Os Humanos escrita por Camélia Bardon


Capítulo 4
O segundo começo


Notas iniciais do capítulo

Oie ♥ como vão vocês? Tá acabando, de novo :c
No capítulo de hoje, temos uma surpresinha. Vocês gostaram muito do último capítulo de "O Inquilino", então por que não mimar vocês mais um pouquinho?
As falas em itálico são do Nath e da Ginger.


a·zo·a·da
substantivo feminino

— Barulho que aturde, que atordoa; zoada.



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Diretamente do monólogo da Gata Branca, intitulado “Os Humanos”

Página 17. Ano de vida: sete

 

A rotina de comer, tomar banho de língua e – os tão temidos – banhos reais, me espreguiçar sobre o sol na janela da lavanderia e depois voltar para o sofá ficava mais monótona a cada dia. Eu amava o humano, mas seis anos de marasmo eram demais. Ele chegava cada dia menos disposto a brincar – firme na crença de que eu estava muito crescida para os truques bobos que ele amava – e eu estava cada vez mais disposta a ser adorável e trazer um pouco de luz para o coitado.

O humano ficou assim depois que a humana foi embora. Fiquei determinada a odiá-la, mas eu a amava também, então me mantive neutra e fiz companhia ao humano quando era requisitada. Um dia, a humana voltou, e todo o ódio que posso ter acumulado por ela por ela ter feito o humano triste foi embora quando vi que o humano voltou a ficar feliz.

Era o paraíso! Ele voltou a brincar comigo, parou de me trancar no quarto quando aquela humana maluca também parou de vir aqui – mas imagino que tenha feito isso mais por ele do que por mim, de fato – e... O melhor... A humana me alimentava com restinhos de comida! Comida e carinho o dia inteiro!

E, é claro, ela trouxe o ladrãozinho insuportável. Eu o odiava. Além de roubar minha comida, o imprestável comia fazendo a maior azoada, e roubava o carinho do humano de mim e... Tinha aquele charme. A pior parte era o charme irresistível. Ora, eu era uma gata de condomínio que jamais havia me relacionado com nenhum gato, então o que era de se esperar além de uma atração fatal?

Vou deixar esse detalhe de lado, afinal nossa relação é apenas física. Não somos escandalosos como os humanos enquanto eles estão acasalando. É tudo feito em sigilo.

O que é interessante mesmo de observar é os humanos. Eles são muito curiosos.

Por exemplo, o humano é bem diferente da humana. Ela é mais enérgica, ele é mais reservado. Mas não quer dizer que a humana não tenha seus momentos de reserva ou que o humano não tenha surtos ocasionais de ânimo. Quando disse para o Hércules que os dois imitavam características um do outro sem perceber, ele só riu da minha cara e disse que era “papo filosófico demais para o meu bico”.

Gato imprestável.

O que quis registrar hoje foi um desses momentos onde o humano se mostrou a pessoa enérgica da relação. Foi um dia bem estranho, que não entendi o que aconteceu, mas mantenho tudo documentado para registro. Aconteceu assim.

A humana ficava bem mais em casa. O trabalho dela tinha mudado, ela ia um dia sim e o outro não. O humano disse que ela não precisava se matar tanto de trabalhar, senão iria acabar odiando o emprego. Hércules disse que o humano tinha toda a razão, então eu e a humana ficamos do lado dele de prontidão. Num outro dia, ela passou o dia inteiro fora. Quando voltou, parecia desanimada que nem o humano quando chegava do trabalho... Mas ela não tinha ido trabalhar. Então, logicamente, eu fui oferecer os meus serviços felinos.

Oi, Branquinha — ela me pegou no colo com aqueles dedinhos mágicos. — Tudo bem?

Miei em resposta, e ela pareceu contente com a recepção. Porém, pelo resto do dia inteiro fiquei sentada ao seu lado no sofá, me perguntando o que havia de errado.

Hércules logo se juntou à bagunça.

— O que tem de errado com ela? — indagou, com completa falta de tato, para variar. Para tentar ajudar, ele se deitou no meio das pernas dela. — Será que foi a comida de novo?

— Não acho — opinei. — Ela fica no banheiro com comida ruim, não triste.

— Você tem um ponto. Acha que foi algo com o humano?

— Não... Se fosse, ele estaria aqui. É algo diferente...

Prosseguimos especulando até que o humano em questão chegasse. Ele também notou que a humana estava muito quieta para o gosto dele.

Foi tudo bem no médico...? — sentando-se ao lado dele, o humano passou um braço ao redor dos ombros dela. — Alguma explicação daqueles exames?

A humana meneou a cabeça, recostando-se no humano com cuidado.

Não é nada grave... Mas a doutora disse que nunca vou poder gerar filhos.

O humano compartilhou do silêncio da humana. Eu nunca tinha ouvido aquela palavra antes, mas parecia bastante com filhotes...

Eu sinto muito... — o humano apertou-a num abraço apertado. Após alguns minutos, disse o que pareceu ser a melhor ideia até o momento. — Teremos vários gatinhos para mimar e apertar. Além disso, as crianças do hospital te amam... Sei que não é a mesma coisa, mas aposto que deve valer de alguma coisa... Certo?

Tem razão...

Hércules saiu do meio das pernas da dona para vir avizinhar-se do meu lado. Tal como eu, permaneceu observando os dois com uma expressão curiosa. Resolvi arriscar e cruzar uma linha de nosso relacionamento e comentar:

— Ele melhorou bastante, você não acha?

— Acho. Apesar de não estar entendendo metade do que estão dizendo.

— Ah, não importa. Vamos ser adoráveis e eles vão continuar nos dando amor e carinho — me espreguicei, ao passo que Hércules passou a tomar seu banho de língua da tarde.

Dali em diante, a humana foi melhorando gradativamente. O humano trocou de lugar com ela no quesito de ser a alma da casa, mas uma coisa era certa: a humana era bem melhor em fazer surpresa. Depois de um tempo meio pequeno e meio grande, Hércules e eu farejamos um novo intruso. Aparentemente, o título fazia rodízio.

Ao filhotinho foi dado o nome de Mozart. Eles eram terríveis com nomes, mas ótimos com amor. Quanto a nós, eu e Hércules, seríamos obrigados a bancar os pais do garoto. Como dizia a humana, ele era acinzentado... Uma mistura de preto e branco.

Por mais que detestasse dividir a atenção do humano, vi que aquela era a melhor opção.

Eu também os amava.


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Notas finais do capítulo

Até amanhã, no último!



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