The Call escrita por LisRou


Capítulo 2
À flor da pele - Parte II


Notas iniciais do capítulo

Devorem a parte 2 sem moderação, porque ela promete. ♡



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POV. Susana

 

Conforme eu atravessava os corredores, mais escuro ficava e menos pessoas perambulavam por ali. Ao contrário do que minha consciência afirmava — voltar para a festa e esquecer esse desejo repentino absurdo —, eu queria me arriscar, queria descobrir o que tinha no final daquele caminho e no que me daria nele.

Ou a quem daria.

Mais uma vez, aquela inclinação, aquela força sobrehumana na qual era inexplicável para a minha razão me impulsionava a caminhar mais rápido, deixando o grande Salão e todo o resto para trás, até parar abruptamente e, com um suspiro, eu o avistei.

A abertura daquela sacada era iluminada pela luz do luar. Apoiado sobre o batente, com as costas largas levemente inclinadas e com a cabeça voltada para cima, observando as estrelas sobre sua cabeça, Caspian admirava o céu, imerso em pensamentos. E sozinho.

Meu coração tropeçou forte no peito, acelerando o pulsar violento entre as costelas. Seu perfume me entorpeceu por um momento, me deixando à deriva das sensações intensas que perputavam por toda minha corrente sanguínea e me esqueci de tudo, me concentrando somente nele. Em seus cabelos, agora tão negros que refletiam a luz prateada da lua, a postura que, mesmo inclinada, pertencia a de um rei, seu traje imponente e bem elaborado envolta daqueles ombros largos e de toda sua altura. Involuntariamente prendi meu lábio com os dentes, sem conseguir deixar de contemplá-lo.

Sem conseguir me conter:

— Também gosta de admirar as estrelas?

Minha voz poderia ser confundida com um sussurro, mas fora o suficiente para chamar sua atenção. Antes que eu pudesse respirar, preparar o meu coração para o baque que seria seus olhos sobre mim, Caspian se virou.

As íris de ônix, agora iluminadas pela luminosidade da noite estrelada, colidiram com as minhas e tudo que consegui fazer fora prender a respiração, completamente cativada pelas profundezas delas. Eu não tinha forças para emergir, porque a cada segundo que se passava, eu mergulhava naquela escuridão perfeita, especialmente no brilho prateado que pintou suas pupilas conforme ele me analisavam. Caspian passeou seus olhos pela minha silhueta e, meu Deus, se respirar já parecia impossível com sua fisionomia diante de mim, ele me observando daquela forma então...

Eu pedi para que as servas fizessem um vestido que não fosse exagerado, e graças aos céus eu fui atendida, não dando tanta importância aos acessórios também. Meus cabelos estavam soltos, livres de qualquer presilha, de modo que minhas mechas castanhas escorriam em camadas pelas minhas costas. Um vento sorrateiro soprou uma delas em minha boca, e eu a afastei. Meus lábios estavam rosados, um pouco escuros, quase na mesma tonalidade que a frente do meu vestido. Diferente dele, minhas mangas eram douradas e iam até meus cotovelos, protegendo-me do frio da calada da noite de Cair Paravel, mas intensificando o calor incomum e inapropriado que aflorava desde o meu peito, até toda extensão do meu corpo. Admirar a beleza de Caspian, ainda mais com ele vestido ao que me parecia um uniforme de honraria Real, digno de sua majestade, tornou tudo ainda mais intenso.

Ainda me admirando, Caspian ergueu o canto da sua boca, me despertando do topor. Eu sacudi levemente a cabeça e permiti que minhas bochechas esquentassem, porque não daria para ele reparar com a escuridão da noite.

Eu acho...

— Desculpe, não quis atrapalhá-lo — interceptei o silêncio e fui girando o corpo. — Eu vou voltar e dei...

— Não, não atrapalhou — a voz grave e arrastada soou rápida e precisa, sua mão se erguendo aberta na minha direção, incitando-me a parar. — Você nunca atrapalha.

É claro que meu coração idiota falhou uma batida outra vez. Claro! Por que isso ainda me surpreendia?

Talvez seja porque isso estava fora do meu controle. Eu odiava quando as coisas fugiam do meu controle. Especialmente quando não conseguia compreendê-las.

Me aproximei dele devagar, ignorando o receio de vez, e parei ao seu lado, apoiando minhas mãos no batente, sentindo a brisa soprar e arrepiar minha pele.

— Eu costumava contemplar as estrelas com meu pai — ele disse, observando o céu, alguns fios dos seus cabelos se movendo com suavidade. — Era uma espécie de ritual para nós dois.

— Ele devia ser um pai e um rei e tanto... — Comentei, virando meu rosto para encará-lo. Caspian ainda admirava o céu estrelado, e agradeci aos céus por isso, porque assim poderia observá-lo sem receio. Admirar principalmente o sorriso cheio de saudade que se abriu em seus lábios bem desenhados.

— Ele foi, sim. — Proferiu, a lateral do seu rosto denunciando seu encantamento e admiração. — Me espelho nele todos os dias. Como o homem que ele foi, mas também agora como monarca.

— Você se sairá bem, não tenho dúvidas — eu disse, voltando a contemplar o céu como ele. Só que, ao contrário de mim, Caspian voltou a me encarar. — Já provou que é nobre e que tem um coração de ouro como imagino que seu pai tinha.

Não falei aquilo da boca para fora. Na verdade, eu senti como se meu coração proferisse por mim.

Mirei meus olhos nos seus novamente, e o que eu enxerguei neles foi o suficiente para fazer com que a gravidade ao nosso redor parecesse não existir, a atmosfera cada vez mais quente e espessa.

Eu quebrei o encanto.

— Meu pai também observava as estrelas e as contava comigo — uni minhas mãos por cima da saia.

Caspian ainda me olhava.

— Sente falta dele? — Ele questionou depois de um tempo, girando o rosto para frente, mas dessa vez não aos céus. Seu rosto estava direcionado à paisagem escura, mas ele parecia não enxergá-la de fato, como se algo o incomodasse. — Sente falta do seu mundo?

Eu suspirei, permitindo escapar o ar dos pulmões pelo peso repentino da sua pergunta.

— Nunca vemos o papai — expliquei, sentindo uma pressão aguda no peito. —  Graças à maldita guerra, nenhum de nós temos mais acesso à ele como gostaríamos. Como ao que era antes.

— Perdoe-me — Caspian girou a cabeça de supetão para mim e franziu o cenho, me fazendo observá-lo. — Em seu mundo há guerra? 

Eu fiz que sim.

— Sim. Uma guerra que parece ser infindável — grunhi, estalando a língua e revirando os olhos. — Mas ela não é parecida com as guerras daqui... Na verdade, até as guerras de Nárnia são mais interessantes.

Meu comentário surtil o efeito que esperava: aquela rendoma pesada se dissipou e um sorriso se abriu na boca dele, para logo em seguida uma risada rouca escapar da garganta.

— E desde quando uma guerra é interessante?

— Desde quando se há arco-e-flecha, espadas, e um Leão poderoso ao nosso lado!

Sorrimos juntos ao que me pareceu por um momento inteiro de alegria e cumplicidade. Que escolha maravilhosa eu fiz de me afastar do grande salão...

— Eu poderia viver para sempre aqui e não sentiria falta de lá — eu confessei como em um sussurro depois de um tempo, mas pela expressão de Caspian, ele me ouvira. Na verdade, parecia que tudo nele estava atento em mim. — A única coisa que me entristeceria seria estar longe dos nossos pais, mas o resto... 

— Você trocaria tudo para viver aqui? — Senti sua voz ficar urgente, mais grave que o normal, e ao encará-lo, pude perceber aquele brilho prateado se expandido enquanto me encarava profundamente, como se pudesse contemplar a minha alma.

Eu seria capaz?, sinto meu coração soprar a questão, para em seguida correr feito um alucinado.

Se fosse para ficar ao seu lado...

— Se fosse para ficar ao... — Parei de falar, assustada, completamente sem acreditar que quase permiti meu coração responder por mim de novo. — Eu acredito que... Se eu tiver um motivo muito forte para ficar, com certeza eu optarei de me estabelecer aqui.

Caspian assentiu, ainda perdido em seus próprios pensamentos. Eu daria tudo para saber o que se passava com ele, mas algo me impeliu. Eu tinha uma coisa a fazer. Tinha que deixar clara a minha gratidão que antes não consegui lhe dizer.

— Obrigada — eu disse com urgência, umidecendo meus lábios com a língua. O gesto não passou desapercebido por ele.

— Pelo o quê? — Quis saber, rouco.

— Por salvar a minha vida.

Soltei de uma vez e ele encrespou um pouco suas feições bonitas. Depois, quando a compreensão o atingiu, ele suavizou as sobrancelhas, o canto dos lábios levemente se sobreerguendo num sorriso de tirar o fôlego.

— Por que você me seguiu? — Perguntei com a voz trêmula, imersa em seus olhos.

O sorriso sumiu da sua boca e deu lugar à uma expressão intensa, urgente, como sempre tivera quando me observava. Era como se ele tivesse tomado uma decisão.

— Porque eu senti que precisava salvá-la — ele disse, se aproximando do meu espaço pessoal até ter praticamente um dos botões da sua farda colado na minha barriga. — Mesmo você não querendo sua trompa, senti que precisava encontrá-la, Susana.

— Caspian... — Suspirei, fechando meus olhos, o músculo em meu peito ameaçando destroçar meus ossos. Sinto sua respiração soprar em meu rosto, eriçando meus poros, atiçando o meu corpo e meu coração. — Você... Você também sente? Essa...

— Essa força que me leva até você e a pensar em você a cada maldito segundo? — Sua mão grande subiu até meu rosto, pousando na minha pele, o polegar passeando preguiçosamente pela minha bochecha até o canto dos meus lábios. Eu abri minhas pálpebras,  observando-o tão de perto. Sim. Era exatamante isso que eu sentia. E constatar que ele sentia isso também me trazia um alívio, uma felicidade inominável.

Eu não era a única.

— Sim — eu consegui dizer, erguendo minhas mãos e tocando seu peitoral sob o traje. Mesmo assim, o tecido não fora capaz de reprimir o calor da sua pele. — Eu não entendo...

— Eu entendo — ele ainda soava urgente, fazendo com que meu coração pulsasse ainda mais acelerado. — Não há criatura mais bonita, mais encantadora para se admirar. — Sua outra mão se encaixou em meu rosto e eu senti que lágrimas quentes começaram a se formar no cantinho das minhas pálpebras. Meu Deus, eu nunca senti nada parecido, nada tão intenso quanto eu sentia comigo assim, em seus braços. — Eu não consigo parar de olhá-la, não consigo parar de pensar em você, Susana. Desde o primeiro instante que a vi, meu fôlego, meu raciocínio pareceram não existir. É isso que acontece comigo toda vez que a vejo, que ouço a sua voz, que contemplo seus olhos de turquesa.

Acho que suas palavras poderiam me causar uma parada cardíaca, mas o que eu poderia fazer além de ouvi-las e as sentirem ecoar por cada canto remoto de mim?

Eu inclinei meu rosto para nunca interceptar aquela colisão de olhar e finquei meus dedos em sua roupa. Meus lábios secaram, minha boca salivou, e meu corpo se acendeu em expectativa porque, por todo aquele instante, eu quis beijá-lo.

— Eu nunca senti isso por ninguém... — Confessei sôfrega, e mesmo seus olhos sendo negros, eu pude enxergar suas pupilas se dilatarem com minha declaração. Era a verdade mais profunda de dentro de mim, afinal. — Não sei se é o certo, não sei por quanto tempo ficarei aqui, mas sei que... Caspian, a chance de ficar longe de você é insuportável.

— Não se detenha nisso, minha rainha — como se fosse possível, ele se aproximou ainda mais de mim, de modo que meu corpo se encaixou por completo no seu. Se fosse outro homem, eu não permitira, eu o empurraria para longe, mas Caspian... Caspian podia tudo. E a maneira que ele pronunciava "minha rainha" era profunda demais... Cheio de significado embutido que somente agora percebi. — Estamos aqui agora. E se depender de mim... Estaremos juntos por toda vida.

Eu sabia que era loucura, que tudo aquilo poderia ser considerado precipitado, mas não em Nárnia. Não com Caspian. Em tão pouco tempo, em todas as vezes que estive com ele, que treinamos e lutamos juntos, eu poderia colocar a minha mão no fogo para afirmar que nunca, em toda a minha vida, eu senti algo parecido.

E era maravilhoso me sentir assim. Maravilhoso e assustador demais. Eu precisava de Caspian. Precisava dele porque sem ele... como eu poderia suportar?

Eu não tinha palavras para expressar o que meu coração sentia, por isso agi conforme guiou meus instintos: mesmo estando com o rosto cativo em suas mãos, eu conseguir ficar na ponta do pé e toquei seus lábios com os meus.

Fora apenas um encostar. Um encostar suave que fez meu peito vibrar e uma emoção inusitada eclodir de dentro de mim. Inepta a fugir, a me afastar, eu inclinei meu rosto, fechando meus olhos, aderindo o toque da sua boca inflamando o meu coração.

Caspian afastou a cabeça devagar, repuxando meu lábio inferior minimamente, até sua testa pender na minha e suas mãos não libertarem meu rosto. Eu abri meus olhos e eles se chocaram com os seus, inflamos e atentos em mim. O tempo que ficamos assim, nos olhando depois do toque, nossas respirações se entrelaçando como névoas, incertos de como agir, fez com que meu peito subisse e descesse rápido demais e, por um instante, tudo o que eu quis era que ele não se afastasse.

Não me deixasse.

Com esse pensamento entorpecendo qualquer linha coerente da minha cabeça, cativeira de seu olhar e cheia de ousadia, espalmei as mãos em seu abdômen firme, e enrosquei os dedos nas dobraduras de seu paletó. Foi um pedido silencioso. Uma súplica.

Uma entrega à ele sem precisar de palavras.

E aquilo transportou Caspian ao inflamável. Vi seu autocontrole que exercia em si mesmo perder as forças: suas íris se incendiaram, e, com urgência, seu braço contornou minha cintura e meu corpo colidiu ao seu com a mesma ferocidade de sua boca na minha.

Seu ataque reverteu meus sentidos e nada no mundo me preparou para a impetuosidade de seus lábios. Fiquei tonta, buscando apoio em seus ombros conforme ele agora intensificava o beijo. Foi selvagem, arrebatador, como se há muito tempo estivesse esperando para me envolver em seus braços e me beijar com todo esse ímpeto. E, ah, eu correspondia com a mesma veemência, na ponta dos pés, tentando acompanhar o seu ritmo, agarrando seus fios negros como um refúgio às emoções intensas e afloradas de dentro de mim.

Todo aquele calor que andava fervilhando, explodiu com violência quando sua boca macia, tão quente, se abriu para sugar meu lábio inferior com os dentes, os dedos em meus cabelos se contraindo de leve, a mão espalmada em minhas costas me impelindo de encontro a seus contornos ásperos como se não estivéssemos próximos o bastante. Um gemido abafado escapuliu no fundo da minha garganta ao mesmo tempo que me segurei em seus bíceps duros.

Ele se curvou ainda mais sobre mim, minhas costas se arqueando para acompanhá-lo a ponto do corpete se deslocar. Fiquei sem fôlego e entreabri os lábios para poder respirar. Então, Caspian fez algo escandaloso, me profanando com insanidade ao enfiar sua língua quente em minha boca. A invasão vibrou por todo o meu corpo, arrepiando minha pele sensível. Tentei corresponder a espécie de dança sinuosa e enlouquecedora, e não resisti de correr a ponta da língua em seu lábio inferior, bem ali, onde fizera o mesmo com o meu, o ponto um pouco mais áspero que o restante da pele macia. Um som profundo ecoou pela garganta de Caspian, que soltou meus cabelos para me abraçar com ainda mais urgência, até meus pés saíram da grama. Seu cheiro misturado ao seu sabor, e seu coração retumbando com violência de encontro ao meu embotaram meus medos, meus sentidos, e tudo em que consegui pensar foi o quanto eu nunca estive tão inteira, tão destemida como agora. O quanto tudo que vinha me sentindo tomou proporções altíssimas com este encaixe.

Se ele não parasse, eu desmaiaria. Se me soltasse, certamente morreria.

E Caspian não parou. Me beijou até minha respiração ficar curta demais, como se a mera ideia de separarmos fosse eloquente, doloroso além das medidas. Me beijou até meu coração bater tão forte contra as costelas que temi que pudessem estourar. Até eu me dissolver em seus braços fortes, me perdendo por completo, me encontrando naquele homem.

Aos poucos, a urgência se tornou menos feroz, transformando-se em águas pacíficas como o mar de Cair Paravel que nos presenciava e, mesmo assim, tão inebriante quanto antes. Cada nervo do meu corpo parecia mais vivo, exposto, sensível até mesmo ao leve resvelar do tecido de minhas roupas, do toque dos meus dedos em seu maxilar anguloso, da aspereza dele e de seu queixo contra o meu.

Mordiscando meus lábios com suavidade, Caspian interrompeu o beijo, me colocando de volta no chão, mas me manteve no maravilhoso cativeiro de seus braços, a testa colada à minha. Soergui as pálpebras devagar, me deparando com suas faces abrasadas pelo fogo que vislumbrei em seus olhos, me admirando. Parecendo arrebatado, ele deslizou os dedos pela minha bochecha, a linha da clavícula, o queixo...

— O que você fez comigo? — Um rugido suave, parte confusão, parte deslumbramento, ressonou pelo seu peito.

Eu não consegui respirar ou raciocinar direito, totalmente embriagada por ele. Desprendi as mãos de seus fios grossos, espalmando-as em seu peito rígido para ter algum equilíbrio. A confusão que ele expressou naquele franzir de sobrancelhas competia com a pergunta insistente nos seus lábios semiabertos. Mas o que mais me tirou o fôlego, a ponto de me sentir caindo num abismo infinito, foi a constatação do que sempre foi tão certo dentro de mim.

Caspian, tornou a sussurrar o meu coração.

Ah, pelo Grande Leão...

Assustada, eu me forcei a impulsionar meu corpo para longe do dele. No entanto, não foi necessário muito esforço, porque Caspian me soltou completamente, impondo alguns metros entre nós. Correu uma das mãos pelo cabelo escuro, como se isso pudesse desanuviar os pensamentos.

— Perdão — sua voz saiu rouca, áspera, provocando pequenos abalos em cada uma das minhas terminações nervosas. — Não pretendia tocá-la dessa maneira. Não agora.

Céus, eu sequer poderia imaginar que fosse assim. Não pensei que um beijo pudesse despertar tantas emoções, provocar tantas sensações. Longe do calor de sua boca, do seu abraço, dele todo, meu coração questionava aflito o porquê dele não me beijar uma segunda vez. Me envolver em seus braços fortes e encaixar minhas curvas no seu corpo másculo como se fossem esculpidos assim desde a criação.

Meus olhos se arregalaram de súbito conforme um pensamento conseguiu emergir em meio à confusão que se instaurara em minha mente.

Um dia eu poderia partir. Não sabia quando, ou como, mas qualquer dia aqui em Nárnia poderia ser o último. E pensar nessa alternativa me desesperava porque, meu Deus, eu estava tão confusa... Tão inerte em nada que não fosse ele. Se eu não saísse dali, certamente faria com que acontecesse de novo.

E de novo, de novo...

O pior de tudo é que isso poderia se intensificar conforme ficamos assim, entregues à essa força e a esse sentimento poderoso. A partida seria dolorosa demais para suportar.

Cobri a boca, que ainda formigava, em completo horror. Ah, minha nossa! Como pude? Como pude deixar me levar dessa maneira?!

Parecendo partilhar do meu tormento — não soube discernir se era pelo beijo ou pelas circunstâncias que nos metemos —, Caspian inspirou fundo, pressionando sua têmpora e cuspindo uma infinidade de palavras que não eram cortês. Ainda mais pelo seu tom. Ele soltou o ar com força, a veia em seu pescoço estufada pelo, ao que me pareceu, seu autocontrole novamente, parando a meio metro de onde eu estava.

— Não quero que pense que me aproveitei da situação para isso — ele soprou, a seriedade muito visível em seu rosto. — Sinto muito que tenha sido desrespeitoso, majestade. Beijá-la... — Grunhiu, mirando meus lábios, a neblina intensa e ímpeta retornando em suas íris. — Beijá-la há muito se tornou o meu mais profundo desejo, de modo que não sei o que me aconteceu. — Com muito custo, ele contemplou meus olhos novamente, passeando-os pelos meus traços. Meus poros se arrepiaram.

Eu engasguei, tentando me recompor ao engolir em seco.

— Tudo bem — minha voz soou enrouquecida da mesma maneira. Meus lábios estavam quentes. — Eu... — Naufraguei em suas íris, vendo-as se conterem a todo custo, seu semblante tão bonito, sua boca avermelhada... Ah, eu também me continha. A qualquer momento, poderia ceder a pressão do meu coração e me jogar em seus braços. — Eu preciso ir.

O olhei uma última vez, notando-o em consentimento para que eu me afastasse dali o mais depressa possível.

E, com o coração na garganta, padecendo em agonia com a mera ideia de me afastar, assim o fiz. E neste exato momento, fogos de artifícios começaram a explodir sobre nossas cabeças.

Literalmente.

Cores reluzentes decoravam o chão conforme eu andava, deixando a sacada para trás. Pessoas passavam por mim, indo até ela para observar o espetáculo, mas eu não consegui me virar, tão pouco deixar de prosseguir o meu caminho para bem longe dele. Em passos sôfregos, ergui um dos lados da minha saia para ser mais rápida e alcancei o salão. Incapaz de controlar minhas emoções e de encarar outro ser humano, segui o caminho até fora do castelo, passando por alguns pedestres, o ar saturado com o aroma de conhaque. Contornei a estrutura grandiosa, alcançando a areia da praia, tentando normalizar a respiração, mas as sensações não iam embora. Minha boca ainda fervilhava, o coração ainda mantia um ritmo doentio, a pele em meu queixo ligeiramente abrasada pelo contato com seu queixo.

Assim que me encontrei diante das águas geladas de Paravel, eu fechei os olhos e toquei os lábios, ainda carentes de calor. Eu não sabia muito sobre beijos, mas estava convicta de que aquele me marcou para sempre. Foi tão... tão certo. Tão único.

Unicamente com Caspian.

De repente, senti que alguém me observava. Uma sensação pesada se abateu pelo meu corpo e, antes que eu pudesse refrear, eu virei meu rosto em direção às árvores, encontrando o olhar do Grande Leão me observando na calada da noite. 

 


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Notas finais do capítulo

Obs.: Sei que o castelo da coroação do filme não é Cair Paravel, e sim Telmarino, mas tomei a liberdade colocá-lo porque será necessário no decorrer da história. E super simbólico também.

Eitaaa que eu fiquei sem fôlego com a Susana. Não consigo não shipar esses dois, sério mesmo.
E Aslam? Algo me diz que esse Leão sabe muito mais das coisas que pensamos, hein.

Espero que tenham gostado de ter perdido o fôlego também. Kisses! ♡



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