Desaparecendo escrita por Dama das Estrelas


Capítulo 26
É muito bom me sentir viva. Estive morta por muito tempo


Notas iniciais do capítulo

Chegamos aqui ao tão esperado (ou não) último capítulo dessa fanfic. Eu confesso que foi uma montanha-russa de emoções com essa história aqui. Queria muito ter encerrado ela no meio do ano, mas eu tive que reescrever boa parte dos capítulos porque realmente não estavam bons e eu queria trazer uma atmosfera legal para a fic, sair do raso. Peço desculpas pela demora em postar os caps e encerrar a história. Esse ano todo foi uma batalha por si só.

Mas enfim. Obrigada a todos que acompanharam essa jornada louca e agradeço a paciência em aguardarem pelos capítulos. Boa leitura.

Obs: peguei emprestado o verso da música "My Throat Is an Open Grave" do Demon Hunter. Finalmente eu tava com a ideia de nome do capítulo antes de fechar o capítulo, muito bom!!!



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— Eu te devo desculpas.

— Pelo quê?

Ela hesitou um pouco antes de responder, já que não sabia como conduzir aquela conversa de modo adequado.

— Eu não fui justa com você, desde o início.

Já passava da meia-noite quando Sara visitou Langston em seu escritório. Assim como antes, o cientista lhe ofereceu uma bebida para aquecer a garganta naquele início de madrugada. Se tudo ocorresse bem, amanhã já teria o resultado da análise e a tão esperada resposta. A palavra final sobre o resultado do procedimento.

— Não é sobre ser justa ou não… — Ele argumentou. — Você estava confusa. No seu lugar eu agiria do mesmo jeito.

— Você não pode afirmar com tanta certeza, doutor Langston. — Ela o alertou. — Mas ainda assim, apesar de tudo… Eu acho que passei dos limites e peço desculpas.

— Eu não posso aceitá-las. — Langston respondeu sorrindo. — Nem ao menos sabemos do resultado.

— E isso importa agora? — questionou-o ao dar de ombros.

— Esqueça isso. — Ele ergueu a mão direita num gesto de trégua. — Como está ou como tem se sentido nesses últimos dias? — esquivou-se.

Copo em mãos, ela olhou para o fundo e viu a bebida quase no fim.

— Na verdade não senti… não sinto nada — esclareceu. — Eu não vou mentir para você. De vez em quando me bate aquela sensação de que algo pode acontecer, mas… Depois de tudo o que houve, nunca me senti tão confortável. Acho que sair daquela sala inteira e viva me deu esperança. — Ela sorriu no final.

Aquele dia ainda lhe era nítido, quase palpável. Os segundos entre o estar ali e o nada. A sensação de sentir seu corpo entrar em combustão por dentro e por não conseguir sentir a firmeza do chão. Uma leve impressão de que — por mais breve que tenha sido — não se encontrava mais naquela câmara e sim num outro lugar.

— O que acontece depois? — Sara perguntou. Talvez nunca tenham chegado a trabalhar com aquela conversa.

— Independente do resultado, vai ser necessário que fique aqui por mais algum tempo.

Êxito ou fracasso, não tinha outro caminho senão permanecer ali até que tivessem certeza de que não havia mais nada com que se preocupar.

— Imagino que já tenha isso em mente — disse ele.

Pra quê a pressa em voltar?

Ela veio com o pensamento de acabar com aquilo o mais rápido possível, sim. Mas agora não via mais tanto sentido em apressar seu retorno aos EUA. O que faria lá se não fosse tentar tocar a vida normalmente como antes? Bastou-lhe muito pouco para afirmar que não estava preparada para isso. Ainda levaria um tempo até se acostumasse com a vida normal.

— Eu já falei antes mas é sempre bom lembrar: Grissom merece saber se está bem.

Uma das perguntas que martelavam sua mente, além da eterna dúvida se ele passou ileso daquele evento.

Não que Langston tenha desaprovado a ideia, mas seu olhar era nítido de alguém que não a apoiava. Executar o mesmo planejamento que fizeram com Sara demandaria tempo e recursos além do estipulado e, dependendo das circunstâncias, isto seria um problema.

— Ele não apresentou nenhum sintoma semelhante ao seu em todos esses meses…

— Isso tem importância? — Ela protestou. — Não dá pra contar com a sorte. Se puder evitar que outra pessoa corra o risco de passar pelo mesmo pesadelo eu vou até o fim com isso.

Nunca imaginou como seria ver o homem que amava encarar a mesma coisa. Nem em seus piores pesadelos. Saber que Grissom não sentiu o mesmo que ela nos últimos meses não era garantia de nada, nem mesmo ao ouvir da boca dos cientistas que dificilmente ele estaria “infectado”. Sara precisava ver com seus próprios olhos que ele realmente está bem.

Langston, então, exalou um suspiro cansado. Como um homem da ciência, não podia ignorar o fato de que tanto Grissom como milhares de outras pessoas no raio daquele incidente eram potenciais vítimas.

— Veremos o que pode ser feito após o resultado de sua análise.

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— Finalmente — Grissom disse entre um suspiro.

Eles chegaram a Mui Wo em pouco tempo. A calmaria do vilarejo pelo qual vieram caminhando deu lugar a um pequeno centro urbano cheio de vida. Uma variedade de veículos de transporte parecia ter surgido do nada. Sons de buzinas e de gente se misturavam modestamente, contrariando a tranquilidade da zona da mata. A quantidade exorbitante de bicicletas impressionava à primeira vista, tomando conta da cidade e vencendo o volume de carro. Uma atmosfera completamente diferente da quietude da floresta, mas tão intrigante quanto. Isolados por entre a vegetação anteriormente, tornaram-se mais um com a presença de outras pessoas.

Ao chegarem à uma praça, Grissom e Sara se encontraram com o responsável por levá-los ao local indicado como combinaram anteriormente. Amigo de Hongfeng, recebeu-os de forma simpática e aceitou sem problemas o pedido de desculpas pelo pequeno atraso. Partindo em seu carro modesto, o trajeto até a região da caverna e cachoeira Silvermine não demorou muito; o restante do caminho deveria ser feito a pé, todavia. Ainda assim, foi tempo suficiente para que memórias de dias atrás retornassem como velhas companheiras.

— Eu não sei se estou realmente preparada. Quero dizer… Eu estou, mas… é tão estranho isso.

— Entendo. Foi muita carga para administrar nesses últimos meses.

— Nem me diga.

Lembrava-se muito bem de como o dia amanheceu: meio nublado, temperatura amena, muita empolgação nos rostos. E de repente lá estava ela, diante de Langston e toda sua equipe que, juntos de Grissom, reuniram-se na ampla para revelarem seu diagnóstico final. Ansiedade estava a mil. Cinco dias após o procedimento e Sara precisou voltar à sala de análise do começo e repetir a mesma rotina de antes. E após mais três dias de espera finalmente chegou o dia. O dia que iria definir o rumo da vida de Sara.

À esta altura já nem mais conseguia esconder o nervosismo, tão estampado em seu rosto. Nem mesmo a presença de Grissom era suficiente para acalmá-la, apesar de sempre ser lembrada de que nos últimos dias sequer ocorreu algum sintoma referente a mais um episódio.

No pior dos casos, dizia Langston, teria de refazer o procedimento.

— Ei, olha só o que eu trouxe.

Enquanto esperava por ele — que se afastou sem explicar o motivo —, Grissom se aproximou dela quase tão de repente quanto saiu e a trouxe de volta para o presente. Segurava em suas mãos um sorvete de casquinha que à primeira vista enchia-lhe os olhos. Uma boa opção para os dois, tendo agora que continuar a pé.

— Baunilha e chocolate. Não sabia qual deles você iria querer então pedi por um misto — disse, estendendo para ela e ficando com um para si.

— Não precisava, Gil... — Apesar de amar o agrado ela corou de vergonha pelo gesto.

Em resposta, ele deslizou o polegar em seu rosto. Rápido o suficiente para que as pessoas ao redor — não muitas —, não percebessem o carinho.

— Pronta para mais alguns minutos de caminhada, senhorita Sidle?

— Você sabe que não — respondeu sorrindo ironicamente, após provar o sorvete. Fez uma careta ao sentir o choque térmico. — E o que é isso, está imitando Langston agora?

Grissom revirou os olhos como quem não gostou da comparação. Não foi sua intenção imitar o cientista em momento algum, o nome dele sequer lhe veio à mente.

— Você não vai perdoá-lo tão cedo, não é? — Ela perguntou. De certa forma se preocupava com o que ele sentia sobre Langston, temendo que isso pudesse prejudicá-lo.

— Vamos seguir em frente. — Ele mostrou um sorriso acalentador e gesticulou para que continuassem a andar. Obviamente foi mais uma tentativa de se esquivar da pergunta e contornar a situação.

O caminho sinuoso e estreito era repleto de placas em cantonês e inglês, facilitando o trabalho dos dois em seguir até a cachoeira. Àquela altura da manhã o sol ainda batalhava com as nuvens, mas o paredão verde que circundava o trajeto foi o escudo contra os raios do sol e a temperatura acima da média. Sem se preocuparem com o calor, bastava-lhes observar o que a natureza preparou.

Lado a lado, caminhavam como dois turistas que se deixaram levar pela beleza da mata quase intocada pelo homem. O cheiro da fumaça e dos gases típicos de uma cidade grande deram lugar ao aroma da vegetação e das correntes de água locais, que invadiam suas narinas e lhe proporcionavam uma sensação nostálgica.

— Não posso adiar mais o resultado com tantas formalidades, seria muito injusto com você. Está curada, senhorita Sidle.

As memórias soavam tão vívidas que imaginava estar vivendo aquele momento ainda. Sara podia lembrar com exímia clareza o tom de voz, a feição e a alegria expressa nas palavras do doutor Langston. Tão contente, que chegou a se questionar se não era ele a pessoa mais feliz pela notícia. Ela se lembrou do olhar arrebatado de Grissom e do abraço que aconteceu de uma hora para outra. E como ela adorou aquele abraço. Muitas lembranças daquele dia se misturavam, mas não daquele abraço. Em meio a lágrimas consequentes e uma série de palmas, Sara recobrava a imagem do abraço como se fosse uma memória viva.

Lembrava-se de cumprimentar e agradecer cada um dos cientistas responsáveis pelo procedimento, toda a equipe de Langston. Este último, o que foi um aperto de mão terminou em um abraço emocionado e um agradecimento com a voz contente e falha de Sara. Apesar de todos os choques e divergências, era grata pelo que ele e os outros fizeram.

Tanto estas quanto a recordação sobre a notícia de que Grissom também estava bem ficaram gravadas na mente de Sara. Era uma história pela qual ela não iria se esquecer tão facilmente, ainda mais após toda uma resistência por parte de Grissom para ser examinado. O zelo por Sara falou mais alto no final. Para ele era muito mais proveitoso usar toda aquela energia para acompanhar o progresso e a recuperação dela que focar nele próprio.

Após uma longa batalha, enfim, o pesadelo havia terminado.

Ao se aproximarem de um elevado construído para a visitação, o som típico da torrente d'água soou como música aos seus ouvidos. À frente deles um mirante semi-coberto lhes apresentava a beleza natural da cachoeira horizontal de Silvermine.

— Olhe só para isto. — Quando chegaram ao mirante, Grissom falou com o peito estupefato.

Uma corrente modesta de água atravessava o trecho marcado por rochas maciças que, envolto pela vegetação local, criavam uma imagem daquelas de se emoldurar e expor numa sala para que todos vissem. Ar puro, clima fresco, ausência de poluição sonora; tudo estava perfeito.

Ele não perdeu tempo. Pegou a câmera digital e tirou algumas fotos da vista panorâmica enquanto Sara se apoiou no mezanino para apreciar a vista e descansar um pouco. Tirou o boné e ajeitou os cabelos soltos. Era o momento de descansar por alguns minutos em companhia dos sons da natureza. Era muito bom aproveitar o tempo sem ser assombrada por um fantasma que a perseguia a todo momento; ter o direito de ir e vir sem medo, respirar e viver em paz. Eram mais de três meses convivendo com a sombra da morte; tanto tempo pensando no que fazer, no que não fazer enquanto seu fim se aproximava que pensar na vida e como agiria adiante era esperar por uma caixinha de surpresas. Foi como receber uma segunda vida. Tão normal quanto a vida que se seguia e, ao mesmo tempo, tudo muito novo. Seu olhar sobre o mundo à sua volta, às pessoas, à natureza. Havia algo de diferente naquilo e esta era uma pergunta que tentou responder no tempo todo da viagem.

Ela não notou que Grissom se via tão deslumbrado nela que aproveitou o ângulo de perfil e tirou uma foto. Espontaneidade valia mais que o preparo, pensava ele, e o resultado foi uma foto surpreendentemente satisfatória. Sorrindo pelo trabalho, até quis mostrar a foto para ela, mas preferiu deixá-la quieta a curtir a natureza; foi quando se deixou levar pela vista daquela mulher. Era um deleite para os olhos e coração vê-la tão bem, exalando vida e felicidade após muito tempo andando no escuro. Sentia-se tão ligado a ela que sua alegria era a alegria dele. Nada e nem ninguém conseguiria arrancar isto dele. Aproveitou e tirou mais duas fotos.

Grissom se achegou a ela logo em seguida. Não falou. Buscou se conectar ao ambiente assim como ela, mas de vez em quando variava sua atenção à cachoeira que fisgou seu olhar de início e a mulher ao seu lado. Ele ainda não podia acreditar até onde chegou por causa dela. Tão apaixonado que o único arrependimento era o de não ter se rendido muito antes. Às vezes seu coração palpitava como se fosse a primeira vez.

Quando ela virou o rosto em sua direção, percebeu que sorria para ele.

— Sei que tirou uma foto minha — comentou sem tirar o sorriso travesso do rosto.

Se pudesse correr para outro lugar e se esconder naquele momento, Grissom o faria pelo tanto de vergonha que sentiu ao ser descoberto.

Ele se afastou alguns centímetros do mezanino e tratou de pegar a câmera em resposta.

— O ângulo lhe favorecia tanto… — lamentou ao ter sido descoberto. — Me desculpe. E-eu... eu posso apagá-la se você quiser — respondeu-lhe, já procurando a foto (ou várias) para a exclusão.

— A não ser... — Ela ponderou, forçando uma postura séria. — Que você tenha tirado alguma coisa boa mesmo com esse meu cabelo desarrumado.

— As fotos ficaram maravilhosas. — Grissom tratou de se defender, mas não reparou que havia se entregado sem querer.

— “As”? — Ela arqueou as sobrancelhas.

Olhando-a meio sem jeito, mostrou a Sara a melhor foto que tirou — ainda sob muita dúvida de qual escolher, já que para ele todas ficaram. Receio batia-lhe a porta lembrando-o de que talvez estivesse forçando algo a mais entre eles. Mas ele não pôde evitar.

— Nossa... — A melhor coisa de se ter um namorado também investigador, é que este saberia acertar bem o ângulo para uma melhor captura. — Eu devia recompensar você.

— Sério? — Foi percebido um tímido tom de ânimo vindo de sua voz. Ele tentou disfarçar pigarreando, porém Sara não deixou de notar e sorriu em resposta.

— Espere só — provocou-o. Ao entregar-lhe a câmera, ela o segurou pelo pulso e se aproximou, ignorando a presença de outras pessoas ao redor e entrando num espaço mais íntimo. — Eu adorei. — Ao terminar de dizer aquilo ela o beijou na bochecha.

Isto o deixou sem jeito. Ele não sabia se a encarava extasiado ou se continuava com o que estava fazendo; só sabia que era necessário muito pouco para conquistá-lo, fisgar sua atenção como uma isca no anzol. Um sorriso bobo e meigo surgiu em seu rosto. Para um homem de meia-idade, vivenciar coisas como aquela ainda era algo recente.

Ela tocou em seu peito para despertá-lo.

— Vamos comer alguma coisa — sugeriu carinhosamente.

Concordando com sua ideia, os dois desceram o mirante pelas escadas para terem acesso à cachoeira. À margem da tranquila corrente de água, Grissom e Sara forraram uma toalha sobre o chão e se instalaram a poucos metros distante da aglomeração de pessoas. Trouxeram alguns sanduíches e bebidas leves, agradecendo aos cozinheiros do Complexo por prepararem aquele lanche especial.

— Experimente este aqui — disse ela ao estender um sanduíche de queijo parmesão com temperos locais. Grissom hesitou e até fez uma careta desconfiada. — Confie em mim, está bom — argumentou, deixando escapar uma risada.

Sem ter para onde ir ele nem se deu ao trabalho de pegá-lo, mordeu-o ainda suspenso. Mastigou o lanche calma e silenciosamente, sem dar impressão alguma se gostou ou não.

— E então? — Provocada pela falta de resposta proposital, pressionou-o a falar.

— Bem… — Ele deu de ombros, esboçando um sorriso zombeteiro. — Eu acho que há gosto para tudo.

— Está brincando, isso aqui está ótimo! — Sara protestou. Naquela mesma hora lançou um olhar mortal, porém nem isso o impediu de rir. Ela voltou a comer o sanduíche e fez questão de devorá-lo com vontade e de ser vista por ele.

O semblante risonho e zombeteiro de Grissom deu lugar a algo mais sóbrio. Não muito tempo atrás só conseguia ver o rosto de uma mulher abatida, que mal conseguia terminar meio prato de comida. Viu-a perder um pouco de peso, sendo devorada por seus próprios medos e por uma doença invisível. Para um cético, enfiou-se num poço sem fundo do qual não havia mais retorno. Mas ela deu a volta por cima e agora saboreava um sanduíche bem à sua frente. Felicidade era muito pouco para definir o que Grissom sentia.

Apesar do pequeno choque de opiniões, se Sara pudesse, apagaria todos os momentos anteriores ao piquenique, guardando para si apenas o que lhe trazia paz e conforto. O tempo ali parecia uma eternidade, como se sua tormenta durasse apenas alguns minutos, não meses. Era estar sonhando viver uns instantes junto da pessoa que mais amava.

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A zona da mata ficou para trás; a cachoeira, a caverna, a vegetação viva. À frente deles uma extensa faixa de areia e o mar imponente. Finzinho de tarde. Parte dos visitantes da praia Silvermine tinha ido embora restando apenas poucos frequentadores, distantes um do outro.

Lado a lado, caminhavam lentamente sobre a areia recém tocada pelo mar, deixando para trás seus pares de pegadas. Pés descalços, mãos seguravam seus sapatos enquanto outras permaneciam entrelaçadas. Foi uma sugestão de Sara recriar o momento que nem nos filmes clichês que odiava, mas que poderia retirar deles algo bom.

Estranho para eles no início. Trocaram olhares curiosos, um pouco de receio e em menos tempo que imaginavam suas mãos já estavam unidas. A ausência de outras pessoas os deixou mais confortável, principalmente Grissom. Quem os via ao longe pensava ser apenas mais um casal apaixonado de longos anos. De certa forma era verdade.

Mochilas atreladas, calças dobradas até o joelho e lá foram eles caminhar pelo entorno da praia até onde suas mentes os guiasse. Num certo momento, quando uma onda mais forte se quebrou na praia, Sara reagiu com um breve sobressalto, pegando Grissom de surpresa também. Foi a quebra do silêncio instaurado tempos depois de darem as mãos. A quebra da onda foi tão intensa que chegou a molhar a barra de suas calças. Desavisados ou distraídos poderiam tornar o evento um perigo.

— Você está bem?

Sara, que no momento agarrava seu braço por instinto, recompôs-se sem muita pressa.

— Quase levada pela onda, mas ok — respondeu zombando da própria situação, o que o fez rir. Em pouco tempo voltaram a caminhar e desta vez ela preferiu manter-se atada ao seu braço; melhor que do outro jeito.

Alguns metros de caminhada bastaram para que ela se deixasse levar por mais divagações. Em como seguiria sua vida sem estar coberta pela sensação de que seu corpo era uma armadilha ou coisa parecida, que agora não passava de mais uma pessoa no meio de tantas outras.

— Está gostando? — Grissom perguntou meio em dúvida, não muito tempo depois do pequeno susto. Tinha medo de que o silêncio prolongado de Sara significasse algo não muito bom.

— Não queria estar em outro lugar. — Ela se inclinou para ver sua reação. — Nem com outra pessoa.

— ... fico feliz em ouvir isso.

— Eu não estaria aqui se não fosse por você. — Enquanto dizia aquilo ela apertou seu braço de leve.

— De nada teria adiantado as minhas tentativas de convencê-la se você não tomasse aquela decisão.

Os lábios dela se curvaram num sorriso doce. Olhou para baixo e viu seus pés caminhando numa coincidente sincronia.

— Mas se você não estivesse lá, talvez eu... — Coragem lhe faltou para terminar aquela frase. Um "talvez" poderia ser um "provavelmente". Foram tantas vezes desejando não estar mais ali e desaparecer de uma vez que era difícil imaginar a si mesma pensando o contrário.

Agora ela sentia paz.

— O importante é que você está aqui.

Podia contar nos dedos os dias de paz que vivenciou nos últimos meses, anos até. Passar por um burnout, uma quase demissão e uma experiência aterrorizante da qual sequer tinha se envolvido faria qualquer um enlouquecer. Nunca mentiu ao dizer que estava a ponto de largar tudo; cansada demais de lutar contra a maré, perdeu todas as forças e o ânimo para continuar. Contrariando as próprias expectativas de que morreria na praia, lá estava ela caminhando sobre a areia, figurativa e literalmente.

— Não pense que me esqueci disto aqui.

Foi num dia desses que, chamada por Langston a se encontrar com ele no escritório, deparou-se com uma situação inusitada. Era tarde de uma noite um pouco fria; frente a frente com Sara, o cientista retirou do bolso a tal carta de despedida, e junto dela um isqueiro.

Ao ver aquilo riu ao se lembrar do pedido feito antes de realizar o procedimento. Passados tantos dias sequer poderia pensar que ele ainda se lembrava daquilo.

— Eu não a li, tem a minha palavra.

— Acredito em você. Mas quando eu disse para queimar foi... algo da boca pra fora.

— Eu sei. Mas eu quero que isto fique marcado entre nós como um novo início. Você terá todo tempo do mundo para conversar com ele agora, não precisa mais disso.

Tinha de admitir que aquelas palavras a pegaram em cheio. A partir daí não se opôs mais.

— Tá, você me convenceu. Vá em frente.

Ele acendeu o isqueiro e pouco a pouco Sara viu o papel dobrado vir às chamas. O coração pulsou forte e a pele se arrepiou quando viu o fogo atingir metade da carta. Todas aquelas palavras de uma mensagem nunca entregue, agora consumidas para sempre. O final para a carta foi ter sido jogada numa lixeira de metal frente a ela, enquanto terminava de queimar. Fim do pesadelo.

— Esta carta não lhe serve mais. Não serve para os vivos.

Ela estava viva. Viva! Era tão difícil admitir a si mesma que não precisava mais temer a morte antes iminente... Ganhou a liberdade de ir e vir novamente, de planejar seu futuro, de caminhar junto do homem que amava tendo para si o prazer de acordar ao lado de Grissom pelos próximos dias, próximas semanas, ou até anos. Talvez nunca tenha experimentado a real sensação do que era aquilo.

— Obrigada.

Era livre. Mais livre que as ondas do mar presas num círculo eterno de ir e voltar. Podia bater no peito, olhar para aquelas ondas e dizer que era livre.

Sara mal percebeu que foi parando de caminhar aos poucos. Grissom que, curioso ao notar que ela se soltou de seu braço sem querer, virou-se para trás e a viu encantada pela vista do fim de tarde. As nuvens do céu pinceladas com uma tonalidade alaranjada ao centro, enquanto o rosa, o anil e o cinza cobriam pouco a pouco os últimos raios de sol como um cobertor para alguém prestes a dormir. Nuvens traiçoeiras que vieram do mar logo cobririam todo o céu num ataque impiedoso, trazendo chuva logo mais.

Olhos acorrentados ao mar, ela retirou os óculos e o boné, desatou o casaco preso à cintura e tirou a mochila das costas. Virou-se apenas para deixar aquelas coisas na areia seca e, sem pestanejar, caminhou em direção às ondas.

— O que está pensando... Sara?

Ele não pôs muita fé no que ela imaginou fazer de início, mas quando a ficha caiu já era tarde.

Sara foi caminhando em frente, atraída pelo mar e ignorando quaisquer outras vozes que não fossem de seu coração. Andou sem parar até que as ondas se quebrassem à altura acima do joelho e então se lançou nas águas. Se pensasse demais acabaria desistindo da ideia e por isso não pestanejou ao fazê-lo. Deu um único mergulho, como se lavasse todas as impurezas do passado e prestes a começar uma vida nova em seu presente e futuro. Não havia tempo para pensar o quão imprudente ou rebelde aquilo tenha sido porque ela só pensava nisto; uma necessidade que corpo, mente e alma pediam.

Nos poucos segundos em que permaneceu debaixo d'água viu sua vida passar diante de seus olhos fechados. Viu o sofrimento de uma vida e o quanto lutou para sair disso. Sentiu ter o poder de seguir ainda mais fundo naquele mar e retornar num piscar de olhos. Sentiu o corpo pulsar com o movimento das águas, parecendo fazer parte delas e sentiu que poderia fazer qualquer coisa.

Todavia, a razão lhe falou mais alto e ela teve de voltar ao mundo real.

No instante após emergir, ela balançou a cabeça rapidamente e esfregou as mãos no rosto. As roupas encharcadas pela água penaram um pouco em seu retorno. Ao voltar, Sara cambaleou um pouco e foi recebida por Grissom antes mesmo de pisar na areia seca, que a esperava demasiadamente preocupado e que tomaria uma atitude caso ela demorasse a sair da água. Ela voltou com um sorriso cansado de orelha a orelha.

Segurando a toalha usada no piquenique, Grissom cobriu-a e envolveu os braços em seus ombros para aquecê-la.

— Estou tentando encontrar um motivo para o que acabei de ver, mas eu não consigo! — Ele comentou, voz exaltada e um pouco traumatizada, mas ao mesmo tempo aliviada por ela ter voltado logo.

— Eu tinha que ir. Eu tinha que... — Ofegante, Sara parou de falar e se deixou rir um pouco. A adrenalina era tanta que o frio ainda não incomodava.

Ele sequer poderia imaginar o que se passava na mente dela.

Tentando secar-lhe o rosto quase que inutilmente, viu que seu sorriso espontâneo não se apagava.

Deus.

Foram poucos segundos que despertaram nele uma extrema preocupação que beirava o desespero. E se algo desse errado, ou e se a corrente fosse tão forte que ela não conseguisse voltar em segurança? Se encontrava mais adepto a tirar umas férias; reais desta vez.

— Você me assustou.

— Desculpe...

Ao recolher seus pertences largados por ali, ele a fez se sentar na areia junto dele quando percebeu que sentia cansaço pelo esforço físico repentino. Foi seu momento para respirar um pouco e se recompor do que acabou de presenciar.

— O que faremos agora, hein, querida? — perguntou carinhosamente enquanto a cobria melhor com tecido. Como ela não trouxe outras peças de roupa, estaria sujeita a adoecer com mais facilidade. Ligar para alguém no Complexo não iria adiantar, já que a espera pela carona poderia ser perigosa; passível de deixá-la à mercê de alguma doença respiratória.

Sem ideia do que responder, ela se limitou a focar seu olhar nas ondas que ousou enfrentar há pouco. Mesmo acanhada sobre o tecido, Sara não mostrou remorso ou arrependimento, pelo contrário, sentia orgulho do que fez. Grissom pôde decifrar isto em seus olhos; ainda assim, raiva ou chateação passavam longe dele. O máximo que conseguiu sentir foi medo e preocupação pelo que houve. Raiva, não.

— Eu tive que... me provar se estou... viva.

Olhos fechados e voz embargada, ela buscou se aquecer naquele abraço cada vez mais apertado. A brisa vinda do mar não lhes daria trégua e ficariam ainda piores com o passar do tempo.

Aquelas palavras o pegaram de jeito. Mesmo que tentasse entender ou colocar-se em sua pele, nunca conseguiria saber de tudo que se passava em sua mente naquela hora. A experiência pela qual Sara passou deve ter sido agonizante, desde o começo até o final daquele procedimento.

— Espero que... tenha encontrado suas respostas.

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A chuva parecia persegui-los a todo instante. Sorte a deles, ao menos, que tiveram a chance de aproveitar o passeio ao ar livre antes que ela viesse.

Ele sequer pensou duas vezes ao escolher a melhor opção. Optou pelo hotel mais próximo, um pequeno edifício a uma rua dali onde poderiam passar a noite e, além disso, levar as roupas molhadas de Sara para a lavanderia. Apesar do olhar torto da recepcionista, conseguiram uma vaga para um quarto no terceiro andar. Era bem simples, à altura do valor cobrado. Decorado ao estilo inglês, dava a impressão de terem voltado ao passado. Mas era aconchegante para um casal despreocupado; desta vez tinha uma cama um pouco mais espaçosa que a do quarto de Sara no Complexo. O banheiro era apertado, porém tinha chuveiro com água quente e apenas isso foi o bastante para conquistá-los.

— Pronto, feliz agora?

Sara deixou o banheiro vestindo somente um roupão de banho — cortesia do hotel — e o encontrou terminando de arrumar o jantar numa pequena mesinha próxima à janela. Pediu o que seus olhos o fisgaram mais e um prato vegetariano especialmente para ela.

Ao vê-la usando aquele roupão — e somente aquele roupão — tentou disfarçar um sorriso descarado, chegando a se virar de costas e voltar a dar atenção à comida.

— Mais do que imagina.

Grissom aproveitou a cortesia e vestiu um roupão também. Ao retornar para o quarto ele tomou um banho e deixou que as roupas tomassem um pouco de ar.

Um jantar ao suave som da chuva que caía lá fora marcou a ocasião. Falaram pouca coisa como de costume. Para não deixar o período de silêncio se estender tanto, todavia, Grissom chegou a sugerir um novo passeio; uma visita à grande estátua de Buda que ficava no lado oeste da ilha. Ela aparentou não dar muita atenção ou importância no que disse, mas na verdade pensava em outra coisa.

— Está tudo bem? — perguntou ele ao notar que estava um pouco avoada.

— Hã?

— Aquilo… Lá na praia. — Grissom disfarçou. — Você… eu não sabia que…

— Eu não queria te assustar, me desculpe. — Sara respondeu deixando escapar uma risada. — Me desculpe, eu… estava sentindo um vazio. Tive que provar que isso tudo era real mesmo.

Ao encará-lo nos olhos foi como se o brilho de outrora nele se apagasse aos poucos.

— Isso não é culpa sua, Gil. — Ela ressaltou. — É… às vezes parece que tudo isso aqui é uma ilusão, não sei explicar... Você… você não tem culpa de nada.

Sem perceber de cara ela parou de comer o restante do jantar e deixou o garfo sobre o prato. Sorriu envergonhada e cruzou os braços ao se retrair por alguns instantes.

— É reaprender a andar, enxergar o mundo de novo — explicou enquanto brincava com o laço do roupão.

Ele não devia estar surpreso. Há pouco tempo ouviu de Langston que muito provavelmente Sara enfrentaria um processo gradual de recuperação. Seu corpo retornara ao normal, mas os danos psicológicos e emocionais ainda estavam lá. Uma espécie de sombra, um resquício do passado que ainda iria acompanhá-la por um tempo e que para eliminá-los seria necessário todo o apoio possível; profissional e pessoal.

— Você não precisa pedir desculpas, Sara. — Ele replicou compreensivo. — É bom saber que você está progredindo.

— Você acha? — perguntou curiosa. Nesse meio tempo lhe mostrou um sorriso.

— Acho.

Ela sorriu em resposta.

— Eu fico feliz que tenha aceitado receber a análise — comentou despretensiosa.

— Você não iria desistir até que eu aceitasse... — Grissom deu de ombros, sorrindo sarcasticamente.

— Queria ter certeza que está tudo bem, mesmo que você continue sendo um desafeto dele.

Ele revirou os olhos por um instante e não ligou se seria visto ou não por Sara.

— Não vou te obrigar a nada, só não quero que... isso prejudique você de alguma forma.

Sara não podia entrar em sua mente. Não podia imaginar como foi encarar tudo aquilo no ponto de vista dele para compreender toda aquela mágoa contra Langston e sua equipe.

— Agradeço a preocupação comigo, mas... — Grissom ergueu a mão. — Deixe isso para o tempo. Vou ficar bem.

Não foi exatamente a resposta que Sara quis ouvir, mas foi um começo. O começo de uma longa jornada, talvez.

— A melhor coisa que poderemos fazer será aproveitar esses dias sem preocupações.

O que aparentava ser uma melhora na condução daquela conversa, no entanto, pareceu ter voltado à estaca zero.

— Você não devia ter feito isso.

— O quê?

— Você sabe do que eu estou falando — replicou chateada. — Não devia ter adiado sua volta. Três semanas? Percebe o que acabou de fazer?

Quase dez segundos de silêncio se passaram até que ele respondesse. Ele deixou de dar atenção ao prato já vazio para fitá-la nos olhos.

— Sim. — Assentiu. — Eu não poderia ir embora sem saber o resultado do seu exame.

— Isso poderia ser resolvido com um telefonema. Como vai se explicar para eles agora? Vai dizer que foi um imprevisto? Você sabe que não é assim que as coisas funcionam.

— Eu vou resolver isso.

— Ah, Gil — sussurrou irritada. — Meu Deus.

Para não tornar o clima ainda mais desagradável, Sara decidiu levantar dali em direção ao banheiro. Antes de sair, parou frente ao pequeno espelho e se apoiou na pia. Olhou para baixo, na direção das mãos e lembrou-se da imagem que talvez nunca iria meses atrás. A sensação de que a qualquer momento partes de seu corpo pudessem desaparecer a ainda a assombrava. Cada dia era um passo adiante para se acostumar com a “nova velha vida”. Mas não foi apenas por isso que se levantou da mesa. Atrás daquelas paredes havia alguém que arriscou acabar com a carreira para estar ali e que se colocou ainda mais no limbo ao adiar seu retorno aos Estados Unidos por um pouco mais de tempo. Ela, ao contrário de Grissom, ainda teria de ficar mais um pouco para concluir os estudos sobre aquela anomalia e acompanhar o progresso de sua recuperação. Um prolongamento de sua estada que poderia se tornar algo permanente dependendo de suas escolhas.

— Como vai resolver isso? — Ela o questionou assim que saiu do banheiro, encontrando Grissom no mesmo lugar que estava anteriormente.

— Hã…? — Pego de surpresa, não compreendeu o que Sara quis dizer na hora. — Oh, bem… Vou saber quando chegar lá. — Deu de ombros.

— Gil, não brinque com uma coisa dessas. — Sara soltou um suspiro cansaço. Desistiu de voltar à mesa e se sentou à beirada da cama. — A gente tá falando de você, do seu emprego.

— E o seu emprego? — perguntou persuasivo.

— Eu nem estou mais considerando essa possibilidade.

Era um passo de cada vez numa escada quase sem fim. Voltar ao seu país já seria um movimento cansativo, arriscado demais para alguém que praticamente se acostumou a viver ali. Voltar ao seu emprego no Laboratório de Criminalística ainda era uma visão distante demais, seria sair da sua zona de conforto.

De onde ele estava ficou observando o semblante cabisbaixo de Sara contagiar até mesmo sua postura. Nunca foi seu desejo preocupá-la por conta de sua decisão, já que achava melhor ficar mais um pouco e lhe dar todo apoio necessário.

— Querida, ei. — Ele foi ao seu encontro e sentou-se na cama, bem ao seu lado. — Não queria que se preocupasse comigo. Vou ficar bem. Nós vamos.

— O que acontece depois disso tudo? — Sara se virou em sua direção.

— Eu gostaria de ter a resposta para isto. — Ao baixar seu olhar ele notou que a mão de Sara estava próxima, então a entrelaçou junto da sua, ergueu-a e beijou seu dorso sem pressa. — Vamos pensar nisso depois.

— Sequer já imaginou que alguém do trabalho deve ter desconfiado da nossa partida, Gil? — Que alguém ligou os pontos e de repente descobriu que você pediu licença só por minha causa?

— Talvez. — Ele deu de ombros. — Mas voltar correndo não vai adiantar muita coisa a essa altura — brincou. E percebendo que suas palavras não surtiram efeito, ele resolveu mudar o foco. — Uma coisa de cada vez. Por agora… Eu não quero mais nada, a não ser desfrutar de sua companhia.

Levou muito tempo para Grissom finalmente reconhecer seus próprios sentimentos, que realmente estava apaixonado por Sara. Quase perdê-la foi o choque de realidade para acreditar que não podia passar mais nenhum minuto distante dela.

Quando ergueu seu olhar, admirou-se ao ver que ela mantinha sua atenção voltada para ele. Pareceu tê-la convencido a aceitar sua ideia, atraída por palavras tão doces.

— Você não voltaria agora mesmo se eu pedisse, não é?

— Não acho que esta ideia seja viável — brincou.

Ela meneou a cabeça rapidamente. Ainda continuava na defensiva.

— E se… alguma coisa acontecer com-

— Sara. — Grissom tratou de intervir desta vez.

— O quê?

— Por muito pouco eu não perdi você. — Ele foi claro e direto quando disse aquilo. — A única preocupação que eu desejo agora é saber o que vamos comer no café da manhã.

Ele acabou com seus argumentos. Às vezes era difícil para entender que tais insistências não os levariam a nada. Preocupava-se em excesso com questões que deviam ser deixadas de lado, ao menos por enquanto.

De repente Sara se viu capturada por suas palavras. Encarava-o perplexa, presa em seu olhar cativante e preocupado com ela.

— Nada — continuou ele. Ergueu sua mão novamente, beijando-a de modo semelhante ao que fez antes, mas desta vez seus olhos se mantinham fixos nela. Olhos que ardiam de paixão e desejo; nem isso pôde passar despercebido por Sara. Suas defesas se esvaíram. — Apenas isso.

Percebendo que ela abriu mão do cabo de guerra, envolveu a mão em seu rosto e o virou em sua direção para enfim beijar seus lábios preguiçosamente, adiando o término pelo maior tempo possível.

Sentir as mãos dela em sua nuca foi a chance de continuar. Gentilmente fez com que deitasse na cama e a acompanhou, pondo-se não muito acima dela.

— Você acha que eu iria querer voltar logo agora? — Grissom disse aquilo bem próximo dos seus lábios. Sara não conseguiu segurar o riso, mesmo virando o rosto para não se deixar levar. Ele aproveitou a chance para beijar seu pescoço.

Não dava para se apaixonar mais por aquele homem. Ou será que isto era possível? Vê-lo ali, dividindo a mesma cama que ela, se declarando sem a menor hesitação e ousadamente parecia coisa digna de um longo sonho. Será que era isto mesmo? Que nunca deixou aquela câmara e estava fadada a viver num vazio eterno, à mercê de seu inconsciente enquanto pouco a pouco sua vida ia se esvaindo?

— Olhe até onde você chegou, querida.

Para alguém que desacreditou em uma chance de cura, aquilo foi mais que uma vitória para ela. Parecia que finalmente Sara havia deixado de lado todo aquele receio.

— É bom estar de volta — comentou por entre um riso.

— Não sabe o quanto estou feliz por ter você de volta. — Ele declarou.

— Me mostra.

Talvez ela precisasse de mais um incentivo para provar que estava viva. Foi a oportunidade perfeita para que ele provasse suas palavras.

Grissom estava louco por ela. A cada dia que se passava só conseguia afirmar aquele fato cada vez mais. Louco, desesperado por envolvê-la e ser envolvido por ela em sua atmosfera particular. Mais do que isso, era comemorar a nova vida que ela recebeu ao sair do Hades de uma vez por todas.

A fenda de seu roupão, apesar de mínima lhe era convidativa, então ele depositou um único beijo por ali enquanto sua mão descia por entre esse espaço até encontrar o laço do roupão. Desatou-o sem muito esforço e dividiu a peça de roupa o suficiente para seus olhos se deitarem com a beleza daquele corpo. Mudou seu foco para aqueles lábios que ansiava tomá-los para si mais uma vez e se afundou em um beijo ávido. Sequer precisou auxiliar as mãos ágeis e sorrateiras de Sara que já buscavam desfazer o nó de seu roupão. E ela o fez sem pestanejar e sem perder o foco naquela boca voraz que não se dava por satisfeita. Foi uma questão de tempo até que os roupões fossem retirados com naturalidade.

Sem mais preocupações. Sem sustos. Sem medo. Ainda havia muito a ser feito, um caminho inteiro pela frente naquela jornada de retorno aos trilhos. Mas o maior passo já foi concluído e havia muito para se orgulhar: Sara fez história.


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Notas finais do capítulo

É, nem tudo dura para sempre. Tá na hora de fechar mais um ciclo e entregar uma fic que, inesperadamente, se alongou um pouco mais do que eu esperava, tanto no tempo quanto em capítulos kkkkk

Obrigada a todos que leram até aqui. Foi uma experiência interessante, algo bem louco. Talvez vocês me verão em breve com outro projeto, não sei dizer quando, mas vamos ver...

Até mais.



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