu querido, Jongdae. — Ela afagou o rosto dele com um carinho exagerado. — Por favor, entregue para a mamãe, sim?

O mais novo olhou para o irmão. Jongin o encarava o desafiando a entregar o cristal, porém ele não tinha muita escolha. Ele suspirou e tirou a pedra do alforje — um cristal verde que brilhava quando atingido pelo sol. 

Junmyeon olhou para o Coração das Esmeraldas e, se pudesse, estaria salivando como um lobo prestes a matar um cordeiro apetitoso. Tinha muito tempo que desejava aquele poder. A única forma de fazer com que Baekje e Silla se curvassem diante do poder de Goguryeo. O soberano tomou a pedra nas mãos, contudo, assim que seus dedos se fecharam, o Coração das Esmeraldas rachou e se quebrou, desfazendo-se em dezenas de pequenas pedras acinzentadas.

Ele encarou os pedaços no chão, assustado. Os meninos também fitaram uns aos outros, chocados. Nenhum deles esperava que a pedra fosse falsa. Mei Lan não pareceu nenhum pouco surpresa, ela levantou o olhar e encarou a figura sombria que se encontrava parada alguns passos logo atrás do grupo. 

Todos viraram quase que instantaneamente ao ouvir o riso fraco do necromante; os olhos brilhando como ouro debaixo das sombras.

— O que você- — Chanyeol começou a falar antes de ser interrompido.

— Queria dar uma olhada na minha irmã mais uma vez. — Ele olhou para Jongin e Jongdae elevando as sobrancelhas com um sorriso debochado. — Realmente, consigo enxergar como ela está doente.

— Você tinha razão — falou Jongin.

Mei Lan arregalou os olhos e tentou abrir a boca para convencer o filho do contrário, mas percebeu que não havia muito o que pudesse ser feito. A mulher atravessou o pequeno grupo e se colocou de frente para o necromante. O barulho da mão da rainha chocando-se contra a face pálida do bruxo atravessou a floresta e um silêncio inquietante abafou todos os ruídos que vinham da floresta e do acampamento. 

Ela o fitou enraivecida, a face deformada pelo ódio.

— Como você ousa tentar virar meus filhos contra mim?

Huang massageou a bochecha passando a língua pela parte interna antes de encarar a irmã.

— Oh, irmãzinha, você sempre foi muito instável. — Mais um tapa. — Nunca superou o Coração ter escolhido a mim para guardá-lo e teve de mentir para os seus filhos numa chance ridícula de que eu fosse me preocupar com uma doença?

— Não me surpreenderia, você nunca teve um coração.

— Ah, eu tenho um coração. — Ele colocou as mãos sobre o peito fingindo estar magoado. — Mas não sou enganado facilmente. Irmã ou não, jamais colocaria a vida de todos nessa floresta para sanar seus caprichos.

Junmyeon se une à esposa. O rei já tinha se encontrado com o necromante muitas vezes no passado e se surpreendeu por ele ainda parecer tão jovem.

— O Coração das Esmeraldas tem poder suficiente para colocar todos os outros reinos em seus devidos lugares. — Junmyeon tinha uma incrível convicção no que dizia, mas isso não era e nunca seria suficiente para convencer o necromante. — O que é uma floresta quando se pode ter o mundo ao seus pés?

Jongin soltou um arquejo indignado.

— Então é disto que se trata? Controle? — Chanyeol nunca o viu tão vermelho desde que o conheceu, podia sentir a raiva exalando de sua pele. — Condenar a vida das pobres criaturas que vivem aqui por poder?

O rei encarou o filho com curiosidade e desviou o olhar para o bruxo ao seu lado. A preocupação que o jovem mágico demonstrava com relação ao estado emocional do namorado chegava a ser hilária para alguém como ele.

— Sim, é tudo por poder. Quando for rei entenderá que precisa de poder para manter o que é importante para você. — E apontou o queixo para Chanyeol numa ameaça explícita. — Você sempre foi tão focado em manter o reino seguro e próspero quando era criança, mas aparentemente o relacionamento com esse feiticeiro mudou seu modo de pensar.

— Sempre pensei dessa forma — bradou contra os pais. — Desde sempre odiei ser obrigado a agir com um boneco só para agradá-los.

— Eu disse a você que nosso dever é para com nosso povo.

— E devemos enviá-los para dar a vida em uma guerra que nós começamos? — Jongin não via a necessidade em desperdiçar vidas inocentes em uma batalha quase sempre sem sentido. — Questões políticas e econômicas podem ser resolvidas com diplomacia.

Mei Lan deu um riso fraco.

— Geralmente, essas questões são resolvidas através do casamento. Está sugerindo se casar com alguém de Baekje? E seu irmão se casaria com uma das mulheres selvagens de Silla? — Ela balançou a cabeça negativamente, suas madeixas se movendo expressivamente.

— Não irei me casar com ninguém que não seja Park Chanyeol — declarou.

As narinas de sua mãe inflaram como balões e ela não se incomodou de maneira alguma em desferir um tapa no rosto do filho. Os amigos dele observaram a cena de queixo caído e olhos arregalados, principalmente Chanyeol que conseguia enxergar a marca dos dedos cravados na pele bronzeada.

— Você precisa dar herdeiros ao reino, não seja um tolo.

Chanyeol não sabia que discussões familiares eram daquela forma. Jongin discutia arduamente com os pais, enquanto os demais permaneciam apenas olhando. O príncipe mais velho tentou pedir ajuda ao irmão, mas este simplesmente abaixou a cabeça como se não quisesse brigar com os pais. O bruxo não estava gostando do caminho que aquilo iria tomar. O quão ruim seria se seu namorado rompesse seus laços com a família por causa dele?

— Ouça sua mãe. — Sua voz saiu mais quebrada que o normal e encarava os sapatos incapaz de elevar o olhar. — Precisa me esquecer e viver sua-

— Preciso viver minha vida ao seu lado. — Jongin o interrompeu, depositando os dedos abaixo do queixo e elevando até que tivesse plena visão dos olhos grandes que tanto amava. — Fiz uma promessa de que não abandonaria você e pretendo cumpri-la.

— Não quero que brigue com sua família por minha causa.

— E eu não quero que você se afaste de mim. — Não era a primeira vez que tinha dito tais palavras para ele, todavia para ele, naquele momento elas soaram mais doces e mais cheias de significado. — Já disse que não posso mais viver sem você ao meu lado. Meus pais terão de aceitá-lo se ainda quiserem conviver comigo.

— Jongin...

— Sem mais.

O príncipe se colocou atrás de Chanyeol e o abraçou por trás. Os amigos dos dois estavam tensos, enquanto pai e mãe encaravam-no boquiabertos — não estavam acostumados com os filhos os desafiando, porque nunca aconteceu. 

Mei Lan lançou um olhar ameaçador para Chanyeol e estava explícito que jamais aceitaria o relacionamento dele com Jongin. Ela sequer fez questão de olhar para o irmão e saiu da floresta. Junmyeon mirou as costas da esposa e suspirou profundamente, imaginando que ela daria trabalho até que se acalmasse. Quando passou pelo filho mais velho, ele parou por um momento, examinando o príncipe e seu namorado.

— Espero que não se arrependa de suas escolhas, Kim Jongin. Não digo por mal, mas espero que entenda a forma como será cobrado, exigirão de você mais do que de outros. — Ele suspirou. — Leve seu namorado para jantar conosco em algum momento, mas só depois de eu acalmar sua mãe.

E foi embora.

Park ficou mirando o rei se afastar, seu manto vermelho se arrastando no chão, enquanto observava o acampamento ser desmontado para que retornassem a Lamuria. Ele ficou surpreso, pois havia presenciado um homem circunspecto com sede de poder assim como a esposa.

— Não fique tão contente, Sr. Park — disse o necromante. — Lembre-se de que nem sempre as coisas são o que parecem ser.

Os cinco rapazes haviam se esquecido de Zitao continuava ali, observando tudo como uma coruja em meio a noite atenta para qualquer coisa que pudesse servir de alimento. Eles estavam apreensivos, principalmente por não saberem o motivo da vinda dele.

— Veio cobrar o juramento? — perguntou Chanyeol, tenso.

O necromante abriu um sorriso, sua cicatriz se esticando junto, mostrando todos os dentes brancos, porém não tinha nada de maldoso como quando foram embora de sua casa.

— Aprendam uma regra importante. — Sua forma começou a se desfazer, uma nuvem de cinzas sendo levada pelo vento, contudo, a voz profunda do bruxo permaneceu. — Bruxos, Magos e Feiticeiros, na maioria das vezes, são mentirosos. Tudo o que fiz foi observar de longe se meu sobrinho não cometeria o mesmo erro que eu e confesso que não me decepcionou, Kim Jongin. Por favor, lembrem-se que sempre existe uma escolha.

Sua jornada tinha terminado, mas os cinco conseguiram sentir que as coisas não se encerrariam por ali. Dificuldades sempre iriam aparecer e tentar perturbar a paz, sobretudo quando sua própria liberdade e poder de escolha estava em risco. Eles permaneceram ali, escondidos pelas sombras das árvores até que o acampamento todo tivesse sido levantado.

— É hora de voltarmos as nossas vidas, não é? — perguntou Byun.

— Teríamos de fazê-lo em algum momento — respondeu Jongdae recostado em uma árvore.

O príncipe mais jovem despediu-se e desceu o pequeno declive, assim como Minseok e Baekhyun afastaram-se para terem um momento de privacidade. Chanyeol desconfiava que ele adotaria a mesma forma de se encontrar com o arqueiro de noite, mesmo não sendo dentro da floresta. O bruxo suspirou, cansado e elevou o olhar para Jongin.

— Estou com medo do que vem agora.

— Também estou — confessou. — Mas com você ao meu lado tenho coragem o suficiente para enfrentar um exército.

Kim contornou a cintura do namorado num aperto forte, trazendo-o para mais perto de si e encarou o namorado por debaixo dos cílios grandes antes de tomar seus lábios. 

Novamente, como sempre acontecia quando se beijavam, o mundo se dissolveu, os envolvendo em uma bolha impenetrável. Eles tinham consciência de que nada era fácil e o relacionamento deles enfrentaria diversos percalços, mormente a impossibilidade de terem herdeiros legítimos para o torno. Mas nada disso importava naquele momento, pois não adiantava sofrer por antecipação. Iriam lidar com os problemas que surgissem um de cada vez, porém fariam isso juntos; um juramento silencioso de que em momento algum iriam se separar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

BESTIÁRIO:

1. Flores que Devoram Cadáveres: O Ser Mágico mais recorrente durante toda a narrativa de Emerald Heart. Esses monstros vegetais consistem em flores que se alimentam, principalmente, de cadáveres (como o próprio nome já diz). Elas possuem a capacidade de liberar um agradável aroma para atrair suas vítimas e, depois de se aproximarem, elas liberam espóros que colocaram o alvo em uma hipnose poderosa que penetra seu sistema nervoso, forçando-o a atacar seus semelhantes.

2. Corujas-Prata: São animais raramente vistos devido a seus hábitos noturnos e a preferência por voarem durante as noites de Lua Cheia. Suas penas possuem uma coloração de preto e marrom, contudo, durante o contato com a luz das estrelas, suas asas brilham como se fossem banhadas em prata. Não são perigosas, mas por possuírem um ar fantasmagórico, sua visão é assustadora.

3. Serpentes de Esmeralda/Víboras de Jade: Esses répteis são as serpentes mais venenosas já conhecidas. Seus olhos de fenda possuem uma coloração amarela venenosa e suas escamas são verdes, brilhando sob a luz direta como se fossem pedras preciosas (por isso, muitos mercadores buscam essas serpentes para retirarem suas escamas e vendê-las). A peçonha dessa víbora é utilizada para inúmeros medicamentos, mas também é utilizada em sua forma pura para envenenar reis e rainhas.

4. Meteoro Flamejante: Esses pássaros são semelhantes as fênix de nosso mundo. As penas possuem uma mesclagem magnifíca de cores quentes, principalmente vermelho e laranja. É um animal raro com um canto majestoso que cruza os céus de determinadas regiões durante as tarde e anuncia a chegada da noite. Dizem que quem ouvir o canto da ave, será agraciado por boa sorte durante toda a sua vida e que as terras em que ela pousa, são fartas e com bons frutos.

5. Lobos do Advento: Os Lobos do Advento são criações mágicos das trevas. Seres indomáveis e imersos em magia sombria que, de alguma forma, fugiram e começaram procriar. Eles são conhecidos por sua selvageria e pela imunidade a magias elementais - Madeira, Metal, Terra, Fogo e Água - tornando-os seres difíceis de se enfrentar.

6. Belssinios: Os Belssínios foram baseados em uma lenda de um grupo de córceis pretos que cavalgavam o mundo e guiavam a alma dos mortos que encontravam para o mundo dos mortos. Para que fosse levado era preciso que, além da sorte de encontrar um Belssinio, agarrar sua crina e montar em suas costas - ação que demandaria muita habilidade em montaria. Por isso existem muitos fantasmas, pois nem todos os encontraram ou conseguiram montá-los.

E essas são as criaturas listadas em todos os capítulos de Emerald Heart, espero que tenham gostado. Infelizmente, chegamos a rota final e a conclusão dessa estória. Agradeço a todos que acompanharam até aqui e nos vemos no próximo projeto de MagicWishes. Gostaria de agradecer a atenciosidade de @suhomyeon que aturou essa história durante os quatro capítulos e me ajudou demais com essa betagem e com sua avaliação do desenvolvimento dos capítulos.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Emerald Heart" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.