Forget me not escrita por Lua Chan


Capítulo 10
Capítulo 09




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JULIE TROPEÇA NAS PALAVRAS, lendo preguiçosamente o anúncio do retorno triunfal do clube de Caleb em um flyer amassado. Um arrepio se dissipa em sua espinha ao pensar em como o líder do Hollywood Ghost Club conseguia ter um ar diplomata até mesmo na escolha de sentenças para atrair um número infeliz de novas vítimas, corpóreas ou não. Embora raiva e indignação fossem os únicos sentimentos que evocavam na menina quando Caleb Covington era mencionado, era irrefutável dizer que ele poderia conseguir o que quisesse sem muito esforço, assim como fizera com Alex, Reggie e Luke meses atrás. Isso a aterrorizava mais do que tudo.

Agora uma circunferência de chocolate quente e generosas migalhas de canela faziam marcas na extremidade do panfleto sobre a mesa da cantina da escola. Rachel Vuska não mede esforços para lamber os dedos lambuzados com o chocolate derramado de sua xícara e oferece um pouco da bebida para a jovem Molina, que recusa pela terceira vez. Julie estava indisposta para comer qualquer coisa naquele momento, principalmente sabendo que Caleb e sua trupe haviam retornado para o clube depois de finalizarem a turnê em Madrid. Não imaginava que seu pesadelo pudesse estar tão vivo, ainda mais depois de Luke quebrar sua promessa sobre voltar para ela tão rápido.

Afinal, já havia se passado 1 semana desde o choque de rever um novo e deslumbrante Luke a sua frente e o trágico incidente com Alex. Julie detestava admitir que sentia a falta do guitarrista, mesmo que ele fosse uma versão semi-desmemoriada e mais enérgica da original. Os meninos não teriam reagido tão diferentemente dela, um pouco amargurados por terem que observá-lo partir deixando apenas expectativas para seu retorno e dezenas de inquietudes acumuladas. Eles ainda tinham dificuldade de processar tudo o que envolvia o tal Ossário, o suposto maníaco que teria mantido Patterson longe de sua nova família.

Ela se recusava a continuar focando naquilo, mas era inevitável.

Julie, sem pensar duas vezes, rouba a xícara quente de sua agente, bebendo o resto do conteúdo de uma vez só. Sua língua agora ardia em chamas, dispondo para fora da boca num quase engasgo para que o ar agradável do ambiente pudesse amenizar a dor.

Rachel não contém um sorriso minimamente vingativo de se esboçar no canto da boca. A jovem Molina agora repensava se permitir a entrada da caricata mulher nos portões da Los Feliz High School teria sido uma boa ideia.

— Eu disse que deveria ter pedido algo gelado pra você. — diz ela, retomando a xícara das mãos de Julie para a mesa, evitando que o panfleto voasse para longe — Você não teria paciência de apreciar um bom café com leite com calma com esse seu estresse todo.

Descuwa, eu xó tawa tent-

— Por favor, me poupe, Molly, — a mulher naturalmente elegante, porém em seu dia de jaquetas puídas e all-stars desbotados, revira os olhos tediosamente. Ainda lembrava das lições de etiqueta aprendidas em seus estágios com produtoras importantes e fazia questão de segui-las — Recupere sua fala enquanto escuta o mar de sorte que podemos ter nessa semana.

Com a língua distendida para o céu da boca, Julie observa Rachel tilintar o anel do dedo indicador sobre o panfleto por repetidas vezes, mirando exatamente no rosto impecável de Caleb. Assim como a própria Molina, sua agente se recusa encarar a imagem do homem bem nos olhos, quase como se o fizesse pudesse ter sua alma sugada. Mais um calafrio se propaga em sua espinha.

— Goste ou não, querida, mas ele é nossa moeda de ouro. — continua ela com sangue nos olhos. A luz matinal transpassando na vidraça de uma das janelas agora refletia em cada detalhe de seu rosto — Muitas pessoas frequentam aquele bar-

Clube. — Julie corrige, fazendo-a torcer o nariz como se estivesse impaciente — É um clube de idiotas.

— Bar, clube, castelo da Barbie... não importa. Não tem outro lugar acessível em Hollywood que seja tão comentado como esse, ainda mais nas vesperas de uma noite de estreia. Soube que os ingressos esgotaram nas primeiras horas que começaram a anunciar. — Rachel percebe o suspiro morto de sua pequena estrela, mas prefere ignorar o ar de negatividade que tornava seus piores dias mais intensos — Qual é, Molly... você sabe que as coisas não são fáceis assim. Sua banda já perdeu o Redlands Bowl, quer mesmo se arriscar e perder uma outra oportunidade como essa?

— Se eu disser sim você iria me estrangular de quantos jeitos diferentes?

Então Rachel volta a sentir aquilo.

É o mesmo sentimento de quando agências promissoras batiam a porta em sua cara após negarem um contrato que a traria um completo triunfo. Ou quando sua irmã mais velha – condecorada como a Não-Ovelha-Negra da família – se esnobava por não ter tempo o suficiente para fazer reparos no motor de seu helicóptero particular todas as terças-feiras. Era desgastante ouvir isso. Estava sendo desgastante ver a Molina ter seu potencial novamente desperdiçado por pura irresponsabilidade.

Mas era como se não tivesse voz para se opor a menina. Como se seja lá o que a tivesse puxando-a para longe dos holofotes quentes do sucesso fosse importante demais para ignorar, embora a jovem caça-talentos quisesse.

Rachel Agapov Vuska libera vagarosamente o ar que havia prendido enquanto resolvia as próprias crises na agitação de sua mente.

— Tudo bem, tudo bem... Você deve ter um bom motivo pra não querer pisar lá, Molly, e eu espero que ele realmente seja bom. Mas não acha que poderia dar uma chance? Nem mesmo pra pensar nas possibilidades de se apresentarem só por, sei lá... menos de 2 horas?

— Rach... eu entendo, você fez tudo por mim nesse tempo todo. — Julie replica, até mais paciente que antes, mesmo com uma língua ainda bastante queimada — Entendo mesmo, mas aquele lugar... aquele homem me traz péssimas lembranças de coisas que poderiam não ter acontecido se... — se os meninos em nenhum momento tivessem me abandonado, ela faz questão de acrescentar apenas em seu cérebro, recordando perfeitamente de quando os 3 fantasmas haviam decidido ser mais importante assombrarem o pai de Carrie do que terem comparecido em sua primeira apresentação oficial na escola — ... se pessoas... tivessem tomado boas escolhas. A vida poderia ter sido menos vazia se eu nunca tivesse ouvido falar daquele clube. Acredite.

Julie força para não encará-la nos olhos, embora estivesse quebrando uma das regras para profissionalismo que a agente recitava todos os dias. Regra número quatro: nunca evite uma troca de olhares com seu ouvinte. Você pode convencê-lo de grandes coisas. A Molina, de fato, gostaria de convencê-la naquele instante, mas também convencer-se das tais grandes coisas se fosse mesmo possível. Convencer-se que poderia ser forte o bastante para enfrentar Caleb e sua trupe de manipuladores uma outra vez e mostrá-lo quem realmente estava no comando. Convencer-se que não seria o medo ou a insegurança que fariam-na se afastar do sucesso.

Convencer-se que Luke iria voltar.

Mas era tão difícil.

Julie sente as mãos macias de Rachel afagarem seu antebraço, um pouco como lembrava sua própria mãe fazer em si quando voltava da escola chorando por Flynn e ela terem brigado feio durante o recreio ou quando havia perdido a amizade de Carrie pelo que julgou ser para sempre. Aquele afeto, por mais que simples, sempre a acalmava e naquele momento não teria sido diferente. Os olhos grandes da agente carregam mais exaustão do que possivelmente ela poderia aguentar em meses de tentativas falhas para conseguir assinar um novo contrato. A Molina não conseguiu evitar a culpa pesar sobre os ombros.

— Vai dar certo na próxima. — diz Rachel, repentinamente — Foi o que você me disse antes, não é? Vamos só torcer pra que não demore tanto assim.

Ela pensa em Luke de novo – era até engraçado como a frase servia para ambas as situações. Pelo menos a garota sabia que poderia contar com seus 2 garotos e a agente para qualquer coisa. Isso parecia ser suficiente.

Um pequeno sorriso se esboça em seus lábios. Ela o mantém apenas para que a esperança permanecesse abrasadora no peito.

— Sim, vamos torcer.

 

 

. . .

 

Se tinha uma coisa com a qual Julie ainda não havia acostumado era o silêncio aterrador dos corredores do colégio logo no fim do intervalo. Nem as férias de verão seriam suficientes para fazê-la esquecer de como as proximidades dos armários pareciam uma zona de guerra com bolas de papel voando sobre várias cabeças, risadas constantes e às vezes até caras tocando violão ou gaita. Não tinha como não sentir falta daquilo principalmente hoje, já que a reunião com Rachel teria a atrasado para uma de suas aulas. 

Pelo menos Flynn a acompanhava, interessada demais em assistir o professor Kalid fazer uma palestra sobre biologia marinha e a importância de golfinhos para os humanos.

— Ele é um tédio, Jules! — Flynn insiste, procurando uma boa justificativa para ela e a melhor amiga matarem aula no ginásio enquanto o próximo horário não começava — Você sabe tanto disso que sem nem pensar seus pés estão te guiando até a quadra.

Você tá certa, ó grandioso oráculo. — a Molina quase cantarola, obrigando a garota das tranças replicar com uma careta rancorosa enquanto caminhavam até o fim do corredor — É isso mesmo que quer ouvir?

— Se diminuir uns 3 tons de sarcasmo eu vou ficar satisfeita.

— Legal. — Julie diz com a menor emoção possível. Aquele dia mal havia começado e as coisas não estavam indo tão bem — Tô ficando boa nisso, sabe? Mentir sobre coisas que parecem óbvias pras pessoas.

Ei! Mas eu estou certa!

A Molina ri, lançando um braço sobre os ombros da amiga para abraçá-la de lado e assim seguirem até o ginásio. Felizmente o zelador não estava por perto, provavelmente dando conta da limpeza da sala de música ou tomando um café na sala dos professores. Flynn não pensa duas vezes ao abrir a porta do lugar e empurrar a Molina para dentro, que quase tropeça nos próprios pés no processo. Não havia nada além de um cesto para bolas de basquete e meio par de sapatos jogados sobre a bancada da escadaria. Ninguém para delatá-las para a coordenadora sobre não estarem na aula. 

Enquanto Flynn resolve se espreguiçar em um dos degraus da escada, Julie rouba uma das pesadas bolas do cesto, tateando-a como se precisasse sentir a textura antes de se aproximar da cesta e atirá-la ao aro da tabela. Um suspiro mal calculado a faz inclinar o braço um pouco para baixo do alvo, culminando num erro e um xingamento silencioso.

— Eu tava falando sério, sabe? — diz, retornando o olhar para uma Flynn prestes a fechar os olhos e tirar um cochilo enquanto ainda tinham tempo de sobra — Sobre as mentiras...

— Tá falando da conversa com a Rachel ou isso é sobre 3 meninos fantasmas de uma banda morta que resolveu voltar a ativa depois de 15 anos?

— Sobre os dois, eu acho. — continua ela, parando para analisar os próprios sapatos — Talvez mais sobre a Rach. É uma droga ter que recusar outra proposta, mas eu simplesmente não posso aceitar uma apresentação no Hollywood Ghost Club já qu-

— Uma apresentação onde?! — a trançada ergue do banco num súbito, não evitando uma onda de tontura jogá-la de volta para o degrau. Julie se apressa para examiná-la, mas a garota afirma com confiança que estava bem — Você aceitou, não é? Lembre que só existe uma resposta certa pra isso.

— Não tava me ouvindo, Flynn? Eu neguei a proposta da Rachel sem nem pensar duas vezes e agora me sinto horrível por estar dificultando as coisas pra ela. Tô fazendo isso por mim e pelos meninos. 

— Ah, é... aquele cara biruta roubou as almas deles, né? Foi mal...

— É... — ambas sentem a atmosfera de negatividade formando nós em suas gargantas. Julie apenas torce para que as coisas pudessem melhorar em breve — Tudo daquele lugar me traz um pressentimento terrível. Menos o Willie, é claro, mas só por causa do Alex.

Flynn estende a mão para o ar, fazendo um pedido silencioso para que Julie pudesse puxá-la e então ficar de pé perto dela. Era estranho como lado a lado elas eram tão parecidas que poderiam ser confundidas como irmãs em um aspecto ou outro – menos no modo de vestir. Flynn tinha um gosto peculiar por estampas de oncinha e jaquetas felpudas que a Molina nunca entendera em anos de amizade. – De qualquer forma, tão parecidas ou não, Julie sabia que poderia contar com ela em seus piores dias.

— Você não tem culpa de nada, Jules. — sussurra a trançada, calmamente — Rachel tem uma sorte absurda de trabalhar com alguém tão incrível como você. Eu ia dizer que tenho certeza, mas na verdade eu sei que vocês vão conseguir encontrar uma próxima vez logo. Não tem nada tão legal como a Julie and the Phantoms por aí. Exceto por Harry Styles e Billie Eilish. Você sabe...

Elas riem como se não tivessem nada a mais para se preocuparem. Como se pudessem viver assim pelo resto do dia sem ninguém atrapalhar. Julie não poderia estar mais feliz por ter uma amiga como ela.

Era uma pena pensar que o momento de tranquilidade seria abalado tão cedo.

O recorrente anseio volta a provocar solavancos fortes no estômago de Julie, mesmo na tranquilidade inabalável do ambiente. Era como estar retornando ao dia em que havia apresentado no Orpheum ou ao Redlands Bowl, quando ouviu centenas de vozes vibrarem ao som contagiante da Final Sentence. Era estranho, considerando que tudo estava indo bem demais até então.

Isso até ouvir a voz de alguém que seu cérebro estava sendo obrigado a esquecer aos poucos.

Hollywood Ghost Club, hein? — Luke pronuncia lentamente, degustando cada palavra do nome que antes já o fizera estremecer — Parece que temos mesmo muito do que falar, Julie.


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Notas finais do capítulo

Voltei aaaaa. Mas acabou saindo um capítulo maior do que eu tava esperando (espero que não tenha problema).

Eis aí de novo o Luke pra causar um leve infarto na Julie, aquilo de sempre né rsrs

Enfim, enfim... vejo vcs no próximo capítulo Até loguinho



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