South escrita por Venus


Capítulo 2
Calmaria


Notas iniciais do capítulo

Hello! Demorei bastante mas voltei rsrs! Planejo atualizações mais lentas para essa história mesmo, espero que não se importem. E finalmente defini o número de capítulos: serão 6 no total, então espero concluir antes do final do ano. Boa leitura ♥



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—Eu não entendo porque estamos fazendo isso- Kyane protestou, observando com uma careta enquanto suas amigas andavam pelo pequeno barco- Eu já trago tanta caça boa! Para que pescar? Super desnecessário...

Mayuri, que estava empoleirada no mastro principal, soltando as velas, parou sua tarefa para encará-la com descrença.

—Até parece que você nunca ouviu os anciões da tribo falando sobre como devemos manter o equilíbrio da natureza, coisa e tal- Mayuri provocou, retornando à sua tarefa logo em seguida.

Kyane revirou os olhos.

—É só fazermos uma semana vegetariana ou algo assim! Pescar não vale o trabalhão que dá- ela continuou, finalmente resolvendo subir no barco- Minha nossa, essa coisa balança.

Lunyi, que até então estava verificando um mapa, ergueu os olhos e riu.

—Então está explicado. Você não gosta de pescar porque fica enjoada em barcos- ela constatou, com um sorrisinho afiado.

Antes que Kyane pudesse replicar, Thalya interrompeu com mais uma provocação:

—Ela passou a viagem inteira vomitando da última vez que andamos de barco! É claro que vai achar que pescar é “desnecessário”.

Kyane fez uma careta.

—Mentiras e calúnias! Intrigas da oposição!- ela proclamou, e as outras meninas riram.

—Então acho que não vai precisar do tônico para enjoo que preparei hoje mais cedo...- Lunyi provocou, tirando um pequeno frasco de vidro de sua bolsa e o agitando no ar, para atrair a atenção de Kyane.

—Bem...- a morena engoliu em seco- Acho que vale mais prevenir do que remediar.

Lunyi riu, entregando o frasco à amiga.

—Estou brincando, Kya. Preparei para você mesmo, Thalya nos contou tudo sobre seu enjoo marítimo- ela disse, enquanto observava a amiga tomando o tônico.

—Thalya é mesmo uma fofoqueira- ela resmungou, esvaziando o frasco- Vou me lembrar disso.

Kyane lançou um olhar ameaçador para a outra, que riu, maléfica.

—Eu não faço ideia do que ela está falando- Thalya proclamou, desfazendo a risada e forçando uma expressão falsamente ofendida- Eu sou uma gracinha, totalmente inocente, nunca faria isso.

—Disse a agente do caos- Mayuri provocou, e as meninas riram.

—Agora eu quem estou sofrendo calúnias! Esse barco é mesmo um ninho de cobras!

A embarcação velejou suavemente a princípio, cortando a água com graça e facilidade. Era um dia bonito, o sol brilhava forte, e nenhuma nuvem podia ser vista no céu. A calmaria que sucedia a tempestade, Kyane pensou. Talvez andar de barco não fosse tão ruim assim, afinal. Os raios de sol esquentando sua pele e o vento passando delicadamente por seu cabelo foram uma grata supresa, proporcionada por finalmente não ter que se preocupar com seu próprio estômago tentando assassiná-la. Tinha de lembrar de pedir a receita daquele tônico para Lunyi mais tarde.

Elas contornaram icebergs e plataformas de gelo com maestria, até que finalmente alcançaram o mar aberto. A imensidão azul brilhava como uma joia sob o sol, e, quando finalmente acharam um bom ponto, Thalya parou de usar sua dobra para mover o navio mais depressa, deixando a embarcação flutuar suavemente à deriva.

—Está vendo algum cardume, May?- Thalya perguntou para Mayuri, que ainda estava empoleirada nos mastros das velas, observando o mar.

Kyane sorriu sutilmente ao ouvir o diálogo, se lembrando de quando, alguns dias antes, havia salvado May de cair de cima de um iceberg. Sua amiga era boa escalando e observando, mas não muito boa em se manter concentrada. De modo que, ao ouvir a pergunta de Thalya, ela quase se desequilibrou, mas acabou conseguindo se segurar às cordas e olhar mais adiante.

—Não estou vendo nada, Thalya- Mayuri respondeu- Deveríamos esperar um pouco. Se andarmos demais, vamos assustar os peixes.

Ela então saltou de seu esconderijo nas alturas para o chão com suavidade, caminhando em direção às redes que Lunyi começava a desenrolar.

—Ainda acho que você era uma Nômade do Ar em alguma vida passada- Kyane provocou, com uma pontada de ironia- Parece achar que sabe voar e está sempre se colocando em risco.

Mayuri fez uma careta, mas Lunyi e Thalya riram.

—Quem sabe May não é a Avatar e está nos enganando esse tempo todo?- Lunyi zombou, o que fez as outras meninas rirem um pouco mais.

—Se eu fosse a Avatar, usaria de meus poderes espirituais para ordenar que todas vocês calassem a boca- Mayuri retrucou, arqueando uma sobrancelha.

—Boa tentativa- Kyane replicou- Mas todos sabem que eu não tenho um espírito.

Gargalhadas altas ecoaram pelo convés da pequena embarcação.

—Droga, nós vamos espantar os peixes!- Thalya disse, em meio às próprias risadas, mas de pouco adiantou. Todas continuaram a rir por mais alguns segundos, e, quando as gargalhadas minguaram, Lunyi não deixou que voltassem ao silêncio necessário:

—Mas é sério mesmo- a garota interpelou, ainda desenrolando as redes- O que acham que aconteceu com ele?

O clima se tornou um pouco mais grave, mas não muito. Já haviam falado sobre o tema algumas vezes antes, de modo que não se acanhavam em expor suas especulações.

—Eu acho que ele morreu- Mayuri respondeu, dando de ombros- E acabou reencarnando na próxima forma. Talvez essa forma seja nova demais para ter descoberto sua verdadeira natureza ainda. Ou talvez só esteja assustada.

—Então você é mesmo a Avatar- Thalya provocou- Não vamos deixar você se esconder para sempre, você sabe, não é? Temos que acabar com essa guerra uma hora ou outra.

As meninas riram.

—Bem- Kyane murmurou- Eu acho que ele está vivo, mas que foi capturado. É a única coisa que faz sentido, já que ele não deu as caras até hoje.

Lunyi esboçou uma expressão pensativa.

—Talvez ele esteja treinando. Ou se preparando. Não sei se estou sendo boba, mas quero acreditar que ele pode voltar a qualquer segundo- ela admitiu, e Thalya soltou uma risadinha.

—Lu, ele já tem uns quarenta anos a essa altura. Teve tempo o suficiente para se preparar- ela replicou- Eu acho que ele está se escondendo. Percebeu que não é forte o suficiente, e vai se fazer de sonso até morrer de velho e deixar a responsabilidade para a próxima encarnação.

Kyane deixou uma risada escapar.

—Parece a Mayuri deixando as responsabilidades para “ela do futuro”- ela provocou.

—Ei!- May respondeu, fazendo uma expressão falsamente ofendida- Eu sou muito responsável, está bem?

Antes que as meninas pudessem recomeçar as provocações, Thalya as interrompeu bruscamente, com um tom alarmado de urgência:

—Gente! Um iceberg!

Kyane levantou os olhos, tomando um susto. De fato, havia um enorme iceberg muito próximo, em plena rota de colisão, e a correnteza as levava até ele cada vez mais depressa.

—Rápido!- Kya disse, se levantando e correndo em direção a estibordo- Vamos desviar o barco antes que seja tarde!

As outras meninas imediatamente largaram o que faziam e correram para junto dela.

—No três- Kyane orientou- Um… dois… três!

As quatro dobraram a água ao mesmo tempo, gerando uma onda considerável, que as jogou para o lado bem a tempo de desviar do enorme bloco de gelo.

—Minha nossa- Lunyi murmurou, recuperar o equilíbrio após o movimento repentino- Essa foi por pouco.

—Aquele era um iceberg muito estranho- Mayuri comentou- Acho que vi uma sombra dentro dele.

Kyane olhou para trás, analisando o bloco de gelo, agora já um pouco distante.

—Parece normal para mim- ela deu de ombros- De qualquer forma, agora certamente espantamos todos os peixes. Temos que arranjar outro jeito de conseguir o jantar.

Thalya riu.

—Boa tentativa, Kya. Mas até parece que eu desisto fácil assim.

Thalya voltou a guiar o barco mar adentro, embora, como Kyane havia previsto, nenhum cardume tenha sido avistado por elas. A água excessivamente parada devido à calmaria fazia com que os peixes se alarmassem e fugissem quando o barco se aproximava, o que dificultava bastante pescar de maneira minimamente efetiva. Elas jogaram as redes ao mar diversas vezes, apenas para encontrá-las completamente vazias.

—Sabe- Mayuri comentou, ligeiramente decepcionada, após mais uma rede ser puxada da água completamente vazia- Nesse ritmo, acho que conseguiríamos mais peixes se fôssemos pegá-los com nossas próprias mãos. Essa pescaria está sofrível.

Uma luz pareceu se acender na cabeça de Kyane repentinamente. Ela abriu um sorriso, dando um soquinho animado no braço da amiga.

—May, você é genial!- ela exclamou, se colocando de pé em um salto- Nós podemos usar a dobra para tirá-los da água! Como não pensamos nisso antes? Se agirmos rápido o suficiente, eles não terão tempo de fugir.

Thalya pareceu pensativa por um segundo, mas acabou assentindo.

—Acho que poderia funcionar. Mas teríamos que andar por sobre a água com extrema cautela- ela disse, por fim.

—Eu posso ajudar com isso- Lunyi se ofereceu- Faço pequenas plataformas de gelo enquanto vocês se concentram nos peixes. Acho que é a maior serventia que posso ter, tendo em vista meus talentos… diferenciados.

As meninas riram, mas Thalya acabou franzindo a testa e ralhando com ela:

—Não fale assim, eu não aceito que debochem dos meus alunos. Essa é a minha função!

Logo os preparativos para a ousada empreitada estavam alinhados. Além da dobra, Kyane usaria sua lança quando fosse necessário, e Mayuri levaria uma das redes.

Lunyi foi quem saiu do barco primeiro, dando um pequeno passo cauteloso por sobre o oceano. Seus pés criaram uma fina camada de gelo na água que tocavam, e Kyane foi logo atrás dela, seguindo a trilha que ela deixara. Olhou para trás rapidamente, encontrando May, seguida de Thalya. Mayuri já tinha seus olhos fixados em algum ponto bem à frente, e logo cutucou Kyane gentilmente, se aproximando para sussurrar:

—Você está vendo aquele cardume? Acho que finalmente demos sorte.

Kyane abriu um sorriso.

—Eu estou vendo. Vamos lá, antes que eles fujam.

Lunyi acelerou o passo na frente delas, já começando a espalhar pequenas plataformas de gelo nas proximidades do cardume. Kyane pulou para uma ao lado da amiga, enquanto Thalya e Mayuri escolheram duas um pouco mais distantes, cercando os peixes.

—No três, vou puxá-los da água, se preparem- Thalya sussurrou- Um… dois… três!

Com um movimento amplo dos braços, Thalya dobrou a água ao redor dos peixes, a controlando com maestria até que ela fosse um grande globo suspenso no ar.

À princípio os peixes estavam confusos demais para reagir, mas logo alguns entraram em pânico, tentando escapar do pequeno aquário flutuante no qual Thalya havia os prendido. Foi então que as outras meninas tiveram de começar a agir.

Mayuri saltou para frente, tentando pegar os peixes que lutavam para voltar para a água em sua rede; e Kyane logo seguiu seu exemplo, capturando os retardatários com sua lança. Lunyi estava conseguindo cumprir sua parte da tarefa relativamente bem, posicionando plataformas de gelo de modo a facilitar a pescaria pouco convencional, e Thalya dividia o globo de água principal em esferas menores, tornando menos difícil pegar os peixes.

Em menos de dez minutos, todos os peixes foram capturados, e poucos haviam conseguido escapar. A rede estava transbordando de cheia, e Kyane tinha peixes o suficiente em sua lança para fazer um generoso churrasco.

—Bom trabalho, time!- Kyane elogiou, com um sorriso- Técnica pouco ortodoxa. Execução impecável.

Thalya riu, e concordou.

—Acho que acabamos de inventar um novo jeito de pescar. A tribo mal vai acreditar quando contarmos a história- ela respondeu.

—Não importa, todos estarão de barriga cheia- Lunyi disse, soltando uma risada- Agora vamos voltar logo, antes que o efeito do tônico que dei à Kya passe. Eu não trouxe uma garrafa reserva.

As meninas concordaram, e começaram a caminhar por sobre as plataformas de gelo de volta ao barco.

A viagem de volta foi tranquila, e mais rápida do que a ida. Kyane não sentiu enjoo em momento algum, e pôde aproveitar toda a glória que aquela vista marítima e ampla oferecia. Suas amigas estavam certas, afinal. O único motivo pelo qual ela não gostava de barcos era seu estômago. Porque seu coração adorava o mar.

De volta à tribo, Kyane imediatamente estranhou a paisagem deserta. Normalmente haveriam crianças correndo pelos arredores das barracas, rindo e se divertindo. Mas havia um silêncio estranho e denso por sobre o acampamento. As outras meninas também pareceram notar, pois logo Mayuri perguntou:

—Onde é que está todo mundo?

Ela não precisou de uma resposta. Pois logo elas conseguiram avistar uma comoção no centro da tribo, o que as fez largar os peixes e ir correndo até os outros.

—O que aconteceu?- Thalya perguntou para uma senhora mais velha, que passava carregando panos e bacias de água.

A anciã parou brevemente para encarar as meninas.

—Finalmente vocês chegaram!- ela exclamou, com um tom ligeiramente exasperado- Alguns dos guerreiros voltaram. Vamos precisar de toda a ajuda que conseguirmos.

Kyane finalmente reparou melhor na aglomeração de pessoas, concluindo que se tratavam de pessoas reencontrando suas famílias, e outras ajudando a carregar os feridos.

—Eu preciso ir ajudar- Lunyi murmurou, imediatamente assumindo uma postura mais rígida. Ela normalmente era um pouco ansiosa, mas agora havia uma frieza em seu tom- Vocês podem cuidar do resto? Tenho a sensação de que vão precisar de mim.

Mayuri assentiu e sorriu gentilmente para ela.

—Não se preocupe, Lu, nós cuidamos da comida. Vá lá fazer o que você faz de melhor.

Lunyi concordou, mas não sorriu de volta. Estava visivelmente concentrada em seu objetivo, e saiu até uma das barracas com passos firmes.

—Acho que nossa paz por fim acabou- Thalya resmungou- Foi bom enquanto durou.

Kyane tentou não esboçar, mas, nesse momento, um arrepio estranho trespassou seu corpo. De algum modo, ela sabia que tudo estava prestes a mudar.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! O final foi um tiquinho tenso, mas, como eu já disse antes, essa não é uma história sombria. O próximo capítulo talvez tenha um ou dois momentos um pouquinho mais difíceis, mas em geral os outros manterão a vibe leve. Até o próximo!

Ps: se aquele era O iceberg? Talvez. Mas eu gosto de pensar que sim. Enfim, ironias do destino kkkk!

XOXO
—Venus ♥



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