Bloody Devotion escrita por Eliander Gomes


Capítulo 23
Monstros do passado.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/799702/chapter/23

Lenore parecia levemente irritada com Simon.

— Por que disse aquilo para aqueles homens?!

— A que se refere?

— Fazendo-os pensar em voltar para nos atacar novamente, ficou louco?!

O lorde sorri, virando seu rosto para a janela da carruagem.

— Não se importe com isso, Lenore.

Ela suspira, abrindo seu leque.

— Deixando isso de lado, no fim das contas foi bom termos nos encontrado com eles.

— Lorde Von Burker, não é?

Alice reage ao ouvir o nome do sujeito.

— Sim, senhor.

— Ele foi seu antigo mestre?

— Sim.

Simon percebe o receio dela em sequer pronunciar o nome do homem.

— Tem lembranças ruins sobre seu passado, não é? Não vou forçá-la a dizer mais do que precisa.

Ela encara o chão da carruagem, pensativa. Logo em seguida ela se vira para Simon com um leve e breve sorriso.

— Obrigada, meu senhor.

O lorde fica curioso com o olhar da menina. Ele acaba deixando um rápido sorriso escapar.

— Me diga, Alice, o que acha dos vampiros? Não acha que somos monstros, como a maioria dos humanos?

Ela faz um rosto sério, ficando pensativa e encarando o chão novamente.

— No princípio, eu não tinha certeza do que esperar. Toda a minha vida, tudo o que eu sabia sobre monstros era o que lia em livros ou o que ouvia outros humanos dizer. Cresci com a ideia de que monstros eram inimigos da humanidade. Porém, após tudo o que passei, não posso dizer com convicção o que pode ser a definição dessa palavra.

— Que tipo de definição você daria? Mesmo que não seja uma definição convicta, diga.

Ela pensa um pouco e olha novamente para Simon.

— Se vampiros forem mesmo monstros, então para mim monstros são criaturas fantásticas e fascinantes.

Simon dá uma breve risada.

— Não se deixe enganar pelo que você conhece, garota. Vivendo neste mundo, cedo ou tarde, terás a real visão de um monstro. Vampiros não são monstros, e nem humanos ou elfos o são; embora entre todos eles existam alguns monstros vestindo suas peles.

A menina sorri, ficando pensativa logo em sequência, com um rosto sério. Lenore suspira, fitando Simon com uma expressão preocupada.

— O que vamos fazer agora?

— Aquele homem está tentando causar um conflito entre vampiros e humanos. Enviando mercenários para cá, de forma separada, ele incita-nos a uma guerra. Fazendo isso, para os humanos que não sabem sobre, vai parecer que nós demos o primeiro passo para a desordem. A longo prazo, isso vai gerar uma confusão sem precedentes.

— Bom, mas não é como se eles não fossem apoiar sua própria espécie se uma guerra acontecesse.

— Pode não parecer, Lenore, mas opinião pública é importante em uma guerra. Mesmo entre humanos, existem aqueles que não nos vê como uma ameaça, ou mesmo como monstros. Se uma guerra acontecesse, certamente haveria oposição entre os dois lados. Temo que o plano dele é destruir essa possibilidade.

— Fazendo com que toda a raça entenda nossa ameaça, ele teria certeza de que essa oposição não aconteceria, não é?

Tudo o que o sujeito precisava era de um estopim. Aquele provavelmente já deixara de ser um problema trivial. Os dois lordes continuaram pensativos e temerosos quanto a situação. Uma guerra entre criaturas inferiores e vampiros poderia ser catastrófica. Tanto Jasfik quanto Hastermash sentiriam isso.

A viagem pareceu um piscar de olhos com tantos pensamentos sobre as mentes do grupo.

E em pouco tempo eles se viram próximos a entrada daquela grande mansão.

A carruagem fora recebida pelos empregados da mansão, que se aproximaram dispostos a ajudar Simon com suas coisas.

— Não será necessário. — Pontuou o homem, rejeitando a ajuda. — Eu vou sair novamente. Onde estão meus irmãos?

— Aqui. — Respondeu Coraline, com um rosto sério e nada amigável. — Então, mal chegou e já vai sair novamente?

— Eu teria ido direto, mas não podia deixar de passar aqui para vê-la, minha irmã.

Ela faz um rosto de repulsa para Simon, apertando a bainha de sua espada.

— Não me provoque, Simon.

— Não estou. Onde estão os outros?

— Realizando seus afazeres.

— Nesse caso, desejo pedir-lhe algo, minha bela irmã.

— E o que seria?

— Fortifique a segurança da mansão em minha ausência.

— Por qual motivo?

— Nenhum em específico, apenas o faça.

Ela levanta uma sobrancelha em dúvida, enquanto encarava-o. Logo em seguida, ela desvia seu olhar, voltando-se para a jovem mulher que descera da carruagem.

— Lady Hagara? Ah, agora entendi... então é para lá que está indo.

— Coraline, como vai?

— Bem, senhora. Se me deem licença, tenho minhas próprias coisas a fazer.

— Sim, irmã. Foi um enorme prazer vislumbrar sua beleza, pode ir.

Ela bufa, apertando mais uma vez a bainha de sua espada, mas se vira e deixa o local. Lenore fez um rosto de dúvida enquanto encarava seu amigo.

— Por que implica tanto com ela?

— Não estou implicando, estou sendo sincero. Eu realmente a acho a mulher mais bonita do mundo.

— É mesmo? Mais bonita do que eu? — Pergunta ela em um tom de flerte.

— Sim. — Responde ele sem rodeios, deixando Lenore irritada.

— Olha aqui... esse não é o tipo de coisa que se diz para alguém com quem você já teve um caso...

Simon ri, seguindo para o prédio principal.

— Venham, tenho algo que desejo dar uma olhada antes de seguirmos viagem.

O vampiro seguiu com o grupo para dentro da mansão. Alice percebera que o caminho que tomavam era particularmente novo a ela. A garota jamais esteve naquela parte do prédio antes.

Tanto Lenore quanto seu servo pareciam conhecer bem o ambiente, e Alice percebia isso pela forma que eles seguiam Simon, quase como se eles não estivessem realmente o seguindo. A fala de Lenore, no entanto, confirmou a suspeita de Alice quanto a isso.

— Estamos indo para aquele lugar, não é?

— Sim.

— Acha que aquela coisa ainda está lá?

— Provavelmente. Se meu pai tinha intenções tão puras quanto ele demonstrava ter quando me deu o controle da mansão, provavelmente deixou aquilo bem guardado.

Lenore parecia levemente preocupada quanto a atitude de Simon. Ela estava pensativa enquanto andavam. Algo em sua mente a incomodava à medida que avançavam; algo que ela já havia confrontado Simon antes, há vários anos no passado.

— Se me permite perguntar, onde esteve durante esses anos, Simon?

Mantendo seus olhos distantes, o homem fez um breve silêncio antes de responder.

— Ocupado.

— Vai me dar apenas essa resposta?

Simon parou, fazendo o grupo parar também. Ele se virou para Lenore e a encarou com um semblante sério e pensativo.

— E que resposta você esperava?

— Eu não sei. Talvez algo mais longo?

Os dois se encaravam profundamente, a uma certa distância. O cintilar das lâmpadas a óleo preenchiam o silêncio que se formara entre os dois. Para Barkar, era nostálgico esse tipo de interação entre os dois mestres, mas para Alice, o clima estava um pouco confuso.

— Lenore...

— Não continue sua fala se não for me dar a resposta. Se não quiser me contar, tudo bem. Mas eu não quero ouvir mais desculpas. Não quero iniciar outra discussão.

Enquanto os lordes se encaravam, Barkar abaixou sua visão, pensativo. Alice fitava-os mantendo-se neutra, embora preocupada com o rumo da conversa. Simon virou-se, voltando a andar. A mulher suspira, decepcionada, mas apenas fecha os olhos e volta a segui-lo.

— Não vou esquecer-me desta tua decisão.

— Eu não desejo que esqueça. Em breve entenderá.

Lenore franze a testa, desconfiada, mas permanece em silêncio. Seguindo em frente, eles finalmente chegam a uma porta dupla, que Simon logo abre e revela uma grande sala.

O lugar parecia um depósito, com muitos objetos diferentes e bastante poeira. Desde armas e armaduras à utensílios de cozinha e ferramentas artísticas; a sala possuía de tudo.

Alice entrou e ficou deslumbrada com o lugar, virando a cabeça de um lado para o outro. Embora a poeira, tudo que a menina via a fascinava. Mas foi algo bem específico, algo pendurado à parede, que fez seus olhos pararem de se mover por um momento. Ela andou para mais perto e ficou parada em frente ao enorme crânio pendurado, encarando-o com bastante curiosidade. Simon percebeu no mesmo instante o olhar curioso da menina.

— Imagino que seja a primeira vez que vê um.

— Isso é um crânio de dragão?

— Sim.

O dragão que Simon derrotara em sua juventude, há vários anos.

Os olhos da menina dançavam sobre a peça que era maior que um homem adulto. Grandes chifres saiam de suas testas, suas presas eram longas e pontiagudas. A simples presença do objeto no lugar trazia consigo uma sensação de poder e intimidação para o ambiente.

— Imagino que não tenha vindo aqui para encarar o crânio de um dragão, não é?

As palavras de Lenore soaram um pouco rudes para os outros três, mas Simon achou compreensivo, visto que ela deveria estar um pouco irritada naquele momento devido ao que aconteceu mais cedo.

— De fato. — Comentou o lorde, voltando-se para um grande objeto coberto por um pano. — Este é o motivo de nossa visita.

Simon puxou o pano com cuidado, evitando a poeira de subir, revelando assim um grande baú.

Ele possuía muitos detalhes e era entalhado de forma sublime. Assim que o pano o revelou, várias escritas e inscrições começaram a brilhar, chamando a atenção do grupo.

— Uma caixa selada? — Perguntou Lenore.

— Sim. Eu apenas queria confirmar que ainda estava aqui.

— O que há dentro?

Simon encara a mulher, dando a ela a resposta que ela esperava apenas com os olhos.

— Eu estava certa então.

Simon encarou-a com certa hesitação, e a mulher percebeu. Este era um assunto antigo e delicado. Anos atrás, quando Simon ainda morava na região vampírica, ambos eram muito próximos. A luta contra aquela fera gigante que atacou seu território despertou em Simon um sentimento que só foi crescendo.

Após aquela luta, o homem mudou.

Lenore, no entanto, jamais julgou-o por isso. Ela o conhecia desde sua infância; ela entendia suas dores, ela sabia como ele pensava.

E então, a mulher assumiu a casa dos Hagara.

Ela era jovem, era inexperiente, mas ela ainda tinha a quem recorrer.

Simon a ajudou muito no início. Assim como o pai dele.

Quando Simon partiu, a mulher sentiu que algo fora arrancado dela.

A ausência de Simon tornou tudo mais difícil.

E não é como se Simon não entendesse isso. Ele sabia dos sentimentos dela.

Não existiam palavras no mundo que servissem de desculpas naquele momento, então a escolha que o homem fez foi o silêncio.

Mas ainda havia aquele objeto a frente do grupo.

— Não vai abri-lo?

— Não.

— Não me diga que não sabe como abri-la?

— Eu sei como abri-la, mas ainda não é a hora.

— Por quê?

— Porque quem abrirá esta caixa não serei eu.

O homem se vira para sua aprendiz, que o encara confusa. Ele retira algo do bolso, algo que Alice reconhecera no mesmo instante.

— Isso é...

— Reconheces?

— A caixa que o senhor utilizou no teste?

— Ainda lembra como abri-la?

A menina pega o objeto, e não demora muito para abri-lo. Ela pega o broche dentro da caixa e o entrega para Simon, mas o homem não o pega.

— Ele é seu, Alice.

— Meu?

— Sim. Você foi a primeira pessoa a abrir esta caixa em suas mãos.

Todos ali ficam surpresos, inclusive a lady Hagara.

— Eu não sei se entendi direito, senhor...

— Esta caixa em suas mãos é algo que fora deixado por meu pai, há anos atrás. Era um desafio, uma espécie de ultimato. Durante anos eu viajei o mundo na esperança de abrir este objeto. Aqueles pedaços de papel que distribuí durante o desafio foram pequenos avanços que eu consegui reunir durante estes anos, pequenas dicas..., mas mesmo com elas...

— Seria impossível abrir a caixa.

— Sim. E eu sei que você sabe disso, afinal, você a abriu.

— Não foi graças as dicas.

— Exato.

Lenore fica em choque com a fala dos dois.

— Simon... está dizendo que esta garota humana foi capaz de completar um desafio que nem mesmo você foi capaz de completar?

 — Sim.

Alice fica um pouco hesitante e perplexa, mas ela volta seu olhar para seu mestre mais uma vez.

— Mesmo assim, meu senhor, por que me dar isto?

— Porque eu acredito que você é a pessoa certa, a única capaz de utilizar o objeto que está dentro desta caixa.

Ela faz um breve silêncio.

— E o que seria isso?

Simon sorri, acariciando a cabeça de Alice.

— É um segredo, por enquanto.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Bloody Devotion" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.