Entre Lobos e Monstros escrita por Nc Earnshaw


Capítulo 33
Sangue do meu sangue




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Capítulo 32

por N.C Earnshaw

 

O NERVOSISMO DE ESTAR de volta àquele lugar fazia com que o corpo de Erin tremesse quase como se estivesse tendo espasmos. Ela se perguntou diversas vezes enquanto encarava a porta do lugar que um dia foi sua casa, se estava tomando a decisão certa ao ir até ali sem conversar com Embry antes. Em nenhuma delas, no entanto, chegou à conclusão que estivesse fazendo algo de errado. Apesar de ter decidido dividir uma vida com o Call, não precisava avisar de cada passo que fosse dar — principalmente quando era algo relacionado ao único membro sanguíneo que restava de sua família. 

— Acha que ele vai ficar bravo? — inquiriu, virando-se para encarar a pessoa sentada no banco do motorista. — Quero dizer… Prometi a ele que ficaria quieta na sua casa enquanto ele ia fazer a ronda, e olha só onde estou me metendo. Estou aqui, indo atrás de mais uma decepção, porque, aparentemente, as que já tenho não são o suficiente. 

— Imagina o Embry ficando com raiva de algo assim? 

Wendy, que desde o instante em que a Landfish tinha pedido para que a levasse até a antiga casa onde morava com sua mãe, havia ficado em silêncio, pronunciou-se finalmente com uma expressão incrédula. Não conseguia criar em sua mente uma situação em que algo que Erin fizesse deixasse o garoto Call irritado. Tendo ele uma personalidade tão doce e maleável, era uma daquelas coisas que a Cullen só acreditaria vendo

— O Paul vai ser o suficiente pelos dois, não se preocupe — brincou ao ver que a humana concordava que seu companheiro nunca ficaria com raiva por ela estar preocupada com sua própria mãe. — Por que está usando o Embry como desculpa para não entrar aí? 

Erin cruzou os braços e desviou o olhar da vampira, visto que o que ela tinha dito era exatamente o que estava fazendo. 

Não tinha sido fácil sentir-se segura após ser quase morta por Carter. Dias ao lado de Embry e com o corpo colado ao dele fizeram a maior parte do serviço, entretanto, as lembranças ainda eram como cobras peçonhentas. Quando menos ela esperava, atacavam-na com memórias que precisava esquecer. 

Também havia o fato de que a última vez que vira sua mãe, tinha sido no pior dia de sua vida, e a quileute não sabia se conseguiria passar por cima da mágoa de ter sido expulsa de casa e trocada pela pessoa que mais amava. Apesar de Carter estar morto, Erin recordava com uma clareza quase insana de cada detalhe do que acontecera na sala de estar a alguns metros de onde o carro estava estacionado, e estar de volta até a casa onde prometeu que nunca mais voltaria, fazia com que a garota sentisse seus nervos se contraírem. 

— Ela está em casa? 

Erin nem disfarçou que não estava interessada em abrir seu coração para Wendy. Embora soubesse que a vampira era alguém confiável que a ouviria sem julgá-la, não se sentia preparada. Não quando estava a um passo de encontrar sua mãe após semanas separadas. Não quando a tinha deixado sozinha; grávida, para lidar com o fato de que seu marido havia morrido. 

Wendy assentiu. 

— Está deitada na cama, no segundo andar, primeiro quarto à esquerda. Está acordada. — A Landfish observou um sorriso feliz se abrir no rosto perfeito da vampira. — Posso ouvir o coração do bebê batendo… Ele está bem. 

A quileute pegou-se suspirando de alívio. Admitia para si mesma que tinha certo receio em relação àquela criança por ela ser fruto de um ser tão mesquinho e repulsivo quanto Carter. No entanto, todas as vezes que sua mente a levava naquela direção, seu subconsciente a repreendia e a lembrava que o bebê inocente se formando na barriga da sua mãe não era culpado de absolutamente nada. E, ainda que compartilhasse o mesmo sangue com aquele homem, também era sangue do seu sangue. 

— Acha que alguém a ajudou com o velório? 

A fragilidade na voz da outra surpreendeu Wendy. As impressões que tinha de Erin, era que ela era uma mulher forte e determinada. Uma força da natureza que não poderia ser controlada por ninguém. E vê-la daquela maneira a fez lembrar que até a mais forte das mulheres tinha seus momentos de fraqueza. 

— Eu não sei. — A vampira tentou ser mais positiva quando percebeu os olhos da humana se encherem de lágrimas. — Talvez. 

— Não me importo se aquele crápula foi jogado numa vala qualquer, se foi queimado com algumas toras de madeira ou comido por ratos — disse Erin com raiva. — Mas me importo com ela. Com o que ela pensa e sente… Sou uma idiota, não é? 

Wendy balançou a cabeça, negando. 

— Não… Você não é idiota. Só está sendo humana. 

— Não me parece uma coisa boa quando você diz desse jeito. 

Erin saiu do carro mais relaxada ao ouvir a risada de Wendy chegar até os seus ouvidos. A conversa que tiveram diminuiu a tensão em seus músculos, e a Landfish teve certeza de que falar com sua mãe, elas se acertando ou não, daria um fim àquele ciclo que tanto a atormentava. 

— Se precisar de mim, é só chamar — gritou a Cullen assim que Erin colocou a mão no trinco da porta. 

A quileute respirou fundo, e conseguiu entrar quando uma súbita onda de coragem a tomou.

O cheiro forte de comida estragada fez com que Erin tivesse que cobrir o nariz rapidamente com a barra da camiseta preta que pegara de Embry para usar naquele dia. Desnorteada, fechou a porta atrás de si e deu de cara com uma cena de caos. 

O sofá estava repleto de restos de comida e a TV tinha um buraco enorme em sua tela do tamanho de um punho. Aquela visão a deu arrepios, uma vez que fora naquele exato local que Erin, de certa forma, foi assaltada por Carter. 

Ela subiu os degraus da escada rapidamente, tomando cuidado para não pisar na madeira podre de alguns deles, e acabar se acidentando. A quileute ignorou os quadros pendurados no corredor com fotos felizes do casal, não querendo trazer à tona a raiva que guardava dentro de si. 

A porta do quarto estava escancarada, o que a deixou preocupada, uma vez que a primeira coisa que seus olhos se focaram foi na figura frágil deitada em posição fetal em cima da cama. 

— Mãe? — chamou com um fio de voz, aproximando-se em passos lentos. 

Ainda que Wendy tenha confirmado com sua super audição que tudo estava bem com sua mãe e o bebê, a ansiedade de ter visto a casa naquela situação deplorável a deixou sem saber o que fazer. 

Erin imaginava ver sua mãe em prantos, triste e até mesmo com raiva. Não esperava encontrar a mulher com uma semelhança aterrorizante a um cadáver, ou a casa — que ela tanto se virava para zelar —, naquele estado de completa desordem. 

— Mãe — sussurrou ao se agachar ao lado da cama, próxima à cabeça de Kayla. — Acorda

O cômodo estava escuro devido à cortina fechada, e Erin não tinha se lembrado de acender a luz quando entrou ali. Levantou-se rapidamente e o fez em questão de segundos, voltando para o lado de Kayla. 

Os olhos castanhos de sua mãe encarando-a quase a fez gritar. Estavam vazios e sem vida, e a quileute caiu no choro ao vê-la erguendo sua mão ossuda na sua direção. 

Wendy prestou atenção em cada passo e em cada mudança que ocorria nos batimentos cardíacos de Erin. Quando Embry tinha deixado seu imprinting com ela naquela manhã, tinha a feito prometer que não tiraria os olhos dela. Sendo assim, viu-se no dever de estar pronta para qualquer coisa. 

Não era um segredo para a Cullen, o fim que o relacionamento entre Erin e a mãe tinha terminado. Lembrava com clareza de quando a encontrou encolhida dentro do próprio carro, assim como do momento que esqueceu da raiva que sentiu por ela durante o primeiro encontro na praia. 

No instante em que ouviu a Landfish soluçar enquanto chamava pela mãe, Wendy disparou para fora do carro. 

O estado da humana deitada na cama enquanto Erin se agarrava a ela deixaria Wendy arrepiada se ainda pudesse. Os olhos fundos e sem vida, assim como o corpo magro, quase esquelético, contrastavam de uma maneira mórbida com o pequeno relevo na parte do estômago. 

A Cullen estivera certa sobre os batimentos do bebê estarem fortes, mas não acreditava que iria durar muito tempo se a mulher continuasse naquela situação. 

— Erin… 

A Landfish se esquivou ao sentir uma mão gelada tocando seu ombro, mais pela surpresa de ser tocada por mais alguém quando achava que estava sozinha com a sua mãe do que por qualquer outro motivo. 

— Por que ela não está falando nada, Wendy? Ela nem consegue mexer o corpo direito! 

A angústia de Erin apertou o coração da Cullen. 

— E-eu não sei — mentiu. Ela sabia exatamente o risco de vida que Kayla e o bebê estavam correndo, uma vez que tinha ajudado Carlisle tantas vezes no passado. Mesmo sem os exames, com apenas um olhar, ela podia dizer que a Landfish mais velha estava sofrendo um caso severo de desnutrição e desidratação causada por uma depressão profunda, e precisava ser internada imediatamente. 

— Erin, você precisa se acalmar. Vou ligar para o meu pai e pedir que ele nos aguarde na porta do hospital…

— Hospital? — Se Erin não estivesse tão agoniada, teria se encolhido ao ouvir o quão aguda sua voz tinha soado. — Achei que eles estivessem bem! Você me disse que eles estavam bem! Eu sei que ela está um pouco abaixo do peso, mas se eu ficar e cuidar dela direitinho…

Os soluços cortaram sua fala, provando que nem mesmo ela acreditava em suas próprias palavras. Ajudar sua mãe estava fora do seu alcance naquele momento. 

— Pode ligar — afirmou após ganhar de volta o controle de suas próprias emoções.

Ela agarrou as mãos de sua mãe firmemente entre as suas, sentindo a culpa consumi-la a cada segundo que se passava. 

— A culpa é minha — pronunciou-se Erin finalmente. Embry estava sentado em uma das poltronas da sala de espera do hospital, e tinha observado por mais de 20 minutos seu imprinting andar de um lado para o outro. 

Tinha sido um choque chegar até a casa de Paul, juntamente com ele, e não encontrar nem sequer a sombra dos seus imprintings. A preocupação foi instantânea, e eles levaram alguns minutos andando de um lado para o outro, como duas galinhas que tinham perdido as cabeças, antes de lembrar da existência daquele aparelhinho mágico que fazia ligações. 

— Está demorando demais, não acham? — O Call sentiu uma imensa vontade de puxá-la para o seu colo quando a viu prendendo os cabelos num coque tão apertado, que ele achou que arrancaria os fios de sua cabeça. — Eu vou até a recepção pedir para verificarem com os médicos. Talvez eles me digam…

— Cacete, Erin! Você está esgotando a merda da minha paciência com essa droga! Senta esse traseiro gordo nessa cadeira e espera como a porra de uma pessoa normal! Sua mãe está passando por uma série de exames. Se ela estivesse à beira da morte como você está insinuando, nós já estaríamos sabendo. Notícia ruim corre rápido. 

Embry piscou algumas vezes na direção do seu irmão, sem saber como defender sua namorada, e decidindo se valeria a pena discutir. Todo mundo sabia o quanto o Lahote perdia a paciência com as mínimas coisas. 

Ele fechou a boca quando viu que o que Paul tinha dito havia funcionado. Com os braços cruzados, Erin sentou-se ao seu lado claramente contrariada. 

Assim que o Call chegou ao hospital após verem a mensagem que Wendy tinha enviado, a quileute correu para os seus braços, deixando Embry satisfeito por dentro de ser o seu refúgio. Ele não sabia muito bem o que estava acontecendo, uma vez que a Cullen somente tinha esclarecido que estavam bem, mas que precisavam que eles fossem até lá, e sentiu seu coração se partir junto com o de Erin ao ser colocado à par de tudo. 

Embry passou o braço pelo ombro de Erin, trazendo-a para mais perto de si, e encostou a cabeça contra a dela, procurando apoio para descansar com mais conforto. Ele ignorou o quanto Paul estava agitado na poltrona em frente a eles. O Lahote tinha insistido para ir com Wendy até Carlisle, mas a vampira foi firme em negar, deixando o lobo “cabeça quente” com um bico enorme. 

Seu imprinting saiu dos seus braços no instante em que viu a figura da Cullen despontando no início do corredor. Com um pulo, Erin encontrou a vampira quase na metade do caminho. Estava tão ansiosa para saber que fim tinha se dado à sua mãe que não ligou para os olhares de repreensão que recebeu da recepcionista. 

— Sua mãe está em uma situação um pouco complicada, Erin. — Essa foi a primeira coisa que Embry ouviu ao se aproximar das duas, com Paul no seu encalço, e foi ágil em voltar a abraçar seu imprinting ao ver seu desconsolo. — O Carlisle queria vir aqui te dizer essas coisas, mas eu achei melhor que ele ficasse terminando os exames que faltam e dando a devida assistência à sua mãe. Se quiser que ele te explique, podemos esperar mais um pouco…

— Não — cortou a quileute, mesmo que por dentro estivesse gritando. A falsa expressão de normalidade no rosto da vampira não estava deixando-a segura. — Quero saber agora. 

Wendy suspirou e assentiu com a cabeça. Estava claro para os dois lobos naquela sala que ela não queria estar sendo a mensageira daquela notícia.

— A gravidez da sua mãe é complicada desde o início. Ela não fez pré-natal, então não tomou os cuidados devidos desde o comecinho. Além da idade avançada, Carlisle descobriu na ficha médica dela que no seu primeiro parto houveram alguns… problemas. Ela não teve passagem, e tiveram que fazer uma cesárea de última hora. O mais provável é que esse bebê também não tenha passagem, então já é quase garantido que ela passará por uma cesárea novamente. 

A vampira hesitou por alguns segundos, sem querer continuar a dizer o diagnóstico que seu pai tinha passado a ela minutos antes. 

— Somando tudo isso ao estado em que a encontramos…

Erin apertou uma das mãos de Embry com força. 

— Sua mãe está com quadros de desidratação e desnutrição severos, e os médicos ainda estão fazendo os exames para saber o quanto isso afetou a formação do bebê.

— É culpa minha — interrompeu Erin. Ela soluçou, virando-se de frente para Embry e o abraçando com força. — Se eu tivesse ido até ela no dia em que aquele canalha morreu…

— A culpa não é sua. — Wendy se pronunciou antes mesmo que Embry conseguisse formular alguma palavra. — Não faz muitos dias do falecimento do seu padrasto. A situação da sua mãe vem ocorrendo há mais tempo do que você imagina. 

Paul se colocou atrás do seu imprinting, envolvendo-a com seus braços e apoiando a cabeça no ombro dela. 

— Olha, Erin… sei que é delicado o momento que você está passando agora, mas você precisa ficar bem e ciente de que nada disso foi causado por algo que você fez. Sua mãe tomou as próprias decisões, que podem não ter acarretado em coisas muito boas, mas foi a escolha dela. Você não a abandonou. 

Erin se manteve em silêncio, não conseguindo forças dentro de si para responder. Seu lado racional sabia que ela não tinha qualquer culpa do que sua mãe estava passando. Como Wendy dissera, a mulher fez a sua escolha, e escolheu Carter em detrimento da própria filha. Não fazia sentido ela se corroer com um sentimento que não lhe pertencia. No entanto, seu lado emocional, apenas a lembrava do que ela podia ter feito para evitar que sua mãe estivesse tão doente. Talvez, se tivesse engolido seu orgulho ou enfrentado Carter… Talvez até mesmo contado a Embry sobre aquele dia, tudo seria diferente. 

— Kayla ainda não passou pelo psiquiatra, mas pelo estado quase catatônico em que ela se encontra, Carlisle tem certeza que ela entrou numa depressão profunda. Ela foi colocada no soro, e ele acha provável que terão que colocá-la nas sondas por alguns dias até que ela consiga recuperar um pouco das forças e se alimente sozinha. 

— Quanto… quanto tempo ela vai ficar internada? — Podia parecer insensível para algumas pessoas pensar na parte financeira naquele momento. Entretanto, quando quase não se tinha dinheiro para comer e pagar as contas de luz e energia, a primeira coisa que se tinha para organizar era a maneira como conseguiria pagar a conta estratosférica do hospital. 

— Eu não sei — respondeu Wendy com sinceridade. — Talvez ela fique aqui até pouco tempo depois do parto. 

Droga, pensou Erin. Como pagaria meses de um internamento? Ela não tinha nem dinheiro para se manter, quanto mais quitar uma conta daquelas.

— Não se preocupe com isso agora. — A Cullen, aparentemente, também podia ouvir pensamentos assim como seu irmão, porque sua sentença deixou ambos os lobos na sala com semblantes confusos. — Vamos dar um jeito. 

— Quando vou poder vê-la? — inquiriu com ansiedade. — Eu… Eu quero muito ver a minha mãe. 

Wendy lançou um sorriso complacente. 

— Carlisle me disse que você ia perguntar isso… Sinto muito, Erin, mas as visitas foram proibidas agora por esses primeiros dias. Assim que eles liberarem sua mãe para o quarto, o papai vai me ligar e eu entrarei em contato com você. 

A Landfish quis retrucar, porém se calou ao lembrar que sem Wendy, ela estaria enterrando a sua mãe naquele momento, uma vez que demoraria muito a saber o que fazer. Ela encarou a vampira com gratidão, sentindo vontade de abraçá-la, mas achando que seria extremamente constrangedor se o fizesse. 

— Obrigada. — Foi tudo o que pôde dizer. 

Foi difícil para Erin deixar o hospital e ir para casa descansar. Embora não pudesse nem sequer ver sua mãe e estivesse condenada a sentar na sala de espera, ela sentia que precisava estar ao lado dela.

— Você precisa tentar dormir um pouco. 

A voz de Embry atrás de si a fez dar um pulinho de susto. Após sua tentativa falha em comer, ela havia se sentado em uma das cadeiras da mesa da cozinha e se perdido em pensamentos. A memória da situação em que sua antiga casa se encontrava ainda a deixava assombrada, e a Landfish marcou em sua mente que deveria limpar o lugar muito em breve, uma vez que sua mãe voltaria e iria precisar de tudo arrumado. Um bebê recém-nascido não poderia viver num ambiente tão degradado. 

— Nunca te contei porque saí de casa. — Aquele segredo era algo que estava consumindo-a nos últimos tempos. Embry tinha se aberto completamente para ela, e a quileute se via sendo injusta ao esconder aquela parte tão grande de sua vida. — Eu não saí por livre e espontânea vontade. Fui expulsa. 

Embry sentiu certa estranheza com sua fala, mas sentou na cadeira ao lado dela mesmo assim. Se Erin estava precisando de alguém para desabafar, ele seria essa pessoa. 

— Minha mãe casou com o Carter quando eu era muito pequena. Ele gostava sempre de passar na nossa cara que era ele quem sustentava a casa e que só tínhamos um teto sobre as nossas cabeças porque ele nos deu. Quando eu cresci, descobri que a casa em que morávamos era uma herança deixada pelos meus avós. 

A garota deu um sorriso amargurado, lembrando que sua mãe se mantinha calada e submissa todas as vezes que o desgraçado começava a “colocá-la em seu devido lugar”.

 — Nós nunca nos demos bem… Carter e eu, sabe? Ele tinha essa energia ruim que me dava calafrios. 

Embry não estava gostando nada de onde essa conversa estava se dirigindo. 

— Ele… — O lobo suspirou, pedindo a todos os ancestrais que o dessem forças para ouvir o que ele achava que seu imprinting tinha para contar. — Erin… Amor. O que… O que ele fez? 

— Quando eu era criança, ele preferia ignorar minha existência ou me humilhar, mas quando eu me tornei uma adolescente… as coisas mudaram. Ele ficava bêbado, e tentava invadir o meu quarto. Tirou as fechaduras do banheiro e queria dar um de esperto para me pegar tomando banho. Fazia perguntas constrangedoras sobre os garotos que eu ficava, e chegou a insinuar algumas vezes sobre o quanto desejava ter Jane e eu na cama. 

O Call tentou ficar sob controle, e buscou a mão de Erin logo que sentiu que seu lobo queria tomar controle. Se estivesse tocando a pele dela enquanto absorvia aquelas palavras, conseguiria se conter.

— Eu achei que não ia passar disso. Ele nunca tinha tentado me tocar, ou algo do tipo. Mas naquele dia, algo de estranho aconteceu. O maldito quase arrombou a porta do meu quarto querendo que eu fizesse o almoço dele, o que não era algo tão anormal, porque nos dias em que minha mãe estava doente, eu acabava me tornando a empregada particular. Mas o meu subconsciente captou alguns olhares esquisitos… A maneira como ele ficou me encarando por mais tempo que o normal. 

Embry se manteve em silêncio. Sabia o quanto estava sendo difícil para Erin falar sobre aquilo, e buscava dentro de si, forças para não dar um jeito de ressuscitar o canalha e matá-lo com as próprias mãos. 

— Eu estava cansada depois de limpar a casa, então me deitei no sofá para assistir TV e acabei pegando no sono… Estúpida, não é? 

O quileute negou no mesmo segundo, e puxou-a para o seu colo. Não queria ficar tão distante do seu amor. 

— Era a sua casa. O lugar em que você deveria se sentir segura

— Eu acordei e ele estava lá…  Se… tocando. Minha primeira reação foi chutar a cara dele. Só de imaginar aquelas mãos sujas encostando em mim me dá… — Erin cravou as unhas compridas de uma mão em sua própria coxa, e deixou-se ser abraçada por Embry. — Minha mãe desceu as escadas quando ouviu o barulho da queda dele. Sabe qual foi a primeira coisa que ela fez? 

— Shhh, você não precisa me dizer nada se não quiser — disse o lobo após ouvi-la soluçar. 

— Ela me ignorou! E foi direto para os braços dele. Ela escolheu o maldito do Carter sem pensar duas vezes! E eu a amava tanto, Embry, mas tanto, que por muito tempo tentei arrumar desculpas para as atitudes dela. Ainda continuo criando várias delas para justificar a mãe de merda que ela foi, e me sinto culpada por… eu não sei. Não ter corrido atrás quando ela me enxotou da vida dela? 

— Sua mãe cometeu erros, e está pagando por eles. Espero que ela se recupere e se dê conta do quanto ela errou com você. — Essas foram as únicas palavras que Embry conseguiu formular, tamanha era a raiva que estava sentindo de Kayla Landfish. 

— Não sei o que eu realmente quero dela. Hoje mais cedo, fui disposta a ter uma conversa definitiva, mas agora…

Agora que ela precisa de mim, pensou a quileute. Aquilo mudava absolutamente tudo. 

— Não está pensando em… hum… 

O lobo sentiu uma súbita insegurança tomar conta do seu corpo. Afinal, os fatos estavam muito claros. Se Kayla saísse do hospital e precisasse de cuidados, Erin estaria disposta a cuidar dela. Parecia egoísmo pensar naquilo, no entanto, a ideia de ficar longe de Erin, de mudar a vida incrível que estavam começando a construir juntos, partia seu coração. 

— Não estou pensando em quê? — Aquela frase de Embry tinha atraído seu interesse, principalmente pela maneira como ele tinha agarrado seu corpo com mais força. Como se estivesse tentando confirmar que ela ainda estava ali e que não iria fugir. 

— Se a sua mãe sair do hospital, você vai voltar para a sua antiga casa? 

Quer que eu volte para a minha antiga casa? — Erin se arrependeu de sua resposta no instante em que Embry a repreendeu com os olhos. Ele tinha falado diversas vezes o quanto a amava e o quão feliz ele estava em morarem juntos, assim como todos os planos para o futuro. A Landfish, no entanto, tinha tanta insegurança dentro de si de ser abandonada, que certas vezes deixava esse sentimento tomar conta do seu coração. — Desculpa. E não. Não quero voltar para lá. Talvez, quando a minha mãe ficar melhor, possamos trazer ela pra cá? 

O Call ia concordar com a proposta, mas Erin fez uma careta em desagrado. 

— Vamos contratar alguém para cuidar dela — decidiu finalmente. 

A quileute não conseguia compreender ainda seus sentimentos. Ao mesmo tempo que queria sua mãe por perto, tinha arrepios com a ideia de morar junto com ela novamente, ou de ter Embry próximo a ela. Queria que seu relacionamento fosse saudável e sem a sombra de sua mãe ou de Carter os amaldiçoando. 

— Consegui aqueles episódios de Supernatural que você tanto queria assistir. 

Embry odiava a expressão sonhadora que Erin fazia todas as vezes que ela via o maldito Jansen Ackles atuando como Dean. Ele sentia certa insegurança ao vê-la babando por outro homem, mas adorava a sua animação a cada episódio da série, então tinha feito o sacrifício de pedir para Quil — que também era muito fã —, para gravar os últimos episódios. 

— Mentira! 

O semblante feliz foi o suficiente para o Call retribuir com um sorriso, principalmente pelo fato de que Erin pareceu ter esquecido um pouco da situação de sua mãe e do que havia acabado de contar sobre o seu passado. Se fosse para deixá-la contente, ele assistiria quantas temporadas de Supernatural fossem precisas. 


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