Os Desqualificados escrita por S Q


Capítulo 37
Botando pra Fora




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Graziele andava de um lado para o outro, mãos na cintura, sem saber o que fazer. Estava em uma cela da delegacia da asa Sul de Brasília. Havia sido levada para lá após o sequestro de Ricardo. Conseguira um habeas corpus, mas o mesmo fora recusado, tendo assim, que retornar ao lugar. 

A cantora sentia-se traída e largada por todos. Simplesmente ao verem seus números nas plataformas de streaming subindo mais lentamente, seus tios pararam de lhe responder tão bem como antes. Seus fãs estavam minguando a cada novo escândalo em que ela se envolvia. Seu namorado virou ex e nenhum outro cara parecia se interessar por ela mais. Seus inimigos estavam triunfando. Pensava nisso, desesperada sem saber o que fazer, quando um policial passou em frente balançando as chaves das celas.

— Seu bosta! Passa com as chaves assim pra quê?! Só pode ser pra provocar, me tirar do sério, né?! - ela falou, avançando para frente, gritando nervosíssima.

O policial empertigou o peito, falando alto e grosso:

— ÔU, ÔU! O que você disse? Cala a boca, sua vagabunda!

A cena era de falta de respeito: uma autoridade abusando de seu poder para colocar a moça “em seu lugar” (com muitas aspas). Porém, se ela quisesse evitar ainda mais problemas, poderia ter feito algum comentário indignado sim, porém um pouco menos… perturbador. Ao contrário, o que falou foi:

—  Enfia dolorosamente essas palavras no seu…

Não conseguiu terminar a frase. O guarda bruscamente abriu a cela e puxou os braços dela para trás, com força, algemando-a.

— Andando!

— Eu sou Graziele Tesmon! Exijo que pare de puxar imediatamente!

O guarda riu, e a soltou com força, o que fez com que a cantora caísse bruscamente no chão. A sorte de Graziele foi que havia outro policial na delegacia, com mais honra e caráter. Ele ouviu os gritos da mulher e quando viu o colega lhe agredindo começou a gritar:

— Tá maluco? Além de abuso de autoridade, isso é violência e covardia de um homem forte e treinado contra uma mulher muito menor!

— Qual foi, seu viado?

O outro estreitou os olhos e balançou a cabeça negativamente. Com aquele tipo, pelo visto, não adiantava conversar. Apelou para o argumento que ele ouviria:

— Quer perder o emprego e ser preso numa prisão militar?!

O agressor rangeu os dentes, mas se afastou. O policial que agiu de modo mais correto se aproximou de Graziele, ajudou-lhe a se levantar, e guiou-lhe de volta para a cela.

— Você sabe me dizer se meus tios ligaram? Mandaram algum advogado... — Ela perguntou, praticamente em prantos, enquanto voltava.

— Infelizmente não.

Era o que faltava para Graziele começar a chorar, de verdade, com força. O policial sentiu pena, mas não podia liberar uma mulher que cometeu um crime, sem que a justiça permitisse. Estava abalado, porém voltando ao seu posto, quando ouviu ela fazendo falando novamente em um tom de voz estranho:

— E a minha… mãe?

 

                                                    ***

Mais para o centro da cidade, um senhorinha sentia um forte aperto no peito. Ela estava em seu quarto na ONG quando teve o mal súbito, que lhe fez gritar. Para sua sorte, rapidamente os voluntários que cuidavam do lugar chegaram ao quarto. 

— Tragam uma água e o aparelho de pressão!

Rapidamente os assistentes sociais atenderam a senhora. Ela ficou bem apesar do susto.

— Aconteceu alguma coisa de diferente?  — um deles perguntava.

— Não, eu estava bem até… — ela falou, tão confusa quanto quem lhe atendia. De repente começou a se balançar, empurrando o ajudante para longe — Minha filha! Eu quero minha filha! — chorando e gritando, continuou — Não foi pra isso que eu trouxe ela aqui! — Aí puxou o braço do homem novamente — Cuidem dela! — então caiu para trás e falou baixo — Não tirem ela de mim… 

Estavam todos assustados. Marizete tinha problemas mentais, mas eles vinham melhorando. De quallquer forma, ninguém nunca tinha lhe visto naquele estado. Deram-lhe então um calmante também. Ela aparentemente se acalmou rápido. Estavam prestes a sair do seu quarto quando um teve coragem de dizer:

— Ela tem alguma filha?

— Talvez. Mas pode só estar delirando… Quem sabe ela não considera a Milena como uma filha?

Esse voluntário voltou ao quarto. Uma outra moça que trabalhava lá percebeu  a movimentação e foi ao quarto junto dele. Ficou observando enquanto o outro se sentava ao lado da paciente grogue, pegava em sua mão e gentilmente perguntava:

— A senhora tem realmente uma filha?

Marizete fechou um pouco os olhos e concordou de leve com a cabeça. Ele, então, mais docemente ainda, lhe perguntou:

— Nós nunca vimos a sua filha. Você acha que poderia me contar o que aconteceu com ela?

A idosa abriu um pouco mais os olhos. Estava fraca, mas suas palavras foram firmes. Tristes, porém fimes:

— Eu não sei. Hoje ela teria por volta de uns… 22 anos. O nome dela era Ezra Dorothy. Ezra é o original em hebraico do nome Esdras. Significa auxilio. E Dorothy, bom, eu era fã do mágico de Oz. Eu e meu marido demos esse nome pra ela porque sabíamos que era um ser especial no mundo, com brilho próprio. Queríamos que fosse um brilho usado para o bem, para auxiliar outras pessoas, como a Dorothy fazia, sabe? Porém, os tios dela zombaram do nome, acharam muito diferente e registraram do jeito errado que entenderam… Eusfradorose ou algo assim… Consegue ver o horror que fizeram ao tomar conta dela?!  E nunca mais falaram comigo!

— Certo, então se o que você estiver me dizendo for verdade, sua filha foi raptada pelos tios?

Ela sacudiu a cabeça em resposta.

— Eu entreguei-a para ser cuidada por eles. Eu já era muito pobre e tinha problemas na rua.

— Bom, mas então, de uma forma ou de outra, você tem uma família… — o assistente olhou para a outra de pé na porta do quarto sorrindo. Recebeu um sinal afirmativo em resposta. Era uma informação muito importante na reabilitação de qualquer assistido pela ONG  e pela primeira vez, conseguiam tirá-la de Marizete. Precisavam tentar identificá-los agora.

— Marizete, nós te ajudamos até agora e podemos te ajudar um pouco mais. Para isso, eu preciso que você nos responda uma pergunta que já fizemos, mas… você não conseguiu responder muito segura. Por um acaso, consegue se lembrar agora de qual o seu sobrenome?

— Barbosa. Eu sou Marizete Barbosa. Mas que a minha família se exploda! Eu só queria encontrar minha filha. Ter certeza de quem ela é…

Dessa vez, a outra voluntária que ficou curiosa.

— Certeza? Acha que pode já ter visto ela?

Marizete devolveu com um sorriso estranho.

— Não acham a Graziele Tesmon parecida comigo, também?

Um olhou para o outro assustado. Deixaram Marizete descansar por agora, e os dois saíram dali pensativos.

— Ela deve estar surtando… De fato, se reparar bem, essa cantora Graziele é um pouco parecida com ela, mas nem é tanto assim. E até aí um completo desconhecido pode ser parecido comigo.

— Tá, mas o que a gente faz com o que ela disse?

— O protocolo diz que qualquer acontecimento deve ser informado a quem assiste ela. No caso, devemos falar com a Milena.


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