Graveyard of Flowers — Gardenia escrita por crowhime


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Venho aqui com mais uma atualização! Espero que gostem!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/799038/chapter/3

Meus maus humores costumavam ser reservados às luas cheias, mas não consegui disfarçar a aura sombria que crescia em mim junto com o peso que se alastrava por meu peito. Meus amigos tentavam, ocasionalmente, me incluir na conversa, sem conseguir minha atenção, o que os levavam a se entreolharem, confusos, mas eu só ignorava. Não estava muito afim de papo – e minha concentração se dividia entre cutucar meu jantar e encarar a Regulus Black na mesa da Sonserina. Como se só o encarando fixamente, conseguisse atrair sua atenção para mim.

A certa altura, não soube dizer se deu certo. Talvez ele estivesse se sentindo observado e buscava de onde vinha essa impressão, ou talvez só procurasse por Sirius na mesa da Grifinória, mas por um breve instante, no qual o mundo pareceu parar, nossos olhos se encontraram em meio ao mar de alunos.

Regulus tinha uma figura elegante e, embora chamasse atenção, ele era discreto. Conversava com os colegas, mas ao mesmo tempo parecia manter certa distância. E eu queria quebrá-la. Já havia o feito uma vez, mas agora não tinha ideia por onde começar.

Aqueles segundos pareceram eternos. Podia ser só minha imaginação, mas era como se estabelecêssemos uma conexão apenas com o olhar.

Não durou muito. Crouch, que estava ao lado de Regulus, o envolveu pelos ombros e puxou, provavelmente tentando incluí-lo na conversa que acontecia ao lado. Regulus rapidamente tirou a mão dele de cima de si, mas naquele meio tempo que Barty o trouxe para perto, vi quando ele me encarou e mostrou a língua para mim – como se, de modo muito infantil, estivesse exibindo um prêmio. E isso não era minha imaginação.

Senti meu rosto se avermelhar de fúria e finquei com mais força o garfo na minha comida. Se algum dia eu pensei algo bom de Barty Crouch Jr., esqueçam. Ele definitivamente é um completo idiota.

Meu gesto não passou despercebido por meus amigos, que calaram a boca imediatamente, cessando o que quer que estivessem falando, e me olharam. James pigarreou, sinal de que tomaria a frente, usando um tom condolente – que eu odiava, diga-se de passagem – para falar.

— Remus. Aconteceu algo? Sabe que pode falar com a gente.

— Não aconteceu nada.

Tentei sorrir, sem muito sucesso.

— Vamos lá, Aluado. — Sirius abaixou o tom, envolvendo meu pescoço bem como Barty havia acabado de fazer com o irmão dele e, só de lembrar, senti meu sangue borbulhar. — Não tem que esconder.

Tentei falar, mas agora foi a voz de Peter que me cortou:

— Pois é, ainda nem é lua cheia, então deve ter acontecido algo...

Eu respirei fundo. Não gostava de descontar minha raiva em meus amigos, mas sentindo um olhar vindo da mesa da Sonserina sobre mim – Regulus, mais uma vez – eu tirei o braço de Sirius de cima. Provavelmente não é como se ele estivesse olhando para mim, especialmente agora que ele me tratava como um ninguém, porém de todo jeito me incomodou.

— Eu estou bem. Eu só... quero ficar um pouco sozinho. Ok?

Não fiquei para ouvir os cochichos sobre mim que eu sabia que viriam. Eu sabia que eles falavam sobre mim. Mesmo que fosse apenas preocupação comigo e geralmente sobre a licantropia, eu me sentia um pouco cansado de ser tratado como o doente e frágil – essa era a sensação que eu tinha sempre que eles começavam a ser cuidadosos demais comigo. Levantei-me da mesa, deixando meu jantar pela metade, decidindo dar uma volta antes da patrulha noturna. Não estava com fome e um pouco de ar fresco poderia ajudar a clarear minha mente. No entanto, a última pessoa que queria ver naquele momento veio ao meu encontro.

— Escondendo sua cara patética, Lupin?

A voz de Bartemius soou atrás de mim enquanto eu andava solitário pelos corredores. Não o ouvi se aproximando. Eu a reconhecia exclusivamente porque eu não conseguia parar de pensar no que ele havia me dito. Cerrei os punhos, mas inspirei profundamente pelo nariz e me virei com toda calma que consegui.

— O que quer, Crouch?

Ele sorriu torto, as mãos nos bolsos de modo casual, porém eu não confiava em sua postura aparentemente amigável. Não podia ser boa coisa ele interromper o jantar para vir atrás de mim, então fiquei pronto para sacar minha varinha a qualquer momento.

— Não precisa ficar tão na defensiva, Lupin. Só estive... observando. — Continuava a sorrir de canto enquanto se aproximava de mim, rodeando-me como se eu fosse sua presa. — Você sabe, como você não tira os olhos do Reg. Não tem vergonha na cara? Não satisfeito com aquele traidor, tem que ir atrás dele também? Você não se enxerga?

Precisei apertar os lábios, controlando a vontade de mandá-lo para o inferno – e outros lugares menos agradáveis.

— O que você quer, Crouch? — repeti, dessa vez lentamente, sublinhando cada palavra o máximo possível. — Eu tenho mais o que fazer, se só veio falar isso.

Bartemius parou a minha frente, seus olhos escurecidos me encarando com a raiva queimando em suas íris. Contive a vontade de recuar, mesmo com a distância que havia entre nós, sustentando o olhar.

— Eu já te avisei, Lupin. Não estrague ainda mais a vida do Regulus. Da primeira vez, fiz um alerta amigável, mas se insistir, não vou ser tão gentil da próxima vez.

— E por que eu deveria te ouvir? — encontrei coragem para desafiar — Se você está tão seguro assim da sua relação com ele, não precisaria vir me falar essas coisas, mas me parece que não é o caso. Acho que é você quem não confia no próprio taco. Ele quem deve escolher. E não você.

Soltei um riso, tirando sarro e podendo sentir o gosto da vitória ao ver Bartemius tirar aquele sorriso idiota do rosto. Eu preferia evitar brigas – especialmente porque eu tinha um distintivo de monitor a zelar – no entanto aquele garoto estava me tirando do sério. O que ele achava que sabia? Talvez ele fosse um bom amigo para Regulus. Ele parecia ao menos, pelo pouco que pude ver ao longo dos últimos meses. Mas isso não queria dizer que podia tratá-lo como sua propriedade!

— Ele já escolheu, Lupin. — Barty disse em tom de alerta, sibilando cheio de veneno. — É por isso que ele não se lembra de você. E nunca vai lembrar. Mas quer saber? Não é como se você pudesse reclamar. Já é tarde para se arrepender. Você pediu por isso.

Em um impulso guiado pela raiva, saquei minha varinha em um movimento rápido e a apontei direto para o rosto de Bartemius enquanto rangia os dentes. Ele sequer piscou, o sorriso que crescia em seus lábios beirando o sádico. E eu percebi que estava caindo no jogo dele: Barty queria que eu fizesse exatamente aquilo. Ele queria que eu o atacasse.

Eu não podia dar esse gostinho a ele. No entanto, a vontade de arrancar à força aquele sorrisinho da cara dele era grande. Eu estava ponderando fazê-lo quando – surpreendentemente – quem me impediu foram meus amigos. Eles vieram ao meu encontro e, percebendo o que acontecia, correram para ficarem ao meu lado.

— O que está acontecendo aqui? — James questionou, pronto para voar no pescoço de Crouch se preciso.

A voz alerta dele me fez relaxar um pouco a postura, enquanto Crouch apenas deu de ombros, o sorriso ainda em seus lábios.

— Não se preocupe, Potter. Nossa conversa já acabou. — Ele sentenciou, lançando em minha direção um último olhar sinistro. — Nos vemos por aí, Lupin.

Eu senti o alerta naquelas palavras.

Ao invés de sentir medo, minha vontade de fazê-lo engolir aquelas palavras só cresceu.

Talvez Crouch estivesse certo. Podia ser minha culpa que Regulus escolheu esquecer-se de mim. Porém ao menos agora eu sabia com o que estava lidando. Ainda não sabia seus motivos de tomar uma decisão tão radical, mas tinha um ponto de partida com o qual trabalhar. E agora, eu estava determinado.

Só não sabia ainda se queria compartilhar meus pensamentos e as ameaças de Crouch com meus amigos. Nenhum de nós tinha uma relação muito boa com a Sonserina e eles estavam bem menos dispostos a tentar. E Sirius ainda tinha o agravante de ser o irmão mais velho de Regulus: ele podia dizer que não, mas sabíamos que ele podia ser um tanto quanto protetor quando resolvia se importar. Peter já havia descoberto a essa altura, por isso nunca mais falou tão mal de Regulus – como se houvesse um limite até onde Sirius permitia que criticassem seu irmão.

No entanto, eu também compreendia que não podia me esquivar para sempre. Eu estava escondendo muitas coisas. E uma delas seria difícil, se continuasse persistindo: minha tosse parecia piorar com o passar dos dias – não era muito, eu podia passar horas sem tossir ou cuspir uma pétala sequer, mas não conseguiria esconder dos meus colegas de quarto caso continuasse assim. Eu anotei mentalmente que precisava ir à enfermaria antes que isso acontecesse e consegui evitá-los de imediato devido à patrulha que precisava fazer, mas, quando cheguei no dormitório, eles estavam acordados me esperando. James e Sirius estavam bem despertos, Peter quase dormia sentado, porém quando eu entrei Sirius puxou a coberta dele, acordando-o no susto. James e Sirius cruzaram os braços, me encarando com aquele olhar de expectativa que fazia parecer que eram minhas mães cobrando alguma explicação – e nem minha mãe de verdade costumava fazer isso.

Eu suspirei e os ignorei por um instante, entrando no jogo do silêncio enquanto trocava de roupa e me preparava para deitar.

— E então? Vai nos falar o que houve? — James tomava a frente como costumeiramente fazia. — Qual é, o Crouch está te perseguindo?

Não era difícil adivinhar que eles só queriam um motivo para entrar em uma briga com Bartemius. James estava se tornando mais responsável desde o incidente com Snape, entretanto eu sabia que ele ainda não hesitaria em brigar com um aluno mais novo se necessário.

— Se ele fez algo, só precisa me falar, eu já estava doido pra querer a cara dele. Não engulo esse cara com meu irmão...

Sirius resmungou e me senti desconfortável. Eu sabia que eles imaginavam que precisavam me proteger. Sirius, em especial, via a mim – e principalmente a Peter – como mais fracos.

— Não foi nada, ok? — Tentei amenizar os ânimos. — Ele só quis me dizer que... que Regulus não se lembra de mim e nunca vai lembrar.

— Quê?

Sirius foi o primeiro a reagir com indignação, achando um absurdo a ideia de seu irmão ter perdido a memória. Precisei explicar como a informação devia ser real, como ele parecia não me reconhecer mais e toda a indiferença. Isso deixou Sirius enfezado, com uma expressão pensativa.

— Feitiço de memória, talvez?

Peter levantou o questionamento. Nenhum deles imaginava algum motivo para ter chegado a esse ponto – Sirius até levantou a hipótese de que talvez seus pais tenham descoberto que o filho mais novo andava com um mestiço sujo e queriam evitar isso, mas a descartou uma vez que duvidava que Regulus escaparia tão facilmente apenas perdendo a memória. Eu queria dizer que ele estava exagerando, porém eu tinha medo de que sim, Walburga e Orion Black poderiam chegar a esse ponto. Nessas situações, eu sempre me pegava pensando que tinha sorte de ter pais amorosos, mesmo sendo como eu era.

Mais uma vez, Peter sugeriu que Sirius tentasse falar com o irmão para descobrir o que houve. Talvez para um familiar ele se abrisse. A sugestão seria boa, não fosse o relacionamento conturbado de ambos. Nesse momento, o silêncio pesou no cômodo e James disse que por hoje deveríamos encerrar a questão e discutir depois de descansar. E eu não podia ser mais grato pela interrupção.

Eu não consegui deixar de me questionar se havia o feito sofrer ao ponto de fazê-lo achar que era melhor não se lembrar. No fim, mal consegui dormir: minha noite foi atormentada por sonhos. No principal deles, eu estava protegido pela sombra de uma árvore antiga, em um campo tão vasto que não conseguia ver seu fim. A grama verde brilhava sob os raios quentes do sol que nascia, tingindo o horizonte com vários tons suaves de rosa, amarelo e azul. Nada tinha a ver com um pesadelo. A paisagem era quase etérea – até eu perceber que em meu colo, amparado por meus braços, estava o corpo de Regulus Black, seus olhos fechados como se adormecido, porém seu torso estava coberto com diferentes tipos de rosas coloridas sobre o uniforme preto, cintilando com o orvalho do início da manhã, como se seu corpo tivesse se tornado um cemitério de flores que se estendia pelo campo.

Acordei transtornado, bem mais cedo que o usual. O sonho era quase poético, mas eu só conseguia sentir algo entalado em minha garganta e com a sensação, a urgência de escapar daquele quarto sufocante e respirar um pouco do ar frio da manhã.

Eu queria ficar sozinho e colocar a cabeça em ordem. Após o calor da discussão com Crouch ter passado, parte de mim me dizia que era melhor ouvi-lo. Não pelas ameaças, mas porque eu não tinha direito de falar ou sentir qualquer coisa por Regulus. Se ele realmente me amou, eu havia perdido minha chance e seria egoísta simplesmente ir atrás dele agora que ele estava feliz com outra pessoa.

O mais engraçado era como Hogwarts, às vezes, parecia saber o que eu estava pensando. O que era loucura – não havia como o castelo saber o que eu sentia, certo? No entanto, mais de uma vez, trombei com Regulus pelas escadas e corredores – não exatamente trombar, mais especificamente passamos um pelo outro. Eu sentia algo diferente nele. Ao contrário de antes, ele me encarava. Não era como antes, quando ele passaria por mim sem sequer se dignar a me olhar como se não me conhecesse, e isso por si só já parecia um avanço. Essas pequenas coincidências me fizeram perceber que talvez nem tudo estivesse perdido.

Era só um pouco. Quase nada, na verdade, uma evidência quase nula. Mas quando nossos olhos se encontravam, Regulus era rápido em desviar os dele e fingir prestar atenção em seja lá o que seus amigos falavam. E não havia traços de desprezo como eu esperava. Por um ínfimo segundo, eram os olhos solitários que eu vim a conhecer tão bem.

Eu estava sendo um idiota. Não bastava ser minha culpa: não é como se Regulus fosse um amor sensato. Não só era irmão mais novo de um dos meus melhores amigos, como tinha amizades duvidosas. Vinha de uma família duvidosa. E havia uma guerra lá fora, prestes a estourar em nossos colos. Porém eu não conseguia também julgá-lo por seus pares como Sirius tinha tendência a fazer em seus momentos de explosão, por vezes falando como ele era só uma marionete de sua família.

De fato, eu era a última pessoa a conseguir julgá-lo.

Eu sentia que éramos mais similares do que parecia a princípio. Claro, vínhamos de realidades diferentes, vidas diferentes, contextos diferentes. Contudo, Regulus era sobrecarregado de expectativas – enquanto eu não queria trair as de meus amigos. Ambos éramos, cada um de seu jeito, omissos – e eu não me orgulho disso. E sequer precisava tocar no tópico para sentir isso. E não é como se eu quisesse também. Eu preferia a realidade simples em que não éramos nada além de nós mesmos.

Resolvi que pro inferno Crouch e suas ameaças. Eu iria me aproximar de Regulus mais uma vez.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Graveyard of Flowers — Gardenia" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.