A Mesma Sensação escrita por Loreh Rodrigues


Capítulo 3
Aqui estarei




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 Sé que nunca me verás
Como la causa de un desvelo
Yo sé que no comprenderás
Que soy el ángel de tu cuento
Entiendo que tus ojos tienen miedo
De ver a la mujer que soy por dentro 
Aquí Estaré — Angélica Vale

***

O elevador não ficaria parado por muito tempo e Victoria sabia que tinha uma fração de segundos para tomar uma decisão num contexto em que jamais imaginou estar antes de sair para ir ao Continental. A cada instante que os olhos verdes e intensos de Heriberto permaneciam sobre ela, ela confirmava o quanto ele ainda mexia com ela. Seu mundo ficava como aquele espaço sob aquela caixa de metal em que ela estava, completamente oco e fundo por baixo de seus pés. Além disso, ele tinha razão. Tinham muitas coisas que conversar, que esclarecer, mas... ainda não estava pronta! E essa era uma realidade incontestável.

A porta do elevador fez menção de se fechar e ela reagiu indo em direção a dentro dele o que fez com que Heriberto corresse e colocasse a mão na porta ainda que aquilo fosse algo que não se devia fazer no hospital. Ele ficou parado na frente dela e ela quase podia jurar que via dor em seus olhos.

— Tudo bem! — Ele disse conformado. — Você não está pronta, eu entendo. Mas precisamos conversar sobre o que aconteceu.

Victoria não conseguia reagir, era como se estivesse envolvida por suas palavras, ele parecia saber ler seus pensamentos e isso voltava a deixá-la vulnerável, definitivamente precisava encontrar uma maneira de fugir de todo aquele imbróglio sentimental que ela se recusava a assumir.

— Eu vou ficar neste consultório, estou voltando hoje a trabalhar no Continental. Vou estar te esperando. Em qualquer dia, a qualquer hora, Victoria... Se você quiser ou precisar falar comigo, aqui estarei te esperando, não duvide em aparecer.

Ele tirou a mão da porta que se fechou levando embora a única mulher que havia entrado nele a ponto de que ele adoecesse de desejo. E agora, por culpa de Bernarda, a havia perdido depois do tanto que havia feito para conquistá-la. Voltou a seu consultório e começou a imaginar Victoria se despindo ali para ele, sem pudores, e eles se amando loucamente com toda a adrenalina de um encontro clandestino. Deus, como a desejava e ainda mais se não a podia ter!

Victoria, por sua vez, entrou em seu carro e tomou um tempo antes de conseguir se mover dali. Seu coração estava disparado, ela podia sentir a adrenalina circulando por suas veias junto com o sangue, a boca seca e aquele desejo! Estava tão magoada com Heriberto, mas sabia bem porque não podia entrar em seu consultório, não sabia resistir a ele. Perto dele, como num passe de mágica, toda a raiva, mágoa e resistência desapareciam e só restava aquele desejo. Se ele se aproximava dela, podia dizer a mentira que quisesse que ela acreditava. E já havia se dado muito mal por confiar na verdade dos olhos de um mentiroso profissional.

— Victoria, escute o que você está dizendo. — Contestou Antonieta às magoadas acusações de Victoria. — Heriberto foi padre até alguns meses atrás, você mesma me disse que acreditava ter sido a única mulher de sua vida, como agora você pode me dizer que ele é um especialista em mentir para conquistar as mulheres?

— Isso foi a estratégia que ele usou para me enganar. — Resistiu Victoria teimosa como só ela sabia ser. — E eu fui muito idiota de ter caído nesse joguinho de homem inexperiente, encantado por mim, enlouquecido pelo modo como fazíamos amor... — Disse com amargura. — Está claro que uma só uma pessoa enlouquecia naquelas noites... tardes e manhãs também... — Chegou a se abanar ao sentir o comichão que aquelas memórias lhe provocavam.

— Victoria, essas coisas não se fingem. — Disse Antonieta levemente ruborizada com um sorrisinho. — Uma mulher pode fingir paixão... Um homem não! Salta à vista e eu não estou falando de uma ereção.

— Pois ele descobriu uma maneira de fingir! — Insistiu insensata. — E eu não entendo porque você o defende tanto.

— Porque Luiz não consegue acreditar, e eu também não, que Heriberto tenha algo com Bernarda. Ele acha que algo aconteceu, algo como... chantagem.

— Ah, por favor! — Irritou-se Victoria levantando-se. — Com o quê? Com o que Bernarda chantagearia Heriberto?

A porta do apartamento de Antonieta se abriu e Luiz entrou cumprimentando Victoria com um sorriso, sempre muito amável e simpático.

— Eu já vou. — Ela disse pegando sua bolsa. — Até logo, Luiz. E Antonieta, te espero amanhã às 11 na reunião com o conselho.

Antonieta assentiu e segurou sua mão com um sorriso de cumplicidade antes de que ela se fosse. Ela sabia que aquela era uma maneira de Victoria pedir-lhe apoio por toda a amizade que compartilhavam. E estava pronta a apoiá-la, mesmo no que ela se recusava a pedir apoio e ajuda.

Depois que ela saiu, Luiz a beijou conduzindo-a para o quarto onde ela pode deixar desbordar toda aquela paixão de mulher ardente que ela havia adormecido por tantos anos em que esteve apaixonada por Oscar em silêncio. Depois do amor, Luiz percebeu seu silêncio diferente, acariciou sua pele e seus cabelos e, carinhoso, quis saber porque ela estava tão calada:

— Victoria se encontrou com Heriberto hoje no Continental. — Explicou. — Luiz, nós temos que ajudá-los, há muita coisa sem explicação nessa história toda e essa Bernarda... Essa mulher me causa arrepios.

— Eu concordo. Me ofereceram uma vaga no Continental. — Ele recordou. — Vou aceitar e me reaproximar de Heriberto. Ele não vai ter outra alternativa senão me contar a verdade.

— Jura que você vai ajudá-los? — Sorriu ela apaixonada.

— Claro que sim. Não quero que nada possa roubar a tranquilidade desse rostinho tão bonito. — Ele acariciou suas bochechas e seu queixo. — Pode deixar que aqui estaremos para o que Heriberto e Victoria precisem.

Voltaram a beijar-se e entregarem-se àquele amor que tanto bem fazia a ambos. E lhes fazia tão bem que eles queriam compartilhar aquela felicidade com seus melhores amigos que estavam tão injustamente distanciados.

***
Eram seis da manhã quando Victoria despertou do pouco que tinha conseguido dormir. Havia passado quase toda a noite inquieta, volteando naquela cama que parecia tão grande só para ela e o bebê que carregava em seu ventre, desassossegada pelas indesejadas visitas dos fantasmas daquela paixão.

A perturbação era tão real, que ela quase podia sentir o corpo de Heriberto pesando sobre o dela, o calor de sua respiração inquieta sobre seu pescoço, enquanto suas mãos acariciavam os mais inesperados cantinhos da sua pele, eriçando cada pelo, como se chamasse por ele. Chegava a ofegar quando aquele calor se entranhava por seus poros e lhe provocava involuntários gemidos de desejo.

A noite de Heriberto não tinha sido muito diferente. Fantasiava com a sensação de ter Victoria em seus braços, desfrutando de suas carícias e da impreterível repetição do movimento do deslizar de seu pênis por sua vulva úmida perfeitamente encaixada a ele, delirando em gemidos e instintos selvagens. E depois de tudo isso, vinha a ternura de senti-la dormir sobre seu peito, sexualmente satisfeita e com a alma também contentada pelo amor verdadeiro. Sua, unicamente sua.

Victoria terminava de se arrumar e olhou-se no espelho em busca daquela confiança que havia perdido com tantos golpes. Ela havia escolhido uma blusa de seda branca com bolas negras e a gola até o pescoço combinada a uma saia preta justa que ia até um pouco acima de seus joelhos. Alguns acessórios, os cabelos soltos e a maquiagem leve faziam-na sentir pronta para falar com Fernanda e os outros conselheiros, mas por dentro toda a insegurança aparecia, precisava de Heriberto, era um fato.

Saiu de casa antes das 8 da manhã, pensando em tentar uma conversa com Fernanda antes da reunião, não se conformava de que a relação das duas tivesse terminado tão trincada por uma sucessão de maus entendidos e o gênio de Fernanda, tão parecido com a da mãe. Em um semáforo, uma chamada entrou pelo painel do carro que tinha o bluetooth pareado e Victoria atendeu com o botão do volante.

— Victoria, onde você está? — Indagou Antonieta aparentando nervosismo.

— Acabei de sair de casa, estou indo para a Casa Victoria. — Respondeu ela intrigada pelo nervosismo da amiga.

— Não venha! — Ela disse enfática. — Não chegue antes das 11, Fernanda acabou de me dizer que espera que você não a procure antes da reunião porque ela vai passar toda a manhã reunida com não sei quem, não sei onde, já até saiu. Deixou ordens para que te barrem caso você tente entrar, eu não sei o que acontece com essa garota, parece possuída por um espírito ruim! — Não viu quando soltou as palavras sem nenhum rodeio.

— Está bem, Antonieta, obrigada. — Agradeceu Victoria quando viu o sinal abrindo seguindo o caminho. — Muito obrigada por evitar que eu passe um momento tão desagradável nesse lugar que é tão importante pra mim. Nos vemos mais tarde. — Encerrou a ligação.

Na rua da frente, Victoria deu a volta no quarteirão pretendendo voltar para sua casa, para a companhia de seus demônios, quando se viu diante da entrada do Hospital Continental. O destino parecia querer pregar-lhe uma peça porque ela se viu sozinha, com três horas livres e uma irresistível necessidade da compreensão que somente os olhos dele podiam lhe dar. Seria verdade que ele estaria ali... a sua espera como lhe dissera na véspera?

***

 Y aún así, te cuidaré
Casi leyéndote el pensamiento
Y aún así, me quedaré, siempre a tu lado
Junto a tus silencios
Y aún así, te seguiré
Hasta que el mundo cambie y gire al revés
Aquí estaré 

 

 


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