Forget me not escrita por Lua Chan


Capítulo 11
Capítulo 10




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/796488/chapter/11

REGRA NÚMERO QUATRO: NUNCA evite uma troca de olhares com seu ouvinte. Você pode convencê-lo de grandes coisas. A sentença que Rachel Vuska considerava como uma de suas leis fundamentais agora explodia na mente da jovem Molina enquanto observava a nova versão de Luke Patterson parada a sua frente. Embora os olhos esverdeados e os pequenos trejeitos do garoto parecessem iguais aos do Luke de meses atrás, quando Julie o vira pela primeira vez, ela estava ciente da personalidade de seu ouvinte naquele momento. Não se tratava mais do Luke, o guitarrista da Final Sentence, muito menos do garoto que ela costumava conhecer meses atrás.

Não.

Aquele era o tal Ossário.

Um leve formigamento se apodera de suas pernas e pés, que tentaram ao máximo obrigar todo o corpo a se movimentar para perto de Flynn e correrem para bem longe do ginásio vazio – sem ninguém para poder ouvir nossos gritos, Julie acrescenta fervorosamente em seus pensamentos. A Molina estava tão absorta com tudo o que acontecia que mal notou que Flynn também admirava o garoto com quase a mesma incredulidade. Talvez Ossário pudesse mesmo se permitir ficar visível para os corpóreos.

Luke-Ossário arrisca dar passos mais largos para perto das duas garotas, ainda estáticas demais para forçarem uma corrida. Julie pensa em como ele, com seus poderes, provavelmente deveria estar ouvindo o ritmo selvagem de seu coração enquanto pensava em novas formas de afastá-lo de vez da escola. Era até humilhante.

Um último passo finalmente a faz pronunciar alguma coisa útil, além de se posicionar na frente de Flynn de maneira protetora.

— Saia daqui agora ou eu garanto que te faço querer sair voando pra longe do corpo do Luke!

Foi um pronunciamento que a garota duvidava bastante conseguir cumprir, visto que o próprio Ossário parecia assustar toda a essência do guitarrista da Final Sentence, mas de qualquer forma se sentiu revigorada pela coragem. Agora as feições roubadas de Luke faziam uma careta muito semelhante a de alguém que havia escutado uma música de gosto duvidoso – ou as carrancas que a própria Flynn esboçava quando a Molina mencionava o nome de Carrie em uma sentença.

Mesmo não entendendo o motivo da reação, Julie mantém-se firme contra o tirano que teria tomado posse dos movimentos de Luke mais uma vez.

— Eu tô falando sério! — insiste, investindo numa postura que lembraria a de um boxeador amador sobre um ringue — Mais um passo e você tá morto!

— Morto eu já tô, né... — ele replica, segurando uma risada provocativa — Mas do que você tá falando, cara? Olha, eu sei que deve ser um desprazer pra você rever essa carinha bonita, mas não deveria ser pra tanto.

— Tente manipular outra pessoa, Ossário! Eu sei o que fez com meu amigo, mas não tem nada pra você aqui.

O vislumbre de puro desgosto atravessou os olhos do garoto pela segunda vez, Julie percebera mesmo em sua constante posição de defesa. Dessa vez ele não evita a risada, deixando-a apenas mais nervosa e com vontade de socá-lo até suas forças se esvairem.

— Acha mesmo que eu sou Ossário? Uau, isso doeu. — ela não responde, embora sequer fosse preciso. Luke mesmo notara a determinação assustadora da garota — Tudo bem... meu nome é Luke, certo? Luke Patterson, o garoto com quem você se esbarrou no Redlands Bowl...?

— Quem garante que o verdadeiro Luke não contou tudo pra Ossário quando deixou a gente no show?

— Você quer que eu faça o que, então? Se você não está possuído bata palmas. — ele cantarola, quebrando um pouco da tensão que embaçava a vista da Molina e Flynn mesmo com a claridade excessiva vinda das janelas do local — Viu, nem você bateu palma.

A Molina, por fim, sente o formigamento se recolher aos poucos de seus membros quando decide relaxar e dar uma espiada em Flynn, atrás de si. A garota estava um pouco perturbada, mas não ao ponto de desmaiar de medo – mas talvez pudesse desmaiar de alívio. Afinal, agora não havia espaço para dúvidas sobre aquele ser Luke até nos míseros traços de personalidade.

Um ar furioso se dissipa nas narinas da garota enquanto o assistia soltar um riso descarado. Definitivamente era Luke. Até nos míseros traços.

— É... não tem como esse tonto não ser você. O que tá fazendo aqui?

— Eu voltei pra te ver, não é óbvio? Achei que ficaria feliz...

— Defina "feliz". — a Molina retruca, ainda se acostumando com o declive repentino de adrenalina em suas veias — Seria feliz por te ver depois de passar uma semana sem saber por onde andou e se tava tudo bem ou feliz por saber que você é você e não Ossário?

— Julie, eu...

— ... sinto muito? — num rápido movimento, os olhos dela se cruzam com os de Flynn, como se tentasse obter o maior apoio naquele momento — É, eu já ouvi isso antes, mas tudo bem. Pelo menos você tá aqui, não é...

As mãos dele se movimentam num espasmo, como as de alguém ansioso demais para receber o boletim final da escola. A Molina não consegue evitar de se sentir mal pelo comentário, mas a parte mais racional de seu cérebro a manteve firme. Aquilo era certo, não é? Exigir satisfações a ele pela segunda vez depois de um novo sumiço. Talvez fosse só o medo de perdê-lo de novo falando mais alto dentro de si, mas Julie simplesmente não se sentia pronta para outra despedida.

— Eu tive alguns problemas com o chefe. — ele anuncia, simplificando o maremoto de sentimentos que colidiam em sua mente — Novas tarefas surgiram e eu tive que estar lá por ele. Eu não me orgulho disso, Julie, e posso não te conhecer agora, mas não quero estragar tudo o que a gente tinha antes só por causa dessas porcarias.

Não seja tão ingênuo. — uma voz feminina distoante repentinamente ecoa nas paredes do ginásio, forçando as três cabeças girarem à procura de sua origem. Julie e Flynn não contém os novos suspiros de terror quando perceberam que não havia ninguém além delas e Luke no local.

Não se passa muito tempo até as duas garotas liberarem um grito esganiçado quando se deparam com um vulto mediano atravessando a quadra em tons morbidamente esverdeados. Julie procura ao máximo acompanhar seus passos, mas a coisa se movia com tanta agilidade que a garota perdeu a conta de quantos zigue-zagues ela teria feito. Embora a figura se movimentasse como se estivesse murmurando coisas aleatórias pelo ar, Julie não deixou de notar como ela parecia flutuar graciosamente sobre o chão sem esboçar muito esforço. Era de se admirar, mas ainda assim os sussurros não deixavam de ser assustadores.

Antes que qualquer um deles pudesse correr e chamar mais atenção do que já haviam chamado, a névoa escura que cobria a sombra dançante se dispersa pelo ar, revelando aos poucos quem a Molina menos esperava ver naquele instante. Julie poderia até não conhecê-la, mas sabia que aquelas vestes vitorianas pesadas combinando com as mechas eletricamente verdes dos cachos da garota a lembravam da baixista da Final Sentence, a banda que Luke agora participava e que teria roubado todos os holofotes da Julie and the Phantoms.

— Não deveria se curvar pra qualquer garota que conhece pela frente, Lucas. — prossegue ela, como se nada de extraordinário tivesse acontecido — Achei que já tivesse aprendido comigo.

— Ophelia... — Luke ronrona num misto de tons que Julie demoraria a interpretar — Já falei pra não me chamar de Lucas. Sabe que eu odeio esse apelido.

— Tudo bem, Lucas.

Ele revira os olhos a passo que Ophelia lança parte da bainha do vestido para trás com a mesma delicadeza de quando chegou, além de expor uma risada desafiadora de dar nos nervos. Ela era uma figura excêntrica, com certeza, e Julie se perguntou se Luke a teria conhecido por esse fator ou se teria sido uma grande coincidência o garoto ter esbarrado em alguém tão sobrenatural quanto ele e que ainda fazia parte de uma banda de rock.

— É claro que não foi uma coincidência, docinho. — a garota inesperadamente retruca, torneando uma mecha volumosa entre os dedos com preguiça — Ou você acha que tem um clube de Fantasmas Anônimos em cada esquina de Hollywood?

— Ela... você... — a Molina se engasga nas próprias palavras, recebendo uma careta de confusão de Flynn — Eu tava pensando nisso agora... como você...?

O sorriso permanece quente nos lábios de Ophelia. Nunca era ruim demais caçoar de pessoas assustadas com suas habilidades fantasmas.

— A telepatia é mesmo um dom incrível, não é? Foi mal, é que às vezes eu não consigo controlar.

— Esta é Ophelia Chapman, Julie. Ela é a filha de Ossário. — Luke adiciona, gerando quase que instantaneamente um misto de reações das três garotas que variavam de desgosto, pânico e uma risada nervosa (Flynn não conseguiu se conter). Ao menos o guitarrista não se demora em defender a fantasma que fora seu maior apoio durante todo tempo em que esteve preso no limbo do Mestre Fantasma — Calma, não é o que vocês estão pensando! Ophelia é a minha amiga e não concorda com o modo de agir de Ossário. Se não fosse por ela, eu teria surtado nesse tempo todo. Eu garanto que ela é confiável!

— Tá falando isso da mesma pessoa que acabou de ler a mente de Jules? Garoto... ou você é inocente demais ou deve estar viajando.

— Isso é sério, boxeadora. — Luke insiste para Flynn, ainda lembrando do soco que a amiga de Julie teria dado em sua bochecha sem nem pensar duas vezes — Além disso, ninguém é tão cruel ao ponto de apoiar as insanidades de Ossário. Bem... a não ser Caleb.

A luz externa do sol é coberta por um amontoado de nuvens escuras, retirando um pouco do calor e brilho que o céu ostentava sobre a quadra do ginásio. Julie sente a mesma falta de calor preencher o peito quando vê o sorriso estampado no canto da boca de Luke ao se pôr do lado de Ophelia-filha-de-Ossário-Chapman. Ele poderia estar em silêncio agora, mas a Molina sabia perfeitamente o que a breve troca de olhares entre os dois significava: Luke estaria aqui por Ophelia e ela, por ele. Não teria como quebrar essa ligação, muito menos como convencer o guitarrista de que o que ele estava propondo era arriscado.

Julie poderia ter dúvidas sobre dar seu voto de confiança para a garota, mas no fundo de seu peito uma pequena luz a tornava ciente de algo: ela poderia confiar nele em qualquer circunstância. E era isso o que faria.

— Sabe... — Ophelia atrapalha seu devaneio, sem mesmo expulsar a expressão de alguém com segundas intenções do rosto — Luke me deixou muito curiosa pra te conhecer algum dia, mas não sabia que isso iria acontecer tão cedo.

A Molina encontra os olhos acanhados de Luke, liberando um pequeno sorriso na mesma hora.

— Ele deixou, é?

— Com toda a certeza. Era Julie pra cá, Julie pra lá... uma pena que ele mesmo não lembrava quem era você até a gente se apresentar naquele dia. A propósito, gostou do meu solo?

A troca de olhares agora se rompe, dando espaço somente para um tênue sentimento de decepção e uma coceira incessante na nuca (Luke não conseguiu se conter). As coisas teriam andado pra um lado tão constrangedor que até mesmo a própria filha de Ossário teria percebido que algo saiu errado.

— Opa... foi mal, eu tinha me esquecido que esse assunto ainda era desagradável. — Ophelia reproduz, deixando pela segunda vez Julie incapaz de interpretá-la — Mas enfim... acho que não foi pra falar sobre o passado que a gente veio aqui, né, Luke?

— Ah, é. Claro... — ele gagueja, não demorando tanto para se aproximar se Julie numa tentativa de acalmá-la. Se a situação fosse outra, ele sente que gostaria de segurar suas mãos sem nem pensar duas vezes — Julie, você não faz ideia de como eu estou feliz em te rever, mas eu não estaria sendo honesto se dissesse que esse era o único motivo pra eu estar aqui.

É claro, ela pensa. Afinal, aquele não era seu Luke. Era apenas um fantasma dos resquícios de personalidade e aparência que o seu guitarrista costumava ter quando ele a conheceu no estúdio de sua mãe. Agora Julie se sentia mais ingênua que o próprio Lucas por imaginar que ela e os meninos seriam o motivo principal de Luke ter retornado. Mas claro que não era só ela. Sempre teria que ter um segundo motivo para aquele desmemoriado Luke Patterson querer visitá-la.

— Tudo bem. — o sorriso dela despenca enquanto tentava aceitar aquilo, mesmo sendo difícil — O que você tem em mente?

— Uma coisa que você vai odiar bastante. — Ophelia o corta, agitada como nos primeiros momentos que a Molina tinha visto a garota sobre o palco do anfiteatro da Redlands Bowl, assim como há pouco tempo, quando estava pairando sobre o chão — Disso eu tenho certeza.

— Ophelia, quer fazer o favor de me deixar falar essa parte? Julie merece.

A Molina engole em seco, sentindo como se a garganta estivesse ácida demais até para respirar.

— Agora você tá me deixando nervosa...

— Eu não fiquei interessado na sua conversa com sua amiga sobre o Hollywood Ghost Club à toa. Meu maior compromisso com Ossário é com aquele lugar. — ele prossegue, ainda como se uma pedra estivesse dificultando as palavras de saírem da boca — Enquanto Covington e os membros do clube faziam turnê eu não tive como me aproximar, mas agora que estão de volta... é a oportunidade perfeita! Eu preciso ir até lá.

— Pra quê, Luke? O que você tá tentando dizer?

O silêncio seria melhor do que qualquer coisa naquele momento. Ophelia estaria certa sobre a Molina odiar o que viria a seguir, mas mesmo assim, o guitarrista não consegue evitar. Ele sabia que só cumprindo o acordo com o Mestre Fantasma teria sua doce liberdade. Ele também se arrependeria do que estava prestes a dizer, mas sabia que era o necessário.

— Julie... eu vou me unir à banda de Caleb.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Luke está há 0 dias dando um treco na Julie. O recorde dele é 0 dias.

Continuem acompanhando pra descobrir as porcarias de decisões q o Luke vai continuar fazendo e novos trecos da Julie bsjshsjs

Até o próximo cap :)



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Forget me not" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.