Emma & Jake escrita por Almofadinhas


Capítulo 14
Capítulo 14 ❄ Emma




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O mês de abril passa tão rápido que eu mal percebo. Desde que voltei do Campeonato Mundial no fim de março, diminui consideravelmente minha rotina no rinque. Não tenho mais nenhuma competição importante até a temporada que vem, com o Grand Prix. Isso não significa que eu estou à toa durante todos esses meses, entretanto. Ainda tenho vários eventos agendados e, em alguns meses, precisamos começar a criar e ensaiar programas novos para a temporada que inicia em julho. 

Aproveitando esse tempo livre que consegui, me inscrevi num curso de piano. Sou apaixonada por música desde pequena, por isso, qualquer oportunidade de aprender mais sobre o assunto é totalmente válida. Como eu nunca tive muito tempo sobrando para me dedicar a outras coisas que não fosse a escola e a patinação, acabei me limitando a aprender somente violino com minha irmã e o básico de piano. Achei que seria interessante usar esse meu tempo livre para me aprofundar mais na música – o que foi uma ótima ideia. Ainda pretendo fazer alguma faculdade de música, mas não acho que agora seja o momento. Não quero ter que me dividir entre a patinação e a faculdade e acabar sendo medíocre nos dois. Querendo ou não, atletas se aposentam cedo, nada me impede de ir estudar assim que deixar o gelo.

Em maio, eu tiro algumas semanas de férias para descansar. Aproveito para ficar em casa com minha família, passear com meu cachorro, assistir filmes e colocar as séries em dia, fazer um “dia de spa” com minha irmã e Julie e até testar receitas da internet. Confesso que para mim é difícil ficar longe do gelo, por isso saio para patinar algumas vezes na semana, enquanto meus pais estão trabalhando e minha irmã está na faculdade.

Por mais que eu goste de patinar nos parques da cidade, sempre tem muitas crianças e gente aprendendo a patinar por lá, por conta disso, decido ir ao Stepanova Ice Center - meu rinque do coração. Ainda no estacionamento, percebo o carro de Jake estacionado em uma das vagas destinadas aos funcionários. Eu sei que suas aulas geralmente são de manhã, por isso não esperava que ele estivesse por aqui.

Eu mal o vi pessoalmente durante essas últimas semanas. Por outro lado, nós continuamos trocando mensagens no celular. Eu nem sabia que ele tinha o número do meu telefone até receber uma mensagem sua com a playlist que estava tocando em seu carro quando ele me deu uma carona até em casa. Nós temos um estilo musical bem parecido, o que levou há horas de conversa sobre bandas, álbuns e artistas favoritos. Nos dias que se seguiram, continuamos conversando. Discutimos sobre filmes, séries, comidas, hobbys, viagens, nosso dia-a-dia... todos os tipos de assunto que mantém uma conversa.

Receber alguma mensagem sua durante o dia acabou se tornando parte da minha rotina. Às vezes nós nem trocamos palavras, só compartilhamos memes. Nesses últimos dias, porém, Jake deu uma sumida para se concentrar mais nos estudos, já que o semestre está se aproximando do fim. Justamente por isso eu pensei que ele estivesse na universidade agora.

Entro no Centro e durante todo o meu trajeto até o vestiário, não o vejo em lugar nenhum. Imagino que talvez esteja ajudando seus pais em alguma coisa. Deixo meus pertences no armário e calço os meus patins novos. Aproveitei minhas férias para comprar um novo patins, já que minhas antigas lâminas estavam bem gastas e as botas estavam ficando velhas.

Meu objetivo de hoje não é treinar nada em especial, só estrear meus novos patins e me acostumar com as lâminas novinhas sob meus pés. A sensação é um pouco esquisita assim que piso no rinque, mas logo pego o jeito. Não tenho nenhum problema com meus giros, já os saltos são outra história. Começo fazendo saltos simples, para me adaptar às novas lâminas, mas elas parecem mais escorregadias no momento de aterrissar, o que me rende muito mais tombos do que estou acostumada a levar.

Na metade do meu treino, já me sinto mais confiante para fazer meus saltos triplos. Tudo vai bem até o momento em que faço um combo que geralmente pratico. Meu primeiro salto sai como o esperado; já no segundo, como se eu estivesse em câmera lenta, sinto minha lâmina tocar o gelo e meu pé girar mais para dentro do que deveria. Meu tornozelo cede com o impacto e eu me vejo caindo lentamente. Tento amenizar o impacto com os braços, como normalmente acontece, mas não é o suficiente para livrar a lateral da minha cabeça de bater diretamente no gelo.

No calor do momento, eu levanto e tento voltar a patinar, mas não me sinto mais tão bem; minha cabeça lateja e sinto meu tornozelo começar a doer. Tento não apoiar o peso no pé que me fez cair e patino para a saída do rinque, calçando os meus protetores de lâminas rapidamente e pegando o caminho dos corredores para o vestiário. Por eu estar caminhando devagar, imagino que a adrenalina que estava passeando por minhas veias minutos antes tenha começado a se dissipar, porque a dor em meu tornozelo começa a ficar mais intensa.

Isso não pode estar acontecendo, me recuso a imaginar qualquer hipótese negativa. Eu estou acostumada a cair, caí várias vezes hoje, essa foi só mais uma queda. Um pouco de gelo e anti-inflamatórios no meu tornozelo e em dois dias estarei nova em folha. As dores em meu corpo, por outro lado, parecem não concordar comigo. Sinto o mal estar se espalhar pelo meu corpo, deixando minhas pernas desajeitadas e minha visão embaçada, me dando a impressão de que vou desmaiar a qualquer momento. Nem tento chegar ao vestiário, entro direto no banheiro feminino que fica um pouco antes. Só preciso sentar em algum lugar e respirar fundo, sei que isso vai ajudar o meu corpo a se recompor, me deixando em condições de passar uma água no rosto e ir direto para casa.

Sento na tampa do primeiro vaso sanitário que encontro e fecho os olhos, respirando fundo. Minha cabeça lateja e meu tornozelo parece me odiar, ficando cada vez mais dolorido. Me sinto frustrada por ter caído e feito isso comigo mesma. Eu deveria me levantar depois da queda e seguir com minha vida, pois é assim que as coisas funcionam – eu não deveria estar aqui sentada no banheiro refletindo sobre como fui chegar a esse ponto.

Começo a ficar preocupada de verdade com meu tornozelo. Eu o quebrei anos antes e por conta disso fiquei uma temporada inteira afastada. Pela minha própria experiência, imagino que não esteja quebrado, então por que diabos no momento em que eu caí, dei conta de me levantar e vir até aqui e agora ele parece simplesmente ignorar meus comandos? Ele está doendo bastante agora, me fazendo ficar sentada aqui nesse banheiro porque não faço a menor ideia de como irei sair daqui se não consigo caminhar de volta para o vestiário. Também não me atrevo a tirar os patins, pois a área está bastante sensível e tenho medo de mexer e piorar o que já está ruim.

Penso em como fui burra de ter ido ao rinque sem meu celular. Ele está trancado no meu armário e agora eu não consigo nem sair daqui, nem avisar ninguém sobre onde estou. Minha melhor opção é esperar alguma patinadora entrar no banheiro e me ajudar a voltar para o vestiário. Sinto as lágrimas começarem a se formar em meus olhos. Lágrimas pela dor que estou sentido, lágrimas por ter sido burra de não pegar o celular e lágrimas por ter caído num contexto ridículo justo no meu pé que já foi operado uma vez. Eu não costumo chorar com muita frequência, mas estou me sentindo frustrada e patética. Acho que tenho o direito de derramar algumas lágrimas para tentar aliviar o que estou sentindo.

Ouço uma batida na porta do banheiro feminino e estranho. Ninguém bate na porta antes de entrar no banheiro, nós simplesmente entramos. Pisco para afastar as lágrimas e limpo meus olhos, pois não quero que me vejam chorando – já vai ser humilhante o suficiente ter que pedir ajuda de quem quer que seja para sair daqui. Escuto a pessoa entrar e, por estar sentada na primeira cabine, logo vejo quem é. Todo o meu plano de segurar as lágrimas falha quando vejo seu rosto. Acho que nunca o vi me encarando com tanta preocupação, o que piora quando ele percebe que eu comecei a chorar.

Emma?! O que aconteceu? – Jake pergunta, se abaixando para ficar na minha frente.

Eu não consigo responder imediatamente. Estou ocupada tentando parar de chorar e manter algum nível de dignidade, mas percebo que não me importo de chorar em sua frente. Por mais ridícula que eu esteja, não dou a mínima para o fato de Jake me encontrar assim, não me sinto nem um pouco julgada por ele em relação a isso.

— Emma, por favor, fale comigo – ele pede, apoiando suas mãos em meus joelhos e dando um leve aperto.

O simples toque de suas mãos sobre os meus joelhos é o suficiente para me deixar um pouquinho mais calma. Passo os dedos por debaixo dos olhos, limpando as lágrimas, e respiro fundo. Encaro seus olhos castanhos cheios de preocupação e me sinto esquisita, como se meu peito também estivesse doendo agora.

— Eu caí. Achei que não tivesse sido nada sério, mas... Eu me senti um pouco mal no meio do caminho e... – interrompo a minha explicação para recuperar o fôlego.

Jake solta o meu joelho e encontra as minhas mãos. Ele segura cada uma delas em suas próprias mãos, apertando-as gentilmente e fazendo um carinho mínimo com o polegar em cima de cada uma delas. Sei que sua intenção é me acalmar e aprecio de verdade isso, mas me sinto mais nervosa com esse gesto.

— Respire fundo – ele pede.

Ele inspira e eu o acompanho, mantendo meu foco na minha respiração e não nas minhas dores ou nas mãos que seguram as minhas.

— O que você machucou? O pé? – ele pergunta depois de um tempinho, quando estou mais calma.

— Foi o meu tornozelo – consigo dizer, dessa vez sem gaguejar – Na hora não doeu tanto, mas agora sim. Eu entrei aqui porque me senti mal, mas parece que tudo piorou e agora não consigo nem sair desse maldito banheiro sozinha. Eu não sei nem o que pensar, Jake.

— Emma, você precisa ir para o hospital.

Eu apenas assinto. Sei que ele está certo, eu preciso que algum médico me avalie.

— Você já avisou seus pais ou alguém? – Jake pergunta.

— Não, meu celular está no armário.

— Não saia daqui. Vou chamar minha mãe e a gente te leva ao hospital agora mesmo.

— E como você espera que eu saia daqui com um pé só? – respondo, sem pensar muito. 

As vezes eu digo as coisas sem pensar e me arrependo logo em seguida. Queria saber controlar melhor a minha língua para não ser grossa com as pessoas que só estão tentando me ajudar, como eu fiz agora. Por sorte, Jake me conhece e não leva isso como uma ofensa proposital.

— Você entendeu o que eu quis dizer, gênia. Todas as suas coisas estão no armário?

— Sim.

Ele solta as minhas mãos e levanta, recuando.

— Já volto, aguente firme.

— 5253, armário 15.

— O que? – ele pergunta, se virando confuso.

— A senha do meu armário, gênio – respondo.

Pela sua cara eu vejo que ele não tinha pensado nisso. Repito a senha e o número do armário porque tenho certeza absoluta de que ele não as decorou da primeira vez.

— Já volto – Jake me avisa e deixa o banheiro feminino.


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