A Criança do Labirinto escrita por Daniela Lopes


Capítulo 15
Retornando de um estranho sonho?


Notas iniciais do capítulo

O nascimento de uma criança deveria ser um evento feliz para os pais, mas no caso de Helen é o início de um pesadelo. O coração duro do Rei goblin toma a pior decisão que a jovem e os habitantes do castelo poderiam esperar.
Helen esquecerá tudo que viveu no Labirinto?



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Hoogle levava flores para Helen no quarto. Algumas fadas ficavam ao lado dela, tentando alegrar a moça, mas essa parecia anestesiada todo o tempo. Breda a forçava a comer e fazer caminhadas pelo aposento ou tomar sol e ar fresco junto à janela. O silêncio da jovem era algo terrível para aqueles que conheciam seu espírito alegre e cordial.

Volta e meia um grupo de duendes se aglomerava no corredor, mas por medo dos trolls de guarda, evitavam se aproximar.

A semana do nascimento havia chegado e Maria ficou ao lado de Helen. Pequenas contrações iam e vinham fazendo a moça chorar baixinho. Breda segurava sua mão e falava:

—Vai precisar fazer bastante força, minha senhora! Vamos fazer esse menino vir ao mundo!

Por algumas horas, os corredores do castelo foram tomados pelos gemidos e soluços de Helen. Maria, Breda, Bone e Maddy foram as parteiras da criança, dando suporte para a moça até que o bebê nascesse.  

Helen abriu os olhos e Breda estendeu o menino envolto num cobertor macio:

—Helen... Seu pequeno é perfeito!

A jovem sentou-se com dificuldade e recebeu o bebê nos braços. Sorriu e abriu o decote, oferecendo o seio para alimentar o filho. Maria afagou seus cabelos:

—Parabéns, querida! Ele é lindo!

Helen sorri e volta sua atenção para o filho. Ele tinha a pele rosada, os cabelos mesclados entre o louro e um castanho avermelhado. Segurava o dedo indicador da mãe enquanto mamava com sofreguidão:

—Calma, meu amor... Senão vai engasgar!

Breda chamou Maria e falou-lhe, afastada da cama onde a mulher amamentava a criança:

—Conseguiu falar com o mestre?

—Ele... Está insano. Não voltará na palavra dada! Eu temo por Helen!

—Oh, senhora! O que faremos? A menina não pode simplesmente ir embora como se o filho não existisse!

Maria olhou Helen abraçada ao filho, acariciando seus cabelos e brincando com sua mãozinha pequena e macia:

—Céus, Breda! Helen morrerá se tirarem o pequeno dela!

Então o rosto da mulher endurece e ela suspira. Toca o ombro de Breda e fala:

—Vou resolver isso.

E sai dali rumo ao salão do trono, onde Jareth analisava uma esfera de cristal, o rosto contraído, uma mão cobrindo a boca. Maria se aproxima e diz:

—Pelo visto, já sabe que seu filho nasceu.

—Sim. Perfeito como sabia que seria.

— E a mãe?

—Ela ficará com meu herdeiro por uma semana, então voltará ao seu mundo.

Maria balança a cabeça em negativa:

—Oh, pare de chamá-lo assim! É um bebê lindo! Não uma cópia sua para sentar nesse maldito trono como o Rei Coruja obrigou você a fazer!

Jareth ergue o olhar para a mãe:

—Acha que sou um monstro?

—Acho que não te ensinei tudo sobre a vida, sobre as armadilhas do coração. Nunca pensei que você poderia...

—Me apaixonar?

Maria encara o filho e seu olhar analisa as feições pálidas e abatidas dele. Ela toca a mão do Rei e diz:

—O que vai fazer, então?

—O que julgo ser o melhor para todos.

Jareth abandona a esfera e se transforma na coruja branca, saindo pela janela. Maria volta ao quarto de Helen e fala com Breda:

—Não tem mais volta.

Helen dormia profundamente. O filho aninhado em seus braços, alimentado e aquecido. Ambos alheios ao futuro que o Rei goblin escolhera para eles, enquanto Jareth vasculhava o Labirinto incansavelmente em busca de seu inimigo.

A semana passou rápido demais para o gosto daqueles que aprenderam a amar Helen McVeigh. Na manhã do último dia, a jovem saiu para o jardim de Hoogle com o filho para um banho de sol. Os servos do castelo a cercaram e ora murmuravam, riam e comentavam como o cheiro da criança era parecido com o da mãe. Era o pequeno mestre deles e já era querido com tão pouco tempo de vida.

Bone foi a primeira escolhida para carregar o bebê e ela ficou com medo:

—Eu posso mesmo? E se ele chorar? Eu vou gritar de medo! Vou sim!

Helen inclinou-se e entregou o filho à serva duende:

—Ele não vai chorar com você...

Então Bone sorriu ao ver os olhos do pequeno pousados em seu rosto encardido, curioso. Ela falou:

—Ele gosta de Bone? Gosta mesmo?

A jovem mulher suspira:

—Porque não gostaria?

Breda vem em seguida e pega o menino, analisando os olhos dele:

—Viu isso, senhora? Ele tem um olho azul outro verde...

—Sim... Ele é especial.

Hoogle funga:

—Vou achar que fui excluído dessa festa de boas vindas...

Helen sorri:

—Como poderia? Venha... Segure-o também!

E naquela manhã, no jardim, os seres mágicos do castelo tiveram seu primeiro contato com o filho do Rei goblin, já considerado um pequeno mestre para aquelas criaturas. Maria, Albert e Maddy se juntaram a eles pouco tempo depois e enquanto embalava o neto, a mulher analisava Helen:

—Como se sente?

—Mais disposta. Breda acha que eu tenho que comer o tempo todo! Desse jeito vou explodir!

Maria sorri:

—Está amamentando. Precisa repor suas forças e comer por dois!

Helen olha o filho com amor e enlevo. Maria sente o coração em pedaços por pensar no que o filho faria ainda nesse dia. Devolveu o neto e sorriu:

—É maravilhoso tê-lo nos braços. Que tal voltar e descansar? Acho que já tiveram emoções demais essa manhã!

Concordando, Helen caminha de volta ao quarto. Quando entrou, viu Jareth parado junto à janela, de costas para ela. A moça segurou a respiração e ouviu-o:

—Está recuperada, posso ver...

—Sim.

—Ele está...

—Dormiu agora. A manhã foi bem agitada para ele...

Jareth se virou. Seus olhos analisando o rosto tenso da mulher e a expectativa que ela tinha de que ele voltaria atrás na terrível decisão.

Helen colocou o bebê na cama e cobriu-o, voltou-se para o amante e suspirou. Num piscar de olhos, a realidade ao redor da jovem parece se alterar, curvando sobre si mesma para em seguida normalizar e mostrar à mulher que ela estava em sua casa, em Lindisfarne Laws, Irlanda.

Os olhos de Helen se abrem muito, mas Jareth não espera mais e toca a testa dela, manipulando suas lembranças, fazendo-a crer que tudo o que vivera fora um sonho delirante do tempo que esteve hospitalizada em Clondalkin.

Ele modifica suas vestimentas, a coloca sentada no sofá e a observa por alguns segundos antes de desaparecer pelo portal mágico que os trouxera. Helen permanece ali até pouco antes das dezoito horas, quando o pequeno apartamento era mergulhado na escuridão. Confusa e exausta, ela segue até o quarto e se deita, dormindo em seguida.

O dia colhe a mulher ainda na cama e ela abre os olhos, sentindo o cheiro familiar de sua cama. Naquele dia inteiro, perambulou pelos cômodos do apartamento crendo que havia esquecido alguma coisa importante. A vizinha Manoela foi a primeira pessoa que viu, a quem contou sua experiência confusa e estranha. No Pub, seu patrão entendeu que a jovem teve uma crise nervosa, precisou ficar internada por um tempo e que ela podia voltar ao trabalho.

Estranhamente, Helen pediu que o homem acertasse suas contas e a demitisse. Ela não estava em condições de trabalhar e voltou para casa. Outro que a procurou foi o detetive encarregado do caso de Jarod Crestani e posteriormente do misterioso sumiço de Helen, agora não tão misterioso assim.

Nos dias que se seguiram, Helen andou a esmo pelo bairro, parando numa lanchonete ou café, meditando sobre as estranhas sensações que tinha em seu corpo e as confusas imagens que iam e vinham em seus sonhos. Num desses, ela se viu segurando um bebê e acreditou que era real para em seguida, acordar e se encontrar sozinha no quarto. Se tudo era fruto da sua imaginação, porque ela sentia que aquela criança fazia parte dela?

Porque levantava à noite, agitada e quente, lembrando-se da presença de alguém junto dela, em suas memórias? Porque sonhava que estava cercada de criaturas fantásticas, que riam e dançavam ao seu redor, trazendo alegria ao seu coração, se conhecia tais seres apenas de contos de fadas?

Manoela vinha jantar com Helen nos dias de folga do hospital. Estava preocupada que a amiga tivesse algum tipo de depressão grave, perdendo a noção da realidade para, em seguida, atentar contra si mesma, mas a moça informava que estava calma.

Num passeio noturno, Manoela perguntou:

—Teve alguma notícia do seu italianinho bonito?

Helen olhou o céu noturno:

—Nada. Acho que... Me apaixonei por uma pessoa que não existe. O homem que se apresentou como Jarod Crestani certamente não se chama assim. Ele deve ser foragido de alguma situação criminosa e veio se esconder aqui. Quando teve oportunidade, foi embora... Talvez esteja fazendo a outra mulher o mesmo que fez comigo...

Manuela balança a cabeça:

—Não pense assim! Eu não acredito nisso! Ele pode estar passando por alguma situação complicada e decidiu se afastar pra proteger você!

Helen sorri:

—Oh, Manoela! Você é tão romântica e otimista!

—Você também é!

Helen olha os pés enquanto andavam:

—Eu... Não sei o que aconteceu comigo. Me sinto... Deslocada, esvaziada. Será que eu fui... Abduzida?

Manoela encara a jovem e dá uma sonora gargalhada que ecoa pela rua. Helen exclama:

—Tudo a ver comigo, ok? Confusão mental, sensação de perda da noção do que é real! Imagens confusas e ainda tem o bebê!

—Bebê? Que bebê?

Helen conta da estranha sensação e assusta a enfermeira. Voltam para casa em silêncio, até que Manoela propõe:

—Quer... Tirar dúvida se você realmente teve um filho?

—Estou com medo, mas sim! Eu quero!

—Amanhã venha ao centro de saúde. Vamos confirmar isso!

Agradecida pelo apoio, Helen abraça a mulher e entra em casa. Dificilmente conseguiria dormir e ficou vendo TV sem prestar atenção no conteúdo. O dia colheu a jovem sentada na cama, o controle remoto na mão e o olhar perdido. A campainha tocou e Helen atendeu Manoela:

—Helen? Você dormiu?

—Acho que não. Fiquei vendo TV, mas não me lembro de cochilar e...

Após ser ajudada pela enfermeira a se arrumar, seguiram juntas pela rua até o ponto de ônibus e de lá, ao centro de saúde da região. Marcada a consulta com uma ginecologista, Helen passou por uma bateria de exames e foi levada a uma sala de espera. Cochilou sem perceber e foi desperta pela médica:

—Venha comigo. Precisamos conversar...

Após se acomodar na cadeira do consultório, Helen observou a profissional separar alguns resultados de exame e voltar-se para ela:

—Senhorita McVeigh... Onde disse que esteve nos últimos meses?

—Uma... Clínica psiquiátrica em Clondalkin... Eu...

A médica analisa o rosto confuso da jovem e diz:

—Recorda-se de estar grávida?

Helen abre a boca e fecha novamente. Morde o lábio inferior e diz:

—Eu... Não poderia. Tenho problemas para engravidar e...

—Não é o que os resultados acusam. Seu corpo manteve uma gestação completa e você teve um parto normal, apesar dos sinais serem quase imperceptíveis, mas descobri algum vestígio, inclusive hormônios que são normais nesse período final. Alguma coisa aconteceu a você... Posso sugerir que procure a polícia e denuncie.

Helen cobre a boca com as mãos e ela fala:

—Você acha que... Sequestraram meu bebê?

—Pelo que Manoela me contou, você passou por muito estresse após o sumiço do seu noivo... Sofreu um trauma e isso pode ter afetado suas lembranças. Sem dúvida, você é mãe de uma criança.

Helen se levanta da cadeira:

—Então eu vou...

Não termina a frase, desmaiando pesadamente sobre o tapete do consultório. Quando acordou, Manoela verificava o soro ligado ao seu braço:

—Menina! Que baita susto me deu! A médica me contou tudo... Vou ajudar você. Primeiro vamos achar essa clínica, depois vamos à polícia!

Ainda fraca pelos eventos, Helen volta a dormir e só desperta no dia seguinte, quando recebeu o café da manhã, suas roupas e alta do centro médico. Manoela seguiu com ela para casa e no apartamento da moça, apresentou o telefone de todas as clínica psiquiátricas conhecidas e casas de saúde mental de Clondalkin e região vizinha.

Ligação após ligação, nenhum dos locais teve uma paciente de nome Helen McVeigh nos últimos três meses e a única paciente grávida que esteve em uma delas, teve alta com o filho.

Sem reposta, Helen voltou ao começo e Manoela não soube mais o que fazer:

—Ah, querida! Você... Vai procurar a polícia?

—E dizer o quê? Que fui sequestrada por uma clínica misteriosa, fiquei lá até dar a luz e não tenho lembrança de nada disso? Apenas sensações vagas de que aconteceu? A única coisa que sei é que existe uma criança. Eu posso senti-la, mas todo o resto é confuso e obscuro.

Manoela coça a cabeça e ri, em graça:

—E se... Aquela conversa toda de extraterrestres for verdade?

Elas se encaram e começam a rir até sair lágrimas nos olhos e perderem o fôlego. Decidem ficar ali, vendo novelas chatas na televisão até Manoela anunciar que queria dormir e foi embora, deixando a moça sozinha com seus pensamentos.

Continua...

 


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Notas finais do capítulo

De volta ao mundo humano, Helen tem a sensação de que algo estava errado com sua realidade. Em busca de respostas, percebe que a falta de memória sobre o que lhe aconteceu era ainda mais bizarro. Poderá Helen descobrir onde esteve e porque a lembrança de ser mãe era algo tão forte?
Boa leitura!



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