Sara entrou no carro de Roberto, e percebeu ele quieto. Calado. Ele havia colocado a chave na ignição quando Sara colocou a mão sobre a mão dele, o fazendo parar o que estava fazendo. Ela sabia que ele estava chateado, não queria uma briga agora, não com ele, que sempre estava do seu lado. 

— Roberto… – Ela começou a se explicar. – Eu sinto muito que você tenha ficado chateado pelo abraço que ele me deu. Eu não queria te fazer passar por uma situação assim, mas é que Gil… 

— Não Sara... – Ele interrompeu com um tom baixo. – Você não precisa se explicar. – Ele se virou para ela. – Na realidade, eu que tenho que me explicar. Eu quero que você entenda que eu... Eu não sou perfeito, eu tento ser perfeito para você, mas eu não sou...

— Eu não preciso que seja perfeito!

Roberto apenas levantou a mão, de forma delicada, como se pedisse que ela se silencia-se e o deixasse falar. 

— Sara, eu sinto felicidade, tristeza, alegria e frustração. E eu sinto ciúmes. Eu sempre senti ciúmes de você com o Grissom, muito antes de saber que ele tinha interesse em você. E até um pouco de inveja. – Ele pode perceber ar de surpresa no olhar castanho. – Vocês moram na mesma casa, você dorme e acorda lá, tem filhos com ele, ele está mais perto de você e vocês dois tem uma ligação muito forte por causa das meninas, você mesma disse, uma ligação inquebrável. E te ver morando lá, tendo essa ligação e, principalmente, sabendo dos sentimentos dele por você, é torturador. Ainda sim, eu entendo, eu compreendo, mas as vezes, tem momentos em que eu simplesmente não consigo suportar. Principalmente agora, que Elizabeth está aqui, e eu não posso estar por perto como antes. 

— Roberto, eu...

— Sara, por favor, me deixa continuar. – Ele suspirou. – Ainda sim, eu entendo, de verdade. Eu entendo mesmo. Você está em um momento delicado da sua vida, sua primeira filha doente e agora internada, ainda está conhecendo a segunda e gerando o terceiro, ou terceira. Você está sob intensa pressão, Gilbert, querendo ou não, é pai das meninas e parte da família, e ele vai buscar apoio com você e você com ele. E eu confio, eu confio totalmente em você. Você me quis, você me escolheu, você está comigo e estamos juntos, de forma completa. Eu só sei que você é a mulher mais incrível, digna e honesta que eu já conheci, e eu sei, que seus sentimentos por mim são sinceros, e eu morro de medo que eles mudem, por que sei que se um dia deixar de gostar de mim e começar a gostar de outra pessoa, até mesmo do Grissom, você vai me falar, na minha cara, ainda que doa. E isso me apavora, ao mesmo tempo que me encanta, por que eu sei Sara, que você nunca irá me usar, me enganar. E eu confio em você. – Ele levou a mão até o rosto de Sara e acariciou com carinho. – Só que como te disse, eu não sou perfeito, e as vezes eu tenho sentimentos que eu não consigo conter, como o ciúme infundado ao ver vocês abraçados e tão próximo como nos últimos dias. E você tem o direito de abraçá-lo, ele também está triste e é o pai de Júlia, ele também está sofrendo. Nós todos estamos, nós todos amamos a Jujuba. Eu só sai por que precisava ficar um pouco sozinho, e colocar meus pensamentos em ordem, para não ser injusto com você, nunca suportaria te magoar, com gestos ou palavras. Por isso, quando eu estou triste, frustrado ou com ciúme... Eu prefiro me isolar.

— E agora? Você quer ficar sozinho? – Sara se resignou, emocionada com as palavras de Roberto. – Eu… Eu te entendo, e eu gosto que você seja sincero comigo. Se você quiser ficar sozinho agora, eu vou entender, eu posso ir sozinha na consulta e...

— Agora, não mais. – Ele sorriu a interrompendo novamente. – Desculpa pelo meu egoísmo. Péssima hora para me isolar. Eu sei que precisa de mim, e eu prometo que vou estar ao seu lado. E te apoiar.

— Você está sempre do meu lado e me apoiando. Você não precisa ser perfeito Rob, só precisa ser você mesmo.

…

A consulta de Sara confirmou a presença de somente um feto, ainda muito pequeno para descobrir o sexo, mas aparentemente saudável. Os demais exames se mostraram ótimos, que mostravam que apesar do estresse, tanto Sara quando o bebê estavam saudáveis. Ainda sim, foram indicadas algumas vitaminas para que ela se mantivesse mais forte nesse período de estresse que era o momento em que Julia se encontrava ainda internada.

No decorrer das semanas seguintes, algumas mudanças ocorreram também. A barriga de Sara crescia, começava a ser visível que ali crescia um bebê. Julia Laura começou a se mostrar mais forte, voltando a comer e as atividades, ainda parecia triste, o que era normal, mas a conversa dela com o pai parecia ter surtido efeito. Elizabeth, havia decidido que não iria embora até que Julia Ann tivesse alta, e nesse meio tempo, ela mesma convidou Roberto para que viesse a casa. Segundo a Sra. Grissom, ele era tio das meninas e namorado de Sara, ainda que ela não concordasse com o relacionamento – e não concordava –, então de uma forma ou outra, ele pertencia a família e não precisava mais se esgueirar pela casa quando achava que ela não estava presente. 

Após a quimioterapia, Julia teve uma queda de imunidade, o que fez com que ficasse mais tempo do que gostariam no hospital, mas logo ela havia saído do isolamento para o quarto e em seguida, fora liberada para ir para casa, mediante alguns cuidados. Entre eles eram a limitação de pessoas no quarto da menina, todos que se aproximassem deveriam estar limpos e usar máscara, e retorno ao hospital para os exames a cada dois dias.

Basicamente somente Gilbert, Sara e Ju conviviam com a menina. Ju, sempre que chegava da escola, ia direto fazer suas tarefas, depois ia para o banho, colocava uma roupa limpa e uma máscara e ia direto ao quarto da irmã para que pudessem ficar juntas. Sara ficava no quarto com as meninas, mas as deixavam livres para brincarem sentadas na cama, fingindo que não prestava atenção nas conversas. Enquanto tentava ler um livro, podia ouvir as duas reclamando de usar as mascaras quase o tempo todo.

— Minhas orelhinhas doem de tanto ficar usando máscara. – Ju reclamou.

— Eu não vejo a hora de não ter mais que usar isso o tempo todo. – Jujuba também reclamava.

— Mamãe quanto tempo a gente ainda vai ter que usar isso?

Sara paralisou e fechou o livro. Olhou para o lado. Ela conhecia aquela voz, e não era de Julia Ann, a pequena Jujuba era delicada, mas raramente a chamava de “mamãe”, era sempre “mãe”. E a voz, a voz também não era da Jujuba. Quando fitou as meninas, percebeu que quem a olhava de volta era a dona dos olhos castanhos, Julia Laura, e ela achou que tinha escutado errado.

— Ju, desculpa… – Ela disse pausadamente, tentando não demonstrar que estava emocionada. – O que você perguntou?

— Quanto tempo a gente vai usar isso? – Ju apontou para as máscaras.

— Eu estava me referindo antes disso, você me chamou de mamãe.

— É… Eu chamei. – Ela disse envergonhada. – Por que?

— Por que eu tô muito feliz meu amor. – Ela levantou da cama sorrindo e foi até a cama onde estava as meninas, se sentando no meio das duas. – É a primeira vez que você me chama de mamãe. E você não sabe o quanto eu esperei por isso. 

Pena que estava de máscara, por que ela queria encher as duas de beijos naquele exato momento. E droga, ela já ia começar a chorar de novo? Tentava conter as lágrimas.

— Eu deveria chamar o Gilbert de pai? – Jujuba perguntou.

— Só se você quiser, é claro que ele vai gostar, assim como eu gostei que a Ju me chamou de mamãe. Só que vocês tem que se sentir a vontade com isso, só devem nos chamar assim, se vocês quiserem. – Ela sorriu. – E quanto as máscaras, amanhã a Jujuba vai fazer novos exames, se estiverem bons, a gente não vai mais precisar de máscaras e ela vai poder sair do quarto e brincar na casa.

— E estrear o elevador! – Jujuba disse animada.

— Isso mesmo.

— Eu ainda não conheço o teu quarto. – Jujuba falou com a Ju.

— Você vai amar. É lindo. E podia dividir contigo, se a mamãe e o papai deixassem.

— Por favooooor! – Os olhos de Jujuba pareciam que imploravam por aquilo.

— Vamos fazer assim, primeiro os exames, e depois conversamos sobre mudanças de quarto. Pode ser?