O Canto da Fênix escrita por AnnaBrito190


Capítulo 7
Sol Nascente III




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/799738/chapter/7

Quando Azizi olhou pela janela o sol já havia nascido. Alguns pássaros cantavam e a atmosfera dava uma sensação de irrealidade. Perdido em seus pensamentos ele acariciou sua pulseira inconscientemente.

Durante a jornada até o Vale do Sol Nascente ele teve pesadelos recorrentes, demônios internos o estavam devorando, trazendo de volta a sensação de estar afundando em areia movediça. Mas os olhos gentis de Erasto sempre estavam lá para mostrar que ele não estava sozinho.

Nas duas primeiras noites sendo membro interno da seita ele não dormiu, assim não houve pesadelos, tudo que ele fez foi cultivar e vigiar para que seu coração não cedesse aos seus demônios internos. Sua mente deveria ser imperturbável, corpo e alma em harmonia canalizando a energia presente no ambiente.

Um som à porta o tirou de suas divagações. Azizi se levantou e abriu as duas folhas, parado em frente à entrada estava o sênior Hirun.

“Sênior” Azizi o saudou automaticamente com as mãos em concha e inclinando levemente a cabeça.

“Júnior”

Hirun observou Azizi e não pode deixar de pensar que o uniforme da seita caia bem nele. O cabelo de Azizi estava preso em um coque alto, a fita do mesmo tom do uniforme abraçava o coque e caia levemente sobre os seus ombros, uma franja completava o quadro emoldurando o seu rosto. Certamente as irmãs da seita suspirariam pelos corredores.

Os olhos de Hirun terminaram o passeio nos de Azizi. Aqueles olhos azuis safira pareciam serenos como um lago.

Hirun notou que Azizi esperava pacientemente ele anunciar o seu propósito e sorriu.

“Meu quarto não é muito longe do seu e é a caminho do refeitório. A essa hora deve estar cheio, venha, vou conseguir um lugar para você”

“Obrigado pelo problema sênior Hirun”

“Não há necessidade de agradecer. Vamos”

Caminhando até a edificação onde se localizava o refeitório Azizi notou que muitos estavam correndo por um lugar no refeitório enquanto outros passavam comendo pãezinhos e conversando. Havia também aqueles que passavam com livros na mão ou apenas com suas ferramentas espirituais em direção à algum pátio para praticar.

Ao entrar no refeitório as conversas foram sessando e os pares de olhos voltaram-se para Azizi, seguindo-se de cochichos.  Olhos atentos mediram Azizi dos pés à cabeça, em alguns a inveja brilhava ao ver o pingente de jade branco, dentre os olhares também tinha admiração e espanto.

“Oh, quem diria que o terceiro ancião voltaria com um discípulo tão bonito” Uma irmã suspirou baixinho para o seu grupo, suas bochechas coraram levemente. Com o cotovelo na mesa ela levou sua mão ate o rosto e o apoiou enquanto seus olhos seguiam Azizi.

Vendo sua irmã aprendiz absorta um dos discípulos masculinos à mesa torceu a boca de desgosto antes de comentar. “Beleza não garante permanência na seita”

“Aiah irmão mais velho, você só está com ciúmes porque a irmã mais nova não vai mais olhar pra você” Outra menina que estava ao lado dele retrucou enquanto o cutucava com o cotovelo.

Com um sorriso lascivo e um tom zombeteiro um jovem da mesma mesa completou: “Há quem só aceita discípulos pela beleza. Além do mais, fora da seita com a beleza dele certamente não faltaria teto e comida sendo oferecidos”

Hirun lançou olhares severos em direção aos comentários e Azizi apenas abaixou os olhos enquanto andavam na fila para pegar o café da manhã. Ele realmente se arrependia de ter praticado inédia no dia anterior, se tivesse vindo antes o band-aid já teria sido arrancado, assim evitando expectativas e o aumento das fofocas.

Após pegarem suas bandejas com pães a vapor e sopa eles se acomodaram em uma mesa junto com alguns seniores. Hirun os apresentou brevemente. Sentada a frente de Azizi a discípula Violeta sorriu para ele amigavelmente.

“Irmãozinho, espero que se adapte logo a vida na seita. Não é emocionante como viver lá fora, mas tem seus benefícios. Se precisar de algo é só avisar e me conte se esses idiotas te intimidarem” Violeta piscou para ele é sorriu ainda mais.

Dun que estava ao lado dela quase cuspiu a sopa ao escutar a última parte.  “Eh? Você é a única que nos intimida!”

“Aiah, vocês não conseguem ver o sol nem quando está a sua frente” Violeta retrucou.

Azizi sorriu ao ver a interação entre os irmãos de seita. Aquela era sua nova casa, certo? Ele pode se permitir a ter isso? Ficaria tudo bem se sim?

O refeitório já parecia normal, sem todos os olhos prestando atenção nele. Azizi suspirou de alívio antes de ouvir algumas conversas sussurradas sobre ele.

“Didi, a posição dele sendo discípulo do terceiro ancião é acima da nossa.”

“Humpf. Entrou agora e já temos que tratá-lo como sênior”

“Irmã, talvez se nos aproximarmos dele com o tempo talvez ele diga boas palavras sobre nós para algum ancião. Não seria bom se cairmos nas boas graças de algum deles?”

Azizi escolheu os ombros e restringiu sua consciência espiritual. Na sua mesa os irmãos ainda implicava um com o outro, ver aquela interação o fazia esquecer suas preocupações e possivelmente feliz.

***

O tempo estava ameno e o sol brilhava timidamente na decima hora do dia, era de fato o fim do alto verão. Mais cedo no refeitório Violeta comentou que em dois meses haveria uma cerimônia de adoração aos deuses e respeito aos ancestrais, então todos poderiam descer a montanha para o festival de outono.

“As luzes do vale só perdem para a capital. Você já viu? É mais bonito que os fogos de artifício do ano novo”. Ela disse.

Azizi olhou através da janela pensando que seria agradável descer a montanha e participar do festival com eles. No gramado lateral à biblioteca alguns discípulos mais novos se divertiam com truques e talismãs, pregando peças uns nos outros.

“Com licença, sênior. Esse é o mapa do continente?”

Voltando-se para a fonte da voz Azizi encontrou uma criança de tez rosada o encarando. As mãos de Azizi deslizaram pela superfície do papel, seus olhos desviaram para a mesa. Havia uma pilha de livros, tinteiro, pincel e anotações, no meio de tudo estava um grande mapa, o qual o menino se referia.

“Sim”

“Oh. É tão grande”

“O irmãozinho nunca viu antes?”

“Respondendo ao sênior, este irmão é ignorante, nunca teve uma educação formal e só sabe de passagem a história do nosso reino”

“Você é novo aqui, certo?”

“Sim, sênior.”

Ao escutar a afirmativa Azizi suspirou e deu permissão para que ele ficasse mais próximo, de forma que fosse fácil visualizar os detalhes do mapa. Deslizando o dedo pelo mapa Azizi começou a sua explicação.

“Esses são os cinco reinos: Iwin, Aren, Ayo, Mutegi e Wammai. Assim como o nosso reino, os outros quatro reinos foram batizados com o nome da casa regente. Nosso continente não era muito pacífico, havia muitas guerras e as pessoas sofriam muito. Há mais entre o céu e a terra que o mundo do cultivo, o sofrimento pode vir de muitas fontes além do cultivo maligno. Dizem que as cinco casas imortais se juntaram para pacificar o continente, assim o dividindo em cinco reinos de acordo com a localização de suas terras ancestrais.

Os imortais governam sobre os humanos deste continente desde então, mantendo a paz. Não há guerras entre reinos e disputa pelo trono desde a fundação dos cinco reinos, mas é fato que muita coisa se perdeu com o tempo.

Iwin é dividido em sete estados. Ibituruna, Luan, Ubá, Ubá do Norte, Costa Brava e Águas Claras. O vale fica aqui, ao leste de Ubá do Norte, perto do estado Costa Brava. A casa real pertence aos imortais, mas o irmãozinho já deve ter percebido que o sistema político não é dominado pelo mundo do cultivo, nós apenas coexistimos”  

“Sênior. Os imortais, é verdade que eles descendem de bestas místicas? Eles não são humanos?”

“Talvez sim, talvez não. Também dizem que eles descendem dos deuses. Talvez sejam apenas uma das vidas dos deuses de passagem pela terra”

“Oh” O menino parecia um pouco espantado e pensativo com as possibilidades. Azizi achou a reação da criança um pouco fofa e não pode deixar de sorrir.

Azizi pegou um caderno de capa de couro e ofereceu para o garoto com um sorriso amigável “Você precisa praticar a escrita e aprender o máximo de caracteres possíveis para entender mais da metade do conteúdo disponível aqui no nível um da biblioteca. Leve esse caderno, tem anotações que serão úteis”

O menino pegou e o encarou pensativo, Azizi não se importou com a reação da criança e se voltou para sua pesquisa.

“Sênior, você acha que os deuses escutam quando rezamos?”

Sem desviar os olhos dos livros Azizi respondeu: “Talvez”

“Então vou rezar por você no festival do outono. Você parece ter uma vida difícil. Obrigado pelo caderno, sênior.”

A surpresa dominou Azizi, seu corpo ficou rígido e um suor frio escorreu por suas costas, quando Azizi levantou os olhos para o menino ele já não estava mais lá. O coração de Azizi ficou inquieto, ele podia sentir que havia algo de errado, mas logo veio em sua mente a voz do seu mestre dizendo que ali era um lugar seguro e o seu coração logo se acalmou.

Depois de terminar sua pesquisa Azizi decidiu se inscrever na turma do mestre em ervas da seita. Aprender com ele seria era muito útil na sua visão, pois ele teria conhecimento em ervas para refino, ervas para cura e envenenamento. Compre um e leve três.

O caminho dele estava se estreitando, ele podia sentir até os ossos que era questão de tempo. Não seria uma má ideia se tornar um médico e viver o resto dos seus dias pacificamente, e por mais que ele não gostasse da ideia de aprender a fazer venenos sabia que era necessário para saber como curar.

Seguindo até o Pavilhão das Flores, onde o mestre em ervas se encontrava, Azizi parou em uma bifurcação olhou e para o caminho que seguia até a residência do líder da seita. A lembrança do seu primeiro dia com aquele bolinho grudento correndo atrás dele veio a sua mente e com um suspiro Azizi se perguntou por onde Ravi andava.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Canto da Fênix" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.