Entre Lobos e Monstros escrita por Nc Earnshaw


Capítulo 22
Pai do ano




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Capítulo 21

por N.C Earnshaw

 

ERIN NÃO ENTENDIA porque Tyffany ainda se dava o trabalho de voltar para casa. Para ser sincera, apesar de estar muito grata por ter sido aceita e adorar a mulher, todas as vezes que a Call pisava os pés em casa, Embry e ela brigavam feio. 

A Landfish entendia completamente os motivos dela. Ela era uma mãe que estava preocupada com seu filho. No entanto, a maneira com que ela abordava as discussões não parecia surgir efeito algum, pois apenas afastava cada vez mais Embry dela. 

A quileute não podia negar que se encontrava corroendo-se de curiosidade para saber o que ele aprontava durante as madrugadas. O garoto tinha melhorado bastante em relação aos horários, mas várias eram as noites em que ela esperava por ele encolhida no sofá da sala. E diversas foram as vezes que ela sentiu uma imensa vontade de enchê-lo de perguntas — ela sabia que obteria respostas se o forçasse —, entretanto, controlava-se no último segundo. Desejava que Embry se abrisse com ela porque se sentia confortável, não por obrigação. 

Mãe e filho tinham evitado brigar abertamente na sua frente durante os primeiros dias. Mesmo que Tyffany forçasse Embry até o limite, ele apenas a escutava em silêncio, e ela evitava gritar. 

Naquele dia em específico, no entanto, enquanto Embry cortava os vegetais para o jantar e Erin preparava a carne, a senhora Call entrou pela primeira porta da frente como um furacão. 

— O diretor da escola ligou — disse Tyffany, furiosa, alcançando Embry em passos largos. A única coisa que separava seus corpos era uma bancada de madeira, e Erin não achava que seria suficiente para conter a raiva da mulher. — De novo. É a quinta vez no mês, Embry! A quinta! Você me prometeu que ia mudar…

— Estou tentando, mãe. — A voz do garoto soou baixa e fragilizada, fazendo com que Erin sentisse uma súbita urgência em protegê-lo. 

— Não minta pra mim, garoto! — gritou com os olhos cheios de lágrimas. Uma veia pulsava em sua testa e ela cerrava as mãos em punho. — Você entende, não é, que ao se recusar a estudar você apenas está ferrando com o seu futuro? Nenhuma empresa que se preze vai contratar alguém que não tenha terminado nem o segundo grau. Se quiser um dia sair desse buraco...

— La Push não é um buraco, mãe. É o meu lar. É onde eu quero continuar a viver e formar a minha família. Por que eu iria querer sair daqui? 

Erin queria se mover e falar algo para acalmar os ânimos, sobretudo quando percebeu um brilho diferente nos olhos de Tyffany. Foi neste instante que ela soube que as próximas palavras dela iriam ferir Embry profundamente. 

— O desgraçado do seu pai pensava da mesma forma, e olha ele onde está! — Tyffany colocou as mãos sobre a boca, arregalando os olhos. Ela tentou consertar o que disse, uma vez que seu filho não tinha ideia de quem era o pai, mas não obteve sucesso. — Eu só quero seu bem, querido — disse ela com a voz mais calma. — Não quero que acabe terminando como ele ou como...

A Landfish segurou a mão de Embry na sua para mostrar que estava ao lado dele para o que desse e viesse. Doía seu coração vê-lo tão despedaçado. Ela queria gritar com Tyffany por fazê-lo ficar daquela maneira, no entanto, não se via tendo o direito de se intrometer. A mulher à sua frente era a mãe dele, e Erin não era nada. 

— Quem é o meu pai, mãe? — perguntou ele, tentando controlar o choro. Em todos os anos de sua vida, mesmo quando era chamado de bastardo por várias crianças de sua classe ou até mesmo por Leah, nunca tinha ido até sua mãe para perguntar quem era o seu progenitor. Por saber que era algo que a machucava, guardava para si mesmo porque não queria magoá-la pedindo a verdade. Sofria em silêncio, ainda que soubesse que seu pai morava no mesmo lugar que ele, e que ele poderia ter algum irmão com quem pudesse contar nos momentos de solidão. — A senhora acabou de dizer que, assim como eu, ele tinha a ideia de morar em La Push para sempre. Achei que tivesse vindo de Makah já grávida? 

— Não tente mudar de assunto, Embry Call! Não estamos falando sobre seu doador de esperma, mas sobre o fato de você não estar comparecendo às aulas como me prometeu! Não importa quem é o seu pai. Ele não merece tanta atenção. 

A respiração errática de Embry atraiu a atenção da quileute ao seu lado. Seu toque não pareceu surtir efeito em acalmá-lo, visto que seu corpo tremia com uma fúria avassaladora. Se Erin fosse mais esperta quando o assunto se voltasse para ele, e tivesse um pouco de autopreservação, teria dado as costas e fugido correndo dali. Não era da sua conta, repetia para si mesma. Não era a namorada, nem sequer sua ficante. Tinham se tornado amigos há poucas semanas, então não tinha o direito de ficar brava com Tyffany ou de querer protegê-lo com seu próprio corpo — se fosse necessário. 

— Importa pra mim, mãe — disse Embry entredentes, soltando a mão de Erin para fechar as suas próprias em punhos. Ele sabia desde que havia se transformado em lobo que seu pai morava em La Push. As teorias que surgiram entre os membros da matilha e o conselho eram diversas, e o faziam se sentir humilhado, por mais que tentasse guardar aquele sentimento para si. — Talvez, se eu souber quem ele é, me ajude a…

— Eu sei exatamente o que pode te ajudar, Embry! E não é saber quem é o inútil do seu pai. Você precisa acordar e ver que a vida é muito mais que sair com seus amigos toda madrugada para fazer sabe Deus lá o quê. É entender que eu não vou estar pra sempre aqui para pagar suas contas. — Ela suspirou, passando a mão pelos cabelos. — Eu doei a minha vida inteira para te manter feliz e alimentado, e é assim que você me paga? Mentindo o tempo todo e guardando segredos? 

Embry sorriu com escárnio, assustando Erin, que não conseguia tirar os olhos dele. Não imaginava que o quileute guardava tanta coisa dentro do peito. Assim como ela, o garoto não sabia quem era o seu pai. Durante muito tempo, aquilo mexeu bastante com seus sentimentos, mas ela acabou deixando de lado quando se deu conta que não queria conhecer o cara que abandonou sua mãe quando ela mais precisava. 

— Apenas andei me inspirando em você, mãe.

Ele deu as costas para ambas e foi em direção ao próprio quarto, pisando duro e ignorando completamente os gritos de Tyffany. 

Os soluços da Call se iniciaram, e Erin sentiu um pouco de pena. Era realmente difícil a situação entre os dois, quando ambos não queriam dar o primeiro passo para se abrir e contar os segredos que tanto atormentavam aquela família. 

— Senhora Call, me desculpe por me intrometer, mas eu deixo o Embry todo dia na porta do colégio e posso garantir que ele está frequentando. Talvez o diretor tenha se equivocado… — Erin segurou na bancada com força. A única coisa que desejava era correr até Embry para consolá-lo, entretanto, queria mostrar para Tyffany o quanto ela estava sendo injusta. — Eu não sei. Mas ele está se esforçando. Prometo que está. 

A Landfish não esperou uma resposta e correu até a porta do quarto em que dormia. Não sabia muito bem se iria conseguir consolá-lo. Contudo, tentaria ao máximo fazer com que um sorriso se abrisse naquele rosto lindo. Doía seu coração pensar num Embry Call triste. 

Ela girou a maçaneta com cuidado, não querendo assustá-lo, e deu de cara com Embry sentado na beirada da cama com o rosto apoiado sobre as mãos. O corpo dele tremia como se ele estivesse com muito frio, mas a quileute sabia que aquele não era o motivo. O corpo dele funcionava com uma temperatura elevada e ele parecia sentir calor o tempo todo. 

Erin achou que ele não a tinha ouvido entrar, entretanto, assim que metade do seu corpo se infiltrou no cômodo, ficou paralisada ao ouvir a voz rouca de Embry. — Acho melhor você voltar para a cozinha. Não sou uma boa companhia no momento. 

A Landfish revirou os olhos e se aproximou mesmo assim. 

— Estou falando sério, Erin. — Ele finalmente levantou a cabeça para olhar em sua direção. — Não quero…

— Você quer realmente saber quem é o seu pai? — interrompeu a Landfish, agachando-se em frente aos joelhos dele. 

Embry a olhou exasperado por alguns segundos, e assentiu. 

— Não tenho tanta vontade de conhecer o idiota, ou formar algum tipo de laço. Sei que ele deve ser um dos maiores babacas que já pisaram na terra. Mas… — Ele fechou os olhos, apreciando o carinho do seu imprinting. Ela acariciava seu rosto com as costas das mãos. — é um capítulo da minha vida que quero encerrar. Quero tirar da minha mente essa dúvida que me atormenta desde criança. Não aguento mais me perguntar as mesmas coisas. Será que somos parecidos? Temos os mesmos olhos ou o mesmo formato do rosto? Ele gosta de carros assim como eu ou tem hobbies diferentes? 

— Bem. Se isso for de alguma ajuda... — sussurrou Erin como se contasse um segredo. — Eu te acho a cara da sua mãe. 

Embry sorriu-lhe e descansou o rosto na palma da mão dela. 

— Posso ter um irmão. 

— Eu te entendo. — Erin lembrou do bebê na barriga de sua mãe. Alguém que sofreria nas mãos daquele monstro do Carter assim como ela sofreu por anos. — Talvez nunca me permitam conhecer meu futuro irmãozinho ou irmãzinha. 

— Sempre tem a opção de sequestro — brincou o Call, desejando animá-la. — Ou podemos provar o quão babaca o seu padrasto é, e tirarmos o bebê deles. Acho que tem espaço ali… — Ele apontou para a parede quase em frente à cama. — para um berço. 

— Embry… — Ela resolveu deixar aquele assunto de lado, por mais que aquela declaração tivesse deixado seu coração batendo forte. — Por que não conta pra sua mãe sobre qualquer que seja esse seu segredo? Sei que pode ser difícil, mas quer mesmo ficar desse jeito ela? Se eu pudesse… Se minha mãe me amasse tanto quanto a sua te ama… 

O coração do lobo se partiu ao ver os olhos da mulher que amava encherem de lágrimas. Impulsionado apenas pelo amor que sentia por ela, puxou-a para cima e a colocou sobre uma das suas pernas. 

Erin arregalou os olhos, surpresa com o ato. Contudo, experimentou uma enorme onda de felicidade tomar conta do seu corpo. Sentia-se completamente segura nos braços do garoto que estava roubando seu coração. 

— Ela não entende, Erin. Ela nunca vai entender. — O quileute fez com que ela deitasse a cabeça no seu ombro direito, passando o braço ao redor da cintura dela. — Você não a conhece direito ainda, mas minha mãe consegue ser a pessoa mais cabeça dura que já conheci. Ela supera até o Paul, se quer saber. 

Erin semicerrou os olhos. Duvidava bastante daquilo. Ninguém batia Paul Lahote quando se tratava de estupidez. 

— Talvez devesse tentar contar a ela. Pode mesmo se surpreender. Ela te ama e vai aceitar qualquer coisa. 

Embry negou. Nem mesmo seu imprinting conseguiria convencê-lo do contrário. 

— É a minha mãe, Erin, e eu a amo muito. Mas não consigo confiar nela. Não quando ela também esconde coisas. 

A Landfish assentiu, sabendo que não daria em nada se continuasse insistindo. Resolveu então aproveitar o momento e se aconchegar ao corpo caloroso que circulava o seu. 

— Tenho que te mostrar uma coisa. — Erin puxou Embry pela mão até a portinha azul desbotada próxima à porta dos fundos. Tyffany tinha saído sem sequer se despedir pouco mais de uma hora antes, e a quileute viu naquilo a oportunidade de mostrar o que tinha descoberto sobre o pai dele nos primeiros dias em que tinha ido morar ali. — Espero que não me ache intrometida ou algo do tipo…

O lobo quis riu da maneira acelerada com ela já arranjava desculpas, estranhando o que de importante ela tinha achado num lugar em que guardavam a bagunça. 

A Landfish abriu a porta e acendeu a lanterna do seu celular para iluminar o ambiente. Sabendo exatamente onde ela tinha colocado a caixinha, não precisou tatear com as mãos — correndo o risco de tocar numa barata ou outro bicho qualquer. 

Ela perguntou para si mesma se estava fazendo a coisa certa ao passar por cima de Tyffany e contar para Embry o que tinha ali. A quileute sabia que ele não diria à mãe que foi ela quem encontrou aquilo quando fosse enfrentá-la, no entanto, ainda experimentava certa insegurança por estar morando ali de favor. 

Com a caixinha em mãos, ela puxou um Embry confuso até a cozinha e depositou o objeto em cima do balcão bem em frente ao corpo do quileute. 

— O que é isso, Erin? — inquiriu o lobo, não sabendo porque seu coração tinha acelerado ou porquê estava tão nervoso. 

— Encontrei há algum tempo quando estava procurando o aspirador. — A garota mordeu a própria bochecha. Encontrava-se tão nervosa com aquela situação que estava prestes a fazer xixi nas calças. — Está vendo estas iniciais? — Ela passou o dedo pelas letras gravadas na madeira. — Acho que são dos seus pais. 

O estômago de Embry embrulhou com aquela revelação. E sua mente começou a trabalhar furiosamente para saber qual dos garotos do bando possuía o sobrenome com letra L. Ele já possuía a resposta mais óbvia, mas não queria admitir para si mesmo. Não desejava que aquilo se tornasse realidade. 

Talvez sua mãe estivesse certa ao esconder dele aquela informação. A verdade o tinha deixado completamente enjoado. 

— Isso só pode ser brincadeira — sussurrou baixinho, sem conseguir tirar os olhos da caixinha. — Você abriu? 

Erin balançou a cabeça em negação, não se atrevendo a fazer qualquer comentário. 

O lobo não sabia mais se queria aquilo. Ele sabia que se decepcionaria de qualquer forma com o homem que tinha abandonado sua mãe grávida e traído sua própria esposa. No entanto, não tinha ideia que seria alguém tão desprezível. 

Daniel Lahote, o homem que tinha feito da vida de Paul um inferno, era o seu pai. 

— Quer que eu abra? — inquiriu Erin ao ver sua hesitação. — Talvez tenha algo aqui dentro que confirme as nossas suspeitas. 

— Nós temos suspeitos? — Mesmo em meio a maior revelação de sua vida, ele não resistiu em provocá-la. — Quem acha que é? 

A Landfish mordeu o lábio inferior, temendo ofendê-lo, mas ao mesmo tempo querendo animá-lo.

— Tem o David Larsen.

— O do posto de gasolina? — riu Embry. — Não, não é ele. 

— E o Dancan Leach? Acho que vocês têm as orelhas bem parecidas.

O Call tocou uma de suas orelhas sem pensar, arrancando uma gargalhada da quileute. Dancan Leach tinha uma cicatriz no lugar em que a cartilagem ficava. 

A presença de Erin o deu coragem para abrir a caixinha ele mesmo — não sem antes admirar por alguns segundos a paisagem do penhasco cravada nela. Dentro dela, havia apenas dois papéis dobrados, e o lobo não pôde deixar de admitir que se sentiu decepcionado. 

Impulsionado pela curiosidade, ele tirou o papel maior e o abriu rapidamente. 

— Mas que merda é essa? 

Erin franziu o cenho e se aproximou mais ainda dele para ler o que estava escrito ali. 

— Acho que é a escritura da sua casa. — Ela deu uma pausa. — E olha… — A quileute ergueu as sobrancelhas em surpresa. — Está no seu nome! 

Apressado, Embry jogou o papel de qualquer jeito em cima da bancada para ler o outro. 

 

“Minha Fanny, 

 

Espero que minha ausência nos últimos dias não a tenha feito pensar que abandonei vocês. A saudade que sinto de você e do calor do seu corpo me atormenta todos os dias, e mal vejo a hora de trazê-la para mais perto de mim. 

Evelyn anda desconfiada de nós dois, e eu não quis pedir para que viesse até La Push quando não tinha qualquer condição de colocar um teto sobre sua cabeça ou sobre a do nosso filho que está prestes a nascer. 

Paul anda mais manhoso do que o normal, e Evelyn não tem muita paciência para cuidar dele. Apenas reclama o dia inteiro que quer voltar a morar em Makah. Brigamos novamente ontem à noite quando encontrei o garoto sem ter comido nada desde o café-da-manhã.

Anseio para que o correio entregue esta caixinha o mais rápido possível. Pois venho, através deste bilhete, dizer que finalmente o banco me deixou fazer o empréstimo para financiar uma casa. Teremos um lar; eu, você e o nosso querido Embry, e enfim seremos felizes. Mando junto, também, o dinheiro necessário para pagar o táxi até aqui. 

Vou contar as horas até a sua chegada.

 

Com amor,

Daniel Lahote. 

 

— Daniel Lahote? — A voz de Erin soou tão aguda que fez com que seus ouvidos doessem. — O pai do Paul?

— E o meu pai também, aparentemente — rebateu Embry, sentindo seu corpo adormecer. 

Eles ficaram em silêncio por alguns minutos, e a Landfish ajudou o quileute a guardar tudo de volta na caixa.

— Pode colocar de volta no lugar em que achamos? 

Erin assentiu, mas antes que o deixasse sozinho, não resistiu em perguntar. — Vai contar ao Paul sobre isso? 

Embry bufou. 

— Não tenho outra alternativa. — Ele tinha quase certeza que não conseguiria controlar seus pensamentos quando estivesse transformado. 

Assim que a Landfish entrou novamente no quartinho para devolver a caixinha, uivos altos a fizeram tropeçar numa lata vazia e se segurar na prateleira, que quase virou por causa do seu peso. Ela estava acostumada com o barulho dos lobos que rondavam aquela área, entretanto, aqueles uivos pareciam mais desesperados que o normal. 

Quando Erin voltou para a cozinha, Embry não se encontrava mais lá. 




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