Meu nome é Nirvana escrita por belle_epoque


Capítulo 10
Guto, o palhaço, contra Nirvana, a ilusionista




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É claro que eu os observei de longe.

E foi isso o que eu observei: Daniel pegou um susto e se virou para Cibele como se estivesse prestes a lhe dar um soco. E então ele pareceu mais aliviado por ser uma garota bonita. A expressão dele mudou completamente para “encantamento” enquanto minha amiga parecia muito sem graça e sentia vontade de se enterrar no chão. Barbie observou tudo com uma expressão de nojo.

Cibele disse alguma coisa que o fez rir. E isso aqueceu meu coração.

No entanto era tudo o que Barbie precisava para revirar os olhos e ir embora.

Ao ver que eles pareciam ter engatado em uma conversa interessante, senti que minha menina estava segura então resolvi parar de observar da pista de dança e ir aproveitar a festa que eu havia penetrado.

A decoração em preto e branco se estendia também para o lado de fora, o deck e a piscina aquecida. Bolas brancas e pretas haviam sido disponibilizadas para as pessoas brincarem na piscina, e lençóis pretos e brancos criavam uma cobertura na tenda onde ficava o cara da tatuagem de renna.

Aproximei-me dele e vi um garoto sair com uma tatuagem de pinto na cara.

Sei que era errado, mas eu gargalhei.

— Ele pediu para você fazer um pinto na cara dele? Mesmo? — perguntei.

— Ele pediu para eu fazer algo que fosse significativo — o cara me respondeu. — Dei-lhe o significado da expressão “vá chupar uma rola”.

Ele parecia ser um desses caras maconheiros que aceitam qualquer bico para comprar as suas drogas, sabe? Mas de um tipo bom. Não de um tipo que vende droga para crianças numa festa.

Por isso me sentei no banco à sua frente e disse:

— Muito bem, vou ser mais específica: quero uma cruz gótica.

Ele passou as mãos pelos longos dreads.

— Não sei se eu sei fazer isso — ele disse, pegando uma folha cheia de desenhos diferentes e disse: – Você pode escolher qualquer uma dessas cruzes.

Eu dei uma olhada, mas não tinha nenhuma que eu quisesse. Foi quando eu olhei para a caneta na sua mão e sugeri:

— Eu acho que consigo fazer em mim se você deixar que eu me desenhe.

Ele hesitou, pensando nisso. Mas então deu de ombros. Quer dizer, ele havia acabado de fazer um pinto na cara de um estranho, a última coisa com a qual ele se importava era com adolescentes bêbados fazendo merda com suas tatuagens de renna.

Ele me passou sua caneta e me explicou rapidamente como usar.

— Vou pegar uma bebida para mim — avisou, saindo da tenda.

Eu sei, às vezes até eu me surpreendo com o como coisas estranhas acontecem comigo com a mesma naturalidade com que eu dizia “Bom dia”. Abaixei uma de minhas meias 3/4 e comecei a desenhar uma enorme cruz gótica na minha coxa. A tinta era engraçada, me lembrava um pouco uma nankin. Ela ficava brilhante e espessa na pele, como uma caneta porosa quando tinha muita tinta.

Ele voltou quando eu estava terminando meu desenho e disse:

— Caramba, garota! Você tem talento para isso!

Eu dei de ombros, convencida.

— Eu só passo muito tempo desenhando cruzes góticas no meu caderno — admiti com modéstia, finalizando o desenho.

Sentei-me ao lado dele, enquanto outros adolescentes bêbados apareciam e ficamos conversando sobre nada e sobre como odiamos festas adolescente. Confesso que banquei o diabinho e sempre que alguém dava instruções não específicas de um desenho, eu dizia: “talvez você devesse desenhar o Patrick com aquelas botas de vinil e cano alto” ou “hum, que tal desenhar uma bela bunda parecendo o pôr do sol?”

— Sério. Você é a garota mais maneira que já passou por aqui — ele disse.

— Eu sei — admiti, dando de ombros.

Até que enfim o deixei para ver como andava o meu projeto: DaniBele.

Meu deus, até o meu ship é perfeito!

Assim que saí da tenda, caminhei pela festa, procurando por Cibele e seu crush. Não os vi no lugar onde os deixei, e não os encontrei pelo deck. Caminhei pela casa, até parar no que devia ser uma grande cozinha abastecida com todo tipo de comida que poderia caber naquele lugar. Uma coisa eu tinha que admitir: Guto deu seu sangue, suor e lágrimas para essa festa ser a festa.

E logo eu descobriria o porquê.

Quando me aproximei das guloseimas dispostas sobre o balcão, algo me chamou muita atenção: um enorme bolo quadrado e com cobertura branca, com os dizeres: “Sweet Sixteen, Monstrenga” com glacê preto.

Eu sei...

O QUÊ?!

Essa visão foi demais até para a minha cabeça.

Respirei fundo e pense comigo: a casa está completamente decorada em cores preto e branco, tem tudo o que eu não gosto, maaas há um bolo para mim na cozinha. Um bolo em preto e branco...

Eu saí da cozinha como se houvesse visto um zumbi (porque eu até gosto de fantasmas) e voltei para o deck porque, de repente, eu não conseguia mais respirar. Encostei-me ao guarda-corpo de madeira que separava o lago abaixo do deck da casa e tudo o que eu conseguia pensar era: “Guto fez uma FESTA DE ANIVERSÁRIO para mim... e fez questão de NÃO ME CONVIDAR... ESSA ERA A SUA GRANDE E TERRÍVEL VINGANÇA?”

Sério, porque ninguém falou para a mãe dele que o bebê dela nascera sem cérebro?

Bem, se você acha que isso foi a coisa mais bizarra da minha noite, está muito errado. Recomendo que se segure à sua cadeira, se não, é capaz que você caia para trás. Se puder, coloque o cinto de segurança também, pois o impacto pode ser repentino.

Enquanto eu juntava todas as peças do quebra-cabeça e pegava um ar no deck.

Cibele me encontrou, com Daniel.

— Nirvana, você precisa ir embora daqui. Agora! — ela disse, agarrando-me pelos braços. Parecia sem fôlego, como se houvesse corrido a festa toda à procura de mim. — Essa festa...

— É para mim... não é? — eu perguntei. — Eu vi o bolo na cozinha...

Ela negou veemente com a cabeça, mas estava sem fôlego para falar.

— Guto fez tudo isso porque ele sabia que você vinha — Daniel me disse, ele tinha porte físico o suficiente para não estar ofegante. — Você precisa ir embora antes que ele te veja. Ele não vai te deixar ir embora até você soprar as velas do bolo e então ele vai explodir na sua cara na frente de todo mundo!

Pode parecer ridículo, mas eu soltei um suspiro de alívio.

Quer dizer, enfim um sinal do Guto que eu conhecia.

Essa ideia pouco inteligente condizia mais com Augusto Macciani do que a se contentar em fazer uma festa de aniversário para mim e não me convidar. Obrigada, meu Deus. As coisas estavam em seus devidos lugares.

— Obrigada pelo aviso, de verdade — eu agradeci aos dois. — Nossa, por um instante quase subestimei a imbecilidade de Augusto e achei que sua vingança era fazer uma festa para mim e não me convidar.

Daniel franziu o cenho e me olhou como se eu fosse uma maluca.

Cibele fez a mesma expressão.

Talvez porque eu estava calma demais para eles.

— Ah, olhem a minha tatuagem de renna. Eu mesma que desenhei, linda, não é? — eu disse-lhes mostrando o desenho em minha coxa exposta.

Cibele arregalou os olhos para mim, exasperada.

— Meu deus, Nirvana, você ao menos nos ouviu?! — ela gritou.

Se ela tivesse coragem, teria me agarrado pelos ombros e sacudido.

Quando eu me virei para responder a ela, não tive a chance, pois Guto me encontrou. Lembro-me de quando ele costumava ser um garoto magrelo com cara de rato, seus cabelos eram loiros, seu rosto continuava muito miúdo, mas ele tinha aqueles olhos azuis e frios que me causavam nojo. Hoje em dia seu corpo possuía alguns músculos que ele fazia questão de ostentar como se fosse uma medalha de honra sempre que fosse possível.

Ele se aproximou a passos rápidos e largos, como um predador que pegou a presa. Mal ele sabia que jamais me pegaria; eu jamais seria uma presa na sua armadilha. Nem mesmo que eu quase houvesse caído nela.

— Ora, ora — ele disse, parando à minha frente e cruzando os braços. — Não conseguiu ficar longe, não é?

— Olha... eu até consegui. Eu até queria ficar longe — eu confessei. — Mas sabe, há coisas mais fortes que eu... como a vontade de ver o seu fracasso de perto.

Ele deu uma risada sarcástica.

— Eu acho que todo mundo aqui ouviu quando eu disse que você não estava convidada para essa festa — ele disse em tom muito alto. — Mas eu entendo que tenha sido difícil... você ficar longe da melhor festa do ano!

As pessoas ao redor gritam em aprovação.

Perguntei-me qual o problema de Guto para transformar tudo em um show.

— Festa do ano? Fala sério — eu disse em deboche. — Sua tatuagem de renna é apenas um cara com marcador permanente. Eu não quero nem pensar em quantas DSTs estão nadando nessa piscina nesse exato momento e eu quero arrancar meu cérebro fora porque tem uma garota no Karaokê acabando com a música da Dua Lipa.

Quando eu me virei para ele, dei um riso sarcástico e disse:

— Você tem uma definição muito vaga sobre “festa do ano”. E graças a deus eu já estava indo embora...

Fiz menção de vazar dali o quanto antes, quando de repente ele agarrou o meu braço e seus amigos grande do time de basquete se meteram na minha frente, criando uma barreira intransponível de músculos.

Ok... Eu fiquei com um pouco de medo.

— Não tão rápido, monstrenga — ele disse, convencido. — Deixo você ir... se você se ajoelhar no chão e admitir que estava louca para vir à minha festa, por isso que você está aqui.

Fez-se um silêncio tenso no ar. Todo mundo parecia estar prestando muita atenção àquela cena de repente. Como sempre, o palhaço em seu circo, cercado pela sua plateia.

Dei uma risada sarcástica.

Ele não podia estar falando sério, né?

Bem, o que você acha?

— Ah é. É quem vai me impedir de ir embora, você? — eu desafiei.

Ele arqueou uma sobrancelha como se me desafiasse a tentar.

Confesso que por um momento, eu tentei. Me joguei contra os seus amigos altos e fortes, e eles prontamente me jogaram contra a murada de seu deck. Guto riu como se isso fosse engraçado. Olhei para Cibele e Daniel, eles pareciam horrorizados, como se nem eles imaginassem que Guto pediria para eu me humilhar daquela forma.

Os olhos de Augusto estavam fixos em mim, como se estivesse decidindo seu próximo passo naquele jogo de xadrez... ou tentando antecipar os meus.

Então você deve estar me perguntando: numa situação como essa, o que você fez Nirvana? Você vai se ajoelhar e admitir o que ele pediu? Ou você vai arrumar outra saída?

Bem, a resposta era simples: Guto fez o seu show.

Precisei fazer o meu maior ainda.

— Muito bem... parece que você me pegou na sua ratoeira, Sr. Rato — eu admiti, virando-me para ela e me apoiando no guarda-corpo de madeira. Comecei a tirar os sapatos. – É só uma pena... — Tirei minhas meias. Meu deus, estava frio. Pelo menos uns 12º — Que você obviamente não saiba... – eu desfiz o meu penteado com um único puxão dos grampos. – Com quem está lidando.

Eu subi na murada de madeira e tirei o meu vestido, e então cantei junto com a garota desafinada no Karaokê “Garanteed, I can blow your mind” e mandei um beijinho, antes de me atirar no lago.

ANTES DE EU CONTINUAR COM ESSE RELATO, PRECISO DEIXAR CLARO ALGUMAS COISAS: eu não nadei pelada no lago, como muita gente espalhou nas redes sociais essa manhã. Eu estava de sutiã bege e shorts preto (porque eu não me arriscava em ficar sem shorts por perto de Augusto Macciani).

Juro que no instante em que meu corpo afundou na água, a sensação era de que mil facas me cortavam ao mesmo tempo. Foi chocante e frio. Como uma tortura. Para piorar, o lago era fundo, de maneira que por mais que eu afundasse, não conseguia encontrar apoio para me impulsionar para a superfície (uma das piores sensações do mundo, se você quer saber).

Mantive a calma, e bati minhas pernas até nadar em direção à superfície.

De lá de baixo, eu podia ouvir o som abafado da agitação que tomou conta do deck da casa de Guto. E quando consegui chegar à superfície, escondi-me entre as palafitas da casa, para que ninguém me visse. E tudo o que eu ouvia eram pessoas gritando:

— Nirvana! Nirvana! Nirvana!

Apesar do frio que cortava meu corpo em pedacinhos, dei um sorriso convencido.

Então mergulhei e nadei para longe da casa dele.

Era como eu havia dito: eu jamais seria uma presa na armadilha dele.


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